Como esquecer seu ex-namorado. pt1

Já sentiu-se impaciente? Pois bem caro leitor, minha história começa exatamente com essa sensação, aquela coisa que você não consegue controlar, movimentos repetidos e inúteis, um olhar disperso que parece ansioso pela chegada de algo e dedos movimentando-se rapidamente pela touch screen do celular. E dentro desta impaciência foi que, após dois meses, eu enviei-lhe uma mensagem. Nada tão criativo ou discreto, apenas uma forma de poder entrar em contato e descobrir o que é que íamos acabar resolvendo daquilo, já que não nos falávamos mais e ele não parecia querer me procurar. ‘Vc tá na sua casa?’ – disse, esperando a resposta que demorou a chegar. Primeiramente imaginei que ele não responderia, afinal fui um pouco seco e talvez conclusivo com essa expressão, mas ainda assim outra resposta – tão pouco atraente quanto tantas outras possíveis – foi sinalizada pelo toque do meu celular. ‘Quem é?’ – dizia, fazendo com que vosso caro narrador, nascido sob o sol de Leão, ficasse um tanto irritado. “Henrique” – respondi. Desliguei o computador e já estava vestindo uma camiseta quando recebi a resposta: “Sim Pet”. Claro, não faz sentido à você caro leitor, porém este era um dos apelidos pelos quais ele costumava me chamar, e a referência à ele certamente me amoleceu um pouco, dissipando a raiva e me fazendo compor uma mensagem menos apática. “Posso passar aí pegar meu livro??? O Marcos pediu emprestado antes de ir ver o filme”. Sua resposta veio rápida. “Pode. Eu nem lembrava disso”. Definitivamente, não iria entregar-lhe o ouro tão fácil: “Nem eu, acabei de receber a mensagem dele”.

Não nos falamos mais por celular então. Terminei de me vestir e saí de casa, descendo alguns quarteirões até chegar à rua dele. O caminho parecia-me estranhamente familiar, como certamente era, mas algo naquela lua cinzenta que brilhava no céu me fez sentir que havia algo novo, preparado e aguardando por mim. Como minhas previsões eram falhar, imaginei muitos pontos como um presente especial, um pedido de reconciliação, uma surpresa emocionante. Ao chegar até sua casa, chamei-o e então deparei-me com sua mãe saindo à porta de entrada.

- Boa noite Rick. O Beto está no quarto, pediu para você entrar. – disse ela. Agradeci, entrando e pedindo licença, me dirigindo diretamente ao quarto dele.

É, caro leitor, talvez já esperasse que eu lhe contasse que minhas pernas bambearam ao entrar naquele quarto. Tudo parecia perfeitamente igual: o cheiro de desodorante imediatamente ao abrir a porta, as fotos espalhadas pela parede, presas por fita adesiva, a cama desarrumada, sua mochila ao canto e ele, sem camisa, sentado no computador. Sua expressão não era muito convidativa, porém tampouco fui recebido mal. Levantou-se e me cumprimentou com um abraço. Caloroso, porém um pouco mais intenso quando sua boca começou a deslizar pelo meu pescoço, provocando um arrepio instantâneo que suspeito, é perdoável a um garoto de dezessete anos que se desacostumou com os carinhos do primeiro namorado. Ainda que tanto o arrepio quanto o beijo no pescoço me agradassem, empurrei ele para trás e torci os lábios numa expressão de desaprovação. Aí então notei que ele havia fechado a porta.
- O que foi? – perguntou ele, encarando-me como se eu acabasse de agir de uma forma completamente estranha e irracional.

- Eu só vim pegar o livro, Beto. N...

- O.K. – sua estranha mania de me cortar. Às vezes eu fico pensando na hipótese de que ele jamais gostou de me ouvir, apenas fazia por obrigação. Abrindo a porta do meio de seu guarda-roupas, ele tirou o meu exemplar de O Hobbit, comprado no ano passado antes da pré-estréia do filme, uma vez que sou fã das obras do Tolkien. Estendeu a mim e eu o apanhei, um pouco cauteloso, depositando sobre a mesa para poder folheá-lo.

- Gostou dele?

- Nem sequer li. Só pedi emprestado para ter certeza de que você um dia iria vir busca-lo.

