A Mentira - Parte I - O acidente

A mentira – Parte I – O acidente
A ligação dos meus pais me pegou de surpresa no trabalho. A voz do meu pai estava notoriamente alterada, coisa difícil de acontecer com seu jeito equilibrado de ser, o que me deixou ainda mais preocupado.
- Acabamos de receber uma ligação da polícia dando conta de que o bimotor no qual o Bernardo estava seguindo com uns amigos para o Rio Grande do Sul acabou caindo num trecho de mata fechada a alguns quilômetros de Guaraqueçaba. O piloto e dois ocupantes do bimotor morreram no local da queda, há dois sobreviventes, mas sem uma identificação precisa. Estou seguindo para aí, mas eu queria que você se antecipasse e fosse até o local que a polícia me indicou onde alguém espera para nos levar até o local do acidente. – relatou meu pai, tão apressadamente que eu mal conseguia acompanha-lo.
- Como assim? Como acharam o telefone aí de casa? Quem foi que morreu? – eu nem sabia bem que perguntas fazer.
- Acharam uma mochila próxima aos restos do avião, provavelmente do Bernardo, pois encontraram nosso número na agenda do celular dele.
- Então ele está vivo! – concluí, nem sei segundo qual lógica.
- Não sei, o policial que ligou disse que dois homens muito feridos e inconscientes estavam fora do bimotor que acabou pegando fogo com três ocupantes dentro da cabine. Nos encontramos em Guaraqueçaba, estou saindo daqui agora mesmo. – emendou, desligando em seguida.
Por uns instantes fiquei segurando o celular feito uma estátua, tentando assimilar tudo que meu pai dissera.
- Tudo bem com você? Você está tão pálido! – disse uma colega do escritório.
- Acho que meu irmão ... – não consegui pronunciar o restante da frase, temendo que com isso estivesse decretando a conclusão da tragédia.
Meu chefe se prontificou a me acompanhar assim que relatei o pouco que sabia ao pedir para ser dispensado. Havia dois anos que eu trabalhava na empresa em Curitiba após ter concluído a faculdade e, seis desde que saí de casa em São Paulo para cursar engenharia na Universidade Federal do Paraná. Meu irmão Bernardo é um desses aventureiros que adora esportes radicais. É um atleta com um corpo sarado, muitos músculos, e pouco juízo segundo meus padrões. Mas, isso nunca nos impediu de sermos muito ligados. Conheci superficialmente alguns de seus amigos de aventura, mais pelas postagens de suas façanhas no Facebook do que propriamente pessoalmente e, sei que são tão ou mais malucos do que ele. Alguns de tirar o folego e o sossego de qualquer um que, como eu, era chegado num macho destemido e musculoso. Mesmo assim, sabia pouco a respeito deles. Quando muito, o primeiro nome e algumas características ou fatos pelos quais meu irmão me fazia saber de quem se tratava ao me relatar algum evento que os envolvesse.
Eu permaneci quase todo o trajeto calado, remoendo as últimas informações, lembrando-me de fatos da nossa infância e tentando disfarçar as lágrimas que teimavam rolar dos meus olhos. Se eu perdesse o Bernardo estaria perdendo parte da minha própria identidade e, naquele instante, eu não concebia e não aceitava essa hipótese.
- Não fique assim! Você vai ver que seu irmão é um dos sobreviventes e logo vocês vão poder estar juntos novamente. – disse meu chefe, tentando me reconfortar e, aproveitando a chance para se fazer mais presente, uma vez que há tempos eu notava seu interesse por mim ou, pelo menos, pelo meu corpo, para o qual não poupava elogios assim que surgia uma oportunidade.
Eu assenti, mas as palavras não conseguiram atravessar aquele nó que estava na minha garganta. O casario antigo da pequena Guaraqueçaba incrustada entre morros da serra do mar surgiu a nossa frente assim que uma neblina baixa se desvaneceu ao chegarmos à entrada da cidade. Pairava uma calma de cidade de interior, uma vez que estávamos fora da temporada de verão, ao contrário do que acontecia dentro do meu peito, onde um turbilhão de sensações mal me permitia respirar. Dirigimo-nos até o local indicado pelo meu pai. Um delegado e alguns policiais nos aguardavam e me perguntaram por quem eu procurava.
- A cena do local do acidente é bastante chocante, esteja preparado! – disse um policial que acabava de retornar ao posto da polícia para buscar por mais equipamentos e homens para fazer o resgate.
