Dor e solidão depois da foda
Oito minutos antes do horário previsto o TGV entrava na estação ferroviária Nice-Ville, em Nice na Côte D’Azur, vindo de Paris. Faltava pouco para a uma da tarde. Isso me fez sentir plenamente satisfeito, como se a estatal francesa estivesse me mostrando que era uma empresa confiável e séria. Desde que deixei o Brasil, há muito tempo, era da pontualidade das pessoas e prestadoras de serviços que eu mais gostava. No meu entender, alguém que não conseguisse chegar num compromisso na hora marcada, não podia ser alguém confiável e responsável, eram atitudes excludentes. A estação fervilhava. Estávamos no meio de setembro, num dia quente do verão que teimava em não acabar. Havia mais turistas deixando aquela parte da costa do Mediterrâneo do que chegando, devido ao fim do período de férias. Enquanto eu estava apenas iniciando as minhas, depois de um longo tempo sem saber o que era descanso sem interrupções ou ligações do escritório de advocacia.
Meu tataravô, quando iniciou seu próspero escritório, não imaginava que também estava iniciando uma dinastia de advogados. Desde então, estávamos na quarta geração da Muniz & Partners, com escritórios em Nova Iorque e Paris, defendendo os interesses de empresas brasileiras e multinacionais nos Estados Unidos e Europa, além do Brasil. A solidez e reputação do escritório foi se consolidando com as novas gerações e, invariavelmente, se tornando um negócio extremamente lucrativo. Nos últimos anos, com a ascensão e perpetuação no governo brasileiro da esquerda socialista trotsquiana ignorante, inspirada no comunismo falido e ultrapassado, os negócios do escritório entraram numa fase de grande prosperidade, basicamente devido às inúmeras falhas nos contratos governamentais com as empresas estrangeiras. Foi no meio dessa expansão que eu saí da universidade e passei a fazer parte da equipe de profissionais do escritório. Dois anos depois estava na filial de Nova Iorque e, simultaneamente, dei continuidade aos meus estudos numa pós-graduação na Universidade Columbia. Com a demanda crescente na filial europeia em Paris, me mudei há três anos e, desde então, passados mais de oito anos, estas eram as primeiras férias descentes que planejava desfrutar viajando pela costa ensolarada do sul da França. Um e-mail curto, sem especificar onde ficaria hospedado, para o escritório no Brasil, informou ao meu pai que eu estava partindo. Sabia que ele ia interpretar aquilo como uma forma de não me perturbar durante as férias e, embora pudesse ser facilmente localizado pelo celular, achei que ele entenderia a sutileza da minha atitude.
Inicialmente fiquei em dúvida se alugava um carro ou seguia até Antibes, meu primeiro destino, de trem. Convencido de que dirigir eu mesmo me daria maior liberdade de deslocamento e autossuficiência, aluguei um Peugeot RCZ na Hertz mais próxima da estação ferroviária. Uma extravagância para meu estilo de vida espartano, mas a liberdade de ter deixado os sóbrios ternos de lado, o calor daquele início de tarde e o azul do Mediterrâneo valiam ousar um pouco, coisa que eu, apesar de jovem, mal sabia fazer.
Demorei 45 minutos pela estrada que serpenteava ao longo da costa para cobrir os vinte e sete quilômetros até Antibes, admirando cenários belíssimos e me adaptando com o carro, o que me custou um sonoro ‘Va te faire foutre, emmanché du merde!’ de um velho grisalho gesticulando feito um louco dentro de sua Mercedes, e uma mão fechada com o dedo médio em riste de uma ruiva sardenta de óculos escuros enormes, que cobriam quase todo o rosto, acompanhada de duas outras quarentonas recauchutadas. Exemplos típicos da refinada educação francesa.
O saguão do Hotel du Cap Eden-roc estava mais agitado que de costume para aquele horário. Tal como na Gare Nice-Ville, havia mais partidas do que chegadas. O atlético e bronzeado atendente da recepção, cujo terno sisudo parecia estufado sobre os músculos, me examinou com um nítido interesse antes de abrir um sorriso largo e pouco convencional, destinado a conhecidos milionários que frequentavam a Côte D’Azur ou a alguém que despertava um interesse mais pessoal. Fiquei um pouco encabulado quando essa última opção me passou pela cabeça, uma vez que eu não fazia parte da primeira possibilidade.
- Bonjour Monsieur! En quoi puis-je vous aider? – O sorriso mostrando dentes grandes e bem alinhados continuava lá, e o olhar curioso me cobria de cima a baixo.
- Bonjour! J’ai une réservation! Eduardo Alpern Muniz, s’il vous plaît. – Apesar de bem mais contido, retribuí o cumprimento com um sorriso afetuoso e sincero, o que o deixou visivelmente contente.
Com o fim do verão se aproximando as suítes começavam a ficar vazias e, a que eu havia selecionado num site de reservas não podia ter uma vista mais privilegiada e compatível com aquele momento da minha vida. Dos amplos janelões via-se a área da piscina e recreação incrustada nas escarpas rochosas descendo até a imensidão tranquila do mar. Fazia tempo que eu não respirava um ar salgado e denso como aquele. De repente, comecei a perceber que todo o meu corpo começava a relaxar, foi como se meus músculos adquirissem um tônus do qual eu nem me lembrava mais. Terminei de desfazer a mala e ajeitar meus apetrechos de higiene no banheiro, quando uma inquietação me impulsionou a fazer uma caminhada pelos arredores. Depois da ducha, uma bermuda, camiseta e um par de óculos de sol me bastaram para encarar a tarde morna e levemente arejada por uma brisa. O atendente da recepção continuava lá e apressou-se a pegar o cartão-chave da minha suíte antes que outros o fizessem. Percebi que ele aprovou os meus trajes mais descontraídos, e isso me fez corar ligeiramente. Era um resquício da minha adolescência tímida, da qual não conseguira me livrar, o que me deixava contrariado comigo mesmo.