Certamente algo que eu não esperava ouvir, caro leitor. A cena certamente terminaria em um beijo de reconciliação maravilhoso se aquela horrível música do Linkin Park não começasse a tocar. Ele atendeu o celular e conversou com alguns de seus amigos atiradores do serviço militar da cidade. Suspeitava que nenhum dos amigos dele soubesse de suas preferências de gênero, porém não me importei quando ele disse que talvez pudesse ir a uma festa na casa de um dos colegas, e pedindo que passassem ali quando estivessem a caminho.

- Bem, então eu vou indo. Obrigado por devolver!

Apanhei o livro e dei meia volta, sentindo então sua mão segurar meu pulso esquerdo e me forçar a virar, encarando aqueles olhos astutos com sobrancelha bem delineada e um pouco baixa. Perdoem pelo equívoco, mas estou certo de que ainda não o descrevi. Bem, Roberto era um garoto de dezenove anos, cabelos escuros como o céu sem estrelas, olhos malvados e sobrancelhas baixas. Atualmente, seu cabelo se mantinha cortado conforme as regulamentações do tiro de guerra que frequentava até alguns dias atrás. Tinha 1,84 e era bem magro, apesar dos treinos de futebol o deixar com um corpo bem definido. Era olhando para ele que recebi o convite de ficar, que por fim aceitei e deixei-me sentar sobre sua cama.

- E como andam as coisas, saindo muito? – ele me perguntou. Ainda um pouco desgostoso por ter sido persuadido a ficar, comprimi os lábios e respondi-lhe de forma insolente.

- Não saio, porque as pessoas idiotas com quem eu saia começaram a me ignorar.

- Eu nunca te ignorei, mas como você nunca falava, eu não via porque falar. E você nunca está online no facebook.

- É, e já que não tem mais meu número de telefone...

- Eu troquei, não viu não? – disse, erguendo um celular diferente do que tinha, que estava repousado sobre a mesa do computador. – Nem todos os números foram transferidos.

- Pois é.

- Se for pra ficar falando assim com essa cara de merda, é melhor ir embora mesmo.

- Era o que eu queria fazer, mas você não deixou.

O silêncio se estabeleceu por alguns minutos. Como bom libriano indignado com o dengo leonino, ele sentou-se ao computador e começou a fechar algumas janelas antes de desliga-lo, ainda tenso após minhas alfinetadas. Ouvi chamarem pelo sobrenome dele, através da janela que ficava na direção da entrada da casa. Apanhei meu livro e saí do quarto, sendo seguido por ele, que parou no banheiro para poder arrumar o cabelo – que era praticamente ausente. Me despedi de sua mãe e encontrei com os amigos dele no portão. Ele apareceu, abriu o portão e cumprimentou seus colegas – apenas sorri e apertei a mão de um, já que o outro estava no carro.

- Vamos Beto, tem algumas coisas pra comer, bebida e um filme pra gente assistir. – disse o que estava no carro.

- Sim, posso levar o traste aí junto? – percebi que se referia a mim, respondi de imediato.

- Não, não. Preciso ir embora, disse à minha mãe que voltaria logo. – pouco convincente.

- Você pode ligar pra ela, você nos dá uma carona Léo? – vi que ele falava com o que estava parado ao lado do carro.

- Beto, eu não vou. Muito obrigado pelo convite garotos...

- Qual é mano? Fica sossegado que eu trago vocês de volta. A hora que você precisar voltar.

Encarei então o tal Léo. Era um cara bem mais alto que Beto, bem mais forte e certamente praticava academia há algum tempo. Usava uma camiseta justa e preta e uma daquelas correntes de identificação do exército. Um pouco tentado, apanhei o livro e entreguei a Beto, que o levou novamente para dentro de sua casa. Léo sorriu e indicou para que eu entrasse no banco traseiro do seu gol, e após estar sentado e ter deixado a porta aberta, apanhei o celular e liguei para a dona onça. Tudo certo, já que até ela estava estranhando o fato de eu passar os finais de semana em casa – ela não conhecia as pilhas de trabalho da faculdade que eu liquidava naquelas noites. Beto chegou bem rápido e sentou-se ao meu lado. Senti seu braço passar por trás de mim no banco, enquanto conversava com os rapazes para saber quem iria até a festa.

