-Ele não vai me bater hoje, isso também não é assim todo dia, é de vez em quando, e hoje é noite de poker, o Mauro vai chegar bem tarde e já estarei dormindo.
A conformidade dela me espantava, tive que usar meu poder de convencimento por um longo tempo para Leticia enxergar que aquilo não é normal. Expliquei que ela teria muito a ganhar com o divórcio, sim, pois o filho da puta tinha até Mercedes para se exibir, sem contar o apartamento que valia uma nota e mais sabe-se lá quantos outros bens, mas o mais importante era se livrar do maníaco covarde. Prometi que ficaria ao lado dela mesmo que se durante o processo de divórcio, a gente não estivesse mais transando. Ela disse que iria pensar.
Não dormi bem aquela noite, minha vontade, como citei antes era de dar um tiro na cara dele. Por anos, o filho da puta a exibia como um troféu em todos os lugares, sabia que ela sempre era olhada e gostava de pensar que os outros o invejavam, mas entre 4 paredes, era um bosta na cama, a agredia verbal e fisicamente, sem contar que tinha amante e chegou a dar um carro e outros presentes a ela.
No dia seguinte, já no trabalho, recebo uma ligação de Leticia, ela estava chorando, não porque Mantovani fizera alguma coisa, mas pelo fato de que finalmente a ficha tinha caído. Em prantos, ela disse que quando contou para a sua família, todos disseram que era errado bater, mas que ela é quem deveria procurar não irritá-lo e que ontem tinha sido um choque de realidade ver eu, de quem ela estava gostando, mas que tinha entrado em sua vida há tão pouco tempo, mais preocupado com ela do que sua própria família.
Aproveitei a deixa e disse que a apresentaria a um ótimo advogado, mas queria que ela saísse de perto do Mantovani ou eu não teria paz para pensar nas próximas ações.
Graças a essas plataformas de aluguel de imóveis, consegui um apartamento, seria uma ótima, pois em um hotel, ele poderia descobri-la. Leticia aceitou e combinamos de no dia seguinte, ela pegar suas roupas e simplesmente sair quando ele não estivesse.
Assim foi feito, e naquele mesmo dia, falamos com um advogado que conheço e ele prometeu que agilizaria tudo o que fosse possível. Com Leticia segura e Mantovani aceitando ir conversar com o agora advogado dela, bolei minha estratégia e foi minha vez de marcar uma reunião com ele para tratar da renovação do contrato, ele estranhou porque ainda faltava um tempo para esse processo, mas aceitou. O jogo era desfavorável para ele, mas se as peças não fossem bem mexidas, sua derrota seria apenas parcial, e eu fazia questão de golpeá-lo onde doeria mais.
Apesar de estar devastado por perder seu troféu e seu objeto de tortura, Mantovani se importava mais com dinheiro e por isso chegou à minha sala sorrindo e me estendendo a mão. Tentando conter meu ódio, banquei o cínico dos cínicos e sem muitas delongas, arranquei o sorriso dele ao dizer:
-Mantovani, estou sabendo de um assunto desagradável envolvendo você e um caso de violência doméstica.
Ele engoliu seco, visivelmente sem graça, eu prossegui.
-Sabe como é ruim se isso vir à tona em tempos de internet, redes sociais para a sua ou para a nossa empresa, essas coisas viralizam em horas e queimam o filme de uma marca ou de uma pessoa. Não podemos ter negócios com uma entidade em que o dono agride a esposa, acho que você entende.
-Como você descobriu disso? A Leticia está espalhando isso para os outros? Não sei o que foi que aquela tonta contou, mas é mentira, essa mulher tem tudo do mais alto luxo e agora está querendo me ferrar, saiu de casa do nada, é a mesma situação que você viveu há algum tempo com a Adriana, amigo, elas saem de casa, arrumam um novo macho e o marido é o culpado.
A tática de Mantovani de tentar ganhar minha simpatia comparando a minha situação com a dele, foi decepcionante, confesso que esperava mais de um homem de negócios, mesmo assim, procurei fingir que era neutro.
-Olha, Mantovani, eu fico assim...Constrangido porque é um assunto de casal e aqui são só negócios.
-Exato! Negócios! Minha vida particular, eu resolvo.
-Mas não é tão simples assim, não posso arriscar o nome da empresa associado a uma que, como já disse, pode ter o nome do dono envolvido em caso de violência doméstica. Entretanto, acho que dá para contornar. –fiz uma cara de pensativo, olhando para a mesa, batendo com os dedos nela e fingindo buscar uma solução.
O medo de perder mais de 50% do que ganhava, o faria dar até a bunda ali, pois sua vida era ostentação e luxo, ele perguntou ansioso:
-Como? Me explica? Não posso perder esse contrato, você sempre me salvando, Paulo.