Ainda havia uma boa leva de turistas percorrendo as ruelas medievais de Antibes ao longo da orla, a despeito do calor. Embora tenha saído sem um roteiro em mente, quando avistei o Chateau Grimaldi no topo do rochedo, fui caminhando até ele, enquanto apreciava, sem pressa, as ruazinhas estreitas e suas lojas durante o percurso. O antigo castelo fortificado, transformado no Museu Picasso, em homenagem a seu ilustre morador, domina o extremo sudeste da cidade e de lá se tem uma visão privilegiada do porto mais abaixo. Deixei para fazer uma incursão mais demorada entre as obras do pintor para outra ocasião, pois havia uma fila considerável diante da bilheteria, e a tarde estava linda demais para que eu me enfurnasse entre as pedras frias das paredes da fortaleza. Assim, me limitei a percorrer os arredores, a me debruçar sobre o muro de pedras que descortinava o mar abaixo das rochas, e a olhar para a diversidade de pessoas que também passeavam pelo local. De lá comecei a descer as ruelas com calçamento de pedra em direção a catedral e ao porto, e fiquei imaginando quantos fatos importantes, como invasões, guerras e conflitos aquelas pedras não haviam testemunhado durante todos esses séculos. Depois de cruzar a areia morna da Plage de la Gravette onde alguns banhistas aproveitavam os últimos raios de sol, caminhei até o extremo do mirante onde se via os barcos e iates, que haviam passado o dia levando seus endinheirados passageiros pelo Mediterrâneo, passando lentamente em seu retorno para manobrar e adentrar ao porto de Vauban.
- Tom Romanoli! – Ouvi minha própria voz pronunciando com um tom de espanto. Enquanto meus olhos se arregalavam para acompanhar a passagem de um iate totalmente pintado de branco, com exceção dos contornos amadeirados das janelas da ponte, parecendo um cisne altivo deslizando sobre as águas. Devia ter uns 80 pés e suas linhas eram um pouco antiquadas quando comparadas aos de outros barcos que navegavam naquelas águas. Na proa a inscrição ‘Margareth II’ em dourado e letras cursivas se destacava logo acima do escovém.
Passava das sete horas, o por do sol derramava raios dourados sobre aquele azul inigualável, quando o sujeito musculoso com quepe de oficial, misturado aos passageiros em trajes de banho no convés, fazia gestos em direção ao que estava na ponte como se fosse um código para preparar o barco na manobra de entrada do porto. A distância que o iate passava não era grande, mas eu desejei ter um binóculo para me certificar que não estava me enganando. Aquele era Thomaz Romanoli, quinze anos depois que o vi pela última vez, mas certamente era ele. Quando dei por mim, percebi que estava suando e meu corpo tremia, estava respirando aceleradamente. Só então me lembrei de que não havia comido nada desde o café da manhã dentro do trem para Nice. Eu sou jovem demais para que uma caminhada numa tarde ensolarada e algumas horas sem me alimentar pudessem estar me fazendo ter alucinações. Eu sabia que mesmo decorridas décadas eu sempre seria capaz, de alguma forma, de reconhecer o Thomaz. O homem a quem eu havia entregado a minha virgindade.
Havia escurecido quando eu finalmente consegui me recuperar do susto e voltar caminhando pelos boulevards ao longo da orla até o hotel. Estava cansado e minhas pernas mais pesadas do que eu podia supor, consequência das intermináveis horas dentro de um escritório.
- Suite 212, s’il vous plaît! – falei com a voz extenuada quando me aproximei do balcão da recepção. O sorriso receptivo quando da minha entrada não estava entre os recepcionistas.
- Bon soir, Monsieur! - Quem me estendeu o cartão-chave foi uma jovem loira platinada, que trazia os cabelos presos num coque e, que também me dirigiu um sorriso malicioso e interessado, junto com sua voz levemente rouca.
Uma vez dentro da minha espaçosa suíte, eu me despi e tomei outro banho de chuveiro. O dia tinha sido longo e quente, e eu me deliciei debaixo daquela água fria e forte, como agulhas provocando uma vibração gostosa na minha pele. Ainda enrolado com a toalha na cintura, deixei-me cair sobre a cama. Em minutos, pensando naquele iate, comecei a voltar no tempo. Mais exatamente quinze anos.
Eu estava com dezesseis anos quando estudava no mesmo colégio particular e conceituado que o Thomaz. O colégio tinha um daqueles programas impingidos à força e com contornos de politicamente correto. Não que nós adolescentes cultivássemos algum tipo de preconceito. Mas, as próprias circunstâncias faziam com que os alunos bolsistas se sentissem inferiorizados e desprovidos das mesmas oportunidades e prazeres que os demais, instalando-se um clima muito embaraçoso para estudantes e professores, que tinham que lidar com as enormes diferenças sociais dos alunos bolsistas. Thomaz era um deles. Ele já tinha dezoito anos, estava atrasado nos estudos, não porque não fosse inteligente, mas por conta da instabilidade familiar em que havia crescido. Ele era muito maior do que qualquer outro estudante da classe, podia facilmente passar por alguém com vinte e um ou vinte e dois anos de idade. Os traços de seu rosto não eram feios, no entanto, havia neles algo de perverso, especialmente no olhar duro e ameaçador. O fato de seus lábios parecerem incapazes de delinear um sorriso também contribuía para a fama que intimidava os demais. Thomaz, Tom como o chamávamos, parecia viver baseado numa certeza: de que ele sempre levava a pior no mundo e que nada haveria de mudar isso, e que o mundo todo podia se foder. O mistério em torno de seu passado era outro fato que corroborava a péssima impressão que faziam dele. Um dia, um estudante de outra classe, apareceu no colégio com uma história que circulou de boca em boca, sempre aos sussurros, nas rodinhas de garotos entre os intervalos das aulas. Muito preocupado em não ser pego em flagrante relatando os fatos, esse aluno contou que descobrira que a mãe do Tom era uma prostituta regenerada e, que estava no terceiro casamento, se é que era um verdadeiro casamento, com um mecânico de automóveis. Ninguém sabia