De repente, pai - Parte I

De repente, pai
Sempre me orgulhei de ter as rédeas da minha vida em minhas mãos. Tomar as decisões quanto ao trabalho, quanto aos planos futuros, quanto aos amores, tudo tinha que estar absolutamente de acordo com aquilo que eu havia planejado. No trabalho, não foi por mero acaso que consegui uma cobiçada vaga numa multinacional em São Paulo. Com um emprego razoável após me formar, em Santa Catarina, onde nasci, almejava algo mais desafiador. Para isso, fui galgando passos até estar com um currículo invejável e, foi ele quem me abriu as portas para a mudança de Estado e um emprego muito bem remunerado. Para os planos futuros, eu investia pesado em horas e esforço num doutorado que me garantiria uma posição de diretoria numa empresa de ponta. No campo sentimental, apesar de ser um homossexual 100% passivo, era eu quem ditava as regras dos relacionamentos, quem decidia quando e onde, com quem e como. Era esse conjunto harmonioso que regia minha vida e, que me dava a segurança da qual precisava para me sentir confortável.
Minha irmã e eu não tínhamos do que nos queixar. Filhos de um casal de alemão e italiana, bem estabelecido na vida, tivemos uma boa e sólida formação educacional, éramos cobiçados por nossa beleza e, podíamos nos dar ao luxo de fazer nossas escolhas de amizade e paixões. Meu primeiro namoradinho, autoproclamado insaciável comedor, não levou mais do que quatro meses para comer na minha mão. Era um garotão bonito, bronzeado, surfista que fez um dos meus verões se tornar minha incursão no mundo homossexual, quando tirou com sua pica indomável não só a minha virgindade como o meu receio de me assumir gay. Enquanto ele se sentia o maioral por ter comido algumas bucetinhas e, agora estar enrabando o cuzinho de outro homem, eu me valia de sua energia para o sexo para aprender os meandros daquele novo mundo. Era um inocente útil, tremendamente gostoso, com um fogo que eu aprendi a satisfazer através de muitas horas de sexo selvagem e primitivo. Deixei-o assim que percebi que sua ambição não ia muito além daquelas ondas, dos papos furados e sem conteúdo com seus pares e, de uma total falta de ambição. Troquei-o por um dos gerentes na empresa onde tive meu primeiro emprego, um cara mais pé no chão que já tivera outros relacionamentos homossexuais e, que terminou de me ensinar o que ainda me faltava em termos sexuais. Gostei de seu jeito machão desde o primeiro minuto que o vi, era um bissexual que à primeira vista, passava por um hétero convicto, embora sua predileção residisse numa bela bundinha de outro homem, preferencialmente submisso. Fiquei com ele por três anos, até surgir a oportunidade de me mudar para São Paulo por conta do emprego. Terminamos por que não valia à pena tentar convencê-lo a me acompanhar nessa mudança e, talvez, por que já estava um pouco saturado daquela pressuposta postura dominadora, muito embora fosse eu a direcionar o relacionamento.
Deixei a casa dos meus pais pouco depois do casamento da minha irmã e, a mudança para São Paulo foi decisiva nesse processo. Ter meu próprio canto significava ter mais autonomia e um controle ainda maior sobre a minha vida. Ao encontrar um bom apartamento, não hesitei em investir nele, mesmo tendo que contar com a ajuda dos meus pais. Havia uma porção de vantagens nele, a relativa proximidade do emprego, o fato de ser amplo apesar de antigo, a questão de não ser um daqueles poleiros gigantescos cheios de famílias barulhentas e, o fato de ter apenas um casal de meia idade como únicos vizinhos de andar. Logo travei uma amizade generosa com eles, que me tomaram como filho, uma vez que os deles residiam no exterior e raramente se encontravam. Das trocas de cumprimentos sorridentes no elevador, à pequenos favores que me dispus a fazer para facilitar o dia-a-dia deles, passando por gentilezas com as quais retribuíam minha atenção, como um pedaço de bolo, um convite para o jantar e me dar um pequeno agrado em datas comemorativas, logo nos tornamos bons amigos. A presença deles, de certa forma, amenizou a distância dos meus pais. Quando resolveram se mudar para uma cidade do litoral, senti o peso do afastamento, assim como eles.
Na multinacional farmacêutica suíça eu era movido a desafios, exatamente como sempre sonhara. Nenhum dia, por mais atribulado que fosse, me parecia entediante. Aliado a isso, ingressei no doutorado, já pensando num passo adiante futuramente, que ocupava outro tanto do meu tempo. Outra mudança vinda com esses novos tempos, foi ter conhecido o Aleixo. Conheci-o quando a empresa resolveu atualizar sua plataforma de informática. Ele era o gerente de implantação da empresa que havia sido contratada para isso. Da troca significativa de olhares, passando por flertes durante os horários de almoço, a discussões acaloradas sobre problemas que o novo sistema gerou no meu setor, foi um passo para eu levar sua rola no cu. Não dava para negar que ele era um deus grego personificado, com aquele queixo anguloso, mãos potentes que pareciam as garras de urso, um torso bem esculpido ao melhor estilo macho viril e, um cacetão sempre disposto a se meter num buraquinho apertado. Quando percebi que não o derrotaria em seu campo no trabalho e, que estava insatisfeito com os resultados que ele nos apresentava, resolvi mudar a tática, e passei a seduzi-lo. Pouco mais de um mês depois, não brigávamos mais feito cão e gato porque os dados que precisava não estavam disponíveis na forma como deveriam, ou como meus subalternos precisavam driblar o sistema para inserir planilhas gerenciais, porque ele passou a resolver cada um desses problemas seguindo minhas sugestões enquanto estocava meu cuzinho num namoro tórrido que, ao mesmo tempo em que nos consumia, nos enchia de prazer. Eu era sua primeira experiência homossexual e, aquela sensação de estar por cima na hora do sexo, o enchia de confiança e autoestima. Era bom que pensasse assim, me dava menos trabalho controlá-lo e ao relacionamento, sem que o notasse. Devo confessar, contudo, que acho que ele foi o primeiro carinha por quem eu realmente senti algo mais do que o simples prazer do sexo e da manipulação. O safado, com aquele seu jeitinho manhoso, de meninão invocadinho, mas carente, despertou em mim o desejo de satisfazer suas taras e, lhe entregar meu coração e meu amor. Nosso namoro não tinha grandes percalços, não era movido a grandes turbulências, estava na medida certa para trazer aquela paz de espírito e aquele algo reconfortante que uma boa, sincera e leal companhia pode trazer. O que era ideal para mim que estava envolvido com a minha tese de doutorado e, para ele, que tinha encontrado na quietude e carinho dos meus afagos aquilo que lhe faltava para dominar sua rebeldia.
Havia meses que o apartamento do casal estava à venda e vazio, até surgir um empreiteiro que não só promoveu uma baderna no edifício, como tumultuou o andar com a reforma que tocava. Raramente me encontrava com os pedreiros, mas os sinais de suas ações estavam tanto no hall da entrada quanto no de serviço, assim como restos da obra e ferramentas que pareciam brotar por todos os cantos. Embora aquilo me aborrecesse, resolvi ignorar, uma vez que não se faz uma omelete sem quebrar os ovos. O síndico é que andava pelas tantas com aquela reforma e, vira e mexe, me questionava se não estavam me incomodando.
- Obra é assim mesmo, Sr. Garcia! Precisa ter paciência. O senhor é que não pode ficar assim, vai acabar enfartando. – dizia eu, quando o encontrava assoberbado com a lida dos pedreiros.
- Nem me diga, Sr. Rodrigo, nem me diga! Outro no seu lugar já teria levado o caso à reunião do condomínio. Não tenho um minuto de sossego desde que começou essa bagunça. O prédio inteiro parece estar de pernas para o ar. – exagerava.
