— Alô? — A voz saiu rouca, ainda arrastada pelo sono.
— Guida, bom dia! A malinha da Priscila tá pronta?
Era a irmã de Dona Lívia, do outro lado da linha, soando animada e apressada ao mesmo tempo.
Guida arregalou os olhos.
“A mala!!!! Meu Pai do Céu!!!”
— Ah, sim! Quase pronta! — mentiu, já disparando porta afora da edícula, com o telefone colado ao ouvido.
Atravessou o quintal como uma doida, os pés descalços batendo na grama molhada pelo orvalho. O ar fresco da manhã fez seu corpo arrepiar, mas não havia tempo para pensar nisso. Abriu a porta da casa principal e correu para dentro, subindo as escadas com pressa, sentindo o coração martelar no peito. No último degrau, quase tropeçou, mas conseguiu se segurar a tempo antes de cair de cara no chão.
Quando finalmente chegou ao quarto de Priscila, parou por um segundo, ofegante.
“Dormi demais, merda!”
Por sorte, já era profissional em arrumar as roupas da menina. Sabia exatamente quais eram e onde estavam cada uma das peças de roupa preferidas dela, bem como objetos e brinquedos. Não demorou nem cinco minutos.
Mas enquanto fechava a malinha, já relaxada da adrenalina do despertar repentino, percebeu uma disposição que não sentia havia tempos.
Já sabia o motivo. Tinha a ver com a maneira “tão agradável” com a qual descarregara a tensão de quase dois anos, na noite passada.
Margarida mordeu o lábio, segurando um sorrisinho, com essa lembrança atrevida.
E foi também nesse instante que, se deu conta que estava só de camisola.
E sem calcinha.
O rubor lhe subiu ao rosto no mesmo momento, lembrando da maneira selvagem que havia arrancado a peça no calor daquela safadeza e simplesmente jogado longe.
“Ai, meu pai... Que noite foi essa???” – pensou com uma envergonhada satisfação.
Mas não dava para perder tempo viajando. Pegou a mala e no caminho ‘”roubou” um dos roupões de Dona Lívia no quarto principal. Já “toda patroa”, desceu as escadas e foi até o portão. Assim que abriu, viu o carro parado em frente à casa. Lá dentro, Priscila e a prima acenavam animadas.
— Pronto, minha princesinha! — disse, entregando a malinha e se abaixando para dar um beijo carinhoso na testa da menina. — Se divirta muito, viu? E obedece a titia direitinho!
Priscila assentiu com um sorriso antes de pular para dentro do carro. Guida se despediu de todos rapidamente e observou enquanto o veículo sumia rua abaixo.
Já de volta la dentro, olhou para o relógio na parede da cozinha.
10h30.
Suspirou e passou a mão pelos cabelos curtos e crespos. Definitivamente, acordou bem tarde… E, pela segunda vez naquela manhã, um sorrisinho satisfeito surgiu no canto de seus lábios, ao relembrar o motivo.
A casa estava estranhamente silenciosa. O tipo de quietude que preenchia o ambiente de maneira reconfortante, mas também um pouco inquietante.
O aroma do café que estava passando logo invadiu suas narinas e a fez sorrir. Nada como uma xícara bem forte para começar o dia.
Sentou-se à mesa com uma caneca e umas bolachinhas. Enquanto tomava seu desejum voltou a pensar no menino Célio.
“Será que ele ainda tá dormindo? Deve ter ficado acordado até tarde, jogando. Ou então...”
Um sorriso travesso ameaçou brotar em seus lábios, mas foi impedido por um ímpeto de pudor. A lembrança da noite, ao mesmo tempo que lhe trazia essa sensação agradável de descarrego, vinha carregada de desaprovação pelo motivo polêmico que a inspirara a se satisfazer.
"Será que o Célinho ouviu alguma coisa?"—pensou de novo, sentindo o rosto corar de vergonha. Sabia que a distância entre a edícula e a casa era grande, mas, com o silêncio da madrugada e seu "fervor escandaloso", era bem possível que tivesse.
Quando terminou o café, ficou ali, sem saber se deveria chamar o menino pra comer, se deveria subir, ou se seria melhor simplesmente não fazer nada e deixar o dia seguir.
Só aí se lembrou que era sábado.