Quando cheguei ao local, percebi que não era realmente uma festa, mas apenas um encontro dos atiradores que havia concluído o curso naquele ano – o primeiro a chegar depois de nós foi um garoto gordinho chamado Gabriel, que eu já conhecia há algum tempo. Um casal (hétero) chegou de moto e mais um garoto de voz fina que parecia ser hétero também. Certamente não cabe contar-lhes o que foi conversado, porém existem algumas observações importantes que eu considero cabíveis (falei bonito!): a todo momento o Léo tentava me manter ‘na conversa’, já que eu me distraía facilmente quando o papo era sobre mulheres, sexo, motéis, o quartel do tiro de guerra, etc. Eu era um pouco intruso ali, enquanto o Beto conversava normalmente, sem disfarçar ou exibir nada. Por fim, ficamos apenas eu, Beto, Léo e o Thiago (dono da casa que estava no carro quando foram nos buscar) para assistir o tal filme. Confesso ter algumas especulações pouco inocentes a respeito desse filme, mas afinal de contas era uma boa comédia que fazia sátira de vários filmes de terror. Mas o interessante era que apesar de todos terem bebido uma quantidade muito parecida, Beto e Thiago caíram no sono enquanto eu e Léo assistimos o filme até o fim, rimos e discutimos tudo juntos. Quando terminou, acordamos os outros dois com sons de berros do celular, ouvimos alguns xingamentos, mas tudo ficou normal. Beto não demonstrou em nenhum momento qualquer tipo de intenção diferente, o que me deixou um pouco de ego ferido, mas também permitiu que eu me soltasse mais. Ofereci ajuda para arrumar as coisas, mas o Thiago dispensou e Léo nos levou de volta, em seu gol vermelho.

Deixamos Beto em sua casa, e eu disse que não era preciso buscar o livro – um bom motivo para eu voltar ali – e passei para o banco da frente, dando as instruções para que o Léo chegasse até minha casa. Quando chegamos, caro leitor, foi que ocorreu a conclusão excepcional da noite. Abri a porta e senti a mão grande do Léo repousar sobre minha perna, de uma forma descontraída e aparentemente desinteressada. Me perdoem, mas para um adolescente como eu, esse gesto é capaz de ferver o sangue – Léo pareceu perceber isso, pois tirou a mão e desculpou-se imediatamente.

- Não, esta tudo bem... – respondi, ficando um pouco arrependido, pois acabara de me denunciar e não sabia qual poderia ser a reação dele. Quando ergui os olhos para encará-lo, vi que estava com o alto da testa um pouco suado, e que sua mão se mexia freneticamente sobre o volante. – Ah, está tudo bem com você?

Não precisou responder, e tanto faz, porque eu já nem queria mais saber. Sua mão direita deslizou pelos meus ombros, segurou minha nuca e fez com que meu corpo todo gelasse, ainda com mobilidade suficiente para que meus olhos fechassem e meu corpo se inclinasse para o lado. Quando retomei o controle de meus sentidos, me vi embaraçado naqueles braços enormes, me apertando enquanto sua boca criava um canal quente com a minha, movimentando aquela língua macia com habilidade e me deixando entregue às carícias que fazia em minha coxa. Apertei os olhos e acho que soltei algum som baixo, que o fez despertar também do êxtase e recuar, pedindo desculpas e limpando o suor do cabelo. Disse que tudo bem, mas acho que minha voz parecia um pouco histérica e não foi muito segura. Foi preciso que nos agarrássemos pelo menos mais duas vezes, com sua mão grande deslizando pela minha perna e as minhas podendo sentir aquele peitoral grande e rijo, contornando seu corpo até as costas e puxando-a contra mim. Era muito tarde para levarmos isso a diante, portanto ele anotou meu número de telefone e me convidou para ir ao seu apartamento no dia seguinte. Eu não queria realmente ir e chegar nos finalmente daquela forma, mas aceitei o convite por educação e esperei – enquanto me preparava para dormir – a mensagem dele para salvar seu número. Vale lembrar meu amigo leitor, que dormi muito bem naquela noite, e imaginei em meus sonhos como seria aquele corpo sem a camiseta, desenhado todo o contorno que eu havia tocado antes de dormir.


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Comentários


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dough Comentou em 21/05/2015

Parabéns pelo conto, escreve muitíssimo bem!

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dough Comentou em 21/05/2015

Parabéns pelo conto, escreve muitíssimo bem!

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rodsousa3e Comentou em 20/05/2015

Simplesmente sensacional. Parabéns, um dos melhores contos já escritos por aqui, amei a riqueza de detalhes e a intimidade que você cria com o leitor, caro escritor. Continue escrevendo, por favor, haha.




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Ficha do conto

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Nome do conto:
Como esquecer seu ex-namorado. pt1

Codigo do conto:
65270

Categoria:
Gays

Data da Publicação:
20/05/2015

Quant.de Votos:
4

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