O Ritual da Loira do Banheiro.

Meu nome é Caio, sou gordinho, simpático e comilão. Dito isso, faltava uma garota em minha vida, então observei uma garota na escola. Um dia tentei me sentar ao seu lado num banco escolar e vi seu olhar fulminante em minha direção.
– Porquê sentar aqui? – Disse Maísa Ibida de Menibolne – A propósito esse é seu nome.
– O banco é seu? – respondi na defensiva.
Se eu fosse um cara esperto teria ido embora, pois no mesmo dia acabei virando amigo e posteriormente fui obrigado a carregar sua mochila e fazendo seus trabalhos escolares.
Então um certo dia, na sala de aula.
– Ei, Caio, queres ver um vídeo sobre fantasma?
Maísa mostrou uma garota flutuando no banheiro da escola. Era possível vê-la mostrando a língua; e de repente um clarão ocupou toda a tela, retornando a normalidade gradativamente.
– Bela montagem – falei dando pouca atenção.
– Pateta. Essa é o fantasma da Loira do Banheiro. Ela é minha aliada nas artes das trevas e posso conjurar do plano espiritual, mas para trazê-la em corpo físico será necessário uma pessoa com características puras.
– Como assim puras?
– Virgem, como você.
– Eu não sou virgem. – menti, mas ela nada falou sobre isso. Nem mesmo quando falei que não participaria de pegadinhas de Halloween.
– Caio, não confunda as coisas, não estou falando de bruxarias ou fantasias de espectros ou invencionices de lendas urbanas, falo de chamado real do mundo material para um mundo imaterial…
Maísa jurou que não haveria perigo algum e que minha simplória participação seria dando três chutes na porta do banheiro, acionar três vezes a descarga do vaso sanitário e gritando três palavrões. E, ela por sua vez entoaria cânticos profanos de necromancias ao plano físico.
Questionei meus motivos de tantas atenções a Maísa. A primeira tese sincera é porque sou um moleque cabaço que só fala merda e não pega ninguém. Isso responderia minha falta de cérebro em entender que manter amizades com Maísa é o mesmo que ser diplomado com atestados de insanidades psiquiátricas\psicopáticas.
Maísa colaborou sua situação psicótica sapateando em frente aos alunos em plena sala de aula enquanto erguia seus polegares a fim de afirmar necessidades da física presença da fantasma do banheiro para que pudessem conversar sobre assuntos inimagináveis para os padrões imaginários de um ser humano comum.
– Então Caio, carregue nossas mochilas e nos esconderemos no terraço até todos saírem e iremos ao banheiro feminino e não se preocupe, pois tenho itens necromantes em minha mochila para rituais profanos.
…
Aceitei ficar escondido no terraço. Mas confesso que esperava ouvir estávamos ali porque ela queria pau na buceta. Mas nada disso aconteceu. Enfim, após o sino tocar percorremos os andares e corredores e foi estranho, pois rodeando de alunos é sinônimo de anarquia barulhenta, mas agora parecia um silêncio sombrio e incomodante.
Uma vez dentro do banheiro participei das loucuras com chutes na porta e dando três descargas no vaso sanitário enquanto agulhas de seringas coletavam meu sangue para que fossem feitos pentagramas invertidos no centro do espelho. Após isso, foram acendidos velas brancas, vermelhas e negras.
Juro que eu esperava que a qualquer momento ela fugiria e riria de mim. Mas permanecemos rente ao espelho. Eu podia ver movimentos de seus peitos enquanto seus lábios emitiam sonetos de cânticos num idioma estranho, no entanto, eis abaixo o que entendi do final do ritual.
“… Sou Maísa Ibida de Menibolne a conjuradora de mortos e necromante de muitas vidas. Ordeno ao carcereiro do mundo do caos espiritual que atenda a invocação. Abla Porium Furios… Espectro da Loira do Banheiro, ultrapasse os limites tridimensionais do espelho portal…”
De repente um brilho ofuscante surgiu no centro do espelho. Uma espectral imagem começou se materializar. Neste momento talvez valha lembrar que pensei ter apenas participado de delírios de uma jovem garota precisando ser internada num manicômio. Mas o espectro no espelho era real. Tentei ajoelhar para fazer sinal da cruz. Mas, tanto Maísa como o espectro foram implacáveis na resposta.
– Deixe de tolices, humano. Se não deseja morte trágica complete o ritual.
– Caio, escute o espectro da Loira do Banheiro e prometo que não perecerá pela arte das trevas, caso contrário, espíritos zombeteiros irão persegui-lo até sua morte na loucura da dor.
– Como assim? Eu vou morrer?
– Não. Mas assim como posso conjurar demônios e espíritos zombeteiros, também tenho autoridades de bani-los para limbos de mundos sem sóis. Mas não poderei ficar nessa o tempo todo, então diga três palavrões e prometo que nada de mal acontecerá.