Na verdade, eu era um pouco alheio ao que acontecia no condomínio. Raramente frequentava as assembleias, desconhecia praticamente todos os vizinhos, tinha um relacionamento cordial, mas distante com os funcionários e porteiros, porque achava uma perda de tempo e energia me envolver com essas questões. Tanto é que levei mais de um mês para notar que meus novos vizinhos de andar já estavam ocupando o apartamento reformado e, só havia dois apartamentos por andar, daí se concluir o quanto eu me mantinha alheio às questões do condomínio.
Foi o Aleixo quem me avisou da chegada dos novos vizinhos, pois ele passava os finais de semana comigo, aproveitando o pouco tempo que tínhamos para namorar.
- Encontrei seu novo vizinho no elevador! Sujeitinho estranho, não fui com a cara dele. Parece que tem o rei na barriga! – afirmou o Aleixo, quando entrou em casa.
- Nem sabia que já tinham se mudado! – retruquei.
- Não é de se estranhar, você é tão displicente com essas coisas.
- O que você queria, que eu fosse fazer as honras e dar boas-vindas?
- Não, claro que não! Especialmente para esse camarada.
- O que tem ele, para você já implicar com o sujeito?
- Sei lá, não gostei e pronto! Espero que você não resolva virar amiguinho dele, como fez com o casal.
- Aí tem!
- Tem o que?
- Você é quem deve saber, para não querer que eu me aproxime dele. Está com ciúmes, meu fofinho, está? – zombei da preocupação dele.
- Eu já vou te mostrar o fofinho, espera só quando ele entrar duraço nesse cuzinho macio. Não tem essa de ciúme, não! Eu me garanto e, além do mais, tenho certeza que você também não vai com a cara do sujeito quando o conhecer. – afirmou, tentando se impor, antes de passar devassamente a mão na minha bunda.
A partir daí, começou o meu inferno. Eu chegava tarde em casa depois do trabalho e das aulas do doutorado e, quando pensava em relaxar, a bagunça no apartamento em frente começava. O som nas alturas, um entra e sai com vozes berrando a plenos pulmões, portas batendo sem cessar, parecia uma casa noturna no auge do movimento. Não liguei na primeira semana, pois achei que estavam comemorando com os amigos a casa nova. Me aborreci na segunda semana, por que estava em época de provas e não conseguia me concentrar nos estudos com todo aquele alvoroço. Na terceira semana, tumultuada na empresa com zilhões de assuntos pendentes a resolver, perdi a paciência e liguei para a portaria.
- Geraldo, você pode me fazer o favor de ligar para o 502 e pedir para abaixarem o volume do som? Parece que estão dando uma festa dentro do apartamento. – denunciei.
- Ih, Seu Rodrigo! Já tem pelo menos oito apartamentos que me ligaram denunciando a bagunça que estão fazendo aí em cima. – disse ele. – Eu até já liguei para o Seu Garcia, pois quando interfono para o apartamento ninguém atende. – acrescentou.
- OK! Faça isso então, por favor. Reforce com o síndico o meu pedido.
- Tudo bem, Seu Rodrigo.
Um quarto de hora depois, ouvi a voz do síndico batendo boca com um sujeito. Depois disso, o barulho continuou, mais baixo, mas continuou.
Os meses passavam e a situação não melhorava. Toda vez que encontrava algum morador de andares acima ou abaixo no elevador, ouvia a mesma indignação. O assunto já tinha ido parar na reunião do condomínio, desencadeando multas que eram pagas, sem, contudo, resolver o problema.
Depois de ter passado o final de semana comigo, como de costume, levei o Aleixo até o elevador para me despedir e, como o hall estava vazio, começamos a nos beijar ainda afogueados pela transa que acabávamos de ter. Os primeiros beijinhos não podiam ser mais inocentes e recatados, mas como o elevador não vinha, o primeiro com a língua dele dentro da minha boca sendo chupada com volúpia, fez o caralhão dele endurecer novamente. Ao sentir sua ereção roçando minhas coxas onde o short não as cobria, meu cuzinho começou a querer aquela pica outra vez dentro dele. Beijei-o depravadamente, roçando minha perna entre as dele, agarrando-o com o tesão a me apoquentar. Ele agarrava minhas nádegas e as apertava libidinosamente entre as mãos predadoras, enquanto me prensava contra a parede. Passei a mão sobre sua ereção e apertei o cacetão duro dentro da calça. Ele enfiou a mão debaixo do meu short e seu dedo seguia decidido rumo ao meu cuzinho, deslizando dentro do reguinho. Eu gemi, mesmo com a boca colada na dele. A porta do 502 se abriu repentinamente, o morador saiu e, antes que o Aleixo e eu pudéssemos nos recompor, o olhar do intruso nos examinou de cima abaixo. Eu lambi os lábios molhados com a saliva do Aleixo, baixei a aba do short de onde a mão dele saiu às pressas deixando exposta parte da minha nádega e a dobrinha entre ela e a coxa, e me recompus como deu. O Aleixo baixou a camiseta onde eu havia enfiado a mão para acariciar os cabelos do peito dele, tentou disfarçar a projeção que seu membro duro provocava debaixo do jeans, e amenizou o olhar de cobiça que estava estampado em seu rosto afogueado pela sanha de me enrabar novamente.
- Olá! – cumprimentou o vizinho. Eu apenas acenei com a cabeça e tentei esboçar um sorriso. O Aleixo entrou no elevador sem dizer nada e o sujeito desceu com ele.
Entrei em casa com o coração palpitando, o Aleixo tinha me deixado excitado e agitado. O cara realmente não me impressionou, conforme o Aleixo havia previsto. Muito embora, seu porte físico avantajado não tivesse me passado despercebido, nem aquele rosto másculo com a barba por fazer, mas algo de petulante nele me desagradou, para não dizer que até me causou certa repulsa. Não íamos mesmo nos dar bem, isso ficou patente. Mas, o que tinha me deixado mais puto, era que o sujeito agora sabia que eu era homossexual, que tinha me flagrado aos amassos com meu homem e, me feito sentir como um garotinho que acaba de ser pego fazendo uma travessura. Esse fato e, aquela baderna dentro do apartamento que fiquei aguentando por semanas, me fez pegar birra do sujeito.
Como as multas dadas pela administradora do condomínio não surtiam efeito, uma reunião a que estive presente, decidiu por uma ação judicial para expulsar o morador do 502. Meu nome constava no topo da lista de assinaturas que votaram pelo acionamento da justiça para resolver o problema. Enquanto os trâmites morosos da justiça demoravam a apresentar resultados concretos, as festas que mais pareciam orgias romanas continuavam a pleno vapor, varando noites e madrugadas adentro.
- Sr. Garcia, está impossível ficar aqui dentro com esse barulho no apartamento em frente, alguma providência mais drástica tem que ser tomada contra esse sujeito! – esbravejei com o síndico, quando às duas horas da manhã o bacanal no apartamento vizinho corria solto.
- O senhor tem razão, Sr. Rodrigo. Estão me ligando aqui a todo momento, já não sei mais o que fazer. Até me sugeriram de chamar a polícia, o que o senhor acha? – o coitado, aposentado, que pensava se distrair com alguma atividade para não morrer de tédio dentro de casa, nunca se viu tão pressionado como agora.
- Pois faça isso! A situação já passou de todos os limites do tolerável! – respondi.
Quase uma hora depois, uma viatura policial adentrou ao condomínio. O Sr. Garcia conduziu os policiais até o apartamento e houve bate-boca. Vieram mais duas viaturas com reforços e, finalmente, a trupe de homens e mulheres meio ou totalmente bêbada foi sendo levada à delegacia do bairro.
Eu estava diante do elevador esperando para descer e seguir para o trabalho na manhã seguinte quando a porta se abriu e o sujeito desceu, visivelmente de ressaca, voltando da delegacia.
- Belo terno, engomadinho! Quem vê nem suspeita que essa bundinha carnuda é chegada numa piroca. – disse ele ao passar por mim. Nem me dei ao trabalho de revidar.
