Achei completamente fofo a maneira como ele escreveu.
Era só um bilhete. Ele podia muito bem ter mandado uma mensagem no celular.
Mas não. Ele escolheu deixar uma cartinha. E isso... isso me fez sentir especial. Sorri, sem perceber. Era diferente, mas ao mesmo tempo, não respondi, não sabia quais eram as intenções dele, e para ser sincero, nem mesmo sabia quais eram as minhas. Havia sido bom. Muito bom, mas para mim, aquilo não podia passar dali. Preferi deixar pra lá.
Fui para a cozinha preparar algo para comer. Belisquei umas besteirinhas enquanto colocava o café para esquentar.
Logo depois, meu amigo, que ainda estava hospedado lá, chegou. Ficamos conversando e colocando o papo em dia sobre como tinha sido nossa noite.
A vida seguiu.
Já era noite quando fui para a casa do meu pai. Foi então que meu celular vibrou.
Lucas.
"Tá vivo? Tá tudo bem?"
Olhei para a tela por um instante antes de responder:
"Oi, Lucas. Tô sim, só com um pouquinho de ressaca, mas tomei o remédio que você deixou. Rss. Acho que amanhã estou 100%."
Ele respondeu rápido.
"Por que não me mandou mensagem quando acordou? Ficou com raiva de algo?"
Respirei fundo. Não queria ser grosso, mas também não queria alimentar algo que eu não sabia onde ia dar.
Então, fui sincero:
"Não, não. Não me arrependo, Lucas. Mas sei lá... pra mim, foi só uma ficada de micareta, pra encerrar com chave de ouro. Acho que já passamos, e eu passei, por muita coisa. Então, preferi ficar mais na minha."
Dessa vez, ele demorou um pouco para responder.
Quando a mensagem chegou, era curta.
"Tudo bem!"
Pela primeira vez, me senti forte , me senti decidido, se fosse em outros tempos, eu estaria caidinho e correndo atrás do Lucas, mas dessa vez, não, e não foi por pirraça nem foi para me vingar, simplesmente aconteceu de forma natural. Eu finalmente havia me curado do Lucas, E talvez isso tenha ferido o ego dele, porque, de certa forma, ele sempre me teve na palma da mão, e eu não queria mais isso.
Durante o mês de dezembro, antes de ir para a fazenda, acabei encontrando Lucas na balada. A gente ficou, Mas foi só um beijo, nada além disso, da minha parte, era apenas um impulso, uma vontade de usar o Lucas, não havia raiva entre a gente, então, quando nos encontrávamos, simplesmente acontecia, depois, fui passar o Natal na fazenda.
Trocamos algumas mensagens, ele me desejou Feliz Natal, fez chamada de vídeo para ver Bruninho, e nosso papo acabou seguindo um tom mais leve. Algo próximo de uma amizade, talvez. O Ano Novo eu passaria em Pipa, com meus amigos da faculdade.
Lucas também ia.
Combinamos de nos encontrar por lá, só para nos vermos rapidamente e darmos um abraço. Eu ia para uma festa famosa, e ele ficaria pela praia com alguns amigos.
Nossos caminhos não se cruzariam o tempo todo. No final da tarde do dia 31, peguei meu carro e fui até o hotel onde Lucas estava.
Eu queria vê-lo antes da festa, ele entrou no carro e seguimos para o Chapadão de Pipa.
Ali, estacionados, ficamos conversando, ele contou como tinham sido seus dias por lá.
Eu falei das festas, das pessoas… E de repente, senti aquela coisa leve entre nós de novo.
Me teletransportei para anos atrás, para aqueles tempos em que passávamos horas no carro, conversando...
— Tava lembrando aqui... No começo, quando a gente passava horas conversando. Quem diria que ia dar no que deu, hein? — falei com um sorriso.
— Eu também lembrei disso esses dias. A gente sempre teve muito papo, né?
— Sim. E não tinha nenhuma intenção por trás... Era só o prazer de conversar. Pelo menos da minha parte!
— Da minha já nem tanto — ele admitiu, rindo de leve. — Meu coração bateu um pouquinho mais rápido desde que te conheci, mas eu não pensava em você o tempo todo. Foi algo que aconteceu aos poucos. Quando percebi, já estava completamente apaixonado. Sentia ciúmes de você e do Bernardo, e meio que entrei em negação. Minha sorte foi o Arthur, que me ajudou a entender esses sentimentos.
Fiquei em silêncio por um momento, e nossos olhares se encontraram. Então, nos beijamos. Um beijo apaixonado e calmo. Não sei explicar, mas minha intuição dizia que agora tudo seria diferente. Que talvez, dessa vez, nós estivéssemos na mesma sintonia.
