Príapo Partindo



A rua do canal, normalmente movimentada pelo tráfego incessante de veículos e pedestres, estava tão deserta e silenciosa naquela madrugada de segunda para terça que o baque metálico da troca de cartazes do totem publicitário poderia ser ouvido da janela de um apartamento próximo. Conforme as instruções passadas por telefone, ela virou na segunda esquina depois do posto de gasolina, a sem placa de identificação e com o casarão amarelo de dois andares. Pouco adiante, no fim do quarteirão, erguia-se o tal prédio cinza com fachada avançada em cuja lateral se podia ler verticalmente a palavra HOTEL pintada em letras pretas garrafais, uma para cada nível. O dele era o quinto. O 'H'. 'Tem dia que o elevador funciona, tem dia que não', ele a prevenira por telefone, mas pelo jeito ela estava com sorte. Perguntado sobre o ocupante do 501, o recepcionista se limitou a apontar a porta pantográfica ao lado de um sofá de mogno e palha, indicando que ela subisse sem se identificar.
O homem que atendia pelo apelido de Guto abriu a porta só de bermuda vermelha de cintura baixa, aparentemente sem cueca, maço de cigarros na mão. “Uau”, ele disse baixinho, olhos crescendo para a visão atrás do batente. Ela podia acusar a excitação dele pelo cheiro. “Entra.”
Ela entrou e atravessou o cômodo, um cubículo escuro com uma janela quadrada debruçada sobre um pátio interno e um preguiçoso ventilador de teto que pouco podiam contra o calor de mais de trinta graus daquela noite de novembro. Depois de fechar a porta, Guto puxou um cigarro do maço, sacou o isqueiro do bolso da bermuda e se largou ao pé da cama, perto de onde o lençol sem elástico deixava entrever o colchão manchado na lateral.
"Está um calor infernal aqui", resmungou entre os lábios espremidos, acendendo o cigarro.
"Nem tanto", ela respondeu em tom inexpressivo.
"Vai ver daqui a quinze minutos..." Com um sorriso malicioso, ele se esticou languidamente para devolver o maço ao criado-mudo, onde se viam ainda um pacote de camisinhas, um cinzeiro e uma caixa de Halls preta. Sempre havia balas para disfarçar o gosto do tabaco, embora o beijo estivesse longe de ser um dos números mais requisitados do repertório. "Mas você ainda nem me disse seu nome", sussurrou num tom pretensamente confidencial que a fez bufar uma risada.
"Precisa mesmo saber?"
"Não." O sorriso de dentes desalinhados e encardidos pela nicotina agora era cheio, mais firme, mais safado. Ele tragou fundo, olhos passando de relance pelas curvas que se deixavam adivinhar através do vestido preto na altura dos joelhos, abotoado na frente, com gola social e mangas três quartos dobradas. "Mas você veio pra ficar aí tão longe? O que te trouxe aqui, afinal?"
“Destino."
Guto deu uma risada desconcertada. Não era o que esperava ouvir, mas tudo bem; talvez tivesse formulado mal a pergunta. Largou o cigarro no cinzeiro, tirou uma Halls da caixa e pôs na boca. Remexendo ruidosamente a bala com a língua, plantou as mãos no colchão e projetou os quadris para frente.
"Você não me quer?"
"Quero..." a mulher murmurou na mesma voz monocórdia, ainda de pé ao lado da janela. Olhava-o de cima, nada no rosto ou nos gestos que indicasse a mais leve excitação. Aquela era diferente. Talvez fosse mais um dos inúmeros casos de mulheres infelizes no casamento, esposas até então conservadoras e fiéis que chegavam ali como por acaso, indecisas, envergonhadas, irritadas, curiosas, receosas, tudo ao mesmo tempo. Tão confusas que nem sabiam por onde começar. Sem problema, ele tinha um plano para essas situações. Era experiente, rodado... Talvez até demais para seu próprio bem.
Num passo repetido tantas vezes que beirava o automatismo, Guto desceu o zíper da bermuda e começou a se tocar, tudo lento e coreografado, como num strip. O truque era não abrir o botão, só enfiar a mão por dentro e deixar o tecido subir e descer sugestivamente. Quando a mulher enfim cobriu a distância entre a janela e o pé da cama, ele sacou a ferramenta de trabalho e voltou a reclinar o corpo. Outro sorriso safado. O pau agora estava bem duro, oferecido para ela através da abertura, prepúcio retraído por completo. Devassado. Pronto em segundos, como um bom profissional, ele se levantou e colou o corpo no dela, encaixando a um tempo a ereção na dobra da virilha e a boca na curva da base do pescoço. Fria. Fria não, gelada. Na verdade, o choque térmico foi tão grande que o fez arregalar os olhos e recuar de chofre.
"A-acho que estou doente", gaguejou; instintivamente se esquivou de novo quando a mulher fez menção de tocar sua testa, mas depois se controlou e deixou que a palma gelada se encaixasse entre a raiz dos cabelos e as sobrancelhas. Embora estranho, o toque tinha certo frescor reconfortante.
"Parece que sim." Ela afastou alguns fios para o lado.
Sim, devia ser isso. Evitando o contato visual, quase como se fosse sua iniciação no métier, ele cingiu-lhe a curva da cintura e puxou-a para beijar o vale entre os seios. De encolhido pelo susto, o pau logo voltou a ficar rijo e desejoso de toques mais íntimos. Ele tomou-lhe a mão, moldou-a na forma de um túnel frio e apertado, fez dois ou três movimentos e esperou. A forma quase mecânica como a massagem começou não o impediu de abrir a bermuda e os três botões de baixo do vestido dela; tinha pressa, precisava saber... Mas a temperatura das coxas parecia a mesma de todo o resto, e os lábios murchos e secos como dois gomos de tangerina deixados por semanas na geladeira. Havia algo terrivelmente fora do normal naquela falta de calor, de desejo. Ela mais parecia um cadáver. Não que Guto já tivesse algum dia tocado um, mas a ideia de fazer sexo com uma pessoa morta lhe deu um arrepio na espinha. E mesmo assim ele, Príapo incurável, eterno escravo dos sentidos, ainda a queria; queria saber o que mais se escondia por trás das camadas de tecido, tocá-la e desbravar seus caminhos.