O Aleixo precisou fazer uma viagem no final de semana por conta da empresa e eu me vi às moscas sem ter onde apagar o fogo do meu cuzinho. No domingo pela manhã, enquanto preparava meu café, vi que não tinha conferido a correspondência que havia deixado sobre o balcão da cozinha. Enquanto devorava a omelete de queijo, fui conferindo envelope por envelope. Contas, propagandas, um cartão-postal de uma amiga que passava férias na Espanha, um envelope contendo a prestação de contas do condomínio e, um envelope com o timbre do Tribunal de Justiça do Estado da Vara de Família e Sucessões endereçado a Bruno Rocco di Tommaso, o famigerado vizinho inoportuno.
- Bom dia, Geraldo! Uma correspondência do 502 veio parar por engano no meio das minhas. Está aqui desde a sexta-feira, pois só agora é que percebi, alguém poderia vir buscar e entregar no 502? – interfonei, pois havia um carimbo de URGENTE no envelope.
- Vou ver se consigo alguém, Seu Rodrigo, pois não posso sair daqui. Hoje é domingo e não tem outro funcionário que possa fazer isso. Eu mesmo levo quando o Mario vier me substituir ou fica para amanhã. – respondeu o porteiro.
- Ok! Talvez eu mesmo enfie debaixo da porta, não se preocupe.
- Obrigado, Seu Rodrigo!
O que esse bandido pode ter com a justiça? Pensei comigo mesmo. Não me admira se for um pedófilo, um tarado que andou metendo a pica nalguma bucetinha menor de idade, ou sabe-se lá o que mais, concluí, tanta era a cisma e a raiva que eu tinha daquele sujeito que acabara com a minha paz dentro da minha própria casa. Ao terminar o café me dispus a me livrar da correspondência. Ao abrir a porta vi que a do apartamento dele estava aberta.
- Olá! Olá! Olá! Alguém em casa? – nenhuma resposta. A porta devia estar aberta desde a noite anterior, pois eu tinha ouvido o entra e sai de pessoas e música tocando até a madrugada.
Chamei mais algumas vezes, sem sucesso. Terminei de abrir a porta e me admirei com o resultado da reforma e da decoração. Porém, fiquei abismado com a bagunça que reinava ali dentro, havia latinhas de cerveja, garrafas e copos pelo chão, móveis e sofás, cinzeiros cheios de bitucas, um ar pesado de fumo impregnando tudo, algumas peças de roupas, inclusive lingerie, abandonadas pelos cantos, o som de uma TV ou algo parecido vindo do corredor dos quartos, numa nítida demonstração de ter havido uma esbórnia correndo solta. Agora, mais movido pela curiosidade do que pelo gesto cordial de entregar a correspondência, fui entrando enquanto continuava a chamar por alguém. Nenhuma resposta, apesar daquele som continuar a vir de um dos quartos. Segui-o até me deparar com o sujeito, de quem eu agora sabia o nome, Bruno, dormindo esparramado nu sobre a cama. Aquele macho imenso, cheio de músculos e pelos, acomodado entre os lençóis parecia um urso em hibernação. Foi impossível não olhar para aquela caceta gigantesca, meio dura e cabeçuda, entre suas pernas peludas e não sentir o cuzinho dar uma travada. Era mesmo uma TV que estava ligada com o som baixo e sintonizada nalgum canal de pornografia, pois uma suruba entre três mulheres e dois homens preenchia a tela, em meio a uma gemedeira teatral. O Bruno dormia tão profundamente que não notou minha presença. Joguei a correspondência sobre a cama e saí do apartamento fechando a porta.
Alguns dias depois, quando voltei do trabalho, coincidentemente, entramos juntos na garagem. Ele estacionou numa de suas vagas que ficava exatamente ao lado das minhas. Tirei meu paletó e minha valise do banco de trás sem nenhuma pressa, esperando que ele se adiantasse para não ter que subir no mesmo elevador com ele. Não adiantou. Apesar da embromação, ele continuava adiante do elevador esperando-o chegar à garagem. Ele não me cumprimentou, eu fiz o mesmo. O elevador partiu e cada um olhava para um canto, evitando nos encararmos. De repente, ele apertou meu queixo com força, jogou seu corpo contra o meu, pressionando-me contra a parede metálica, colou sua boca na minha e fechou a outra mão na minha nádega. Com ambas mãos ocupadas segurando o paletó e a valise, fiquei atado, enquanto ele esfregava, avidamente, sua boca na minha. Atônito, eu só encarava a câmera do circuito interno do edifício com os olhos arregalados e injuriado pelas imagens que ficariam registradas e disponíveis para qualquer bisbilhoteiro de plantão.
- Está maluco, cara? – questionei atordoado.
- O beijo é sofrível, a bunda é gostosa, mas o fato de ser um nerdzinho tremendo de um mala sem alça põe tudo a perder! – exclamou, ao chegarmos ao nosso andar e ele sair sem virar as costas.
O elevador já fechava as portas e precisei apertar rapidamente o botão para que abrissem novamente, ao mesmo tempo, respirei fundo umas duas ou três vezes, tentado entender o que foi aquilo. Quando enfiei a chave na fechadura, ele havia desaparecido atrás da porta de seu apartamento. Se alguma vez na vida eu havia sentido raiva, foi naquele momento. Não tinha sido eu a decidir se aquela abordagem era oportuna ou conveniente. Tinha sido aquele sujeito desprezível a ditar as regras, um ultraje que ainda por cima ficou sem resposta. Eu não podia estar mais puto.
Meu doutorado estava começando a me tirar o sono. A tese não progredia e meu orientador havia se transformado no mais exigente e insatisfeito carrasco que podia existir. Eu perdi horas reescrevendo os esboços conforme sua indicação e, dias depois, ele não se contentava com o resultado, rabiscando, anulando e modificando parágrafos inteiros. A minha impressão é que não conseguia sair da estaca zero. Mais do que nunca, eu controlava absolutamente tudo no meu namoro com o Aleixo, para que nada atrapalhasse minha concentração na tese. Eu dizia quando ele podia vir e quando devia partir, determinava que programas íamos fazer, com quem e quando, encurtava os papos pelo celular, demorava horas para responder suas mensagens, mesmo quando elas me faziam declarações de amor e, coloquei-o em segundo plano na minha lista de prioridades. A imposição desse distanciamento logo o irritou, fazendo com que reclamasse da frieza com que tratava nosso amor. Frente a isso, ele ficou hiperfeliz quando eu o autorizei a passar o final de semana todo comigo, pois havia algum tempo que isso não acontecia. O que me motivou a deixá-lo ficar foi, na verdade, algo um pouco egoísta. De tão irrequieto que eu estava, insatisfeito e precisando relaxar, achei que transando com ele essa aflição teria fim. Talvez brincando um pouco com aquele cacetão eu deixaria de pensar nos problemas e conseguiria me acalmar, pensei comigo.
Voltei do trabalho mais cedo na sexta-feira. Caprichei num fetuccini com molho de cogumelos que o Aleixo adorava, coloquei duas garrafas de vinho na geladeira, acendi umas velas pelo apartamento e sobre a mesa bem-posta, tomei uma ducha e aspergi algumas gotas de perfume pelo corpo, vesti uma cueca de seda e esperei por ele em meio a iluminação aconchegante do ambiente ouvindo a minha playlist do celular acoplado ao sistema de som. Sam Smith cantava Dancing with a Stranger, quando ele destrancou a porta e entrou.
- Hummmm! O que estamos comemorando? Não me diga que esqueci alguma data! – disse, largando suas coisas displicentemente e vindo na minha direção para enlear seus braços na minha cintura e beijar minha nuca.
- Não esqueceu nada, não! Não se preocupe, avoadão! Estamos comemorando o fato de você estar aqui! – respondi, ao me virar e tomar seu rosto em minhas mãos num beijo cheio de saudade.
- Você está tão cheiroso e gostoso! É para me deixar de pau duro? – sussurrou no meu ouvido
- Não vou achar nada ruim se o encontrar duro aqui dentro. – devolvi, num assopro que roçou sua orelha, enquanto minha mão deslizava sobre seu membro.