“Ai... Ele tem o cursinho de manhã, hoje. Tá atrasado.”
Ao subir as escadas, um pequeno arrepio percorreu sua espinha. Cada passo parecia mais pesado.
O que ela iria falar pra ele?
Sentiu um nervosismo diferente se formar dentro dela.
“Oi Célinho. Vem tomar seu café, qye você tá atrasado pro cursinho! Ah, e desculpa pela gritaria ontem. É que eu acabei ficando com tesão te vendo bater punheta e toquei uma siririca também.”
Ridículo!
“Não, não vou nem tocar no assunto! Nada! Só chamar pro café e só!”
Mas, ao virar no fundo do corredor, viu a porta escancarada. Do jeito que rle só deixava quando tinha saido.
“Ah bom. Já saiu!”
Ela respirou fundo, o coração batendo um pouco mais rápido. Ele já devia estar lá.
Ficou por um instante na porta, como se esperasse que ele surgisse do nada—sentindo um misto de alívio e frustração.
Dentro de sua mente, um turbilhão de pensamentos se emaranhava...
A explosão de acontecimentos e sensações da noite passada.
A lembrança de como vira aquele menino crescer.
De como se sentiu viva ao descobrir o que ele sentia por ela.
A reprovação que ela mesma se impunha e o escândalo que seria se Dona Lívia soubesse de tudo aquilo.
E, como um veneno insistente, as palavras do safado do ex-marido...
Era uma loucura. Tudo havia sido uma grande e insana loucura. E ainda assim, ao pensar bastante sobre aquilo, ela finalmente chegou a uma conclusão, em silêncio, dentro de si mesma...
“Nada de mais aconteceu, ué!”
Apesar das confusões, das dúvidas e das contradições, tudo isso não passava de uma série de acontecimentos efêmeros, algo que não foi concretizado, e que não poderia ser considerado.
E o que realmente importava era a sensação de estar viva, de ter redescoberto algo que ela havia perdido há muito tempo — algo que a fazia se sentir, pela primeira vez em muito tempo, plena.
Depois dessa epifania, com a cabeça livre de neuras, decidiu dar uma volta.
O som da água do chuveiro caindo a acalmava enquanto ela se banhava. A água quente escorrendo pelas curvas do seu corpo fez com que Margarida fechasse os olhos, sentindo um prazer simples, mas profundo, em cada gota que tocava sua pele.
Ligou o chuveiro no máximo para que a água caísse forte e direcionada. O jato atingiu seus seios, já não tão firmes como antigamente, mas tão sensíveis ao toque como sempre foram. Um arrepio forte percorreu todo o corpo. Guida começou a massagear os seios, sentindo os mamilos tão duros e salientes quanto a ponta de um taco de sinuca.
O tesão cresceu rápido. Guida sorriu devido a sensação prazerosa. Ligou o chuveirinho com aquele jato forte e direcionou na altura perfeita para estimular seu clitóris. Ela gemeu baixinho, os olhos ainda fechados, enquanto a água batia no ponto certo. A sensação era boa, mas não o suficiente. Guida queria mais. Com a outra mão abriu os lábios, deixando o grelo empinado pra fora e aproximou mais o chuveirinho, começando a roçar a pontinha ali, misturando a sensação do toque do metal ao jato de água. Ela arfava, intensificandoo os movimentos, roçando com mais rapidez e vontade. Seu corpo começou a tremer, e o som da água batendo no azulejo se misturava aos seus gemidos, que ficavam cada vez mais altos.
Mas aquilo passou a não ser mais suficiente. Guida largou o chuveirinho, que caiu no chão com um barulho surdo, e levou as mãos à buceta, enfiando os dedos com selvageria. Dois dedos primeiro, depois três, movendo-os com urgência, do mesmo jeito que na noite anterior.
— Aiiii.... Caralho!!! – vociferou com a voz rouca de tesão . Os dedos deslizavam fácil, graças a lubrificação naturalmente abundante que sempre teve. Foi aumentando o ritmo, sentindo a pressão se construir dentro dela, uma onda prestes a estourar. Os dedos penetrando sua buceta faziam aquele som alto, como se estivesse apertando a embalagem e espirrando algo viscoso. Ela não se importava com o barulho, nem da sua buceta, nem dos seus gemidos, com nada além do prazer que a consumia.
