CURTAS, 2 DONA DORA

Eu, Dora, não sou um caderno em branco. Meus sessenta e dois anos são páginas sublinhadas a vinho e suor. Quando enterrei o marido, enterrei também a mulher que se escondia sob saias largas e rezas. Agora, minhas coxas são colunas dóricas, meu quadril balança como um sino rouco nos bailes da terceira idade. Os homens me olham como se eu fosse um pecado que eles juraram esquecer.

Mudei para Camboriú com o dinheiro das terras — uma venda que dividi entre os filhos como quem reparte migalhas. Aqui, na mercearia empoeirada perto da escola, sou rainha de sacos de farinha e balas de menta. Mas o verdadeiro reino está no meu corpo: seios que desafiam a gravidade, cintura que insiste em ser um relógio de areia. Uso vestidos que sussurram segredos quando caminho.

Lucas chegou como um raio de sol em dia nublado. Filho de Fátima, minha amiga de confissões e copos de vinho barato. Ele tem vinte e poucos anos, músculos desenhados por Deus em um dia de folga, e olhos que parecem ler os sulcos da minha alma. Começou a ajudar no estoque, arrumando pacotes com mãos que tremiam levemente. Depois, invadiu minha cozinha, lavando louças enquanto eu observava a curva de suas costas sob a camisa suada.

As noites eram nossas. Ele trazia cervejas geladas, eu contava histórias de amantes passados — homens que mordiscaram minha pele, mas nunca alcançaram o cerne. Lucas ria, o som era baixo, quase rouco. Sua mão às vezes roçava a minha ao passar o saleiro. O ar ficava denso, como antes de uma tempestade.

Numa tarde de sol inclemente, ele apareceu com um frasco de bronzeador. "Dona Dora", disse, meu nome na sua boca era uma contradição — reverência e provocação. Estávamos no quintal, onde as samambaias crescem selvagens e o muro é baixo o suficiente para que os vizinhos ouçam gemidos disfarçados de risos.

"Precisa passar, senão queima", ele insistiu. Deixei que suas mãos encontrassem meu vestido. O zíper desceu como um suspiro. O ar tocou minha nua pele antes dele. Lucas não falou; seus dedos traçaram linhas de loção quente em minhas costas, deslizando para além do permitido. Eu me curvei como um gato, meu corpo uma oferenda antiga.

Ele me virou, e ali, sob a luz crua, não havia mais Dona Dora. Era apenas carne e ânsia, seus lábios seguindo o rastro do bronzeador, descobrindo que meus seios ainda sabiam cantar. O mundo virou um borrão de suor e sol, suas palavras um mantra: "*Você é linda, você é linda*", e eu, finalmente, acreditei.

Quando ele entrou em mim, contra a velha mangueira que resiste às estações, não pensei em moralidades. Pensei em raízes, em seiva, em ciclos. Lucas era jovem, eu era eterna. E ali, naquele instante roubado ao tempo, ambos éramos apenas pulsação — brutais, belos, efêmeros.

O sol se pôs. Fátima nunca soube. A escola ao lado continua ensinando tabuada. E eu, Dora, sigo dona de mim.

*Nota: O bronzeador ainda está na gaveta da cozinha. Às vezes, cheiro o frasco e rio baixinho.*