ao certo quem era o verdadeiro pai do Tom, talvez nem a própria mãe. E que, agora convertida a uma dessas pseudo-religiões de cunho pentecostal ou neopentecostal, em cujas cerimônias barulhentas e teatrais um suposto pastor mais clama pelo nome do capeta do que faz seus fiéis refletirem sobre uma espiritualidade que lhes traga uma vida mais harmoniosa; estava levando uma vida mais regrada e discreta, embora houvesse uma porção de escândalos, inclusive prisões por andar envolvida com traficantes em seu passado nefasto, sempre envolvida com homens cuja índole nunca fora grande coisa. Tom parecia ser fruto de um relacionamento do qual ela estava tremendamente arrependida e pouco queria se recordar, motivo pelo qual ele pouco ou nenhum carinho havia recebido por parte dela. Sem uma figura paterna confiável, o garoto ia crescendo e resolvendo ele mesmo os reveses da vida, quase sempre se valendo de seus músculos avantajados que punham a nocaute qualquer desafiante ou malquisto que aparecesse na sua frente. Desde cedo ele aprendeu a conseguir seu próprio dinheiro, uma vez que nenhum dos amantes da mãe se dispunha a bancar seus luxos. E, quando o faziam, o dinheiro vinha acompanhado de uma série de exigências e reprimendas. Os outros irmãos, que conheciam seus pais, também não se afinavam com ele, o que o tornou um cara esquivo e de poucos amigos. Na verdade, esses podiam ser considerados mais comparsas do que propriamente amigos. No entanto, a parte da vida obscura do Tom o garoto deixou para o final de seu relato. Antes de ele entrar no colégio a família morava em Porto Alegre, e tiveram que se mudar de lá na calada da noite depois que a mulher do vizinho, um policial militar fuinha que tentava desde a noite de núpcias colocar-lhe um filho no ventre, apareceu grávida ao mesmo tempo em que o marido recebia os resultados de uma bateria de exames que atestava a hipomobilidade e o reduzido número de seus espermatozoides impossibilitando-o de gerar um rebento seu pelo meio convencional. Como a esposa era vista pelos vizinhos em constante companhia do Tom enquanto o marido exercia a nobre e mal remunerada função de livrar das ruas meliantes que apavoravam a sociedade, não demorou para que os rumores fizessem sua testa coçar com uma dúvida que o obrigou a tirar satisfações com o sarado vizinho. Garotão carregado de testosterona que fazia engomar suas cuecas a cada par de coxas e seios mais expostos. Não havia dúvida que a jeba do Tom frequentava assiduamente a caverna puta e larga da vizinha. O que ela se esquecera de mencionar quando o marido corno a colocou contra a parede e a cobriu de bofetadas, foi o fato de não apenas o garotão vizinho, mas dois primos do marido, um sargento do mesmo batalhão do esposo e, um cunhado mergulharem suas rolas no mesmo recinto. Quando o pobre marido ultrajado foi tentar lavar a honra com a ajuda de dois companheiros de farda, foi preciso que o Tom lhe rachasse o crânio com uma barra de ferro, forçando-o a uma estadia de quase dois meses no hospital, e aos colegas, tinha quebrado alguns dentes de um, enquanto o outro achou por bem fazer uma retirada estratégica enquanto ainda podia fazê-lo com suas próprias pernas. Naquela madrugada a família partia da rodoviária de Porto Alegre carregando basicamente as roupas do corpo.
Nosso professor de educação física era um sujeito intragável, do qual poucos alunos gostavam. Era o mais jovem dos professores, e fazia questão de se mostrar sempre muito enturmado com as garotas, que viviam suspirando por seu físico de atleta e charme de ator hollywoodiano. Nós garotos o detestávamos, pois ele nos fazia penar durante os exercícios que aplicava durante as aulas. A única exceção era o Tom que terminava a série de exercícios como se tivesse feito um leve aquecimento. Isso deixava o professor furioso e, sem o desejar, o Thomaz havia conseguido mais um desafeto, embora isso pouca importância parecesse ter na sua vida. Talvez ele já tinha se habituado a não ser querido.
Nessa época meu físico e rosto já apresentavam os sinais da proporção áurea, da qual uma amiga arquiteta veio a me instruir anos mais tarde quando eu já estava na faculdade. Segundo me explicou essa amiga, e os ensinamentos que teve durante o curso de arquitetura, tendemos a achar as coisas belas quanto mais estas se aproximarem da proporção áurea, cuja razão é 1, 618. Ou seja, a beleza, ou como a maioria de nós a concebe, se resume a medidas cuja proporção resulte nesse número, que a matemática valida, e que Leonardo da Vinci desmistificou nas medidas ideais do ‘Homem Vitruviano’. Numa brincadeira durante uma temporada de inverno passada com um grupo de amigos em sua casa de Campos do Jordão, essa minha amiga se prontificou a demonstrar que eu era tão bonito por que as medidas do meu rosto e corpo estavam muito próximas dessa proporção ‘ideal’ e, que por isso, eu fazia tanto sucesso. Enquanto todos ríamos dessa brincadeira, ela e, as outras amigas presentes, concordavam que as únicas exceções a essa regra eram os meus lábios, ligeiramente mais carnudos e a bunda bem mais volumosa o que, no entanto, me deixava ainda mais tesudo. Mal sabiam elas que minhas mãos com dedos longos e delgados, aliadas ao meu rosto imberbe e de traços suaves quase femininos serviram para que zoassem de mim na escola e, mesmo hoje em dia, eu ainda pareço um garotão a quem não dão mais do que vinte e poucos anos. E, mais ainda, que boa parte da minha timidez vinha exatamente destas características.
Certa vez durante uma dessas zoadas que faziam comigo, a brincadeira começou a sair dos limites quando quatro colegas de classe, liderados por um garoto que se julgava o mais rico do colégio, arrancaram meu short depois da aula de educação física no vestiário das quadras esportivas e começaram a me bolinar. Entrei em pânico quando um dos garotos tirou um baita cacete de borracha da mochila e intentava enfiar aquilo em mim. Eu me debatia com o rosto coberto de lágrimas, mas não conseguia me desvencilhar daquela profusão de braços e mãos.
