Banheiro da Escola - Part. 13



O prédio de Gabriel era perto do meu, a família dele morava numa cobertura, era o pai, a mãe e sua irmã mais nova chamada Debora. Quando chegamos, estavam todos na sala de TV.

- Esse daqui é meu colega Gustavo. – Disse Gabriel me apresentando. Acenei para eles com a mão e em seguida fomos para o quarto de Gabriel.

Quando ele abriu a porta do quarto eu tomei um susto. O quarto dele era arrumadinho e havia uma dúzia de origamis muito distribuídos, enfeitando todo o quarto.

- Quem faz esses origamis? – Eu perguntei.

- Eu mesmo.

- Você? – Eu perguntei novamente, como se não acreditasse.

- É, ué. Eu mesmo.

Aí estava uma coisa que eu não esperava do Gabriel. Havia um dragão chinês feito em origami em cima da estante de estudo dele, ele tinha um dom, havia várias coisas legais que ele tinha feito em origami.

Passei algum tempo admirando todas aquelas obras em papel que ele tinha feito e pensando em como Gabriel era muito fofo. Havia até um pequeno vaso com uma rosa, parecia muito verdadeira, quem visse de longe nem perceberia que eram feitos de papel.

- Gabriel, você é um artista!

- Você é um artista em me dar prazer. – Ele falou me dando um abraço gostoso por trás enquanto eu olhava boquiaberto para a rosa de papel.

Entre várias coisas que fizemos, Gabriel me mostrou as músicas que ele gostava, vídeos no YouTube que ele achava engraçado, inclusive a música que ele queria que tocasse no funeral dele.

- Credo Gabriel, você não acha que é meio cedo para pensar nisso não?

- Talvez, mas quando eu escuto essa música, eu não sei porquê, mas penso nela tocando no meu funeral, acho ela perfeita para um funeral.

Que horror, eu pensei. Mas a música não era nada horrorosa, aliás, era deveras bonita.

- Eu vou colocar no YouTube, porque não estou achando o arquivo dela aqui no meu PC. – Falou Gabriel. Eu assenti com a cabeça, ele continuou falando. – Não repara no vídeo, que o vídeo não tem nada demais, presta atenção na música.

- Tá certo. – Eu respondi.

Ele então digitou “Wander My Friends” na busca do YouTube e em seguida selecionou um vídeo.

Começou a tocar uma espécie de uma marchinha e logo depois uma voz cantando numa língua que eu não soube reconhecer. Eu percebi que lágrimas começaram a escorrer dos olhos de Gabriel. Ver ele ali emocionado acabou me fazendo ficar emocionado também e lágrimas também desceram dos meus olhos, a música era linda, mas carregava um peso de tristeza junto com ela, difícil até de explicar.

Olhando um para o outro e começamos a rir da nossa fragilidade emocional. Passei a mão secando meus olhos, ele também.

- Que língua é essa? – Eu perguntei

- Eu não tenho certeza, mas eu vi na internet que é uma tal de “Irish gaelic”, não sei como é chamada em português.

Gabriel me explicou que ele tinha conhecido essa música numa série de ficção cientifica, por mais estranho que isso soasse, chamada BattleStar Galactica, a qual era fã fanático.

- Pois é. – E ele continuou a falar do seu sonho de funeral perfeito. – Eu quero ser cremado e quero que joguem minhas cinzas no mar enquanto tocam a música no fundo.

Era engraçado ver Gabriel contando os detalhes de como que ele queria que fosse o seu próprio funeral. Para começar nossa cidade nem ficava no litoral, como que ele queria que jogassem as cinzas dele do alto de um penhasco no mar? Mas de qualquer jeito era bonitinho ver os olhos dele brilhando enquanto descrevia cada detalhe.

- Se eu fosse rico, iria mandar construir um mausoléu... – Ele falou.

- E você sabe o que significa a música? – Eu perguntei.

- Bom, eu já olhei na tradução em inglês, mas não sei de cor.

Então procuramos na internet a tradução em inglês da música, que em português fica mais ou menos assim:

Caminhem meus amigos, caminhem comigo
Como a brisa da montanha, se movendo eternamente
Apesar do nosso cansaço, vamos seguir a estrada
Sobre as colinas e vales, até o fim da jornada
Vamos lá meus amigos, cantem comigo
Vamos encher a noite com muita alegria
Aqui está um brinde para os amigos que já se foram
Como a briga da montanha, se foram para sempre.

- Poxa, forte a letra. – Eu falei. Gabriel concordou com a cabeça, depois ficou contemplando a parede. – O que foi, Biel?

- Essas coisas me dão um aperto no coração. – Ele falou.

- Por quê?

- Sabe o que é? – Ele disse choroso. – Minha espiritualidade é muito fraca. Eu não sei o que vai acontecer comigo depois que eu morrer. Eu queria ter alguma convicção de algo, mas simplesmente não consigo ter. Às vezes acho que tudo vai acabar mesmo, e aí fico pensando que minha vida não faz sentido nenhum.