Minhas pernas tremiam quando entrei numa viatura 4x4 da polícia ambiental. Sem me dar conta do que estava fazendo, segurei a mão do meu chefe, que ficou visivelmente satisfeito com a minha atitude. Depois de caminhar por mais de dois quilômetros numa picada na mata, chegamos a um clarão que cheirava a querosene queimado e algo mais, que de início identifiquei como sendo de carne queimada. Nem consegui engolir a minha própria saliva sem sentir engulhos. Árvores chamuscadas pelo fogo e pequenos arbustos arrancados da terra formavam uma trilha de destruição atrás do que restou da fuselagem queimada e sem as asas que haviam se partido em pedaços espalhados ao redor. Os bombeiros estavam terminando de ajeitar dois corpos sobre macas para que o helicóptero que pairava sobre o arvoredo pudesse içá-los e transportá-los até um hospital em Curitiba. A cabeça imobilizada que emergia da manta aluminizada que envolvia o primeiro sobrevivente não era a do Bernardo, e o rosto imóvel, másculo e sereno que aparecia na pequena abertura me levou às lágrimas. Eu o reconheci de umas postagens do Bernardo, era o Roberto, um colega dele que eu cheguei a encontrar pessoalmente umas duas vezes, por uns breves momentos, antes de me mudar para Curitiba. Um bombeiro me conduziu pelo braço até o segundo sobrevivente, igualmente embalado e pronto para ser içado. Era o Bernardo. Soltei um grito agoniado e de alívio quando vi seu rosto. Toquei-o tão sutilmente como se estivesse com receio de lhe causar mais danos.
- É meu irmão, Bernardo! Como ele está? Ele vai sobreviver? Para onde vão leva-lo? Posso ficar ao lado dele? – eu era só perguntas, quando agarrei o braço do bombeiro e o puxei pela manga da farda.
- Lamentavelmente não há como acomodá-lo no helicóptero. Nossa prioridade são os feridos. – disse o bombeiro, tentando me acalmar com um sorriso gentil e carinhoso.
- Eu vou leva-lo até o hospital, não se preocupe, em pouco tempo estaremos lá. – disse meu chefe, mas o delegado me avisou que eu precisava antes comparecer à delegacia para fornecer algumas informações, antes de ser liberado.
A tarde caía sobre a serra do mar junto com um nevoeiro denso e frio. Eu não sabia se meus arrepios estavam vinculados a ele ou ao temor das informações que me dariam no hospital. A mão do meu chefe deslizava pela minha coxa enquanto ele dirigia e falava alguma coisa para a qual eu não conseguia atentar, pois meus pensamentos vagavam longe dali.
No hospital fiquei sabendo que tanto meu irmão quanto seu amigo estavam sendo operados. Meu irmão tinha fraturas em ambas as pernas, três costelas fraturadas e um extenso ferimento no ombro esquerdo. Já o estado do amigo dele, o Roberto, era bem mais delicado. Um trauma crânio-encefálico, cuja extensão ainda estava sendo avaliada através de estudos de imagiologia, uma ruptura de baço e, fraturas múltiplas pelos membros inferiores haviam-no deixado no limiar entre a vida e morte.
Meus pais chegaram no início da noite à Curitiba, depois de também terem prestado informações à polícia e ao CENIPA, juntamente com a empresa de taxi aéreo à qual o bimotor pertencia, em Guaraqueçaba. Eu não tinha quase nada a informar a eles e, esperamos até de madrugada pelas notícias da equipe médica que cuidou do meu irmão e do amigo. Apesar de crítico, o estado do meu irmão era bem melhor do que o do amigo e, segundo os médicos, dentro de três ou quatro dias ele estaria pronto para ser transferido para um hospital em São Paulo.
- Vocês têm algum contato da família do outro rapaz? – perguntou uma assistente social que veio acompanhando os médicos.
Diante de nossa negativa ela apenas se limitou a anotar o primeiro nome do Roberto, pois era tudo o que sabíamos sobre ele. Meu pai mencionou que o Bernardo havia dito que os pais de um dos colegas que fariam o rapel no Itaimbezinho estavam numa viagem ao exterior, mas ele não sabia precisar de qual deles. A polícia também não tinha mais informações, uma vez que todas as bagagens, à exceção da mochila do Bernardo haviam queimado no incêndio do bimotor. Portanto, estávamos na dependência do Bernardo recuperar a consciência para que esses pontos pudessem ser esclarecidos. Segundo os médicos, isso talvez só fosse acontecer dentro de alguns dias, uma vez que ambos ficariam na UTI até que seu quadro clínico se estabilizasse.