Sabendo-se observado com a mesma indiferença, ele a deitou na cama e despiu do vestido o que se revelaria a definição literal da expressão 'beleza escultural': uma estátua animada em carrara, fruto improvável das mãos talentosas e da auto-congratulação embevecida de algum mestre romano. Os deuses pagãos, brincalhões que eram, deviam ter decidido pregar-lhe esta peça, e agora a peça estava prestes a ser pregada em outro artista. Destino. Tal qual estátua, ela continuava imóvel, pele imaculadamente branca em contraste com as vestes escuras — 'um anjo de asas negras’ foram as palavras que passaram pela cabeça de Guto —, seios médios de auréolas claras e pequenas, cintura fina, quadris redondos, triângulo de pêlos curtos entre as coxas grossas, tudo ali exposto para ele.
'Diz não', veio o sussurro em seu pensamento, calmo e firme, quase professoral. A cola do teste soprada pela própria avaliadora. 'É só dizer não.'
Sem tirar os olhos dela, Guto se despiu da bermuda. Também não usava nada sob a peça, e nu se deitou sobre a bela estátua, abandonando o pau entre as coxas frias. A cabeça melada roçou os pêlos e com alguma insistência escorregou entre os lábios, primeiro pelo clitóris e depois pela fenda, em busca do encaixe. Cingindo a coxa esquerda da mulher para abri-la mais, Guto se posicionou na entrada e avançou até a metade com um gemido alto, parte alívio, parte desejo. Começou todo errado, sem preliminares, sem proteção, sem auto-controle, esquecido de toda a rotina aprendida e praticada por anos de experiência. Num segundo estava tudo dentro, corpos se ajustando à forma e temperatura um do outro, buscando o ponto de equilíbrio. Doía entrar a seco e com tanto ímpeto por uma passagem tão apertada, mas o prazer era maior que tudo, avassalador, anestesiante. Ele estava perto, estava quase... Sem se dar conta dos próprios gemidos, segurou-a pelas nádegas para ir mais fundo e se lançou em investidas enérgicas. A posição projetou seu pescoço contra os lábios dela, que imediatamente se colaram à pele pegajosa de suor e se abriram para dar passagem aos dentes.
"Ahn?" ele balbuciou desorientado, como alguém sacudido durante o sono. A mulher frígida agora o olhava com um sorriso largo, o fino lábio superior repuxado sobre caninos que mais pareciam presas. "Mas o que..."
Dessa vez Guto estava realmente assustado. ‘Apavorado’ talvez fosse a palavra. Não experimentava aquela sensação num serviço desde certo incidente três anos antes, quando um lutador de jiu-jitsu de cerca de um metro e oitenta e cinco pagara para espiá-lo com a esposa de trás de uma cortina que só deixava de fora o olhar vidrado de quem poderia a qualquer momento saltar para o sofá e espancá-lo até a beira da inconsciência. Como naquela noite, Guto pensou em recuar para o pé da cama e dali fugir aos tropeções, mas seu corpo parecia indiferente a todo e qualquer comando; apenas deixou que a mulher rolasse por cima dele e corresse lábios e língua pelo seu corpo, acariciando, entorpecendo, preparando. A partir dali, tudo virou um borrão. Só recuperou a consciência quando a dor alcançou o limite do suportável e a boca começou a sugar com pressão, sedenta pelo líquido rico e espesso. Agora o corpo reagiu primeiro, os olhos se arregalando, uma golfada de ar invadindo a boca, a mão direita agarrando o vazio e por fim esbarrando no criado-mudo, por pouco não perturbando o cinzeiro. A surpresa deu lugar a uma violenta e aterradora sensação de perda, como se algo essencial lhe fosse tirado. Sentia-se irremediavelmente doente, necessitado com urgência de um médico ou pelo menos um padre que lhe ouvisse os pecados e garantisse que sua alma fosse para o Purgatório e não o segundo círculo do Inferno, o patamar dos luxuriosos. Mas, acima de tudo, pairava a certeza de não haver tempo para mais nada. Dessa vez não seria só uma 'pequena morte'.
Unhas cravadas com firmeza no corpo jovem e rijo, ela mergulhou ainda mais fundo e chupou ainda mais forte, saboreando gostos e cores, consumindo corpo e alma. Toda a história das duas vidas dele. Imagens de um turbilhão de rostos, bacanais reais e imaginados e todo tipo de perversão fluíam com o líquido vital no ritmo desesperado das batidas do coração dele, aos poucos perdendo força e velocidade até tudo se reduzir a um monótono murmúrio indistinto. Três... Dois... Um. Descanso absoluto para os sentidos. Tão rápido, e no próximo segundo ela desaparecera na noite. Quem quer que fosse o primeiro a entrar pela porta escancarada, encontraria apenas o corpo nu estirado na cama — branco como leite, esvaziado, inerte, pescoço torcido num ângulo estranhamente desconfortável para alguém adormecido — e meia dúzia de moedinhas espalhadas pelo criado-mudo.

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Ficha do conto

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Nome do conto:
Príapo Partindo

Codigo do conto:
92056

Categoria:
Fantasias

Data da Publicação:
16/11/2016

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