Parte 1 - O segredo de Amanda

        No auge dos meus vinte e um anos de idade, em uma sexta-feira, uma reunião de negócios em Moema (SP) acabou já passava das oito horas da noite. Tudo acertado, negócio fechado, era hora de comer alguma coisa e, quem sabe, me divertir um pouco. Os outros participantes foram embora; pois, casados, tinham suas responsabilidades familiares. Ao ir para o estacionamento pra pegar meu carro, passei na frente do Fran’s Café, e decidi entrar pra comer algo lá mesmo. A coxinha deles é fantástica…

        Pedi um café e duas coxinhas, e me sentei do lado de fora pois lá me sentiria mais a vontade. Nesse momento eu a ví: uma mulher incrívelmente sensual, aproximadamente 1,70 de altura, cabelos pretos passando do meio das costas, pele branca, rosto pequeno e delicado, olhos verdes decorados com delineador preto na medida certa, pés delicados, coxas grossas, bunda no tamanho certo e seios médios… Ela fez seu pedido, todas as outras mesas tinham grupos de pessoas, então ela veio na minha direção. Pude apreciar aquela mulher maravilhosa, ela usava uma mini saia, meia calça escura, uma blusinha vermelho escura e saldálias que realçavam seus belos pés. Me perguntou se eu me importaria em dividir a mesa com ela, pois todas as outras mesas estavam ocupadas, e é claro que não me importei nem um pouco. Ela se apresentou como Amanda, eu também me apresentei (meu nome é Castro), e aproveitei a oportunidade pra puxar a cadeira pra ela se sentar. Agradeceu a gentileza com um sorriso lindo e um olhar sensual que me fez pirar ali mesmo.

        Seu pedido chegou junto com outro café pra mim, ela comeu um lanche natural e ficamos por ali, conversando besteiras, nos conhecendo, rindo bastante. O tempo foi passando, nem me dei conta, e de repente já era mais de honze horas; e nós continuavamos conversando. Se sentindo mais a vontade comigo, ela me falou sua idade, 27, disse que veio do interior tentar a sorte na cidade grande; e pra fugir do preconceito, pois nas cidades pequenas tem muitos moralistas e falsos moralistas, que tinha muitos problemas de aceitação devido a sua condição.

        - Que condição? Não estou entendendo…
        - Não percebeu que eu sou uma mulher diferente?
        - Sim, você realmente é diferente… Sua beleza é estonteante...
        - Obrigada, mas não é isso. Fique por perto e quem sabe você descobre… Tem um barzinho aqui perto que apresenta bandas de rock and roll, você gosta?
        - Gosto sim, principalmente de metal. Vamos lá tomar uma cerveja?
        - Vamos.

        Paguei as duas contas, a minha e a dela; ela agradeceu novamente e fomos para o tal bar. Conseguimos uma boa mesa, em um lugar mais reservado. Ela se sentou bem perto de mim, pedi duas cervejas, ela pediu uma porção de frango a passarinho pra acompanhar, e ficamos por lá conversando, bebendo, comendo, ouvindo musica. Não sei o nome da banda que tocava, mas era muito boa. Mais cerveja, mais porções, mais conversas e mais música.

        Eu estava me sentindo nas núvens, apaixonado por aquele momento, me apaixonando por Amanda. Queria que aquela noite não acabasse nunca… Mas algo me deixava com uma dúvida, toda vez que eu tentava tocar nela, ela se afastava. Várias vezes ela tirou minhas mãos de suas pernas, tentava beijá-la e ela fugia. Até que perguntei o que acontecia.

- Amanda, o que está acontecendo? Eu sinto que você quer, mas sempre foge de mim… Você namora? É casada?
- Não, bobo… sou solteira, livre, leve, solta e desempedida….
- Então por que não deixa eu te beijar?
- Por que você ainda não descobriu meu segredo… Eu sou uma mulher diferente, lembra?
- Sim, mas não vejo nada de errado com você. Vejo uma mulher linda, interessante e divertida… Qual será o seu segredo? Você gosta de mulheres?
- Eu vou te contar. Mas você tem que me prometer uma coisa antes.
- Prometer? O que?
- Lembre-se de que eu te respeitei, não me aproveitei de você. Depois que você souber da minha condição, se ainda quiser, veremos o que acontece.
- Tá, mas o que eu tenho que prometer?
- Promete que não vai me maltratar? Não vai ficar violento nem me deixar sozinha aqui?
- Mas por que eu faria isso?
- Promete?
- Prometo sim. Seja lá qual for o seu segredo, eu prometo que não vou te maltratar nem te desprezar.
- Promete mesmo?
- Sim, prometo.
- De verdade?
- Prometo, mesmo, de verdade. Agora fala.
- Você prometeu três vezes, hein… olha lá…