Era isso que eu queria acreditar. O Lucas sempre foi especial, mas agora parecia que estávamos finalmente no mesmo ritmo, andando lado a lado. Ainda assim, eu não queria me precipitar. Resolvi deixar acontecer. E foi o que aconteceu.
Ficamos juntos até dar minha hora. Eu poderia ter largado a festa para ficar com ele, mas não queria deixar meus amigos de lado. Da mesma forma, também não queria que o Lucas fizesse isso pelos amigos dele. Então, o deixei no hotel onde ele estava hospedado. Antes de sair, nos despedimos com um beijo e um abraço apertado.
— Feliz Ano Novo, Rafa. Que 2020 seja incrível — ele disse, antes de entrar no carro e partir.
Não vou mentir, aquelas palavras e aquele beijo mexeram comigo. Mas era diferente. Não existia mais aquela obsessão.
A virada foi ótima. Bebi, beijei, curti. E quando já estava amanhecendo, recebi uma mensagem do Lucas:
"Onde você tá?"
Respondi:
"Tô saindo da festa."
"Quero te ver."
"Lucas, tô muito bêbado. Vamos nos ver amanhã, quando eu acordar. Não consigo pegar o carro agora e você tá longe!"
Ele insistiu:
"Poxa, Rafa, faz um esforço..."
Mas eu não fiz. Não respondi a mensagem. Fui para casa. Estava cansado. E, por mais que quisesse me jogar nos braços dele, o Lucas não era mais minha prioridade.
Quando acordei, peguei o celular e vi que não havia nenhuma mensagem do Lucas. Passei o dia com meus amigos e, no final da tarde, retornamos para a capital.
No dia 2, o Lucas me ligou:
— Oi, Rafa, bom dia! Tá por onde?
— Tô na casa do meu pai. E você?
— Vamos pra praia agora?
— Hmm... pode ser.
— Te busco em 20 minutos, ok?
— Certo!
Levantei, tomei um banho rápido, comi qualquer besteira e fiquei esperando a mensagem dele. Quando avisou que já estava lá embaixo, desci.
Ele tinha me falado qual era o carro, e lá estava ele: regata branca, óculos escuros, short preto e aquele sorriso que fazia qualquer um estremecer. Entrei no carro, dei bom dia e disse:
— Você tá muito bonito, hein?
— Especialmente pra você — ele respondeu, antes de me dar um selinho.
— Pra onde vamos?
— Pra um lugar tranquilo, quero conversar com você.
Ele dirigia enquanto conversávamos sobre o Ano Novo. Falamos sobre nossas festas, rimos de algumas histórias. Parecia uma conversa entre dois bons amigos.
Chegamos a uma praia mais afastada, quase deserta. Estranhei e perguntei:
— Me trouxe aqui pra quê?
Ele me olhou sério e disse:
— Pra dizer que te amo e que estou com saudades.
Senti um frio na barriga. Suspirei antes de responder:
— Lucas... você sabe que é complicado, não sabe?
— Você me ama?
Baixei o olhar e sorri de canto.
— Nunca deixei de amar. E acredito que nunca vou deixar.
— Eu também… — Ele fez uma pausa, respirou fundo e continuou: — Sabe, hoje eu vejo o quanto fui estúpido comigo mesmo por ter te largado. Mas, ao mesmo tempo, sei que fiz a coisa certa. Eu te amava — e ainda te amo — demais pra te ver sofrer. Então, por mais que me arrependa, sei que lá atrás fiz o que era certo.
Assenti, olhando para o mar.
— Sim, Lucas… Devo admitir que foi melhor assim. Óbvio que sofri, chorei, mas, como você disse, foi sincero. Você falou a verdade.
— Que bom que você entende… Mas vou ser sincero: desde a micareta, só penso em você. E fico imaginando… — Ele hesitou, como se estivesse buscando as palavras certas. — Rafa, eu queria que a gente voltasse a namorar.
Me virei para ele, surpreso.
— Lucas? Você acha que é assim tão fácil? Me trazer pra uma praia, fazer declarações e, pronto, voltamos?
— Você tem outra pessoa? — ele perguntou, direto.
Suspirei.
— Lucas, essa não é a questão. Mas a gente não pode simplesmente começar a namorar do nada. Isso tem grandes chances de dar errado.
— Você me ama?
— Lucas, já disse que sim. Sempre vou te amar.
Então, Lucas me puxou para um beijo. Um beijo intenso, forte. Estávamos deitados sobre uma canga na areia, com pouca movimentação ao redor. Ele não teve medo. Nem eu.
Eu estava ali, entregue, mas consciente. Talvez fosse mais uma das táticas do Lucas para me ganhar com beijos e pegadas — ele sempre fazia isso quando eu relutava no passado. Mas agora era diferente. Eu estava maduro o suficiente para não cair nesses jogos.