- Vamos ver o quanto essa bundona recheada aguenta levar! – instigava o líder em sua perversidade compartilhada e aplaudida.
Eu implorava para me deixarem ir quando o Tom entrou no vestiário, vindo da biblioteca onde passara a manhã finalizando um trabalho de geografia que precisávamos entregar na aula seguinte. Tom e eu nunca havíamos trocado uma palavra. Eu o cumprimentava com um meneio e um sorriso tímido quando nos cruzávamos nos corredores do colégio, ao que ele respondia com um grunhido, e era só. Ele olhou para a cena com a mesma indiferença que olhava para tudo, por isso achei que ele fosse fazer o que veio fazer no vestiário e viraria as costas como se tudo aquilo não lhe interessasse. Mas, surpreendentemente, ele colocou calmamente os cadernos e livros que tinha nas mãos sobre um dos bancos e caminhou em silêncio na nossa direção. O garoto de segurava o cacete de borracha nas mãos não teve nem tempo de atinar como sua cabeça estava se estatelando contra os armários de metal que circundavam as paredes do vestiário, uma fração de segundo depois que um soco atingiu seu rosto. O líder enfezado tentou um revide, uma vez que achava que a superioridade numérica o favorecesse, mas seu estômago foi o alvo do segundo soco do Tom, e o atingiu com tanta força que ele se curvou procurando desesperadamente pelo ar que parecia não querer entrar em seus pulmões. Alguns débeis chutes e socos não foram suficientes para conter a fúria que brilhava nos olhos do Tom e, em menos de cinco minutos, a briga estava terminada, com um garoto sangrando pela boca e aquele do cacete de borracha chorando enquanto sua camiseta se tingia com o sangue que vinha do seu couro cabeludo. Nossos pertences estavam espalhados pelo chão, e depois de me vestir fui ajudar o Tom a pegar seus livros e cadernos. Infelizmente constatamos que o trabalho de geografia dele estava irremediavelmente perdido, pois caíra próximo aos boxes dos chuveiros onde o chão ainda estava todo alagado. Ele o atirou na primeira lixeira que encontrou quando saímos do vestiário.
- Obrigado! Não sei como te agradecer. Devo minha vida a você. – agradeci, ainda enxugando as lágrimas do meu rosto e correndo atrás dele.
- Deixe de ser dramático! Pare de chorar, veado! E vamos sair daqui antes que eles te peguem novamente. – grunhiu, sem olhar para trás.
Engoli meu choro e fomos para nossa aula de geografia. No final da aula o professor, um homem de meia idade, bastante corpulento, mas ainda em forma, começou a recolher os trabalhos que valiam como nota para aquele bimestre. Quando ele se aproximou da carteira do Tom para pegar o trabalho, ele apenas disse que não o tinha feito. Um sorriso cínico e de escárnio começou a se formar no rosto do professor.
- Estamos vivendo uma época em que alguns imbecis querem fazer com que a sociedade passe a conviver com tudo que seja politicamente correto, como é o caso desta instituição. Com isso querem que engulamos goela abaixo pervertidos sexuais, etnias cujos costumes e modo de vida nada têm haver conosco, favelados e desordeiros selvagens, delinquentes juvenis sem eira nem beira, e querem que aceitemos isso mansamente ignorando qualquer traço de civilidade que a sociedade demorou anos para burilar. Não é assim, senhor Thomaz? – discursou irônico.
- Professor! Eu posso explicar ..... – comecei balbuciando nas costas do professor.
- Cale-se! Não estou falando com você e ainda não terminei. – rosnou, sem se virar.
- Onde você acha que vai chegar com essa irresponsabilidade, senhor Thomaz? – continuou, sem se abalar.
- Mas acontece que .... – voltei a protestar
- Se eu ouvir a sua voz mais uma vez, o senhor vai parar na diretoria, senhor Eduardo. Estamos entendidos?
- Como eu dizia, o senhor quer continuar a ter o mesmo tipo de vida miserável que seus pais, senhor Thomaz? Ou pretende aproveitar essa onda de bondade que permitiu que o senhor conseguisse estudar numa instituição como essa? – as palavras dele saiam sonoras e reverberavam pela classe mergulhada num silêncio constrangedor.
O Tom se levantou da cadeira para deixa-lo falando sozinho, quando o professor o deteve segurando seu braço.
- Tire as mãos de mim! – não era mais do que um rugido feroz, e aquele brilho incendiário e destruidor estava novamente nos olhos do Tom, enquanto seus punhos se fechavam.
- Sente-se e cale .... – antes que o professor conseguisse terminar a frase um murro o atingiu na barriga saliente por cima do cós das calças, e um estertor saiu por sua boca enquanto ele se apoiava nas carteiras próximas tentando recuperar o equilíbrio.
O Tom saiu caminhando tranquilamente da sala e do colégio deixando sua mochila e pertences sobre a carteira. Fui espontaneamente até a sala da diretoria e relatei tudo o que acontecera no vestiário, omitindo apenas os detalhes mais sórdidos. Me sentia culpado pelo que estava acontecendo ao Tom. Naquela tarde a direção do colégio articulou a expulsão dele.
Depois das aulas consegui o endereço do Tom com uma das secretárias, uma quarentona divorciada sem filhos, que desfilava pelo colégio com calças muito justas, decotes avantajados que exibiam um enorme par de seios flácidos, e bastante chegada aos garotos mais atléticos. Aqueles mais dados ao exibicionismo da idade se vangloriavam de tê-la levado para a cama, e eu não sei por que, mas eu achava que o Tom também já tinha enfiado seu pau no meio daquelas coxas.