Eu fiquei olhando surpreso para ele, o que eu poderia dizer? Eu também era muito fraco em paradigmas, eu fazia sempre o máximo possível para não pensar neste tipo de assunto. Ele continuou desabafando.

- E hoje em dia cheguei a uma conclusão lógica terrível.

- E qual é? – Perguntei.

- Eu não estou satisfeito com nenhuma opção possível que existe para a minha vida depois da morte. Se eu deixar de existir e tudo acabar, isso pra mim é horrível. Se eu tiver alguma espécie de vida eterna no paraíso, isso é horrível também, o que eu vou fazer a eternidade no paraíso? Vai chegar uma hora que vai perder o sentido ser eterno.

Gabriel levava a um outro patamar a questão de duvidas existenciais.

- Sabe... – Ele continuou. – Eu queria só não ser esquecido depois que eu morresse. Queria ser lembrado para sempre, deixar algo para a humanidade. No meu subconsciente eu tenho uma utopia de ser um escritor, sei lá, escrever algum grande livro e me tornar inesquecível ou alguma outra coisa. Maluquinho eu, né?

- Que isso! Não tem maluquice nenhuma nisso. Não sei se serve de consolo, mas para mim você será inesquecível, eu não vou esquecer de você nunca.

Gabriel abriu um sorriso sem jeito.

- É, de consolo talvez sirva... mas não muito, o problema é que um dia você vai morrer também, e aí depois que você morrer, eu serei esquecido. Na verdade, é uma coisa que não tem como escapar em última análise, até Hitler um dia será esquecido, pode ser até que demore, mas um dia inevitavelmente ele será esquecido, mesmo que seja quando a humanidade for extinta. Afinal, um dia a humanidade vai deixar de existir, o planeta Terra vai deixar de existir, não tem como escapar disso. E tudo terá sido em vão... as guerras que o Hitler fez terão sido todas em vão, não terão feito diferença nenhuma, no final, tudo acabou, nada fez diferença... entende?

Eu olhava extasiado para Gabriel.

- Entendo, mas sei lá, igual você falou, se não tem como escapar, para quê ficar esquentando a cabeça com isso?

- Esquentar a cabeça ou não, não faz diferença, no final nada fez diferença... nunca queria ter chegado a essa conclusão.

- Descola disso! Bom, se serve de consolo, você não é o único condenado ater uma vida assim, todos os seres humanos estão fadados a isso, você não é diferente dos outros.

Gabriel parou por um instante para pensar.

- É, até que é verdade isso aí que você está falando.

- E tem mais, talvez o sentido da vida seja justamente não ter sentido. Afinal, que graça teria se você descobrisse o sentido da vida? Se você descobrisse o sentido da vida, ela deixaria de ter sentindo, sacou?

- É, gostei disso. Você tem razão. - Ufa, por segundo eu achei que ele fosse ficar agarrado naquele pensamento. – Mas eu já fiz um esboço de uma história que eu gostaria de escrever um dia, você quer ver? – Ele ofereceu.

- Claro!

Gabriel abriu um arquivo Word que estava salvo no seu PC. O título da história era “As Consequências de uma Chantagem”. Na hora achei o título meio ruim, mas nem comentei nada.

- Sobre o que é a história? – Perguntei.

- Bom, eu só escrevi um esboço ainda, mas é sobre um menino que se apaixona por outro, mas acaba acontecendo um desencontro entre eles e esse tal menino obriga o outro, através de uma chantagem, a ficar fazendo sexo com ele. Assim, é meio complexo o enredo, tem outras coisas também, além disso eu ainda não consegui pensar num final. – Ele confessou.

- Hum, entendi... me manda por e-mail, quero ler o que você já esquecer.

- Tá bem, vou te mandar agora mesmo. – Ele disse animado. – Depois você me fala o que achou.

- Tá certo.

Gabriel anexou o texto e enviou o e-mail para mim.

- Mas assim... – Ele explicou. – Seria só a minha primeira história, só para criar uma intimidade com a escrita, o meu clássico mesmo eu ainda tenho que pensar como vai ser.

- O pior de tudo é que eu gosto de ouvir você falando essas coisas.

- Você tá duvidando? Você vai calar a boca quando eu ficar famoso! – Em seguida ele me deu um selinho na boca, totalmente inesperado, mas foi bom. – Dorme aqui em casa hoje?


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Comentários


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k4bs Comentou em 16/10/2017

eu comecei de pau duro e terminei tendo uma crise espiritual, minha santa mãe...

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k4bs Comentou em 16/10/2017

Wander My Friends é irlandês. Muito boa e triste também.




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Ficha do conto

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Nome do conto:
Banheiro da Escola - Part. 13

Codigo do conto:
107556

Categoria:
Gays

Data da Publicação:
15/10/2017

Quant.de Votos:
9

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