Enquanto meu irmão permaneceu na UTI eu tive acesso ao Roberto e à evolução de seu estado de saúde, mas quando meus pais o transferiram para um hospital em São Paulo, onde poderiam ficar mais próximos dele, deixei de ter acesso ao Roberto, sob a alegação de que não era um parente oficialmente apto a responder pelo paciente.
- Isso é ridículo! Eu estou aqui acompanhando tudo desde o dia em que ele chegou ao hospital. Ele não pode ficar sozinho aqui. – protestei inconformado.
- O senhor não têm vínculo de parentesco com o paciente, portanto, não pode frequentar a unidade de terapia nem acompanhar o paciente. – alegou uma funcionária da recepção que me barrou no dia seguinte a transferência do meu irmão.
- Como não? Eu sou ..., eu sou o parceiro dele! Será que preciso conseguir uma liminar de um juiz para ter acesso ao meu cônjuge? – questionei, sem pensar na mentira que estava inventando.
- Há poucos dias o senhor nem sabia o nome do paciente que alega ser seu cônjuge, como pode afirmar tão repentinamente que são casados? – questionou a moça, numa petulância que procurava me intimidar.
- Como não sabia o nome dele? É claro que eu sei como ele se chama, o nome dele é Roberto Cavagnelli! – exclamei de pronto, pois meu irmão nos havia dado o nome completo do amigo, assim que recobrou a consciência. A moça engoliu em seco. Mas, não quis se dar por vencida, precisei voltar a ameaçar com uma liminar para que ela me liberasse as visitas, muito a contragosto.
Tudo foi feito para que eu enfrentasse mil obstáculos para visitar o Roberto na UTI. Os horários de visita eram rígidos e coincidiam com o meu expediente na empresa. Tentei argumentar que não podia deixar o trabalho em pleno expediente para estar presente no horário estipulado. O hospital público não cedeu nessa questão. Tive que recorrer ao meu chefe para conseguir sair durante o expediente e voltar depois do horário de visitas. Nas primeiras duas semanas ele foi compreensivo, mas notando que eu estava cada vez mais envolvido com os cuidados do Roberto ele foi se mostrando mais intransigente. Cheguei mesmo a perceber que ele queria uma compensação pelo favor que estava me fazendo. E, ciente de qual natureza seria essa compensação, intercalei as visitas e passei a fazê-las nos finais de semana. O Roberto ficou inconsciente por quatro semanas e, quando o via lutando pela vida com todos aqueles tubos e cânulas atados ao seu corpo eu temia por um desfecho trágico.
Todo o tempo que me era permitido estar ao lado dele eu dedicava a segurar em sua mão, ajeitar um lençol aqui, enxugar algumas gotas de suor que apareciam acolá enquanto estava com febre, umedecer seus lábios ressecados com compressas de gaze umedecida, enfim, cuidar daquele rosto plácido que me cativava cada dia mais. Não era apenas eu quem me empolgava com os cuidados daquele paciente deliciosa e afrontadoramente másculo. As enfermeiras não se furtavam à oportunidade de dar uma espiadela debaixo do lençol que cobria o enorme sexo que ele carregava entre as coxas musculosas, e sonhar com o impossível. Um enfermeiro também gay se empolgava cada vez que tinha que lidar com aquele paciente gostosão, fazendo as trocas da sonda uretral, o que lhe permitia segurar, mesmo que profissional e brevemente, aquele caralhão intimidador. Ele me encarava com um quê de inveja e ciúme, depois que descobriu que eu era o parceiro dele, numa mentira que crescia à medida que a recuperação do Roberto se estendia. Havia momentos que eu me perguntava do porquê de ter inventado essa estória que, a qualquer momento, podia ser facilmente desmentida assim que o Roberto voltasse a si. Eu já havia estendido a mentira à polícia que voltou ao hospital mais algumas vezes para poder concluir as investigações do acidente, à direção do hospital para justificar minha presença ao lado do leito dele, à equipe médica numa infindável invenção de fatos para tornar plausível todo aquele imbróglio. A cada justificativa a mentira se avolumava com novos detalhes tomando uma dimensão que me obrigava a ser muito cuidadoso para não me contradizer e por tudo a perder.