A fim de evitar um destino sofrível gritei o primeiro xingamento.
– LOIRA DO BANHEIRO DO CARALHO..
No primeiro chamado o cadavérico espectro ganhou contornos com órgãos, tecidos cartilaginosos, tecidos musculares e veias sanguíneas.
– LOIRA DO BANHEIRO, PUTA QUE PARIU.
Neste segundo chamado o corpo foi nutrido com peles, cabelos, olhos e dentes.
– LOIRA DO BANHEIRO DOS INFERNOS.
O terceiro chamado o espectro do espelho piscou energicamente os olhos e segundos depois desapareceu como uma figura encantada de um conto de fadas.
Minha visão turvou e senti como se o tecido da realidade tremesse como que rompendo a membrana mística que separava o mundo físico do espiritual. Houve explosões semelhantes a luzes psicodélicas finalizando materializações de duas entidades.
Uma delas parecia um ser angelical trajando reluzente vestido branco, tendo faces coradas e ondulados cabelos louros caindo-lhe às costas. A entidade mostrava seus dentes bem tratados enquanto sorria ao lado de Maísa.
A outra entidade tinha a aparência demônica, travava camisola branca e toda ensanguentada. Era possível ver as vértebras ossudas por entre os trapos do tecido apodrecido. Ela materializou em pleno ar e emanava uma aura maléfica, seu sorriso era de puro escárnio e seu olhos eram órbitas negras cheios de ódios e furor.
Maísa, no entanto, desprezou a entidade moribunda e se comunicou verbalmente com a bela Loira do Banheiro.
– Fantasma do banheiro. Diga que porra é essa? – Maísa falou fitando a entidade moribunda gargalhando insanamente agarrando-se na grade metálica do banheiro logo acima de nós.
– Ah, Maísa, aquela é Maria Sangrenta do Encosto. Ela é carrapato, encostou, grudou, já era. Mas tive que trazê-la por ordens do próprio Satã que queria se desencostar desse enjoado encosto a todo custo…
– Sim. Mas…
– Mas o que? O inferno entrou em festa. Mas houve discussões acaloradas. O brinquedo assassino Chucky jurou perseguir meus familiares até os finais dos tempos. O caladão Jason fez um discurso e Freddy Krueger chorou feitos criança para que eu a arrastasse para o mundo dos vivos e olha que essa galera é o que tem de pior entre os macabros e sinistros perturbadores dos infernos.
– Pare de papo furado e resuma tudo – Maísa falou fitando a entidade moribunda gargalhando insanamente logo acima de nós.
– Satã teve seis paradas cardíacas e quatro pontes de safena. Então aquela moçoila do encosto é dose cavalar até pro próprio Satã.
– Shhh, moçoila do encosto é o caralho, me respeite. – sibilou a demônio da grade. – Senhora, eu sou Bloody Mary, mas pode me chamar de Maria Sangrenta…
*****
Maria Sangrenta passou a argumentar sobre ser um demônio do encosto vingativo. Mas jurou não me fazer mal algum, pois sabia que poderia ser banida num simples estalar de dedos e tudo que desejava era ser agraciada com feitiços capazes de restaurar seu corpo no auge de sua juventude para fazer sexo comigo.
Embora o pedido viesse de uma entidade assassina. Maísa compadecida com a sinceridade questiona se entidade estava ciente do preço a pagar. A entidade confirmou ter conhecimento e pagaria o preço atendendo chamados como serva por sete vezes sete anos.
– Tem certeza disso? Sou exigente.
– Ordene e eu assombro. Ordene e eu mato, ordene e deixarei viver.
– Então que assim seja.
*****
Enquanto isso a Loira do Banheiro se divertia cutucando profundamente minha barriga com seu dedo indicador.
– Ei gordinho. Se você morrer aqui seu nome será Gordinho Veadinho do Banheiro e quando um aluno o chamar três vezes você aparecerá todo feliz da vida para punhetar, é? Mas e se for uma aluna querendo uma siririca. Você aparecerá com um machado? Vai assombrar ou amaldiçoá-la para sempre?
Pior que ser alvo de encarnação é que a situação tomava rumos inesperados e ninguém questionou se eu desejava perder minha virgindade com uma entidade demoníaca.
Alheias aos meus sentimentos, Maria Sangrenta flutuou, rodeando meu corpo, em seguida pousou rente a mim. Eu olhei para o ser fantasmagórico. Ela agora estava olhando para mim, seus olhos escuros cadavéricos brilhando em negritude opaca. Sua face e peitos expostos estavam cobertos por sangues e cicatrizes.
– O que vai acontecer? – perguntei, sentindo medos extremos em recusar o pedido.
– Um milagre das trevas.
Continua no texto O Ritual de Bloody Mary.