O primeiro tempo tinha terminado no 1x1, eu era o atacante e sabia que precisava marcar gol para decidir. O prêmio de melhor artilheiro também dependia disso. Era o intervalo e eu precisava de uma ducha antes de retornar, por isso entrei no vestiário sem dar muito papo para os repórteres. Me enrolei na tolha, tirei o uniforme e me lembro de jogá-lo no armário antes de ir para a cabine do chuveiro. Quando voltei, a roupa não estava mais ali. Alguém havia sumido com ela e levado junto a única cueca que eu tinha.
— Quem pegou meu uniforme? — ninguém se pronunciou. Para de sacanagem, a gente já tem trabalho suficiente pra virar o placar. Vocês vão ficar de zoeira?
Corri para procurar nos armários e mochilas, até puxei o short de um dos caras mais sacanas, para verificar se ele não havia vestido a peça. Foi nessa hora que o treinador entrou e mandou todo mundo para o campo, me esculhambando por não estar pronto:
— Que palhaçada é essa, Donato?! Tem uniforme no armário. Veste e vai pro jogo!
— Pegaram minha cueca e não tenho outra — digo segurando a toalha na cintura e sentando no banco, visivelmente desesperado.
— Você quer que eu faça o quê? Que eu tire a minha pra você usar? — baixando o short com raiva e quase esfregando sua cueca recheada na minha cara. Bota seu calção e entra naquele campo, ou você está fora do time pra sempre!
Não sei o que é pior: levar esculhambação do seu técnico, com ele vestido; ou de cueca, com os pentelhos saltando na sua cara. Eu também não queria ver ele pelado e muito menos ter que usar aquela cueca suada. O jeito foi colocar o uniforme e seguir para o campo que, àquela altura, já estava sob garoa.
Nos 45 minutos que seguiram, a minha atenção não estava no jogo mas em proteger meu equipamento debaixo do calção. Enquanto eu corria, sentia meu saco balançar. Batia em uma coxa e na outra, era golpeado pelo meu próprio pau e, quando eu me descuidava, era acertado por uma joelhada, em uma ou outra dividida. A repetição disso fazia o desconforto aumentar, subindo pela lateral do abdômen. Eu precisava parar em alguns momentos para esperar a dor passar. Era nessas horas que eu reparava que meu pau também aumentava, devido ao atrito com a bermuda, mas também atiçado com cada esbarrada, ou mão boba que dali se aproximava.
A chuva piorava a situação, pois o tecido molhado, branco, colava no corpo e demarcava todo o contorno do dito cujo. Em cada salto com a barreira, se eu esquecesse de segurá-lo, todos percebiam ele saltando também. Eu tentava disfarçar, mas ficava cada vez mais difícil, até que em uma das minhas investidas em direção ao gol, me puxaram na grande área e na queda, a situação ficou realmente impossível.
Quando levantei eu estava pelado no campo. Meu short na mão do zagueiro, à uns três metros de distância. Meu pau, duro, com a cabeça vermelha, exposta, apontando para a lateral do campo e o estádio lotado olhando para mim. Um silêncio no estádio. Não havia como esconder ou cobrir nada. Foi aí só pude respirar fundo e caminhar, de cabeça baixa e pau duro, aqueles três metros até o short. Eu percebi todas as câmeras filmando e fotografando e sabia que aquilo iria viralizar na internet e podia acabar com a minha carreira. Uma voz fraca, ao longe, gritou algo que se parecia com o grito de guerra que eu já ouvi dos torcedores antes: "Donatão!". Eu alcancei meu short e vesti.
O juiz havia marcado pênalti no lance e eu peguei logo a bola para bater, fingindo ignorar o que acabara de acontecer, antes que o técnico pudesse intervir e me substituirr. Me posicionei na marca, com a mão sobre meu pau, ainda tentando, sem sucesso, ajeitar o material que permanecia como um bandeira de escanteio sob o calção. Aquela era nossa última chance de desempatar e talvez minha última chance de contornar o embaraço. Então eu ergui a cabeça, a postura firme como meu pau já estava e chutei para o fundo da rede. Era gol! A multidão vibrou! Todos voltaram a entoar, em forte coro, o grito de guerra que, agora, havia mudado um pouco:
— Dotadão! Dotadão! Dotadão!
Era inevitável não achar graça daquilo. Um sorriso bobo não largou mais do meu rosto até o final da partida e eu já não me preocupava mais com os olhares que se dirigiam para a região abaixo da minha cintura, nem com os esbarrões propositais, ou os dois jogadores que caíram, meio que por acidente, sentados sobre o meu pau, inclusive se apoiando no meu saco para se levantar. Ao final, o título foi nosso e o time todo invadiu o campo para comemorar. Eram dezessete caras e o técnico, todos só de cueca, girando a bermuda para o alto e somando voz ao coro que ecoava no estádio:
— Dotadão! Dotadão! Dotadão!
Tem quem ache isso excitante, um monte de cara de cueca molhada, debaixo de chuva, abraçando e pulando, mas na hora era engraçado e eu só me preocupava em conferir se alguma daquelas cuecas era a minha. Dias depois eu a encontrei em um leilão na internet, junto com outros objetos de jogadores, valorizada pela repercussão do incidente. Isso também me rendeu uns convites para propaganda de roupa e para sair pelado numa revista, mas ainda estou analisando. Só sei que, depois dessa, aprendi que às vezes a gente precisa enfrentar a vida sem cueca, pois mesmo que acertem seu saco ou rocem no seu pau, a liberdade que se sente compensa e você pode acabar gostando da sensação.
A inspiração que realça o talento. Criatividade e humor erótico de primeira, excelente conto!
Muito bom seu conto.
Votado !