Num domingo, no horário de visitas, quando estava se iniciando a quinta semana do Roberto na UTI e inconsciente, eu repentinamente senti que ele apertou a minha mão enquanto eu segurava a dele. Inicialmente, pensei que fosse apenas um espasmo, como outros que ele tivera durante aqueles dias, mas o aperto se intensificou quando eu cobri sua mão com as minhas.
- Roberto! – exclamei quase em prantos. Ele lutou contra a claridade e abriu lentamente os olhos. Eu comecei a chorar.
- Doutor! Doutor! Ele acordou! – eu estava quase gritando na UTI interrompendo os bipes dos equipamentos que mantinham os pacientes ali internados presos a um fio de suas vidas.
- Andrezinho? É você, Andrezinho? – balbuciou o Roberto, me surpreendendo pela lembrança.
- Sou eu, sim! Que bom que você acordou Roberto! Eu estou tão feliz! – sussurrei entre lágrimas.
Tanto o médico quanto as enfermeiras que acudiram ao meu chamado se convenceram de que realmente eu e o Roberto tínhamos um vínculo, depois do que presenciaram. Eu já me preparava para ser desmascarado assim que o interrogassem. Mas, apesar de se lembrar do meu nome e, talvez, até de mim, suas respostas ao questionamento do médico foram confusas. Ele não se lembrava do acidente. Na verdade, não se lembrava de ter estado num avião e de ter sofrido uma queda, nem de qual motivo estava naquele voo e, muito menos, para onde e com quem estava viajando.
- Não se aflija nesse momento, é comum estar um pouco confuso e com as lembranças embaralhadas depois do que você passou, isso é resultado da concussão cerebral que sofreu. Com os dias e conversando com seu esposo em breve você vai se lembrar de tudo. – disse o médico, me fazendo regelar quando vi a contração no rosto do Roberto.
- Meu esposo? – ouvi-o sussurrar, antes de esboçar um tímido sorriso na minha direção.
Alguns dias depois, o Roberto foi transferido para um quarto, já não dependia dos cuidados da UTI. O delegado mal havia entrado no quarto para ouvir o depoimento dele quando eu abri a porta e quase me atirei sobre o Roberto, beijando-o na testa. Por alguma razão ele não reagiu.
- Que bom que você está aqui! – disse ele numa voz titubeante. – Talvez você consiga me ajudar a dar as informações que o delegado está querendo. – emendou.
- Eu já disse a ele tudo o que sabia. – apressei-me a afirmar. Contudo, o Roberto não soltou da minha mão, como se esse apoio fosse facilitar o entendimento de toda aquela questão. A mentira só crescia, e eu não encontrava o momento certo para dizer toda a verdade e qual o motivo me levou a cria-la.
- Por alguma razão o acidente me fez perder parte da memória, também não consigo me livrar dessa terrível dor de cabeça, por isso, não sei se serei de grande valia para o senhor nesse momento. – disse o Roberto ao delegado.
- Qualquer fato já será de grande ajuda. Até o momento não conseguimos identificar os outros dois corpos. Só o piloto foi identificado através da empresa de taxi aéreo, mas uma falha nos registros da empresa e do voo fez com que não conseguíssemos apurar quem eram os ocupantes do voo. Apenas o senhor e o irmão de seu esposo puderam ser identificados através do depoimento dele. Estamos fazendo contato com a polícia de São Paulo para ouvir o irmão do seu esposo. – disse o delegado.
A cada vez que ele pronunciava a palavra esposo eu me contraía todo. A verdade viria à tona sem dúvida alguma a qualquer instante. Mas, por incrível que parecesse, o Roberto parecia não se abalar com essa informação repentina.
Conseguimos apurar os nomes dos outros dois colegas do meu irmão e, que eram os pais do Roberto que estavam em viagem ao exterior, porém sem um destino conhecido. Também fiquei sabendo que o Roberto já não morava mais com os pais e, que meu irmão não tinha nenhum contato do Roberto que não o seu celular e, muito menos dos seus pais. Meu irmão também tinha a informação de que o Roberto era dono de uma oficina mecânica, mas não sabia onde ela se localizava. Apesar de colegas nas aventuras, pouco sabiam uns dos outros, juntando-se naquelas maluquices sempre através de uma agência que promovia essas viagens.