-Pelo jeito, a Leticia quer se separar de você mesmo, não vou entrar no mérito de quem está certo ou errado, então, amigo, cairia muito bem se você fizesse um acordo rápido com ela, divide o que vocês têm, com a condição dela não falar nada sobre esses probleminhas domésticos, mais cedo ou mais tarde, você terá que dar mesmo o que é de direito dela, mas se souber conversar, fazer um acordo, o escândalo não vem à tona e vida que segue.
-Isso nem fodendo! Se aquela retardada quiser mesmo se separar ficará anos para ver uma moeda.
Fiz cara de decepção e olhei para a mesa:
-É complicado, Mantovani, mas como disse, são negócios, com esse chabu seu pronto para estourar, estamos correndo contra o tempo, março está aí.
-Porra, me ajuda, Paulo, se perder esse contrato, não vou conseguir honrar uma porrada de compromissos e esse ano que passou foi foda.
-Olha, pela nossa amizade, se você resolver esse pepino antes de março, ao invés de um contrato de um ano, fazemos por cinco anos, claro que desde que mantidas a qualidade e demais situações já previstas em contrato. O que acha?
Mantovani parecia derreter na minha frente, o contrato de cinco anos era um sonho, pois permitiria que ele respirasse financeiramente, mantendo seu padrão de vida elevado, por outro lado, além de ver Leticia bater asas para bem longe, veria metade de seus bens irem junto. Ele ficou pensativo, chegou a recorrer a uma calculadora e por fim, disse:
-Sem eu aceitar a separação numa boa não tem jeito mesmo?
-Infelizmente não, Mantovani, e se você não me der uma resposta, terei que já começar a procurar os seus concorrentes. Março está aí...
-Quer saber? Não vou mentir, sem esse contrato eu tô fo-di-do, fo-di-do e mais cedo ou mais tarde, terei que me desfazer de alguns luxos e bens, melhor então ficar com o contrato e dar metade para aquela tonta de merda que nem para engravidar presta. O que eu preciso fazer para provar que cedi tudo que era de direito dela e não correr o risco dela sair falando merda.
-Isso o advogado deve te orientar melhor, mas faz rapidinho um inventário de tudo que possui e passa metade para ela e em troca pede um documento assinado por ela, atestando que a separação foi numa boa e que ela não poderá reclamar de nada. Eu acho que é assim, tô só chutando.
Mantovani saiu da sala chateado, mas tinha comprado minha história. Em poucos dias, os advogados dos dois lados se reuniram e ele aceitou dividir tudo com Leticia, mas pediu algumas semanas para sair do apartamento que ficaria para ela, pois seu padrão era elevado demais e não poderia ir para “qualquer lugar”.
Para comemorar aquele feito, Leticia e eu fomos para o Guarujá passar o final de semana, onde além de muito sexo, nos sentimos pela primeira vez como um casal de namorados, saindo juntos para vários locais, de mãos dadas, abraçados etc. Aquela mulher alta e corpulenta estava se revelando uma companhia muito boa, se ia durar, eu não tinha certeza, talvez dali um mês, ela quisesse parar de me ver ou eu, em uma de minhas perturbações, fizesse alguma merda e a afastasse, por isso, procurei focar no momento e viver intensamente.
Quando voltamos, ela ainda seguiu no apartamento que aluguei, esperando Mantovani desocupar o que passaria a ser só dela. Ninguém ainda sabia que estávamos juntos, mas no momento certo, estava disposto a contar, desde que claro, ela também quisesse.
Valentine’s Day
Se tem uma coisa que a classe média/média e principalmente a média alta sabem fazer é tentar imitar os norte-americanos. Como se já não bastasse forçar a barra para introduzir o Halloween em nossa cultura, em meu condomínio ainda havia a grande festa de Valentine’s Day, que é o equivalente ao Dia dos Namorados aqui no Brasil, porém no dia 14 de fevereiro. Todos os anos, nessa data, ocorre uma grande festa romântica no salão principal, com direito a uma banda que tocas músicas lentas do passado, confraternização entre os condôminos que trocam cartões e até presentes. Adriana e eu fomos duas vezes. Mas por que coloco esse assunto aqui? É que justamente no primeiro ano em que estamos separados, minha ex me liga dizendo que as amigas que organizam o Valentine’s Day no condomínio a convidaram para a festa do dia 14. Se fosse meses antes, tomaria aquilo como uma provocação, afinal de contas, ela já não morava mais no local há quase um ano, mas eu sim, e ela vir curtir o Dia dos Namorados com seu novo companheiro aqui, pareceria deboche, maior até que o do aniversário de nossa filha, pois ali ela tinha motivos para estar presente e ainda que recente, estava livre. Porém, eu estava tão bem nos últimos dias que apenas respondi.