Cheguei ao endereço que ela me forneceu de ônibus. Um canto perdido da zona leste onde eu nunca estivera na vida. Depois de caminhar uns vinte minutos numa ladeira estreita e íngreme onde as casas se perfilavam desorganizadas e sem acabamento, muito próximas umas das outras, cheguei a uma construção assobradada que escalava um morro. Bati palmas por um bom tempo, antes que a vizinha enfiasse a cara para fora da janela e me dissesse que a mãe do Tom tinha ido ao supermercadinho nas proximidades. Resolvi sentar na calçada e esperar. Pouco depois uma mulher espalhafatosa em sua maquilagem carregada demais para aquela hora do dia, com os cabelos tingidos num ruivo exagerado, me perguntou o que eu queria. Era a mãe do Tom.
- Posso falar o Tom, sou um colega da escola?
- Ele ainda está na oficina junto com o pai. Devem estar chegando dentro de meia hora. Não quer entrar? – ela me examinava com interesse. Não aquele interesse com que muitas garotas me olhavam, mas com um interesse mais voltado à minha posição social.
- Se não for incomodo. Obrigado.
O Tom chegou acompanhado do padrasto pouco mais de uma hora depois, e se espantou vendo-me sentado no sofá da sala acanhada.
- Eu trouxe sua mochila. – disse num sorriso, ao qual ele não deu importância e nem respondeu. – Eu fui até a diretoria e expliquei tudo o que aconteceu. Que a culpa foi minha. – continuei, diante do silêncio dele.
- Você não devia ter feito isso. Eu sei me virar sozinho! – retrucou com a cara amarrada. – Era só isso? – percebi que ele estava se sentindo constrangido com a minha presença naquele lugar.
Solícita demais e cheia de formalidades a mãe dele reapareceu na sala com uma bandeja e uma única xícara de café.
- Acabei de passar! – exclamou, colocando a bandeja na minha frente. – Então você estuda com o Thomaz? – continuou, sentando-se ao meu lado no sofá.
- Sim senhora! Somos amigos da mesma turma. – Ele me encarou como se ao proferir a palavra ‘amigo’ eu estivesse superestimando o simples fato de estudarmos na mesma classe. Mas, não me deixei intimidar por sua expressão carrancuda.
Nesse instante o celular que ela trazia enfiado estranhamente dentro da blusa curta e justa começou a tocar. Ela atendeu a ligação e permaneceu muda durante quase todo o tempo que o interlocutor falava, apenas soltando alguns ‘a-hãs’ de vez em quando. Seu olhar mirava furiosamente o Thomaz, e eu comecei a imaginar quem deveria estar dando notícias pouco agradáveis no outro extremo da ligação.
- Seu merda! Jogou mais uma chance na privada! Quantas vezes você acha que a vida vai te dar oportunidades que você despreza? – berrava, logo após desligar o telefone e partir para cima do Tom aos tapas. – Depois de todo o esforço que o pastor fez para arranjar este colégio de grã-finos para você não continuar esse asno que é; depois de seu padrasto e eu te mostrarmos o caminho certo traçado por Jesus na cruz, e implorarmos para que você venha ao templo e receba a benção do pastor; você blasfema agredindo um professor. – ela ignorava minha presença e continuava a fazer uma cena patética. – Você é igual ao vagabundo do seu pai, um escroto que meteu o caralho nas minhas entranhas e me largou quando soube que eu estava grávida. Você tem o mesmo sangue ruim, nunca vai prestar para nada. – vociferava gesticulando os braços roliços pelo ar como se estivesse numa espécie de transe.
- Não foi culpa do Tom. O professor o ofendeu diante de toda a turma. Foi ele quem provocou tudo. – afirmei, me pondo de pé e interferindo naquela discussão.
- Toda vez que o Thomaz se mete em confusão nunca a culpa é dele, são sempre os outros que são os culpados. Eu já ouvi essa história um milhão de vezes. Mas, eu é que sei o delinquente irresponsável que tenho dentro da minha casa. Um tarado feito o pai, incapaz de manter o pau dentro das calças, e agora o miserável foi expulso do colégio! Imagine só, isso acaba com qualquer chance dele ter um futuro digno. – berrou, diminuindo o tom agressivo quando se deu conta de que estava se dirigindo a mim. Em seguida, ela saiu da sala pisando duro e chamando pelo amante.
- Temos que esclarecer toda essa confusão lá no colégio. Você não pode ser expulso por conta do que aquele desgraçado fez com você! – disse indignado.
- Acho melhor você ir para sua casa agora. – sentenciou, olhando pela janela como se nada daquilo tivesse a haver com ele.
A mãe dele retornou a sala agora acompanhada de um sujeito magro, ligeiramente careca, com um cigarro pendurado no canto da boca de lábios finos, trajando apenas uma bermuda e um par de chinelos. Seu aspecto era asqueroso. Jogou uma mochila aos pés do Thomaz e voltou a encará-lo com fúria.
- Para mim chega! Você vai deixar essa casa agora! Aqui não é lugar para você, somos pessoas descentes. – sentenciou ela, sem nenhuma compaixão na voz, e depois se colocando ao lado do amante.
- Calma senhora! Tudo vai ser explicado, tenho certeza que o Tom vai poder continuar estudando no colégio. – argumentei conciliador.
- Nesta casa mando eu! E minha decisão está tomada. Quero esse delinquente longe daqui. – proclamou insensível.
Apressei-me para alcançar o Tom depois que ele colocou a mochila nas costas e saiu porta afora sem dizer uma palavra. Apenas fiz um aceno de despedida em direção ao casal parado na porta da casa e apressei o passo para alcança-lo ladeira abaixo. Caminhamos em silêncio até o ponto de ônibus. Naquele momento aprendi que a gente sofre de acordo com a nossa capacidade de sofrer, e havia alguma coisa no Tom que me fazia recear que sua capacidade de sofrer fosse perigosamente grande.
- Para onde você vai? – perguntei quando chegamos ao ponto de ônibus.
- Não sei. Eu me arranjo. – murmurou, e eu vi que seus olhos estavam úmidos. – Sabe voltar para a sua casa? – inquiriu, desviando o rosto para o outro lado.
- Venha comigo para minha casa. – disse, de supetão. Ele não respondeu, mas me acompanhou em silêncio até em casa.