Ele acabou me arrastando para ducha novamente antes mesmo do jantar e, um minuto depois, o caralhão impetuoso deslizava para dentro do meu cuzinho, no embalo de uma dança da música que vinha da sala. Tanto a água tépida que descia sobre meu corpo, quanto suas mãos deslizando sobre ele enquanto eu levava as estocadas vigorosas dele no cu, me faziam desejar que aquele momento se perpetuasse indefinidamente. À medida em que o Aleixo sussurrava sacanagens na minha orelha, mordiscando-a, eu empinava a bunda carnuda contra sua virilha, fazendo com que ele conseguisse enfiar o cacete até o talo. Quanto mais eu me oferecia, mais chulo ficava seu palavreado e mais intensos ficavam seus impulsos predatórios. Fui lavando meu pau à medida que a porra do meu gozo era ejaculada. Ele gozou no meu cu sem parar aquele vaivém frenético com o qual me fodia. Ao terminar, ele arfava ainda retesado e trêmulo. Eu me virei e o beijei, todo ele estava duro e, foram minhas mãos deslizando e espalhando o sabonete sobre seu corpo que foram relaxando os músculos tensos.
- Valeu à pena ficar uns dias distante de mim? – balbuciei, com um sorriso sensual.
- Muito! – respondeu, enfiando a língua na minha boca num beijo depravado. Ele estava novamente em minhas mãos, e isso me deixava seguro.
Depois do jantar e de um filminho meloso, nossa noite terminou em mais uma tórrida transa na cama, bem ao estilo do que ele gostava e, para ser sincero, eu também. Passear com as pontas dos dedos por seu corpo viril me dava tesão. Meu olhar se fixava em cada uma das maravilhas anatômicas, enquanto os dedos se encarregavam de seduzi-lo aos poucos, o que ficava evidente quando a pica não chegava a amolecer completamente, ficando sempre a um triz de uma ereção impulsiva. Ele se entregava a essas carícias, apenas observando com um olhar doce e libidinoso cada um dos meus movimentos. Ele me sorria quando eu parava nalguma região sensível, a tocava delicadamente, a beijava, a lambia ou a mordiscava. À medida que essas carícias chegavam nas proximidades dos genitais, sua respiração se aprofundava e se tornava mais lenta, as veias que se espalhavam tortuosas feito o leito de um rio ao redor de sua rola iam se enchendo e se tornando mais salientes, a pele flácida que revestia seu sacão se contraía deixando-o globoso, a cabeçorra ia saindo aos poucos do prepúcio, lustrosa, arroxeada e com o orifício uretral bem exposto para logo em seguida, começar a verter pré-gozo numa abundância crescente. Enquanto eu a sorvia umedecendo meus lábios com seu visgo, ele gemia e, já sem nenhum controle, o caralhão se preparava para me foder. Ele me agarrava, se esfregava em mim, suas mãos atacavam meus mamilos, sua boca minha nuca, descendo lentamente até as nádegas, onde seus dentes deixavam marcas na minha pele antes de sua língua úmida deslizar dentro do meu rego até chegar às preguinhas rotas da foda de há pouco e, lambê-las como um cão fareja uma cadela no cio. Então ele me prendia sob o peso de seu corpo e começava a meter o caralhão no meu cuzinho. Ao primeiro gemido intenso ele sentia que havia vencido a resistência dos meus músculos anais e, que dali em diante, minha carne rija e quente encaparia seu falo até ele terminar de se esbaldar no meu cuzinho.
Nem toda foda da noite anterior deu jeito de tirar o atraso do Aleixo. Na manhã do sábado eu mal conseguia dar uns passos sem que ele me abraçasse pela cintura e se esfregasse em mim querendo me foder. Meu cuzinho já estava esfolado e sensível, e eu procurava adiar a próxima transa para não acabar tão arregaçado a ponto de não conseguir me sentar. No fundo, aquela caçada o excitava. Ficar perseguindo meu corpo sensual só de short pelo apartamento o deixava com tanto tesão que ele mal se concentrava em outras coisas, à semelhança de um garanhão que é solto num piquete cheio de éguas no cio. A benga dele estava sempre à meia bomba debaixo da bermuda, obrigando-o a ficar ajeitando-a constantemente. Eu ria daquela gana desenfreada, e ele me ameaçava com o destempero da foda seguinte. Na própria tarde daquele sábado ele cumpria uma de suas ameaças. Ele me enrabava a uns quinze minutos quando repentinamente me veio à mente uma observação importante para a minha tese que eu havia lido numa das bibliografias consultadas. Para não perder a inspiração do momento, eu peguei o caderno e a caneta que deixava sobre o criado-mudo para fazer as anotações enquanto lia antes de dormir, e comecei a desenvolver umas notas breves para não me esquecer da inspiração repentina.
- O que você está fazendo? – questionou ele exasperado, enquanto a sua pica bombava meu cu.
- Lembrei de uma coisa importante para a minha tese e estou anotando para não me esquecer. – respondi sincero.
- Eu aqui te comendo cheio de amor e tesão e você pensando nessa maldita tese. Caralho! Que merda! O que é que eu sou para você? Um fornecedor de porra? Um macho que você chama com um estalar de dedos quando está a fim de levar vara no cu? Um gigolô que supre suas carências anais? – perguntou furioso, ao mesmo tempo em que brochava dentro do meu cuzinho.
- Claro que não! É que é realmente muito importante. – retruquei.
- Tudo para você é mais importante do que o nosso amor. Aliás, do meu amor! Porque do seu eu desconfio que não restou mais nada, se é que um dia houve algum. – revidou, tirando o pinto mole e frustrado do meu cu e saindo da cama.
- Que exagero, Aleixo! Você está fazendo uma tempestade sobre uma coisa tão banal. Eu estou aqui, não estou?
- Não, não está! Seu corpo e seu cu estão, mas você está com os pensamentos e o coração voltados para essa porra de tese. Caralho, Rodrigo! Se você não está mais a fim de mim, fala de uma vez! Abre o jogo! Eu não estou a fim de ser seu fornecedor de esperma! – ele estava tão irado que andava de um lado para o outro e passava a mão pelos cabelos.
- O que deu em você, amor? Não sei de onde você está tirando todas essas bobagens.
- Quer saber? Para mim deu! Ou você fica comigo de corpo e alma, ou fica com essa porra dessa tese e, enfia ela no teu cu quando estiver carente. – sentenciou, começando a se vestir.
- Pare com isso, Aleixo! Vem cá, vem.
- Não! Você não vai me dar mais ordens, chega! – de repente, eu senti que ia perdê-lo, e que gostava dele muito mais do que imaginava.
- Por favor, amor? O que você está fazendo, para onde vai? – eu estava a um passo de suplicar para ele não ir embora, pois aquilo me apavorou.
- Estou te dizendo, adeus, Rodrigo! É isso que estou fazendo.
Eu vesti apressadamente o short e corri atrás dele. Tentei segurá-lo enquanto destrancava a porta e saía do apartamento.
- Desculpa, amor! Não vá, por favor. Vamos conversar, eu prometo que vou te escutar e vou prestar mais atenção em você, juro! Eu te amo, Aleixo! – era tarde demais. Corri atrás dele até o elevador, argumentando e implorando.
- Não, você não me ama! Você gosta da minha pica, nada além disso! – exclamou zangado, no exato momento em que a porta do elevador se abriu e o Bruno deu de cara conosco.
Eu fiquei sem ação. Não sabia se continuava a impedir a partida do Aleixo, diante das vistas curiosas daquele sujeito, ou se o deixava ir para consertar as coisas depois, quando ele estivesse de cabeça fria. Fiz a escolha errada, deixei-o partir para não passar pelo vexame de ver aquele estranho participando de um momento tão delicado da minha vida. Nunca mais houve uma chance de consertar as coisas, o Aleixo estava irredutível e, eu precisei lidar, pela primeira vez, com aquele pé na bunda. Até então, sempre tinha sido eu a terminar os relacionamentos. Dessa vez tudo fugiu do meu controle. Se eu não estivesse tão envolvido e gostando do Aleixo como estava, talvez não teria sido algo tão doloroso e traumático.
