As feiras já haviam terminado e lá estava eu trabalhando pro cara que traçou minha mãe debaixo do meu nariz. Estávamos buscando uma solução para o último caso dele. Como se ganha um caso em que o acusado é um “colarinho branco”, hein?
Dr. P., de hora em hora ele entrava e saía de sua sala pegava livros e mais livros das estantes e retornava para sua sala. Aquele caso realmente era de fritar o cérebro.
– Alice! – chamou ele a secretária – se alguém ligar anote o recado, eu não quero ser interrompido – dizendo isso ele se dirigiu para o banheiro. “Quem leu o último conto deve imaginar como me senti”.
Tentei parar de pensar naquilo. Olhei para o chão e vi um papel dobrado.
Devo esclarecer. No mesmo local funciona também um escritório de contabilidade, dividido apenas por uma parede de PVC. Logo do meu lado, do outro lado da parede, trabalhava o CDF Eduardo. Ficamos grandes amigos e assim trocávamos mensagens e nos inteirávamos dos assuntos do escritório do outro. Abri o papel que ele havia passado por debaixo do PVC. Era a convocação para um porre no final do expediente. Dei minha resposta afirmativa e passei o papel de volta. Voltei-me para a minha mesa e me deparei com duas belas pernas cruzadas sobre a minha mesa num vestido vermelho justo e as coxas à mostra. O cabelo dourado e ondulado cobria-lhe um dos braços. Um belo par de seios em um decote absurdamente sensual. Mas, para minha decepção, era Paula, filha do Dr. P. me encarando com cara de poucos amigos. Fechei a cara também e voltei-me par o computador.
– Por que está passando recadinhos, enquanto devia estar trabalhando?! – falou ela para que todos da sala escutassem. Enfezei-me com aquilo, mas fiquei calado. Afinal era filha do chefe.
– E vocês estão olhando o quê? Perderam alguma coisa? Voltem ao trabalho!
– Pirralha! – disse eu entre os dentes. Pro meu azar ela escutou.
– Do que foi que você me chamou?
Perdi a paciência e pirei.
– Te chamei de Pirralha, sua egocêntrica, mimada! – gritei.
Todos fizeram uma cara de: “ÓÓÓÓÓ”.
– Volte a trabalhar, agora! – disse ela com tom de voz amedrontado.
– Não – disse eu cruzando os braços – O que vai fazer, me entregar pro papai?
Todos do escritório prenderam a respiração aguardando o que viria a seguir.
– Não tem medo de perder o emprego não, é? – continuou ela.
– Nem um pouco. Eu até teria mais liberdade para lhe dar umas boas bofetadas, sua vadia.
Maldita língua. Foi soltar isso no instante que o Dr. P. saía do banheiro.
Para piorar minha situação a cínica cobriu o rosto e saiu chorando da sala.
Fiquei pálido como papel quando o Dr. P. se aproximou.
– Ela precisava ouvir isso – disse ele sorrindo e batendo no meu ombro. Voltou para sua sala e dali não saiu. Me senti como se me mandassem sair da forca no último instante.
Na hora do almoço Eduardo e eu saímos para um restaurante do outro lado da rua, em frente ao prédio. Ele me contava o que rolava do outro lado da parede.
– Estão correndo boatos que a Sueli está gamada em você – disse ele.
– Você está louco! Espero que isso fique só como boato.
Sueli era uma garota zoada pelo pessoal tanto da contabilidade quanto da advocacia. Não que ela fosse feia fisicamente… talvez um pouco, digo, bastante magra e mal vestida. Só a víamos de cabelo preso, além de andar escondida atrás daqueles óculos fundo de garrafa. Do tipo de garota que podemos chamar de classe C.
– Mas admita, ela não tem defeitos físicos, como: ser zarolha, mancar de uma perna, ter um seio maior que o outro, os dentes encavalados e saindo pra fora da boca.
– Mas você sabe bem que eu não curto garota zen.
– Sei. Zen peito, zen bunda,… – ele riu, conhecia a piada – mas, mudando de assunto… o que aconteceu hoje no escritório? Ouvi uma discussão.
– Ah, era a Paula. Ela me deu nos nervos hoje e falei umas poucas e boas a ela até chamá-la de vadia no exato momento que o pai apareceu. E ainda a piranha saiu derramando lágrimas de crocodilo. Fiquei com o cu na mão. Pensei até que perderia meu emprego naquela hora, mas pra minha surpresa o Dr. P. me deu os parabéns – fiz uma pausa e dei mais um gole no refri – mesmo sabendo que ela merecia ouvi aquilo eu me sinto mal.
– Cara, não me diga que está pensando em pedi desculpas. Ela gosta mais é de humilhar as pessoas e já estava na hora de alguém humilhá-la.
– Mesmo assim. Vou falar com ela depois.
Depois do expediente pedi que Eduardo e o pessoal fossem direto para o bar que depois eu apareceria. Dr. P. permaneceu cerrado em sua sala com uma pilha de livros em sua mesa.
– Dr. P. eu já estou indo.
– Ah, tudo bem, rapaz, pode ir. E… se não se incomodar… pode levar a Paula pra casa. Eu vou ficar aqui até tarde.
– Eh, é que eu prometi ao pessoal que iria ao bar com eles.
– Pode levá-la junto então, mas vê se não bebe. Quero minha filha inteira em casa.