-Você não precisa me dar satisfações de onde vai ou não, exceto se for levar minha filha, de resto, poupe o seu e principalmente o meu tempo, só ligue se for importante.
Desliguei antes que ela reclamasse de minha grosseria. Fiquei puto sim, não com ciúmes, mas por achar aquilo como dizem os mais jovens bem “sem noção”. No outro dia, vendo um cartaz sobre o evento do Valentine’s Day no condomínio, comecei a me lembrar da ostentação que de homens e mulheres do prédio fazem, comemoram a nova plástica, a bolsa de grife, a camisa italiana, mas o que menos comemoram, de fato, é o romance que é o objetivo da festa.
Por falar em ostentação, lembrei-me do comportamento de Mantovani nas duas ocasiões em que fui nessa festa, ele desfilava com Leticia, ambos impecavelmente vestidos, ela, sem dúvida, era a mulher que mais chamava a atenção, não que não houvesse várias outras lindas, mas, como já citei anteriormente, a Leticia era um caso à parte. Para o canalha, era um de seus pontos altos, ver os homens desejando sua esposa e muitas mulheres querendo ser ela.
Horas mais tarde, acabei tendo uma ideia maluca (mais uma) e se desse certo seria o grande tombo do canalha do Mantovani. Contei a Leticia que mesmo ficando apreensiva no começo, aceitou e a partir daí acertamos todos os detalhes. Ela ligou para ele e disse que gostaria de conversar, mas em um lugar com mais pessoas, pois tinha medo de sua agressividade devido ao modo como ela saiu de casa e se escondeu. Mantovani topou e quis marcar em um shopping, porém ela disse que preferia que fosse na festa no condomínio, pois lá haveria muita gente conhecida. O safado demonstrou até uma certa alegria e ainda tentou bancar o romântico:
-Só não sei se ouvindo aquelas músicas, lembrando de outros anos lá, eu não vou me jogar no chão e pedir para você voltar. Olha que eu faço. O que você me pedir eu faço para ter mais uma chance e demonstrar que agora vou mudar.
Ele ainda seguiu com o longo e manjado discurso do marido arrependido dizendo que poderiam reatar. Leticia procurou não ser seca demais, mas cortou a conversa e disse que se veriam lá.
A queda de Mantovani já era fato consumado, mais cedo ou mais tarde ele saberia, poderia ser silenciosa ou teatral, dependia de Leticia e de mim, optamos pela teatralidade e no dia 14 o amor estaria no ar.
Como toda banda que é contratada para tocar por várias horas, a que iria se apresentar no Valentine’s Day do nosso condomínio, fazia algumas paradas para descansar e nesse momento, as luzes que estavam no estilo discoteca dos anos 70-80, se acendia para que as pessoas pudessem se ver melhor, beber, conversar etc. Uma playlist ficava tocando músicas românticas, porém com um som de fundo não tão alto para não incomodar a conversa entre as pessoas. Combinei que Leticia entraria apenas após a 1ª parada da banda, pois assim, todo mundo já teria chegado e as luzes estariam acessas. Impaciente, Mantovani já havia ligado para saber o porquê da demora, ela disse que houve um problema no trânsito, mas já estava próxima.
Minutos depois após a 1ª parada da banda e as luzes acessas, Leticia surgiu na porta, com um justíssimo e curto vestido cinza brilhante, havia feito um novo penteado que deixava seus cabelos jogados para o lado, além dos saltos muito altos. O salão principal era bem grande e para quem entra, do lado direito ficava o palco, no meio, um grande espaço para dançarem e do aldodo esquerdo e nas laterais as mesas. Várias pessoas olharam para Leticia, ela era muito conhecida no condomínio. Mantovani, que estava em pé, próximo ao palco, conversando com outros três caras, quando a viu, abriu um sorriso e segundo soube depois, teria dito: “Minha esposa chegou” e deu três ou quatro passos em direção à porta, porém, nesse momento, eu surgi de trás dela, estendi meu braço e entramos juntos a caminho da mesa que havia reservado. O canalha ficou branco, congelou e ficou no mesmo lugar, sem retornar para a roda de amigos nem se mexer. Mas hilário mesmo foi ver a cara de todos que nos conheciam. Amigas dela, amigos dele, todos foram pouco a pouco parando o que estavam fazendo e tentavam entender o que estavam vendo, nos sentamos em nossa mesa, fingindo que nada de anormal estava acontecendo, no caminho até ela, ainda acenei com a cabeça para alguns conhecidos e Leticia fez o mesmo. Acho que nunca vi tantas bocas abertas e olhos arregalados ao mesmo tempo, pelo menos não por algo em que eu estivesse envolvido.
