Thomaz
Acordei com muito sono e com muito frio, mesmo estando totalmente coberto pelo edredom. O quarto parecia ter sido invadido por uma família de ursos polares e eu era um deles. Coloquei minha cabeça para fora do cobertor, tremendo, e olhei para o lado. A ficha foi caindo e só então me toquei: Júlio deveria ter dormido no meu quarto naquela noite. Eu deveria ter retirado o colchão da cama do quarto de hóspedes para ele dormir ao meu lado, como quase sempre eu fazia quando ele dormia na minha casa, entretanto não fiz nada disso. Eu simplesmente apaguei e Júlio nem estava na cama.
Espertei-me e então me lembrei do que havia acontecido na noite anterior: meus pais foram dormir cedo e Júlio e eu terminamos de comer uma pizza que eles tinham comprado. Lavamos a louça e fomos para o meu quarto. Meu pai nos liberou para cancelar o estudo, pois era visível que nós nos dedicamos o suficiente para várias provas seguidas. Entramos no quarto e me joguei na minha cama, exausto. Com pena de mim, meu amigo me ofereceu uma massagem nas minhas costas para tentar amainar a minha tensão. Eu aceitei, porém, além de ter recebido uma massagem muito melhor que a de Lígia, minha namorada, algo que para mim já foi uma grande surpresa, ele também me presenteou com uma punheta e uma chupada deliciosa no pau.
Eu permiti que ele fizesse cada coisa que fez, claro; quase impossível de resistir. O prazer e a excitação que eu senti com a boca dele devorando minha pica foram únicos. Além de Júlio ter me chupado como ninguém, eu gozei na boca dele e ele ainda engoliu, com muita eficiência e com cara de quem provava um sorvete de morango; como um verdadeiro profissional e como nenhuma outra garota, das poucas que fiquei, fez em mim. Eu não era um garanhão, mas eu já tive a chance de transar com duas garotas, sem contar a minha namorada. E Júlio chupou meu pênis melhor que todas elas juntas.
Júlio, depois disso, pegou sua escova de dentes e foi até o banheiro. Logo depois, eu dormi. Não o vi mais. A vergonha deve ter sido maior e ele optou por ir embora para a sua casa. A nossa amizade, eu tinha certeza, ficaria abalada depois dessa brincadeira. Se é que eu poderia chamar aquilo de “brincadeira”. Eu não sabia como ele estava se sentindo; eu estava em paz, tranquilo. Meu gosto preferencial ainda era por garotas, mas, indubitavelmente, eu não achei nada ruim o que fizemos na noite passada. Pelo contrário, eu gostei, e se eu pudesse, faria de novo. O tesão que senti com Júlio, foi apenas com ele. Mas uma repetição não dependia somente de mim.
Finalmente, Júlio abriu a porta do quarto, calmamente. A primeira coisa eu falei foi:
- Por favor, desliga esse ar-condicionado. – ele atendeu meu pedido e foi até a minha cama. Júlio já estava vestido e bem perfumado. – Você acordou que horas? Aliás, que horas são? – perguntei sonolento e verifiquei o horário no meu relógio de pulso. Já passava das onze. Meus pais nem ao menos me acordaram para estudar.
Notando o espanto em meu rosto, Júlio se adiantou ao explicar:
- Calma, Thomaz. Seus pais saíram cedo pro clube. Eles bem que nos convidaram para ir com eles, mas eu disse que nós ficamos assistindo um filme até tarde e eu duvidava que você fosse acordar cedo.
- E como você falou com eles?
- Minha mãe me ligou cedo, querendo que eu vá almoçar na casa do irmão do meu padrasto. Acho que eram umas oito horas. – respondeu, pensativo. – Fui na cozinha e encontrei com eles. Tia Neuza e tio Jairo disseram que podemos ir, se você quiser. Mas se você preferir ficar aqui, tem almoço na geladeira. É só esquentar.
- Falta pouco para o almoço. – bocejando. Júlio se espreguiçava na minha frente, sorridente. – Por que você tá todo arrumado?
- Daqui a pouco eu já vou. Só estava esperando você acordar.
- E por que você está tão sorridente? – perguntei, desconfiado.