        Toda a ansiedade pra descobrir o segredo de Amanda fizeram com que meu tesão baixasse um pouco, ou talvez foram as bebidas, não sei ao certo. Eu ri. Estava curioso, até um pouco preocupado… Qual poderia ser o segredo de Amanda? Ela chegou mais perto com sua cadeira, e falou tão baixinho quanto possível no meu ouvido:

- Eu não sou uma mulher que gosta de mulheres, eu gosto de homens. Meu segredo é que… Eu não sou uma mulher… Sou travesti…

        Quando ela me revelou que é uma travesti, não sei o que me deu… Senti um misto de emoções muito fortes, meu sangue ferveu, meu corpo esquentou, eu tremi… Meu pau ficou duro de um jeito que eu não sabia ser possível; e, em um segundo de insanidade (ou sanidade), aproveitando que ela ainda estava perto do meu ouvido falando algo que eu não ouvia, a beijei… Beijei aquela boca como se fosse a única boca que existia no mundo, um beijo longo, molhado, prazeiroso; transbordando desejo… Então ela parou de me rejeitar, e me aceitou. Uma de minhas mãos passeavam por suas costas, enquanto a outra acariciava suas coxas…

        Quando paramos de nos beijar, olhei dentro daqueles olhos verdes e ví a pureza de suas intenções. Não ví maldades. Sim, ví que ela me desejava, e muito; mas também ví medo de ser desprezada, maltratada. Ví uma pessoa sofrida pelo preconceito. Fiquei extremamente contente por ela ter me respeitado e confiado em mim, e ao mesmo tempo fiquei confuso… Beijei uma travesti, beijei um homem? O que isso significa?

        Sempre tive a visão de que gays e travestis são pessoas sem padrões morais, naquele momento percebi a farsa programada por anos de convivência em uma sociedade machista e preconceituosa…

        Amanda também parecia confusa, creio que ela não esperava minha atitude. Nem eu esperava beijar-la daquela forma, foi algo instintivo, primitivo, animal; fui dominado pelo desejo puro. Prazer não tem gênero… Iniciamos um novo diálogo, quando ela, em sua própria confusão, me perguntou:

- O que acabou de acontecer?
- Também não sei, não consegui me controlar. Precisei te beijar.
- Você já tinha ficado com uma mulher como eu?
- Não, nunca. E que eu saiba, nunca tinha conhecido uma mulher como você. Se já tive contato com alguma, ela não me falou…
- Como está se sentindo?
- Confuso, não entendo o que está acontecendo… Agora minha cabeça tá uma zona… E você, como está se sentindo?
- Eu estava com muito medo da sua reação, e agora estou me sentindo feliz. Um pouco preocupada em saber que você está confuso. E agora, o que acontece?
- Não sei, não faço idéia de como agir com uma mulher como você.
- Bobo, eu sou uma mulher quase igual as outras… Sou uma dama, só que de paus… (riu)
- E seu pau funciona? Desculpa, eu nunca pensei sobre isso, nunca imaginei uma situação dessas…
- Funciona sim, e muito bem (rindo muito); e eu adoro usar ele com alguém que goste da fruta… Mas também adoro usar minhas outras formas de prazer…
- Outras formas? (perguntei, mostrando claramente que não entendia nada do assunto)
- Sim, eu tenho uma boquinha que dizem que é de veludo, e tenho um cuzinho que cuido muito bem pra estar sempre apertadinho…

        Naquele momento a realidade bateu, percebi que aquela era uma oportunidade única, perfeita pra explorar novas possibilidades de existência. Dei um selinho nela, pedi mais duas cervejas, ela falou pra pegarmos uma só, que dividiriamos. Bebi o resto que ainda tinha no copo, a abracei pelo pescoço, trazendo ela pra bem pertinho de mim, e assisti um pouco do show. A cerveja chegou e bebemos, ela parecia muito leve, muito tranquila com aquela situação. Quando acabamos de beber, ela falou pra sairmos de lá, que conhecia outro lugar muito legal e que seria chato passar a noite em um único bar. Paguei a conta e saimos.

(continua)