– Ok.
Cheguei ao estacionamento, onde esperava encontrar Paula, mas eu não a vi. Desativei o alarme da caminhonete e entrei. Foi quando a via saindo de dentro do carro do Dr. P., um Ford Fusion preto de vidros escuros Ela olhou em minha direção sem ódio nenhum. Desci imediatamente do carro e caminhei em sua direção.
– Me desculpe – dissemos juntos.
– Me desculpe – repeti – fui grosseiro com você.
– Quem deve pedi desculpas sou eu, Fabio. Não só a você, mas a um monte de gente.
–…
– Você tinha toda a razão em dizer aquelas coisas de mim.
– Não, eu…
– Sim, eu sou mesmo uma pirralha, egocêntrica e mimada.
– Faltou dizer chata, autoritária e hipócrita.
– É verdade – de seus olhos escorriam agora lagrimas de verdade – eu não tenho amigos, Fabio. Por favor, me perdoa. Eu não sei o que meu pai disse pra você, mas eu vou falar com ele e dizer que você estava certo.
– Não, está tudo bem. Ele já esqueceu isso – abracei-a e ela se derramou em lágrimas me pedindo desculpas.
Do outro lado da rua pude ver Sueli no ponto de ônibus nos observando. Se fossem verdadeiros os boatos eu tinha que dissuadi-la daquela ideia naquele momento. Beijei Paula no rosto e voltei a abraçá-la. Sueli, sem demonstrar inveja ou ódio, olhou para o lado, aonde vinha seu ônibus.
– Estou indo encontrar o pessoal no bar. Seu pai disse que eu podia levá-la. Aliás, é uma excelente oportunidade de você pedir desculpas a todos.
– Tudo bem, então.
Entramos no meu carro (do meu pai – ele tem dois e eu nenhum).
– Você quer ser meu amigo?
Juro que pensei bem antes de responder.
– Tudo bem, Paula. Eu aceito ser seu amigo, desde que você realmente mude.
– Obrigada, Fabio – disse ela dando-me um beijo no rosto – assim eu começo a criar um círculo de amizades. Pequenininho, mas é um.
Nós rimos daquilo e de tudo que se passara naquele dia.
Chegamos ao bar e estavam todos à roda de várias mesas juntadas. Olharam como se quem tivesse entrado no bar fosse Hitler.
– Gente! – pus-me à frente de Paula – antes de começarem a atirar pedras, quero, peço, escutem o que ela tem pra dizer.
– Eu… queria pedi desculpa a vocês, a todos vocês, pela forma como eu tenho agido. Reconheço que não foi legal da minha parte tratá-los daquela forma e… eu queria uma segunda chance – confessou ela torcendo as mãos de nervosismo.
Todos se calaram e se entreolharam. Até que um deles se pôs de pé. Era Fernando, o que iria bancar a pizza daquela semana.
– Os que votarem a favor da Paula levante a mão – um a um foram erguendo o braço – Pois bem, ela estará perdoada… e poderá juntar-se a nós… se comprometer-se a pagar a conta hoje.
Cinco pizzas gigantes, mas os refrigerantes iriam dar R$’s, mas ela sorriu e voltou-se para mim satisfeita.
Sentamos à mesa e nos divertimos.
As horas passavam voando e quando percebi já eram quase sete horas da noite. Nos despedimos e entrei com Paula no carro. Morávamos no mesmo condomínio, mas não éramos exatamente vizinhos. Ficamos na clausura até que o porteiro nos identificasse. Estranhou até; Paula sendo gentil com ele?! Poderia ser algum sinal de assaltante no carro nos fazendo de reféns para entrar no condômino.
– Fica tranqüilo, Jorge – disse eu de dentro do carro – aquela velha Paula não volta mais pra casa.
Ele sorriu e abriu o portão.
Paramos em frente à casa dela, mas Paula não desceu imediatamente.
– Obrigada, Fabio – disse ela com uma voz doce, a qual nunca tinha ouvido dela. Segurando em minha mão e olhando em meus olhos ela continuou – Você veio pedir desculpas a mim, mesmo sabendo que eu é quem estava errada.
– Nunca falei com outra pessoa daquela forma. Eu exagerei. Senti-me mal depois.
– As outras pessoas não pensariam assim, mas não você.
Vi ternura naqueles olhos azuis e arrependimento em suas lágrimas.
–…
– Você… você me mudou, Fabio.
Enxuguei-lhe as lágrimas que escorriam pelo seu rosto e a beijei superficialmente nos lábios trêmulos de Paula.
Até que o Dr. P. buzinou atrás de nós. Nos olhamos novamente e ela baixou os olhos.
– Acho melhor isso ficar só na amizade, Fabio.
– De acordo.
Ela ainda me beijou no rosto e desceu para abraçar o pai.
Nos despedimos e tomei o rumo de casa.
Vou parando por aqui. Se fosse contar até a hora em que eu vou pra cama com alguém daria o dobro do que já escrevi até aqui.
Nesse dia não houve transa nem nada, mas foi um fato importante para o que viria a seguir. Se decepcionei alguém com isso me desculpe, mas se gostaram, comentem e lêem o próximo capítulo.
Muitas emoções estão por vir.
Continua…
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continue o ritmo!!
ótimo .de vez em quando e bom a gente ler um romance .gostei e votei.
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