- E o namoradinho? Deu mesmo um pé na sua bunda? Pois foi o que me pareceu naquele dia, e desde então, não vejo mais o carro dele na garagem. – provocou o Bruno, algumas semanas depois, quando casualmente esperávamos pelo elevador para descer.
- Não me parece que qualquer assunto sobre a minha vida seja da sua conta! – respondi.
- Não, não é mesmo! Mas confesso que não pude deixar de achar graça naquela cena. – retrucou
- Há pessoas que se contentam com pouco mesmo. Seria mais vantajoso se você cuidasse da sua vida e, de não importunar os vizinhos. – revidei. Ele riu.
- Estou cagando para os vizinhos! Não vou mudar meu estilo de vida por conta de alguns velhacos ou de um nerd que não sabe aproveitar a vida.
- Pois então engula suas convicções! Não estou interessado nelas. – não bastava eu ainda estar ressentido com o fim do relacionamento com o Aleixo, para ter que aturar aquele sujeito intratável.
Enfiei a cara no trabalho e na tese como forma de compensar aquele revés. Não foi tão fácil como eu havia imaginado, por isso resolvi que o feriadão que se aproximava seria passado com meus pais. Havia tempo que eu não os visitava e, talvez o carinho e o amor deles pudesse ajudar a suprir minha carência. Passei dias maravilhosos ao lado deles e, tinha voltado bem mais animado.
Um dia, voltando do trabalho, encontrei o Sr. Garcia e um oficial de justiça em frente à porta do vizinho.
- Algum problema, Sr. Garcia? – perguntei por educação, só para ter o que dizer, além do cumprimento.
- Este senhor é um oficial de justiça que veio entregar uma intimação para o Sr. Bruno. – respondeu solícito, enquanto o homem me encarava. – Não é nada relacionado à ação que o condomínio está movendo contra ele. O Assunto é outro. – emendou, dando todo o serviço, com um prazer que chegava a ser ferino.
Quando o Bruno abriu a porta eu tratei de sumir para dentro do meu apartamento. Mas ele me encarou antes de interpelar o oficial de justiça e o síndico. Dentro de casa, livrando-me das roupas de trabalho, fiquei imaginando que tipo de bandido era aquele que não parava de receber correspondências da justiça. Através das fofocas que corriam pelo condomínio, soube que ele não trabalhava, pois ninguém o via sair com regularidade. O estilo de vida que levava não era barato, segundo atestavam o carro de luxo e a motocicleta potente que ocupavam suas vagas na garagem, as festas que promovia e, a própria decoração do apartamento que eu mesmo tive a oportunidade de conferir.
- Já conseguiu substituir o namoradinho? – questionou o Bruno, num domingo pela manhã quando resolvi descer para comprar umas revistas.
- Cara! Estou farto das suas observações cretinas! Não sei se você já percebeu, mas aqui todos querem te ver longe desse condomínio. – devolvi.
- Sei, sua assinatura está no topo da lista da ação que movem contra mim. Por falar nela, os porteiros me informaram que uma intimação tinha sido deixada por engano entre as tuas correspondências. Também me disseram que não foram eles a deixá-la no meu apartamento. No entanto, eu a encontrei na minha cama uma manhã quando acordei completamente nu. Suspeito que você teve bastante tempo para matar sua curiosidade, não foi? – o cinismo dele era de enlouquecer, mesmo assim fiquei abalado, sem saber como me justificar por ter entrado em seu quarto.
- Adentrei àquele antro porque a porta estava escancarada e ninguém respondia, mesmo havendo ruídos vindo do quarto. Como achei que podia ser algo importante, pois havia um carimbo de URGENTE no envelope, resolvi ser prestativo com quem não o merece. Quanto ao fato de estar pelado não era de se esperar outra coisa de quem vive na esbórnia, e garanto que jamais teria o menor interesse no que vi. – resolvi afirmar, sendo o mais sincero possível, sem me acovardar ante aquele sujeito.
- Tenho certeza que você se lambuzaria! – exclamou petulante.
- Duvido! Talvez um bando de moscas o faria, ou o tipo de mulheres que frequentam sua casa. – retruquei. Ele riu.
Primeiro dia de férias. Subitamente, o tempo que me faltava e me obrigava a me desdobrar em dois para dar conta de tudo, estava sobrando. Pensei em dar uma pesquisada em mais alguns artigos que me ajudariam a compor a tese, para ir adiantando as coisas nesse ramo e, depois quem sabe tirar uma ou duas semanas de folga numa praia ou nas montanhas para renovar as energias. Saí tarde da cama só para ter o gostinho de poder apertar a tecla do despertador e voltar a cochilar. Havia ido até uma padaria próxima que servia um café da manhã digno de hotel cinco estrelas, caminhando pelas ruas do bairro sem nenhuma pressa enquanto as pessoas corriam apressadas para o trabalho.
- Bom dia, Geraldo! – cumprimentei o porteiro que havia acabado de assumir o posto quando voltei para casa.
- Bom dia, Sr. Rodrigo! O senhor por aqui a essa hora, que milagre é esse? – questionou surpreso.
- Férias, Geraldo, férias!
- Faz três anos que trabalho aqui e é a primeira vez que vejo o senhor tirar férias. Espero que consiga aproveitá-las muito bem.
- Obrigado! Tem alguma correspondência minha aí?
- Não, senhor! A única que tem é do senhor Bruno. O senhor não vai querer levar, não é? – perguntou rindo.
- Nem pensar!
- Até a gente fica ressabiado quando tem que levar alguma coisa lá para cima. O homem ficou uma fera depois de receber a intimação da justiça, por conta da bagunça. – revelou.
- Até mais, Geraldo! – cortei logo a conversa depois que pressenti que ele estava a fim de fofocar sobre meu vizinho.
- Até, Sr. Rodrigo! Bom descanso para o senhor!
O notebook ainda estava abrindo quando a campainha tocou. Através do olho mágico vi o Bruno diante da porta. Noventa por cento do meu bom humor desceu pelo ralo.
- O que quer? – questionei ríspido.
- Bandeira branca, ok? Vim na paz!
- Então diga a que veio, e tchau!
- Consegui mesmo de deixar bem puto, não foi?
- Cara! Na boa, você é a última pessoa com quem eu estou a fim de conversar. Se não tem nada a dizer, eu gostaria de voltar aos meus afazeres. – retruquei, mal humorado.
- Vi quando você saiu para dar uma caminhada e deduzi que estava de folga. Juro que estou até sem graça para te fazer esse pedido, mas é que estou numa sinuca danada. – começou, encabulado como nunca o tinha visto antes. – Você poderia me acompanhar numa audiência? – emendou, constrangido.
- Como é que é? Você só pode estar tirando uma com a minha cara! Não tenho nada a ver com os teus rolos. É muita cara de pau! – devolvi
- Não, é sério! Dessa vez é sério! – exclamou, tirando um envelope do bolso semelhante àquele que eu havia deixado sobre sua cama pouco mais de um mês atrás.
- Lamento! Estou realmente sem tempo. Por que não convoca um dos teus amigos de farra, se eles têm disposição para varar a madrugada fazendo zorra, hão de ser solidários com você agora. – afirmei.
- Além de me zoarem, não são as pessoas mais indicadas para eu levar nessa audiência. Posso acabar me ferrando! – afirmou.
- E aí você resolveu bater na minha porta para ver se eu sou trouxa de cair numa brincadeira de mau gosto sua? – questionei.
- Não é nada disso! Pô, eu já disse que o assunto é sério. Não dá para me dar um voto de confiança? – indignado, mas preocupado por eu não lhe dar a devida importância, resolveu partir para o tudo ou nada. – Sei que vai tripudiar sobre mim depois, mas, vamos lá. Estou te pedindo isso por que estou com medo, medo não, desespero mesmo. E, preciso de alguém tipo você do meu lado para não falar nenhuma bobagem.
- Leve um advogado! Ele lhe será bem mais útil do que eu.
- Não preciso de um advogado, porra! Preciso de alguém que inspire credibilidade, deu para entender? – por pouco não o mando à merda. – É coisa rápida, duas, três horas no máximo.