- Nada não. – disse, sem muito me convencer. Agoniado por estar com um bafo nada agradável, pedi a ele que me esperasse no quarto enquanto eu escovava meus dentes e lavava o rosto. Olhei-me no espelho e me achei estranho, não pelos cabelos pretos bagunçados ou pela olheira, mas por ter feito muita sacanagem com meu amigo naquela noite.
Ao sair do banheiro, encontrei sua mochila no sofá da sala. Pelo que eu puder perceber, Júlio já estava indo embora. Mas eu iria fazê-lo demorar só mais um pouco.
Voltei ao meu quarto e Júlio estava deitado na minha cama, olhando atentamente para o teto como se procurasse uma rachadura, e levou um susto quando entrei. Pulei e fiquei ao seu lado, que se sentou para ficar de frente a mim. Fingindo seriedade, perguntei:
- Por que você nunca me contou?
- Por que nunca te contei o quê?
- Que você era tão bom chupador de pica quanto em dar aulas de literatura? – ele riu alto e se jogou na cama de novo. Juntei-me a ele e brinquei, com um olhar safado: - Os caras com quem você fica devem ficar doidinhos, não é?
Júlio riu com uma fungada e respondeu:
- Eu nunca fiquei com muitos caras, Thomaz. Foram poucos.
- Deixa de graça, Júlio.
- Não é brincadeira.
- E as meninas? Essas sim devem ficar louquinhas. – insisti, dando cotoveladas em seu braço.
- Meninas? Você tá me zoando! Eu nunca nem sequer transei com uma. – ele assumiu, voltando a olhar para o teto.
- E você tem vontade, não tem? – perguntei, interessado.
- Na verdade, não. – com um ar de tristeza. – Eu queria poder sentir atração por garotas, querer transar com uma, mas... Não sinto, cara. Se eu tivesse que escolher, eu escolheria ser heterossexual, mas, infelizmente, não existe opção sexual. Isso é difícil pras pessoas entenderem e, às vezes, até mesmo pra gente, e... – ele me olhou e se calou. – Desculpe, eu devo tá te enchendo com isso. – e Júlio se levantou da cama, porém eu o puxei de volta. – Eu tenho que ir, Thomaz. Minha mãe me ligou cedo para que eu fosse almoçar com ela e com o Mario na casa de um irmão dele. Eu estou demorando muito, pra falar a verdade. Contudo, Júlio não demonstrava muito contentamento com o almoço em família.
- Posso estar enganado, mas acho que você não está muito a fim de ir almoçar com eles. – arrisquei.
- Não mesmo. Não gosto muito do Mário e menos ainda da família dele. Os sobrinhos até que são legais, e quase todos os irmãos que são tão chatos quanto ele. E o filho dele, que nem mora na cidade, deve ser ainda pior.
- Você não gosta mesmo do seu padrasto. Por quê?
- Porque ele é chato e já sacou que eu sou gay e vive pegando no meu pé. Mas a minha mãe gosta dele, por estranho que possa parecer.
- Verdade, você me contou uma vez. Não sei como você tem tanta paciência.
- Nem eu. – suspirando. Júlio se levantou mais uma vez e me mostrou seu telefone celular. Era sua mãe ligando.
- Vou ter que ir, cara. Não quero ouvir bronca por besteira. – um pouco sem ânimo. – Mas, Thomaz, me responda uma coisa.
- Diga, meu amigo Júlio. – eu fiquei em pé, na frente dele.
- Eu acho que já sei a resposta, mas... Você gostou... De ontem?
- Claro! Já não falei?
- Mas o que você sentiu...
- Ah, senti a sua boca bem melada e... – zombei e ele exigiu que eu falasse com seriedade. – Sei o que você quer dizer. – como ele queria, fui mais circunspecto. – Cara, eu gostei e, sinceramente, quero repetir, se você quiser. Mas não me vejo fazendo isso com outros caras. Eu curto garotas, sinto tesão por elas, e principalmente pela Lígia.
- Eu sabia. – com um largo sorriso.
- Mas isso não significa que eu não possa brincar com você de vez em quando. – e pisquei, de um jeito bem sacana. Puxei-o pela cintura mais para perto de mim e o abracei. Não sei exatamente o que deu em mim, mas tive coragem e vontade o suficiente para cheirar seu pescoço e depois beijá-lo no rosto, com muita leveza, para que meus lábios pudessem tocá-lo com calma. Júlio corou e eu o beijei de novo, porém dessa vez mais próximo dos lábios. Segurei seu rosto com as duas mãos, despi-o com o olhar e dei um delicado beijo nos lábios.