De repente, Guida não aguentou mais. Ajoelhou-se no chão do box, os dedos ainda dentro dela, e gritou. O orgasmo a atingiu como um terremoto, fazendo seu corpo quase convulsionar e seu grito ecoar pelas paredes do banheiro. Ela sentiu o líquido quente escorrer pelas coxas, misturando-se à água do chuveiro, e sorriu, ofegante.
Quando o prazer finalmente diminuiu, Guida ficou ali, ajoelhada, sentindo a água cair sobre seu corpo exausto. Ela se sentia leve de novo, como se tivesse deixado para trás anos de insegurança e medo. A mulher que ela era, a mulher devassa e livre, estava de volta. E Guida sabia que, daquela vez, não a deixaria ir embora novamente.
Ficou ali no chão por uns segundos. Pensando em porquê tinha parado de se masturbar. Era tão gostoso gozar daquele jeito. Mesmo quando transava quase todos os dias ela adorava dar prazer a ela mesma. A tarde, de manhã. Sempre que estava sozinha. Aquilo a acalmava e a deixava mais leve. Feliz.
Com um suspiro, ela se levantou, desligou o chuveiro e saiu do box, envolta em uma toalha. Ao se olhar no espelho, deixou o pano cair no chão e encarou a imagem que antes via como usada e amassada— feia, gorda, quase 50 anos, corpo cheio de marcas e celulites. Mas não era mais assim que se enxergava.
Passou os dedos pelas coxas carnudas, pela barriguinha um pouquinho saliente, pelos braços mais grossos. A juventude ficou para trás, mas seu corpo ainda tinha suas formas generosas e curvas extremamente sexys.
Deu um sorriso de satisfação.
“Nega velha largada, né? Vamo ver...”
Foi até o armário e pegou a calça jeans mais justa que tinha. Precisou encolher a barriga e puxar o zíper com esforço, mas conseguiu. Olhou-se no espelho e sorriu. Apertada até a alma, mas deixava sua bunda mas tesuda ainda.
Completou o look com uma blusinha colada, que empinava os seios e segurava bem as sobras da barriga, salto alto e maquiagem para realçar os olhos e o sorriso sedutor e deu uma ultima olhada no espetáculo...
A “Nega mais gostosa do Capão Redondo”.
Pegou a bolsa e partiu, imponente.
Resolveu ir caminhando mesmo. O salto incomodava um pouco, mas nada que uma mulher acostumada a andar poderosa por aí não soubesse administrar.
Enquanto seguia pelas ruas, notou o silêncio. O bairro estava quase deserto. Passou por um senhor e uma senhora fazendo jogging, ambos vestindo roupas esportivas caras, com aquele jeito de quem nunca precisou correr atrás de nada na vida. O velho até que tentou dar uma espiada com o canto dos olhos na Nega, mas a patroa logo ao lado estava atenta e ele desistiu. Fora isso, um ou outro carro passava devagar, mas com as janelas fechadas.
“Rua de rico é vazia mesmo.”
Parecia que tinham dado uma pausa na cidade.
Mas apenas cinco quarteirões depois, a paisagem mudava. Eram os arredores do Largo 13. Comércio, ruas abarrotadas de gente, as lojas abertas despejando música de fundo nas calçadas, e os camelos já gritando suas promoções do dia.
Guida respirou fundo. Era a hora do show.
Endireitou a postura, empinou o nariz e começou a andar como fazia quando era novinha. Cada passo era cadenciado, sensual, um rebolado perfeito que vinha da essência, não só do quadril. Aquele gingado de quem sabia que carrega um pecado ambulante naquele corpo.
Podia sentir os olhares. Todos.
Os homens paravam no meio da conversa, os olhos percorrendo cada curva. Os mais ousados encaravam sem pudor. Os mais tímidos desviavam o olhar quando ela passava, só para virar o pescoço depois, achando que ela não iria perceber.
As mulheres também reparavam. Algumas torciam a cara, numa expressão de inveja.
Margarida sorria satisfeita. Ah, como ela sentiu falta disso.
Mas tava faltando algo.
“Cadê?”
Os queixos caídos estavam lá, as babadas, os cochichos. Mas ninguém ainda tinha soltado em alto e bom som aquilo que ela queria ouvir. E sem isso, faltava combustível.