- Já sei que vou me arrepender pelo resto da vida, mas vá lá, que seja! Só vou te avisar uma coisa, se isso for uma brincadeira, não respondo por mim e, garanto que vou te ferrar. – ameacei.
Meu queixo caiu de vez quando entramos numa sala da Vara de Família e Sucessões de uma Regional do Tribunal de Justiça e, um juiz começou a ler o testamento da irmã do Bruno. Sem pais vivos ou outros parentes residindo no Brasil, ela deixara um testamento no qual designava o irmão como tutor de seu filho, após a morte trágica dela e do marido estrangeiro há questão de pouco mais de dois meses.
- Como o senhor é o único parente elegível e essa é a vontade expressa da declarante, fica a seu encargo criar essa criança. Ela já permaneceu tempo demais sob a tutela provisória de um abrigo assistencial, enquanto aguardávamos as reiteradas convocações para que comparecesse a esse tribunal. – declarou o juiz, fechando a cara quando mencionou a questão das reiteradas convocações.
- Não tenho condições de assumir essa criança, ele é um bebê! Não posso cuidar de um bebê! – exclamou o Bruno.
- Um levantamento conduzido pelo tribunal aponta que o senhor não tem problemas financeiros, responde a dois processos de menor importância na justiça, um movido pelo condomínio onde reside e, outro por desacato ao um delegado durante uma blitz da lei seca, quando foi autuado por estar dirigindo bêbado. Além do que, estou designando uma assistente social que acompanhara pelos primeiros meses os cuidados dessa criança, por medida de precaução, até que seja expedida a guarda definitiva. – sentenciou o juiz.
- Posso deixá-lo em adoção? Há tantas famílias querendo adotar uma criança, podem ficar com essa! – retrucou o Bruno.
- Essa criança é seu sobrinho! Se sua irmã não quisesse que o senhor cuidasse dela não teria feito um testamento. Se for o caso, depois de dois anos, e o senhor se mostrar incompatível com as necessidades da criança, podemos pensar na questão. Mas, por hora, determino que leve imediatamente a criança aos seus cuidados. – o tom de voz do juiz soou autoritário e, um sinal para um auxiliar, fez com que ele fosse buscar a assistente social que trazia a criança nos braços.
- Agora? Já? Não estou preparado para isso! – o pavor estava estampado na cara assustada do Bruno, como se ele estivesse diante da própria morte.
- O senhor teve tempo suficiente para atender nossas convocações, não o fez, agora tivemos que tomar uma atitude mais incisiva. Advirto-o, o bem-estar desse bebê é sua total responsabilidade. Qualquer intercorrência e o senhor responderá judicialmente pela falta. – ameaçou o juiz.
Depois de assinar uma papelada, a assistente social lhe entregou o bebê nos braços. Pensei que o Bruno fosse cair duro ali mesmo. Ele olhava para o bebê, olhava ao seu redor, me encarou, e começou a caminhar trôpego até a saída.
- Pelo amor de Deus, me diga o que faço agora? Onde é que vou deixar esse bebê? – balbuciou, enquanto caminhávamos para o estacionamento.
- Eu preciso de um tempo para processar tudo isso! Sua irmã morre e te deixa o sobrinho e você não vai procurar saber dele, é isso? Você ignora as convocações da justiça para ir buscá-lo e não vai? Que tipo de pessoa você é? Cara, você é um monstro! – exclamei, tão perplexo que mal sabia o que estava dizendo.
- Eu sou! Eu sou um monstro, eu sei. Mas, estou apavorado. Como vou cuidar de um bebê, cara? Como? – ele falava consigo mesmo.
Diante da porta do apartamento ele agarrou meu braço e não queria me soltar.
- Não me larga sozinho com essa criança, é tudo que eu te peço. Não me larga! – balbuciou aterrorizado.
- Ele é um bebê inofensivo, não um leão!
- Eu preferiria que fosse! – precisei rir.
- Bem! Boa sorte! Já fiz minha boa ação de hoje, certo? – disse ao me despedir.
- Não! Não faça isso! O que eu faço agora?
- Entre, coloque o bebê numa cama, contrate uma babá e seja feliz! – respondi
- Você também é um monstro! – revidou ele.
- Posso até ser, mas não abandonei um bebê indefeso, estou apenas me livrando de um marmanjo que tem plenas condições de cuidar de si mesmo. Portanto, sou um monstro muito mais bonzinho do que você. – retruquei, deixando-o.
Como eu esperava, duas horas depois ele estava diante da minha porta novamente.
- O que é agora? Já perdeu o bebê? – ironizei.
- Não brinca com uma coisa dessas! Ele está berrando a plenos pulmões, não sei mais o que fazer. Dá uma força, vai.
- E por que eu haveria de saber o que fazer? Não entendo nada de crianças. Já disse, vai procurar uma babá.
- Mas até eu conseguir uma o que é que eu faço?
Acompanhei-o até o quarto onde o bebê berrava a não poder mais, esperneando e agitado dentro do mesmo pacote no qual lhe fora entregue pela assistente social.
- Você não trocou essa criança? Deu ao menos uma mamadeira, pode ser que seja fome? – questionei.
- Não! Não tive coragem de mexer nele, vai que eu o machuque.
- Me parece que bebês não são algo que não se possa tocar. Eles precisam ser trocados, ganhar comida, essas coisas básicas, tipo o que os seres humanos também precisam, saca?
- Cara, você sabe tripudiar sobre uma vítima! – exclamou. Caí na risada.
- Você, vítima? Larga de ser besta!
Sob minha vigilância, ele começou a despir o bebê, completamente cagado e com a fralda molhada de mijo até as tampas.
- Caraca! O que deram para esse moleque comer? Que puta fedor! – exclamou ele, tentando controlar os engulhos. Voltei a cair na risada.
- Eis aí o motivo de todo aquele berreiro. – afirmei. – Trate de limpá-lo que vai ficar tudo bem outra vez.
- Como? E o que vou vestir nele depois?
- Que tal uma fralda e uma roupinha limpa semelhante a essa? Já pensou nisso?
- Não tenho nada disso em casa. Pelo amor e Deus, diga que vai me dar uma força, só hoje, prometo, prometo não, juro! Ou, vou me atirar por essa janela. – sentenciou.
Eu era mais mole do que pensava ser, constatei, quando estava dentro da drogaria comprando tudo que estivesse relacionado a bebês. A atendente se derramava em sorrisos por cima de mim, como se eu fosse um tremendo de um papai tesudo de primeira viagem.
- Aí está, acho que isso deve ser o suficiente para começar. – disse ao entregar as sacolas na mão do Bruno.
- Você não vai me deixar aqui sozinho, vai?
- Vou.
Certamente já estou me tornando redundante nesse relato, mas adivinhem quem bateu à minha porta uma hora depois. Bruno e um bebê chorando em seus braços.
- Eu limpei toda aquela merda, só eu sei a que custo! Coloquei fralda limpa e improvisei com essa camiseta minha mesmo, pois não tenho roupas de bebê. Está tudo certo, não tem cocô, não tem mijo, mas ele está berrando de novo. – relatou, como se eu fosse um manual ambulante que pudesse socorrê-lo ao menor sufoco.
- E fez mamadeira para ele, é lógico! – exclamei. – Pois faz praticamente cinco horas ou até mais que ele estava sem mamar. – a cara imbecil que o Bruno me lançou, bastou para eu saber que ele se esquecera desse pequeno detalhe.
- E como se faz isso? Passa uma vitamina no liquidificador e põe na mamadeira? – questionou.
- Cara! Você é maluco ou o quê? Em que mundo você vive? Posso não ser nenhum expert em crianças, mas todo mundo sabe que elas mamam e que mamam leite, ou algo no gênero quando não tem os seios da mãe. – respondi. – Afinal de contas, qual é a idade dele? É em função disso que você saber o que ele precisa comer. – emendei.
- E como é que eu vou descobrir o que devo dar a ele? Me ajuda a pesquisar no Google. Eu acho que ele deve ter um ano, sei lá. – havia tempos que eu não ria tanto. O cara era a própria encarnação do desespero.
- Você não sabe a idade do seu próprio sobrinho? Não acredito!
- Eu não tinha muito contato com a minha irmã. Meu cunhado meio que não ia muito com a minha cara, sabe como é. Só fiquei sabendo que ela teve um bebê, mais nada.