Naquela noite, durante o jantar, que o Tom devorou, quase sem dizer nada, como se não tivesse visto comida durante uma semana, eu contei aos meus pais o que aconteceu no colégio, omitindo, mais uma vez, os pormenores ocorridos no vestiário. Não era hora de eu me fazer de vítima, e eu nunca pretendia fazer esse papel.
- Uma agressão física a um professor é coisa séria. Mas, creio que as circunstâncias em que ela se deu são um forte atenuante a seu favor nesse caso. – esse era meu pai, de quem eu me orgulhava muito. Sempre sensato e capaz de mediar grandes conflitos com seus conhecimentos e argumentos.
- O que se pode fazer nesse caso, pai? – eu procurava envolver meu pai nesse assunto para dirimir um pouco a culpa que me atormentava.
- A princípio eu vou ao colégio na segunda-feira, procurar saber o ponto de vista deles. Depois, veremos. – disse, continuando seu jantar como se aquilo já estivesse resolvido. Uma causa ganha.
- Eu agradeço muito o seu interesse, senhor. Mas, creio que não há necessidade de se envolver nesse assunto. Eu pretendo deixar mesmo o colégio. – retorquiu o Tom, seguro daquilo que estava afirmando.
- Falaremos nisso depois, meu jovem. Trata-se do seu futuro, e isso não pode ser ignorado. – emendou meu pai.
Minha mãe havia ajeitado o quarto de hóspedes para o Tom e, como não conseguia dormir, bati discretamente na porta quase a uma da manhã, queria saber como ele estava. A porta se abriu em seguida, ele também não deveria estar conseguindo dormir depois de todos aqueles acontecimentos. Eu entrei, meio tímido, e fechei a porta atrás de mim. Ele se atirara sobre a cama, só de cueca, e voltou a olhar para a televisão que estava ligada.
- Como você está? – perguntei, constrangido por ele estar tão próximo de mim e praticamente nu, embora eu já o tivesse visto debaixo dos chuveiros do vestiário do colégio, mas naquela ocasião ele não me parecia tão ameaçador.
- Legal. – grunhiu. – Seus pais são muito legais por me deixarem passar a noite aqui. Amanhã vou dar um jeito e deixo vocês em paz. – emendou.
- Você não precisa ir embora amanhã. Meu pai vai ao colégio na segunda-feira, conversa com eles e depois tudo volta ao normal. – argumentei.
- Não quero voltar para lá. E eu já te disse que você não precisa se preocupar comigo. Eu vou me arranjar. – afirmou, sem desviar o olhar da televisão.
- Mas eu me preocupo. Acho injusto o que aconteceu. Quem deveria ser punido eram aqueles caras. – afirmei.
- O mundo é injusto. E, não vai ser você que vai mudar isso. – revidou ele.
- Também não vou me conformar de braços cruzados. E sei como conseguir aquilo que quero. – retruquei.
- E o que você está querendo comigo? – perguntou, encarando-me pela primeira vez desde que entrei no quarto.
- Bem, eu .... com você .... nada. Quero que você volte para o colégio, só isso. – minha voz tremia, pois ele me olhava de um jeito esquisito.
- Acho que você não sabe bem o que quer. – disse, avançando na minha direção e me puxando para o meio da cama.
O peso do corpo dele estava sobre o meu quando senti seus lábios tocando minha boca. Não esbocei reação alguma quando ele começou a enfiar a mão debaixo da minha camiseta e a dirigiu aos meus mamilos, apenas me deliciei com aquilo.
- Está com medo? – perguntou, seu hálito morno roçando meu rosto.
- Não tenho medo de você. – respondi com a voz firme.
Ele tornou a colar seus lábios nos meus com mais intensidade, e eu senti o sabor da boca dele quando sua língua me penetrou, fechei os olhos e deixei aquela sensação me invadir. Ele apertava meus mamilos em suas mãos ásperas e isso chegava a doer. Aos poucos ele foi levantando a minha camiseta até ela sair pela cabeça. Ele examinou meus peitinhos e riu.
- Peitinhos de menina moça. – sussurrou, antes de começar a lamber um dos meus mamilos.
Senti envergonhado que os bicos dos meus mamilos ficaram duros, e se projetavam no meu peito liso como crianças curiosas espiando pela janela. Aos poucos ele começou a mordiscar cada um deles alternadamente enquanto apertava entre os dedos aquele que não estava em sua boca. Não consegui conter um gemido de prazer que aquilo me causou, e enfiei os dedos de ambas as mãos entre seus cabelos. O pau dele saiu parcialmente da cueca e eu o sentia resvalando numa das minhas coxas.
- Gosto da sua boca! – disse ele, tornando a me beijar freneticamente.
Eu senti tanto tesão como nunca imaginara poder sentir. Meu corpo começou a tremer, e eu queria que aquela pele quente roçasse cada centímetro do meu corpo. Quando a mão dele entrou por baixo da bermuda do meu pijama e se fechou amassando a minha nádega eu passei os braços ao redor do pescoço dele e o puxei para junto de mim. Ele me virou de bruços e puxou a bermuda e a cueca até meus tornozelos, e depois se deitou em cima de mim. A pica agora roçava minha nádega e ele tentava friccioná-la no meu rego.
- Sabe o que eu quero fazer? – perguntou, aproximando a boca do meu cangote e me lambendo o pescoço.
- Sei. – respondi, mesmo não sabendo exatamente o que era que ele queria fazer, mas desejando que ele entrasse em mim.
- E você não tem medo do que eu quero fazer com você? – questionou, enquanto libertava o caralho da cueca.
- Eu já disse que não tenho medo de você. – respondi arfando, pois minha respiração estava acelerada e ansiosa.