“Caralho, essa homarada ficou tudo frouxa, é!?!?”
Ela continuou desfilando, descendo a rua sem pressa, sentindo cada olhar sedento e tarado, mas queria mais. Precisava das palavras. Aquela audácia que só um certo tipo de homem tinha.
E mais a frente virando estava o lugar perfeito: o boteco da esquina.
O bar era aquele clássico de rua de comércio popular. Com balcão de azulejo encardido, mesas de plástico da Brahma espalhadas pela calçada e um cheiro de cerveja misturada com fritura que grudava no ar. E os fregueses? Eram daqueles...
Homens rústicos, mão grossa de tanto bater massa, de tanto carregar peso. Mecânicos, pedreiros, motoristas de taxi, o tiozão que trampou a vida inteira na obra e agora passa as manhãs no bar com um copo de 51 na mão. Cachaceiros de respeito, com cheiro de cigarro e bafo de pinga. Gente sem frescura. Ali, o desejo não ficava preso a uma olhada. Era cuspido em palavras xulas e sem vergonha.
Era agora.
Margarida diminuiu o passo, fazendo questão de salientar ainda mais o rebolado. A calça jeans estava tão justa naquela bunda tesuda e enorme, que parecia uma pintura corporal. Aquele crime em forma feminina, gritava a cada passada, como se pedisse pra ser comida ali mesmo.
Bem na frente da entrada, ela fingiu um probleminha no salto. Parou, olhou para baixo e, sem hesitar, se abaixou—pernas firmes, quase sem dobrar os joelhos. Aquela bunda espetacular brilhou como um farol na neblina.
O bar, antes cheio de conversas e risadas, virou um comício de putaria vociferada.
— Puta que pariu!?! olha a raba dessa mulher!?!?
— Ô, bença, o que é isso, hein? Joga água aqui que tá pegando fogo!!!!
— Abaixa assim de novo e eu caso na hora, tesuda!!!!
— Se eu te pego num domingo de chuva, cê só sai de casa na quarta, Delícia!!!!
Guida sentiu um calor subir pelo corpo. Estava no céu. Ficou mais um segundo nessa posição, deixando que cada olhar a devorasse um pouco mais. Sacudindo as ancas em câmera lenta. Depois, ajeitou o salto, se levantou, e plenamente vitoriosa, deu uma colher de chá pra sua plateia.
Antes de seguir, olhou por cima do ombro, encarando sua plateia, e soltou aquele sorrisinho bem sacana, passando a ponta da língua nos dentes. Um agradecimento, pelos elogios descarados. Depois, virou de novo com um ar de desdém, como se nada tivesse acontecido e seguiu em frente.
— Ela gosta da coisa, rapaziada!!!!
— Ô, nega gostosa da porra! Volta aqui!!!!
Enquanto virava a esquina, ouvindo o som distante dos gritos e assovios se misturando com o burburinho da rua, se lembrou mais uma vez do "lixo” do ex. O mesmo que tempos atrás “cuspiu” que ninguém ia querer uma nega velha, gorda e acabada como ela. E riu sozinha.
“Ninguém vai querer essa nega, né?”
Só num passeiozinho pelo bairro, Margarida encontrou um caminhão de homens prontos pra largar tudo, só por um segundinho de sacanagem com ela.
“Otário!”
Se quisesse, ela poderia ter qualquer um dali. Mas não queria.
Estava feliz. Como há muito não se sentia.
Já de volta, subindo a rua pra casa, Margarida sentia o corpo quente, a pele úmida de suor e os pés castigados pelo salto alto, mas nada disso a incomodava. Pelo contrário. Depois do teste bem-sucedido, cada dorzinha no pé parecia um troféu. Valeu a pena.
E ainda teve um bônus, com Seu Jerônimo.
Ela nem lembrava que o velho vigia da rua estava de ronda hoje. Como não tinha cruzado com ele antes, com certeza estava cochilando dentro da guarita. Ao passar em frente a mesma, viu ele sair do posto pra cumprimentá-la, como sempre fazia.
Mas dessa vez... Teve aquela secada. Uma olhada de cima até embaixo, pousando demoradamente nos lugares certos. Aquele olhar cheio de fome e pecado.
— Bom dia, Dona Guida... — O tom carregado de intenção veio junto com aquele sorrisinho amarelo no canto da boca. Ela retribuiu o sorriso, mas num jeito muito mais matador.