Assim que nos sentamos, fizemos questão de mostrar que estávamos mesmo juntos, segurei sua mão sobre a mesa, beijei suavemente, trocamos um rápido selinho e começamos a conversar fingindo que não estávamos sendo olhados com espanto. Não havia necessidade de um beijo estrondoso de língua ali, pois a cena em si já era deveras impactante. Tirando os que ainda não tinham nos vistos ou os poucos que não conheciam nem a ela e nem a mim, todos os demais estavam incrédulos. Sentado numa mesa ao canto com sua esposa, Tavarez estava com os olhos esbugalhados, olhando para nós dois e, de vez em quando, para Mantovani, como que querendo saber o que ocorreria. A mulher de Tavarez atacava firme uma porção de canapés, mas também não tirava os olhos.
Leticia e eu seguíamos conversando e sempre trocando um carinho suave, nada exagerado. Passeando lentamente meus olhos pelas mesas, vi Adriana, mais à direita, era mais uma que realmente tinha ficado estupefata, não ao ponto de ficar literalmente de boca aberta como vários ali, mas estava visivelmente perturbada e nos olhava sem disfarçar. Já Alexandre, devia estar apenas pensando que eu tinha arrumado uma bela namorada, pois ele não sabia todos os detalhes. As amigas de Leticia também foram um show à parte, começaram a conversar agitadas entre elas e também fitavam Mantovani que seguia estático. Aliás, após sermos olhados como dois ETs por longos minutos, o que todo mundo queria saber era o que o “marido” iria fazer, os olhares então passaram a ser para ele e após um tempo para nós, como num jogo de tênis, onde os público presente fica olhando o vai e vem da bolinha.
Comecei a olhar fixamente para Mantovani com um discreto sorriso de deboche. Acredito que num dado momento, ele percebeu o tamanho da armadilha que tinha entrado: não teria mais Leticia, não teria mais 50% de seu patrimônio e também não teria mais o contrato com a empresa da qual sou sócio, pois deve ter deduzido que eu apenas o manipulei e agora o mandaria para a puta que o pariu. Para completar, toda sua autoestima cultivada por anos de achar que todos o invejavam no condomínio pela mulher que tinha, havia ruído em poucos minutos. Quando ele se deu conta, alguns de seus “amigos” mais próximos, já cochichavam com ar de riso. Sem contar as demais pessoas na festa.
Foi um golpe duro demais para o canalha que se retirou apressadamente e quando deu breve olhar para a nossa mesa já próximo à porta, viu Letícia com o cotovelo apoiado na mesa e a mão fechada no formato que ele fazia para lhe dar violentos cascudos, ela sacudiu a mão e em seguida estendeu o dedo médio para o canalha que saiu quase trombando com a porta. Vários viram o gesto, houve até um rápido burburinho e risos.
A banda se preparava para voltar a tocar e Leticia me perguntou:
-Ficamos mais um pouco ou vamos?
Em tom bem-humorado, acariciei seu queixo e respondi:
-Você é quem decide, mas não sei se notou que essa festa deu uma esfriada de repente?
Leticia riu e disse:
-Sem dúvida, essa festa tá meio caída, mas eu sei de um lugar para onde podemos ir e te garanto que será bem agitado.
Levantamos de mãos dadas e fomos saindo, deixando aquela gente pseudofina com muitas histórias para contar por semanas. Tentei não olhar diretamente para Adriana, mas vi que ela nos seguiu com o olhar quebrando o pescoço. Curiosamente, ela não fazia parte do meu plano, o foco era Mantovani, mas se minha ex se queimou nessa fogueira, paciência.
Tive mais uma noite maravilhosa com Leticia. No dia seguinte, tomamos conhecimento de que Mantovani não curtiu muito a festa, e ainda na madrugada foi visto enchendo seu carro de malas e abandonando o condomínio.
Amigos, a história ainda não acabou, ainda há reviravoltas de toda sorte. Aos fãs de sexo, também haverá novidades. Abraços
está muito bom
caralho passei a tarde lendo tudo e sem duvidas um dos melhores que já li
Parabéns pela estória, continua por favor!!!
Meu irmão você é meu herói tô acompanhando bem atentamente a sua história parabéns lol
Top demais, continua ..
Cada vez melhor seu conto, parabéns é de uma riqueza de detalhes maravilhosa,muito bom o enredo todo, votadissimo
Votado, que trama, muitos inimigos, por uma mulher!!! Mais ainda está dando, as cartas!! Bem escrito!!!
Sensacional sua historia. Estou ansioso aqui pelos próximos capítulos.
delicia demais