Ele se levantou por instante rápido para se livrar da cueca e abriu as minhas pernas. Veio deslizando as mãos até chegar às nádegas e apartá-las expondo meu cuzinho. Um diminuto orifício, que se afundava no centro de um círculo de preguinhas rosadas e parecia pulsar por vontade própria. Os músculos dele se enrijeceram todos, especialmente os de sua virilha e projetavam o caralhão como o mastro de um veleiro. Ele parecia possuído. Eu gostei de saber que era capaz de deixa-lo nesse estado, e quando virei meu rosto com um sorriso na direção dele, ele mordeu minha nádega e começou a lamber meu cuzinho com sua língua hábil e áspera. O arfar da minha respiração se transformou em gemidos que eu tentava calar afundando o rosto no travesseiro, pois temia que alguém pudesse nos ouvir. Quando meu cuzinho estava todo úmido, ele encostou a cabeçorra do cacete nas preguinhas e começou a força-las a se abrirem. À medida que o pré-gozo dele lubrificava minhas pregas, elas iam se tornando elásticas e receptivas. Num golpe mais impetuoso elas se distenderam e a cabeçorra se alojou nos meus esfíncteres provocando uma dor aguda e lancinante, ele se assegurou de afundar a minha cabeça no travesseiro sufocando meu ganido desesperado. Depois de alguns segundos, totalmente petrificado e inerte, eu projetei minha bunda contra a virilha dele e ele começou a me penetrar em golpes brutos, sequenciais e impulsivos. Minhas entranhas se abriam para alojar aquela carne quente e pulsátil que me invadia sem refreio, e eu experimentava a melhor sensação da minha vida. Minha pelve e todo o meu ser ardiam de desejo com aquele cacete entrando e saindo ritmicamente no meu cuzinho, esfolando e rasgando as pregas que, como eu, se entregavam lascivamente aos desejos dele. Três ou quatro estocadas brutas e profundas antecederam um fluxo morno que começou a escorrer para dentro de mim, o Tom deixou escapar um som gutural que emergia do fundo do peito, e eu tive que conter as lágrimas que afloravam nos olhos embaçando a minha visão.
Ele cobriu todo o meu corpo com o dele e acariciou meu rosto. Eu sentia os pelos do peito dele, todos suados, colados nas minhas costas, enquanto a respiração dele ia se desacelerando lentamente. Encaixei meus dedos nos dele e apertei sua mão antes de colocar um beijo úmido nela. Só se ouvia o som da televisão muito baixinho se espalhando pelo quarto, e eu queria que ele nunca mais saísse de dentro de mim. Ao se levantar, algumas gotas de porra pingaram do seu cacete, e eu admirei aqueles músculos distribuídos harmoniosamente pelo corpão dele e não reconheci um garotão, mas um homem que sabia o que queria da vida.
Ele pegou uma toalha no banheiro e a umedeceu sob a torneira da pia, depois voltou ao quarto e a esfregou delicadamente entre as minhas coxas, só então percebi que estava sangrando e abri um sorriso carinhoso na direção dele. Me recostei nos travesseiros e puxei sua cabeça para o meu colo, ele adormeceu sentindo meus dedos afagando seus cabelos. Tom dormiu um sono agitado, mexendo-se em movimentos repentinos, emaranhando os lençóis e gemendo de vez em quando, como se de noite fosse prisioneiro de uma angústia arraigada que durante o dia ele evitava ou disfarçava. Fiquei um bom tempo ali, afagando seu rosto com a barba por fazer pinicando meus dedos, achei curioso que ele sendo apenas dois anos mais velho do que eu já tivesse uma barba tão densa e máscula, enquanto eu continuava tão liso quanto no dia em que nasci. Olhava para ele tão sereno e entregue às minhas caricias e me perguntava por que me sentia tão impelido a dar tanto carinho a esse garoto quase homem de quem eu nada sabia, e também, quantas vezes alguém o havia acolhido tão desinteressada e amorosamente. Adormeci enroscado nele.
O sábado amanhecera nublado com o sol fraco de inverno tentando atravessar as nuvens. Eu continuava enroscado nele e sentia um pouco de frio, embora boa parte do lençol estivesse cobrindo minhas costas. Não me lembrava de ter me coberto com ele. Meu rosto e um braço estavam apoiados sobre os pelos do peito dele, que subia e descia conforme ele inspirava e expirava tranquilamente. Na medida em que ficava mais desperto percebi que o Tom estava acordado, e fiquei encabulado de estar assim tão esparramado sobre ele, embora notasse que ele parecia estar gostando disso.
- Terminou de dormir, dorminhoco? – perguntou, com a voz mais grave que de costume, e uma expressão muito rudimentar do que parecia ser um sorriso. O primeiro que vi em seu rosto desde que o conheci.
- Foram as intensas emoções da noite passada. – respondi troçando. – Mas o que é .... Você podia ser mais discreto! – minha voz ganhando um tom de censura ao ver que o cacete dele estava duro e numa posição completamente perpendicular às pernas abertas.
- São as emoções da noite passada. – me plagiou irônico. – É inevitável, acordo assim todas as manhãs. – a voz dele estava séria novamente.
Fizemos uma porção de coisas durante o fim de semana. Conversamos mais nesses dois dias do que em todo o tempo que nos conhecíamos. Ele parecia gostar das minhas brincadeiras e piadas, e mesmo das outras coisas que eu dizia, como se houvesse descoberto um interlocutor à sua altura. Eu também nunca o vi falando tanto e tão descontraído, embora soubesse que a tragédia recente ainda pairava sobre ele. Nas duas noites seguintes também não precisei ir ao quarto dele, ele mesmo veio me buscar assim que percebeu que todos haviam se recolhido. Ele transava comigo com uma voracidade bruta e sôfrega, e a ardência no meu cuzinho já não desaparecia só quando ele tirava o caralho de dentro de mim.
Durante o café na segunda-feira pela manhã, quando eu me preparava para ir para o colégio, o Tom desceu a escada com sua mochila nas costas. Embora a menos de uma hora nossos corpos nus estivessem enrodilhados e nossas peles como que eletrizadas com aquele contato íntimo, eu nem suspeitava de suas intenções.
- Aonde você vai? – perguntei aflito, mal disfarçando minha angústia.