- E, é claro, que você não foi visitá-la, nem perguntou se era menino ou menina, em suma, você não estava nem aí. – devolvi
- Eles não moravam em São Paulo, como eu disse meu cunhado, um francês metido a besta, não morria de amores por mim, minha irmã e eu sempre fomos distantes, o que você queria que eu fizesse, que bancasse o titio bonzinho e coruja? – retrucou ele.
- Até já imagino porque seu cunhado não ia com a sua cara!
Lá estava eu, novamente envolvido com aquele problemão que não era meu, pesquisando na Internet para não chegar na drogaria sem a menor ideia do que pedir, pagando um mico que não tinha que ser meu.
- Tem que esterilizar tudo que vai enfiar na boca desse moleque, acabei de ler aqui. – disse o Bruno, assim que regressei com umas latas de leite em pó fórmula infantil. Ele me encarou surpreso quando viu as latas e começou a ler o rótulo. Exatamente como eu tinha feito na farmácia, depois de escolher o nome que mais chamou minha atenção entre as dezenas de latas enfileiradas na prateleira. Ele não precisava ficar sabendo desse mero detalhe.
- Como você sabe que é isso que tenho que dar para ele? – perguntou.
- Não é o que diz aí no rótulo? Qualquer um sabe disso! – exclamei, para tripudiar um pouco dele. – Como ele tem por volta de um ano, também precisa complementar com umas papinhas.
- Cara! Você está sendo a minha salvação! Valeu! – exclamou abobado.
- Só não pense em se acostumar! É hoje e ponto final, entendeu? – revidei. Embora estivesse convicto de que não seria bem assim.
Quando tudo parecia ter entrado nos eixos, o bebê limpo, alimentado, dormindo feito um anjo, o apartamento estava de pernas para o ar. Exaustos, sentamos no sofá, ele trouxe duas latinhas de cerveja e caiu sobre as almofadas. No segundo gole, murmúrios vinham do quarto, cinco minutos depois, com o berreiro instalado, a maratona recomeçou. O moleque parecia um reloginho, a cada três horas havia mais mijo naquelas fraldas do que um boi era capaz de mijar e, a cada seis horas havia uma surpresa fedida fazendo companhia. Assim como uma mamadeira cheinha era esvaziada nesse intervalo.
- Cara! Eu não vou aguentar, dentro de uma semana estou morto! Esse moleque parece uma máquina, coloca aqui em cima e sai tudo aqui por baixo, quem é que aguenta uma coisa dessas a cada três ou quatro horas? Não dá nem tempo de eu mesmo ir dar uma mijada. – desabafou o Bruno. Só me restou rir.
- Daqui há pouco você se acostuma! Pede para uma daquelas suas amigas te dar uma força, logo você fica craque. – debochei.
- Vai me alugando, vai! Você sabe muito bem que aquelas minhas amigas não são o tipo de mulher que sabe cuidar de um bebê. Só de saber que agora tenho um, nem vão querer mais me ver pela frente. – afirmou.
Passou-se assim meu primeiro dia de férias, em seguida a primeira semana, toda dedicada a comprar e equipar o apartamento do Bruno para o novo hóspede. E eu, servindo de muleta, ora carregando o bebê no canguru, ora no bebê conforto, opinando sobre berços, carrinhos, cadeira para instalar no carro e por aí vai. Enfim, um tremendo de um programão para um cara solteiro, em férias e sem nenhum compromisso que não o de tentar encontrar uma nova paixão. Também passei e nem trancar mais a porta do apartamento, uma vez que, vira e mexe, o Bruno estava diante dela com um novo problema. Terminado o mês, até eu já estava fazendo mamadeiras, amassando frutas, fazendo papinhas, dando banho, trocando fraldas e varando noites com o Arthurzinho no colo, sem me dar conta de que tinham sido aqueles sorrisinhos marotos ao trocá-lo, aquelas bochechinhas fofas que formavam uma covinha quando ele ria, aquelas dobrinhas nas pernas e braços que tinham arrebatado meu coração. Bastava o safadinho me ver para esticar os bracinhos e pedir colo, aconchegando-se em mim e dormindo como um anjo. A mesma tática ele usava com o Bruno, em troca de termos de volta o delicioso silêncio e algumas horas de tranquilidade. Contudo, ambos ainda eram tremendamente desajeitados com o trato dele, embora ele parecesse não se importar muito com isso, e sorrir toda vez que ficávamos perdidos ou enrolados com alguma coisa.
- Uma coisa eu garanto, Arthurzinho, se você sobreviver a nós dois, depois disso sua vida será um mar de rosas! – exclamei certo dia, quando enfiamos o pé na jaca ao agasalharmos o moleque para um passeio com meia tonelada de roupas temendo que pudesse tomar alguma friagem. Foi uma senhora com quem cruzamos nos corredores do shopping que nos alertou da cagada.
- Por onde você andou? Estou te procurando desde hoje de manhã. – questionou o Bruno, cinco minutos depois de eu ter voltado do meu primeiro dia de retorno ao trabalho.
- Minhas férias acabaram! Eu tenho um emprego e preciso dele para pagar as minhas contas, não sei se você sabe. – respondi.
- Putz! Como é que eu vou me virar agora? Hoje foi o maior sufoco. – retrucou ele.
- O que você pensou, que eu ia servir de babá para o Arthurzinho o tempo todo? Já está na hora de você assumir suas responsabilidades. – respondi.
- É que eu pensei que .... Tá, deixa para lá, eu pensei errado. Acabei com as tuas férias e estou aqui pedindo para você me ajudar, não tem cabimento. – devolveu desolado.
- É isso aí, agora é por sua conta!
- Esta semana tem outra visita surpresa da assistente social, e se eu fizer alguma cagada pouco antes dela chegar e ela fizer anotações para aquele maldito relatório que envia para o juiz mensalmente. – argumentou. Pois já tínhamos passado pela experiência de vê-la com aquela cara carrancuda de censura diante das trapalhadas que fizemos nas primeiras semanas. – Até agora você estava do meu lado e me ajudava a dar uma engambelada nela, mas agora estou sozinho. – acrescentou.
- Mais um motivo para você ficar atento!
- Seria abusar muito se eu te pedisse para fazer a papinha enquanto eu dou banho nele? – perguntou, na cara de pau.
- Cara! Você é folgado! Passa o dia de pernas para o ar e vem me encher o saco depois de um dia de trabalho. – respondi.
- Não parei um minuto! O Arthurzinho não dá uma folga! Só dessa vez, vai!
- Coitadinho de você, chego a ter pena! Acho que é a milésima vez que ouço você dizer que é só dessa vez. – ironizei.
Fiz a papinha, ajudei-o a colocar o garoto para dormir, dividi minha janta com ele e presenciei-o cair no sono no sofá da minha sala. No prazo de um mês, aquele troglodita que ronronava só de short sobre as minhas almofadas, tinha virado minha vida do avesso, feito eu perder as rédeas e o controle de tudo e, mesmo assim, ao olhar para aquele rosto viril e sereno eu não conseguia mais sentir aquela raiva que tinha dele ao ter que aturar a baderna que rolava em seu apartamento. Fiquei ainda mais puto quando me bateu uma tremenda saudade do Aleixo, do jeito companheiro com que ele me acariciava, do modo solícito com que dividia as tarefas comigo, da maneira sensual como enfiava o caralho no meu cuzinho e me fazia adormecer com as entranhas úmidas. Enquanto esse babaca chegou para me tirar o sossego, para me fazer chegar ao ponto de reivindicar na justiça a sua saída do condomínio, para acabar com a única certeza que eu tinha, a de que minha vida era regida exclusivamente por minha vontade. E lá estava eu, admirando aquele tórax imenso e peludo, subindo e descendo a cada inspiração e expiração dele, aqueles braços vigorosos cheios de músculos, aquelas pernas que mais pareciam o tronco de uma árvore e, aquele volume gigantesco entre suas pernas que nem o short largo conseguia disfarçar e, do qual, eu ainda tinha nítida a imagem sedutora de quando o flagrei nu naquele dia; somando-se a ela o sabor do beijo que ele me roubara à força no elevador. Preciso urgentemente arrumar outro namorado, pensei com meus botões, pois essa carência não pode continuar e, com esse sujeito é que não vai rolar mesmo, nem pensar. Pouco antes de ir me deitar, fui tentar acordá-lo, ele resmungou alguma coisa depois de eu sacudir seu ombro, virou-se para o outro lado e continuou dormindo. O Arthurzinho dormia no bebê conforto, alimentado e seco. Joguei uma manta sobre o Bruno e fui dormir. A que ponto cheguei, vituperei ao me aconchegar aos travesseiros.