— Bom dia, Seu Jerônimo.
— Tá muito bonita. Foi passear hoje?
Guida não respondeu. Só sorriu outra vez. Aquele sorrisinho descaradamente sacana.
“Cê sabe que eu sei que não é bonita a palavra que queria falar pra mim, né, véio safado?”
Então apenas continuou andando, sentindo o olhar tarado do velho queimando suas costas. Quase ouviu os pensamentos sujos dele.
“Ô... Essa nega 10 minutinho aqui comigo nessa guarita...”
Chegou até a pensar em dar uns minutinhos de alegria ao velho vigia. Ficar conversando com ele. Talvez até entrar um pouquinho na guarita... Mas foi só um pensamento divertido. Já tinha tido o suficiente por hoje. Agora, o que queria mesmo era a paz de uma casa vazia. Mas assim que entro pela porta, já ouviu os barulhos.
— Ah, puta merda... — pensou.
Célio já tinha voltado do cursinho. E não tava sozinho. Conversas, risadas, o som da água espirrando na piscina.
— Ele chamou os amigos. - murmurou, deixando a bolsa no balcão da cozinha e respirando fundo.
Ficou parada na porta do quintal, observando a cena.
Os dois melhores amigos de Célio estavam lá — aqueles que, quando não estavam grudados com ele na rua, tavam grudados online, jogando sem parar. Meninos bonzinhos também. Bem educados.
Mas ela torceu o nariz pras três patricinhas do bairro que também estavam lá.
“Ah, essas meninas...”
Até pareciam comportadinhas, mas eram bem nojentinhas. Cheias de frescura e cheias de criar intriga, era o que as empregadas das outras casas fofocavam. E sempre que cruzavam na rua com ela, cumprimentavam com um ar de escárnio e ficavam cochichando.
Margarida respirou fundo e cumprimentou, educada como sempre.
— Oi, meninada. Tudo bem?
A galera, acostumada com ela, respondeu no automático:
— E aí, Dona Guida! Tudo beleza?
E seguiram se divertindo, como se ela fosse só um detalhe no ambiente.
Mas Célio não respondeu.
Ele olhou pra ela rápido, desviando o olhar no instante seguinte. Parecia sem graça. Com a cabeça longe.
Era aquela história que ainda estava incomodando.
Margarida sentia que, assim como ela já tinha se entendido com tudo aquilo, ele também devia. Talvez uma outra conversa, mais tranquila, ajudasse.
Quem sabe na janta?
Mas, por enquanto, ela tinha outra coisa pra resolver: a casa era sua responsabilidade.
Ela aguardou que ele levantasse o olhar, fez um gesto discreto com a mão, chamando-o. “Vem cá”, disse com suavidade.
Célio hesitou por um momento. Ela notou, mas logo ele se levantou da piscina e caminhou até ela.
E foi aí que Margarida sentiu aquilo de novo.
Célio estava todo molhado. Só de sunga. Caminhando na direção dela. Cada passo seu parecia carregar uma certa timidez, mas também algo de envolvente. Os pingos d’água escorriam pelos seus músculos juvenis, e o jeito como ele se movia fazia o coração dela acelerar.
“Nossa... Esse menino tá mesmo lindo demais!!!”
Quando ele parou diante dela, ainda um pouco sem jeito, a tensão no ar era palpável. Dos dois lados. Mas Guida se forçou a manter a compostura.
— É… Célinho, você convidou seus amigos pra cá? — perguntou, tentando quebrar o clima, mas sem conseguir desviar o olhar dele.
Ainda sem jeito, ele confirmou.
— É... a gente tinha saído do cursinho e resolvemos vir na piscina.
— Mas você sabe que a sua mãe não gosta que você traga ninguém aqui quando ela não tá.
— Mas eu liguei pra ela e pedi. Achei que ela fosse te ligar pra avisar.
Guida lembrou que nem tinha levado o telefone quando foi dar sua “voltinha”.
— Tá... Então eu vou fazer um lanchinho pra vocês.
— Não precisa não. Daqui a pouco vai todo mundo embora.
— Até parece... Imagina se sua mãe souber que cê trouxe os amigos aqui e eu nem dei um suco???