Foi a primeira vez que eu beijei um homem. E era ainda meu melhor amigo. Não foi, de fato, um beijo, um beijo de língua, mas por livre e espontânea vontade eu encostei meus lábios em outros lábios de uma pessoa do mesmo sexo que eu meu. Uma boca gostosa de sentir. Por isso me dei a liberdade de beijá-lo outra vez, porém com uma certa demora. Nossos lábios se entrelaçaram e não se desgrudaram. Eles se conhecerem, se descobriram e se tornaram íntimos. Não era um beijo violento ou cheio de malícia. Era um beijo puro, singelo, e principalmente, delicioso. Os lábios de Júlio eram macios, suaves, e molhados; não tinham pressa de percorrer os meus. E isso tornava tudo ainda mais gostoso.
Quando o larguei, senti algo estranhíssimo e fechei a cara. Júlio me olhou assustado e perguntou se havia algo de errado. Eu disse, rindo de mim mesmo:
- Eu beijei um cara pela primeira vez. E eu gostei, que é o mais esquisito. Acho que eu tô ficando maluco. – e riu mais ainda. Naquele instante, a campainha tocou. Pedi para que ele me esperasse no quarto enquanto eu verificaria quem era, e Júlio logo me alertou que não podia mais demorar.
Abri e porta e recebi um longo abraço da morena mais gata que eu conhecia: minha namorada. Fiquei feliz em perceber que mesmo tendo acabado de beijar um garoto e ter sido chupado por ele na noite passada, eu ainda me sentia atraído por ela. Lígia me deu um longo beijo e reclamou que eu não atendia meu celular, por isso foi até a minha casa; perguntou se Júlio estava comigo, pois queria contar algo a ele.
Nós subimos e ela fez um estardalhaço ao encontrar Júlio. Abraçou-o e o fez sentar na cama. Como sempre, ela foi direta ao ponto.
- Amigo, tem uma prima minha louca pra ficar com você. – ela contou a ele. Júlio permaneceu calado. Curioso, perguntei:
- Quem é?
- A Luma, lembra dela? Acho até que já havia comentado com você. – ela me recordou. Eu a conhecia. Era uma menina linda. – Então, ela me disse hoje que está louca pra ficar com você. E já até sei a ocasião que isso irá acontecer: no aniversário do Thomaz, que vai ser daqui a duas semanas. Que tal? – estava claro que Lígia estava muito mais empolgada que Júlio.
- Olha, eu não sei se é uma boa ideia... – ele hesitou. E na mesma hora sua mãe o telefonou. – Vou ter que ir. Não tem jeito. Ou ela me esgana de uma vez por todas. – Júlio, preocupado.
- Tudo bem, vou te deixar lá fora. Espera ai, gata. – falei para Lígia, que recebeu um beijo de Júlio, de despedida.
Já com a mochila nas costas e na porta da casa, tentei voltar ao assunto sobre a prima de Lígia.
- Júlio, por que você não fica com a prima da Lígia, meu amigo? Eu sei quem ela. É uma gati...
- Você sabe que eu não me importo com isso. Nem um pouco.
- Eu sei, mas cara, pensa bem: se tudo der certo, pode rolar algo a mais entre vocês. O que você acha? Séria uma ótima chance pra você transar com uma garota.
Júlio balançou a cabeça com um ar de reprovação. Estendeu a mão para mim e me abraçou. Beijei-o rapidamente no rosto e aconselhei:
- Pensa bem. Ter algo a mais com uma garota fará muito bem a você, Júlio! – ele me ignorou de novo. Olhou para trás e viu um táxi passando. Chamou-o e disse:
- A gente se vê. – e se mandou.
No meu quarto, perguntei a Lígia, que estava com os olhos grudados no seu maldito celular, se o que ela havia dito sobre sua prima era verdade.
- Claro que é. Luma me contou hoje. Está louquinha por ele! – bloqueando a tela do celular.
- Ótimo. Então me passa o número do telefone dela.
- Pra quê?
- Pra fazer macumba. – respondi, com uma careta de idiota.
- Tá doido? – perguntou, assustada.
- Deixa de ser besta, gata. Vou ligar pra ela agora mesmo. Tive uma ideia para ajudar meu amigo. E acho que a sua prima vai nos ajudar ainda mais.