E assim, dia após dia, foram se estreitando os meus laços com o Bruno e com o Arthurzinho. Enquanto o primeiro me deixava sempre com dois tijolos na mão, o segundo ia tomando conta do meu coração sem o menor esforço, bastando um sorrisinho, aqueles olhos enormes acompanhando cada um dos meus movimentos, e meu colo, do qual se valia para afugentar todos os seus desconfortos e inseguranças.
- O senhor conseguiu fazer as pazes com o Sr. Bruno, Sr. Rodrigo? – bisbilhotou o Geraldo.
- Nunca fomos inimigos! Me incomodava, assim como a todo o edifício, a bagunça que ele promovia. – respondi, já imaginando que àquela altura todo o condomínio já estava sabendo do nosso estreitamento de relações e, certamente, fazendo conjecturas das quais tinha até receio de ficar sabendo.
- É que eu tenho visto o senhor com ele e aquele bebezinho saindo para passear. – continuou o porteiro.
- É estou dando uma força para ele nesse sentido.
- O bebê é filho dele? – enquanto não esmiuçasse todo o mistério ele não daria sossego.
- Não! É da irmã dele. – respondi. – Até mais, Geraldo, bom trabalho.
- Ah! Até mais, Sr. Rodrigo! Um bom dia para o senhor também!
Não me faltava mais nada. Agora já estava na boca do povo, era provavelmente o assunto predileto das comadres boquirrotas, foco das especulações alheias, e alvo de maledicências.
- Que cara é essa? – indagou o Bruno quando me viu.
- A minha!
- Tá, é a sua, mas qual é a desse mau humor?
- Acabo de ser interrogado pelo Geraldo como se estivesse num banco de réus. Virei o assunto predileto dos fofoqueiros de plantão e, adivinhe qual é o motivo?
- E você vai dar importância para isso? Pensei que fosse mais senhor dos seus atos. – devolveu ele.
- Aí é que está, já nem sei mais se sou senhor de alguma coisa. Eu tinha tudo sob controle, agora fico ansioso só de pensar o que vem no minuto seguinte. E a culpa é sua! – esbravejei.
- Minha? O que foi que eu fiz?
- Você dorme aqui, você não sai da minha cola, sou visto com você como se fosse minha sombra, é isso que você fez.
- Você não se preocupava com isso quando aquele seu namoradinho passava o tempo todo por aqui te fodendo. – retrucou ele.
- Some, Bruno! Some! Não quero mais essa sua cara por hoje! Vai! – nem me lembrava mais de quando foi a última vez que chorei, mas ao entrar no meu apartamento desabei num pranto doído, para o qual não encontrava explicação.
Comecei a sair com o pessoal do trabalho depois do expediente, coisa que não me apetecia muito, só para ficar mais tempo longe de casa, pois eu precisava ficar um pouco distante da encrenca do 502, voltar a ter um tempo apenas meu. Como nossa última conversa não tinha sido das melhores, o Bruno demorou a me questionar sobre as minhas repetidas ausências. Dei como desculpa o fato de termos algumas questões pendentes que obrigavam a equipe a fazer hora extra. Não sei se ele engoliu, mas isso não me importava. Mais entrosado com a galera acabaram surgindo uns convites para passar os finais de semana ora aqui, ora acolá. Apesar de ter entrado em algumas furadas, eu aceitava tudo que vinha pela frente. No computo geral não foi de todo desastroso, pois acabei conhecendo um carinha bem interessante. O único mal dele é que tinha se divorciado há poucos meses e, seu assunto primordial ainda era a ex e os dois filhos, mas a falta de onde meter o cacetão gostoso supria essa falha. A voracidade com que vinha para cima de mim estava bem a contento das minhas necessidades atuais, e me proporcionava horas de intenso prazer. Na primeira vez em que ele e o Bruno se encontraram, o Bruno sacou o que estava acontecendo.
- Faz tempo que você não aparece, o Arthurzinho está sentindo sua falta. – fez questão de dizer, na frente do Paulo.
- Levei o brinquedinho dele anteontem na sua casa! – exclamei, referindo-me a um brinquedo que tinha ficado no canto de uma poltrona e que, devido a possibilidade do Paulo passar em casa, eu fiz questão de não deixar visível para não gerar questionamentos.
- Ah é! Tinha me esquecido.
- Boa noite! – desejei formalmente. O Paulo não precisava saber que o Bruno e eu tínhamos um assunto em comum.
- Tá! Tchau!
O Paulo tinha vindo dormir em casa porque na manhã seguinte seguiríamos cedo para o litoral passar o fim de semana. Recebi algumas mensagens do Bruno que, com certeza, havia ido bater à minha porta com uma desculpa qualquer para se desobrigar um pouco dos cuidados com o Arthurzinho. Na volta do litoral eu é que tinha ido passar a noite com o Paulo no flat onde estava provisoriamente alojado. E assim, eu ganhava alguns dias de sossego. Fiquei a semana toda sem ver o Bruno.
No sábado seguinte, ele bateu na minha porta pouco depois das seis da manhã. Sonolento, virei para o outro lado e continuei a dormir. Foi a vez do celular não me dar trégua, as ligações não atendidas se transformaram em mensagens a cada cinco minutos. Quando finalmente resolvi sair da cama, já passava das nove horas. A estratégia que ele usou para isso, foi ligar na portaria e pedir para que interfonassem. Três minutos depois de eu ter conversado com o porteiro, ele esmurrava a porta.
- Qual é, vai derrubar a porta? – questionei
- Você não responde as minhas ligações e mensagens! – exclamou empertigado.
- Devo ter uma razão para isso, não é? – devolvi.
- Que razão? Aquele protótipo de galã? – então era isso, ele estava puto por eu ter encontrado alguém.
- Talvez!
- Ele não faz o seu tipo. Está entrando numa furada. – afirmou categórico.
- Ah, não me diga! E é você quem sabe quem faz o meu tipo? Vamos, diga o que quer e cai fora! Tenho uma festinha essa noite e quero dormir mais pouco. – revidei.
- Festinha é? A suruba vai rolar aonde? Na sua bunda? – provocou.
- Isso já passou dos limites! Fora! Quem é você para me questionar sobre surubas? Até outro dia seu apartamento era um verdadeiro puteiro, e agora você quer controlar com quem eu durmo? Sai! Tenho certeza que você tem outras coisas com que se preocupar, seu sobrinho, por exemplo! – ele saiu pisando firme e bateu a porta com tamanha força que pensei que a arrancaria do batente.
Foto 1 do Conto erotico: De repente, pai - Parte I


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Comentários


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lordricharlen Comentou em 30/06/2020

Gostando muito odiando o Bruno

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coroaaventura Comentou em 21/06/2020

O TÍTULO ENGANA. PARECE INCESTO! NA REAL, FOI SURPREENDENTE. NÃO É 'CONTO'. É ROMANCE. ADOREI.

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machogyn Comentou em 21/06/2020

Nao terminei nem o primeiro paragrafo. Tao altivo.

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Comentou em 21/06/2020

Perdi 40 minutos da minha vida lendo isso 🙄 Grande e exagerado.. nada exitante 🤷

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darkangele Comentou em 20/06/2020

\excelente conto!




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Ficha do conto

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Nome do conto:
De repente, pai - Parte I

Codigo do conto:
158599

Categoria:
Gays

Data da Publicação:
20/06/2020

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14

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