No meio da frase, ela se virou em direção aos armários da cozinha. Abriu os de cima, procurando algo rápido para preparar, depois se abaixou para checar os de baixo. Ficou naquela posição por um instante, sem perceber que seu corpo assumia a mesma postura com que tinha atiçado aqueles homens no boteco.
Ao se levantar, encontrou o olhar de Célio. Um segundo longo, carregado de um silêncio que pesava no ar.
Ele estava paralisado, tomado pela timidez, mas seus olhos denunciavam outra coisa. Era o mesmo olhar faminto que os homens do bar tinham lançado sobre ela.
— Calça da hora... — balbuciou Célio, sincero, mas totalmente indiscreto. No instante seguinte, ficou vermelho como um pimentão.
Margarida sentiu o corpo esquentar. O elogio inesperado, o jeito atrapalhado dele... A surpresa a deixou sem ação.
— Ahhh... Deixa de besteira, menino... Essa calça velha... — murmurou, tentando parecer desinteressada. Mas a voz falhou um pouco ao final da frase, no momento em que percebeu o volume avantajado da ereção na bermuda molhada de Célio.
Realmente avantajado.
Os olhos dela ficaram presos ali. Depois subiram para o rosto dele. Estava estupefata. Célio percebeu e, num reflexo inútil, tentou cobrir com as mãos. Mas já era tarde. Ficaram ali, se encarandoo por longos segundos. Surpresos, inquietos e constrangidos.
E então ele fugiu para o quintal, carregando sua vergonha.
Guida ficou imóvel por um instante. Depois sentiu o arrepio percorrer sua pele, se concentrando entre suas pernas. Apertou as coxas, a mão deslizando por cima da calça, como se tentasse conter algo. Mas sabia muito bem que aquilo não era vontade de urinar.
E num milésimo de segundo toda aquela conversa que ela teve consigo mesma de manhã – “Nada de mais aconteceu, ué!” – foi pro beleléu.
“Aiii... Puta que o pariu... Não acredito?!?!”
Quando jovem, ela já tinha se interessado por alguns homens mais velhos. Lembrava bem de um colega de trabalho de seu pai, quando ela tinha 16 aninhos. Um senhor casado, que era a cara do José Mayer. Ela se encantou por ele de imediato. A ponto de, certa vez, quando os dois se encontraram em um ônibus lotado, não recuar quando sentiu o corpo dele se encostar ao seu. Pelo contrário. Deixou-se ficar ali, presa entre os balanços do veículo e a respiração pesada dele.
Os corpos foram se encaixando no aperto da lotação, os movimentos tímidos se tornando mais ousados. Guida começou a rebolar sutilmente, mas intencionalmente. Um roçar que virou fricção. O homem segurou firme em seus quadris e começou a bombar com vontade, até que estremeceu, gemendo baixinho.
Guida percebeu de imediato que tinha feito-o gozar nas calças. E, naquele momento, tudo o que queria era que ele a levasse pra um motel e a fodesse de tudo quanto era jeito. Deixaria até ali mesmo, se ele tivesse coragem.
Mas pensou no que o pai iria fazer se descobrisse, e desistiu. E o seu relacionamento com o colega do pai parou por ali.
Mas o fato é que ela nunca tinha se interessado ou achado que algum dia ia se interessar por um algum novinho.
Ainda mais esse novinho.
Ela ficou ali parada, com o pacote de pãozinho de queijo nas mãos, olhando aquele Deus grego adolescente mergulhar rapidamente na piscina, antes que alguém notasse que ele estava com uma ereção. Espalhou água nos meninos e nas amiguinhas, que reclamaram prontamente.
As patricinhas novinhas. Gostosinhas e lindinhas, de biquini do lado dele.
E mesmo assim, o menino só ficou de pau duro porque viu a Nega de calça apertada.
Ela teve certeza naquele momento. Não era só uma coisa efêmera. Putaria de adolescente. Célinho tinha tesão nela. Só nela.
E apesar de todas as complicações e tabus que aquilo impunha, ela já não tinha mais como negar.
“Ai... Dona Lívia... Me perdoa...”
Guida não estava a fim de flertar com nenhum daqueles homens na rua, porque o homem que a estava atiçando de verdade estava ali ao lado dela.
Guida estava com tesão no filho adolescente da sua patroa.
CONTINUA...