Quando nos afastamos, respirei fundo e disse:
— Lucas, melhor a gente ir com calma. Não sei se quero voltar a namorar. Tenho o carnaval chegando, vou entrar na reta final da faculdade… Não sei se quero um relacionamento agora.
Ele me olhou sério, franzindo a testa.
— Então o problema é o carnaval? Sério que você tá preocupado com isso?
Suspirei, me ajeitando sobre a canga.
— Lucas, você me trocou pra viver uma vida de solteiro. Você queria ficar com outras pessoas. Do mesmo jeito que você foi sincero comigo lá atrás, agora sou eu quem tá sendo sincero. E sim, quero ir pro carnaval solteiro.
Ele ficou em silêncio por alguns segundos, desviando o olhar para o mar. Seu rosto assumiu uma expressão triste.
— Tudo bem, Rafa…
Me aproximei e segurei sua mão.
— Lucas, eu te amo e sempre vou te amar. Mas a gente não pode simplesmente esquecer tudo e voltar como se nada tivesse acontecido. Vamos ficar, vamos ver no que dá. Sem pressa, sem pressão.
Ele me olhou por um instante e, sem dizer nada, me beijou novamente.
— Certo — murmurou contra meus lábios.
Passamos o resto do dia naquela praia. Comemos, conversamos, trocamos beijos. Falei pra ele dos meus planos para Salvador, de como tinha sido o carnaval passado. Tudo de forma leve. Ele me contou dos rolos que teve, do lance com o outro Lucas, e, pela primeira vez, não senti ciúmes.
Eu estava preparado. Estava forte. Não existia mais aquela obsessão, aquele sentimento de posse. Eu entendia que Lucas era livre. E que eu também era.
Durante o mês de janeiro, seguimos ficando. Eu não estava exclusivamente com o Lucas — tinha outros contatinhos —, mas nossa relação melhorou 100%. Fazíamos programas de casal, viajávamos, íamos para baladas. Eu ficava com outras pessoas, ele também, mas evitávamos fazer isso na frente um do outro.
O que eu sentia pelo Lucas estava renascendo, como um novo livro sendo escrito. A química entre nós era algo que eu achava impossível de ter com qualquer outra pessoa. Era único, somente nosso. Mas, devo admitir, a palavra "namoro" ainda pesava para mim. Talvez medo do passado, ou até mesmo medo de sofrer novamente.
Então, fevereiro chegou e mudou tudo.
Estava prestes a viajar para Salvador e resolvi cometer uma loucura: chamei o Lucas para ir comigo. No início, ele disse que não tinha condições de ir de última hora — afinal, era um carnaval caro —, mas eu garanti que daria um jeito. Falei que queria que ele fosse comigo, mas como amigo, sem ser como namorados, e que eu pagaria. Na verdade, pediria ao meu pai.
Ele não gostou da ideia no começo, mas no fim aceitou. Ele já tinha comprado camarotes para o carnaval de Recife, conseguiu revendê-los e comprou alguns abadás para Salvador. Meu pai usou algumas milhas para tirar a passagem. Além disso, um dos meus amigos do ano passado desistiu de ir por causa dos boatos de que a COVID-19 já estava no Brasil. Assim, o Lucas acabou ficando com a vaga dele.
O carnaval foi incrível. O combinado era irmos como amigos, mas, na prática, fomos como casal todos os dias. No primeiro dia, era o tradicional Blow Out. O abadá daquele ano tinha um tema de marinheiro, com tons de laranja. Claudia Leitte fez uma abertura surreal, voando sobre o público presa a um guindaste. Ver aquilo ao vivo foi indescritível.
Lucas estava feliz. Eu também.
Durante todos os dias, ficamos juntos. Ficamos com outras pessoas também, às vezes até dividíamos o mesmo menino, mas tudo de forma leve. Não existia ciúme, nem da minha parte, nem da dele.
No último dia de carnaval, estávamos na pipoca do Saulo. Ele começou a cantar uma música que dizia:
"A minha história de amor começou
Era carnaval, era Salvador
Amor à primeira vista, eu sei
Ao olhar você, me apaixonei…"
Foi então que, ali, no meio da multidão, Lucas me pediu em namoro:
— Namora comigo, Rafa?
Eu sorri.
— Namoro, sim.
— Sério?
— Sim. Te amo!
— Também te amo!
Enquanto Saulo cantava, nos beijamos. E ali, novamente, começávamos uma nova história. Um novo livro. Novas descobertas, novas brigas. Mas, dessa vez, sem as amarras do passado. Dessa vez, sendo completamente sinceros um com o outro.
Eu estava preparado.
Lucas também.
E, sim, eu tinha certeza de que estávamos na mesma sintonia. Tínhamos tudo para, finalmente, dar certo.
E foi assim que terminei meu carnaval: namorando o grande amor da minha vida.
Muito bom! Quero saber o desenrolar