Quando o Roberto teve alta, cerca de duas semanas mais tarde, ainda carecia de cuidados e eu resolvi leva-lo para o meu apartamento, pois não tínhamos para onde enviá-lo e, sozinho ele não podia ficar. Àquela altura do campeonato eu havia me afeiçoado a ele muito mais do que imaginava. Na verdade, estava encantado com aquele homem tão viril e tão carente. Embora ele tivesse perdido mais do que quinze quilos durante aqueles quase dois meses de internação e, estivesse bastante fraco devido a perda de tônus de seus músculos, ele ainda despertava arrepios de tesão quando aquele corpo ficava exposto durante os cuidados dos quais ainda precisava para sua recuperação. Eu tentava disfarçar o olhar que não queria deixar de apreciar o sacão bem formado e globoso onde dois enormes bagos deslizavam sob a pele, e o caralhão grosso e cabeçudo que mais parecia uma tora de carne, para que ele não notasse meu ávido interesse por seus genitais. Eu me recriminava por ter pensamentos tão pouco pudicos diante da fragilidade na qual ele se encontrava e, me considerava um pervertido por deseja-lo com tanta ardência.
- Como foi que viramos esposos um do outro? – perguntou-me ele quando chegamos ao meu apartamento e eu o acomodei na minha cama, a única do pequeno apartamento no qual eu vivia. Fiquei petrificado por uns instantes, havia chegado a hora de revelar tudo. Mas, ao encará-lo, faltou coragem.
Se eu dissesse que nunca tivemos nada, ele certamente tentaria se levantar e sairia dali direto para sua casa que, a bem da verdade, ele não se recordava se existia. Quem cuidaria dele? Como eu ficaria sem saber se ele estava se recuperando bem, ou se estava sem nenhum tipo de apoio? Como deixar de ver aquele sorriso em seu rosto pelo qual eu já estava completamente apaixonado?
- Foi há poucos meses, deve estar coincidindo com o período que se apagou de suas lembranças. – respondi, mais uma mentira. Meu peito estava me sufocando, não consegui encará-lo.
- Lamento! Eu jamais deveria fazer você passar por isso, não me recordando de um fato tão marcante na vida de qualquer casal, você têm se mostrado o melhor esposo desse mundo, cuidando de mim com tanto desvelo. – disse ele, com certa tristeza no olhar. Eu me senti o pior dos seres levando essa mentira tão longe.
- Não estou fazendo nada demais! Gosto de cuidar de você! – isso não era mentira. Eu estava mesmo adorando cuidar dele.
Ele me encarou e lá estava aquele sorriso novamente. Eu me derreti todo. Ele fixou o olhar no meu corpo, eu me senti nu diante daquele olhar penetrante e lascivo. Não sei o que se passava em sua mente naquele momento, mas dava para perceber que ele, de alguma forma, estava satisfeito com aquilo tudo. Subitamente, um calafrio percorreu minha espinha, no mesmo instante em que me dei conta de que aquela cama, na qual ele estava tão sedutoramente reclinado com aquele peito largo e peludinho totalmente exposto, era a única disponível e, que teríamos que dividi-la naquela noite.
Os dias que começaram com aquele relacionamento tímido e pouco confortável logo se transformaram nos melhores que eu já havia vivido. Apesar da lacuna de memória, o Roberto mencionou que se recordava muito bem de mim, pois o Bernardo falava bastante do irmão caçula, introvertido e estudioso. Ele também mencionou as três vezes em que estivemos juntos pessoalmente e foi capaz de se recordar de cada detalhe desses encontros, o que me surpreendeu, pois eu mesmo não tinha memorizado tantos pormenores. Questionei-me quanto ao fato de ele se lembrar tão bem desses encontros, uma vez que eu sempre havia julgado que nenhum dos amigos do meu irmão fosse achar a menor graça no meu jeito tímido e reservado.
O primeiro mês passou tão rápido que mal percebi o tempo passar. O Roberto tinha muita dificuldade de se locomover devido aos pinos e placas metálicas que foram colocadas em suas pernas para reduzir as fraturas, fazendo-o só com a ajuda de um andador ou se apoiando em mim. Eu sentia calafrios cada vez que ficávamos tão próximos, mas não conseguia evitar de sentir um tesão danado. Esse mesmo tesão me atormentava todas as noites quando me deitava a seu lado na cama. Também ficava encabulado quando, pela manhã, ao acordar, percebia que tinha me esparramado tanto na cama, por sempre ter dormido sozinho, que o empurrava para uma das beiradas mal dando espaço para ele se mover. Isso, quando não acordava enrodilhado no corpo dele sentindo sua rigidez roçando minhas nádegas encaixadas em sua virilha. O estranho é que ele parecia não se importar com isso ou, talvez fosse educado demais para se queixar de alguém que o estava amparando com tanta solidariedade naquele momento difícil.
- Me desculpe por encurralá-lo, você deveria me dar umas cotoveladas para me afastar e te deixar dormir mais confortavelmente. – dizia eu, ao acordar e ter que inventar uma desculpa para me desvencilhar daquele corpo deliciosamente atraente.
- Não sei por que você se sente tão incomodado por dormir nos meus braços, afinal é o que um casal faz normalmente, não é?
- “É, se fossemos um casal de verdade, mas nunca fomos.” – pensei comigo. – É, acho que é, mas eu posso te machucar, suas fraturas ainda são muito recentes. – respondi.
- Não sou tão frágil assim! – devolveu ele.
- De qualquer forma, é bom tomarmos cuidado! – retruquei. Ele me deu aquele sorriso capaz de acelerar meus batimentos cardíacos.
Eu já havia desistido de me convencer de não estar completamente apaixonado por ele. Só não queria admitir por que sabia que ele iria embora tão logo estivesse apto a cuidar de si próprio e, de sua memória voltar e ele se lembrar que jamais esteve envolvido emocionalmente comigo. Talvez ele fosse me desprezar por eu ter sustentado essa mentira, enganando-o quando esteve vulnerável. Que espécie de criatura é capaz de tanta vilania? Eu tremia só de pensar do que ele seria capaz de fazer comigo quando sua memória voltasse.
Eu levava o Roberto todos os dias para a fisioterapia e ele aos poucos foi readquirindo as forças. A atrofia muscular já não era mais tão visível, ele já caminhava sem ajuda. Dos quinze quilos que havia perdido durante a internação, boa parte também estava sendo recuperada, e ele se mostrava cada dia mais autoconfiante e autossuficiente. Por um lado, eu me sentia feliz por ele estar se recuperando; por outro, sabia que o dia de nos separarmos estava cada vez mais próximo e, às vezes, não conseguia esconder uma lágrima repentina que teimava em desmascarar os sentimentos que afligiam meu peito.
- Por que está triste? – perguntava ele, vindo me abraçar e achando que a carga que ele estava me impondo estava sendo demais para mim.
- Não estou triste! É que me lembro de como você estava há pouco tempo naquela UTI e como está bem agora, e fico emocionado. – respondia, escondendo o real motivo daquela tristeza. “Eu não quero ficar sem você!” “ Te amo tanto que já não sei mais viver sem você.” “Será que um dia você será capaz de me perdoar pelo que estou fazendo?”
- Bobinho! Vem cá, vem! Eu estou e sempre estarei ao seu lado. Não vai ser uma simples quedinha de avião que vai me manter longe de você. – retrucou ele. “Como eu queria que isso fosse verdade, você não vai pensar assim quando souber de tudo.”
Ele logo me puxou para junto de si, e meus pensamentos voaram para longe. Eu apenas sentia suas mãos agarrando minhas nádegas e se apossando delas, enquanto trocávamos beijos tórridos. Poucos minutos depois eu estava com a pica dele na boca, saboreando seus fluídos másculos e, ainda mais tarde, sentindo sua língua se mover na entrada do meu cuzinho que se projetava para fora a mando dele, tão assanhado e despudorado como eu nunca pensei que pudesse ser. Ao sentir sua jeba deslizando para dentro de mim, mal consegui conter a euforia e a dor daquela sensação única e maravilhosa. O Roberto estava dentro de mim, como se fizesse parte do meu próprio corpo. Ele era tão meu como eu sempre havia imaginado. Nenhuma dúvida mais restava, eu o amava com todas as minhas forças e, foi com elas que o acalentei em minhas entranhas. Se, ao descobrir a verdade, ele me abandonaria, pelo menos eu teria essa lembrança dele pulsando dentro de mim e me molhando com seu esperma e, ele se lembraria de ter sido tão querido que jamais se esqueceria dessa transa.

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Comentários


foto perfil usuario lordricharlen

lordricharlen Comentou em 07/08/2019

Tô gostando dá história, mais tem um porém a família do André não questionou ele em relação ao fato em si. Como Roberto não estranhou que ele gostava de homem é que era gay.




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Ficha do conto

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Nome do conto:
A Mentira - Parte I - O acidente

Codigo do conto:
141819

Categoria:
Gays

Data da Publicação:
24/07/2019

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