- Tínhamos um combinado, não é meu rapaz? Não faça nada sem pensar no seu futuro. – disse meu pai, ciente das intenções do Tom.
- Edu, você é um cara muito legal. E os senhores também! – sua voz soava decidida e firme. – Nunca alguém fez tanto por mim quanto vocês. Mas eu não posso voltar aquele colégio. Nunca me senti bem ali e, depois do que aconteceu, tenho a certeza de que de alguma forma terei mais problemas, e eu não quero passar por isso.
- Talvez possamos encontrar outra maneira de você continuar seus estudos, noutro colégio, por exemplo. – ponderou meu pai.
- Por favor, Tom. Deixe a gente te ajudar. – eu já estava quase chorando com meu sentimentalismo de menino mimado.
- Vocês já me ajudaram, me acolhendo aqui. Agora é por minha conta. – retrucou, terminando de engolir seu café.
- Você tem como se manter? – meu pai era prático e direto.
- Eu me arranjo! – ele mesmo não tinha certeza disso naquele momento.
- Então considere isso um presente, talvez ajude nesse inicio de sua nova empreitada. Mas, lembre-se de que pode voltar aqui quando quiser e que vou ajuda-lo naquilo que me for possível. – disse meu pai, depois de haver se levantado da mesa e ido ao seu escritório, voltando com um envelope onde enfiara o correspondente a dois mil dólares e estendendo-o na direção do Tom.
- Não posso aceitar isso, senhor. – ele tinha seus brios.
- Por favor, Tom. – meus olhos úmidos e perdidos o convenceram. E ele partiu.
Quando acordei a suíte estava mergulhada na escuridão, pelas portas-balcão entrava a brisa fria carregada do cheiro do Mediterrâneo. A toalha de banho havia se desenroscado da minha cintura e eu estava nu sobre ela. Senti um oco no estômago e tornei a me lembrar de que só tinha comido o desjejum do trem. Tateei sobre a mesinha da cabeceira em direção ao meu relógio de pulso e vi que passava um pouco das dez horas. O restaurante do hotel sempre muito concorrido durante o verão devia estar fervilhando, mesmo assim resolvi me vestir e descer. Precisava daquele burburinho depois de todas essas recordações. Havia uma fila de espera de mais de uma hora, informou-me o maître, quando adentrei no salão. Resolvi tentar o Grill & Bar, mais descontraído e com uma carta especialmente atraente. Consegui uma mesa no extremo do terraço com uma bonita vista do mar e da piscina do hotel. Optei por uma salada de vegetais frescos da estação ao molho de creme e ciboulette e um filé de albacora ao vinagrete de piquillos. Era tarde e eu não queria ter pesadelos também por conta do jantar. Aceitei a sugestão, quanto ao vinho branco, do garçom malhado, loiro e bronzeado que me olhava cautelosa, mas sagazmente. Isso me fez pensar que aqueles funcionários do hotel não foram selecionados ao acaso, ou somente por suas competências, eles provavelmente prestavam serviços mais íntimos a alguns hóspedes. Eu, um jovem desacompanhado, na alta temporada, com uma aparência sedutoramente bonita, e num hotel daquela categoria era um potencial cliente para esses serviços extras. Mais uma vez não desejei ter aquele corpo.
Terminei a garrafa do vinho que desceu fresco e levemente frutado pouco antes da meia noite. Nunca costumava beber tanto, no entanto o vinho era excelente e o fato dele ter me deixado ligeiramente sonolento encarei como um presságio para uma boa noite de sono. Apesar de ter deixado uma boa gorjeta para o garçom, percebi que ele ficou decepcionado. Talvez o serviço extra o tivesse deixado mais contente. Censurei-me intimamente por ter esse tipo de pensamentos, mas abri um amplo sorriso quando lhe desejei um ‘bonne nuit’ com uma voz mais sensual do que prudente. A culpa é dele, pensei, foi ele quem sugeriu o vinho.
- Bonne nuit, monsieur! ... Fais de beaux rêves. – embora sorrindo com seus dentes grandes e brancos, a frustração estava lá. E a ousadia também.
Fui para a cama assim que voltei para a suíte com uma certeza, no dia seguinte, logo pela manhã, eu ia ao porto procurar o Margareth II ou, mais especificamente, aquele homem com quepe de oficial. Ele ‘tinha’ que ser o Tom. Tive dificuldade para dormir aquela noite, pairava entre o sono e a vigília, enquanto lembranças do passado se moviam como espectros na minha mente. Na madrugada, vencido pelo cansaço e estimulado pelo vinho, finalmente caí no sono.
Passava das nove quando eu tomava o café da manhã vendo os barcos saindo para o mar. Passou-me pela cabeça que o Margareth II também podia estar deixando o porto que ficava no outro extremo da península, e que eu talvez não o pudesse encontrar. Senti um aperto no peito e deixei o hotel apressado caminhando pelos mesmos boulevards do dia anterior em direção ao Vauban.
A caminhada na manhã fresca e ensolarada desanuviou meus pensamentos. Embora inúmeras embarcações flutuassem ao sabor da maré nas docas do porto, balançando seus mastros contra o céu azul, havia grandes vazios entre eles. Depois de quase duas percorrendo os atracadouros não vi sinal algum do Margareth II. Desapontado, procurei pelo capitão do porto, talvez ele pudesse me dar alguma informação. O sujeito era um homem grande, de meia idade, com a pele morena e cabelos bem negros, grossos pelos escuros saíam do colarinho e ele me recebeu com um efusivo ‘Bonjour’. Quando perguntei pelo barco ele me conduziu até o escritório e consultou um terminal de computador, completamente compenetrado no que estava fazendo.
- Oui, Voilá! Margareth II, yacht de croisière, 26 mètres, tirant d’eau 0,85 centimètres, ... blá, blá, blá, ... propriétaire Monsieur Bryan McCornell, adresse, ... blá, blá, blá, ... commandant Monsieur Thomaz Romanoli. Destination du jour, Saint Tropez. – ele ia citando enquanto consultava a tela do computador. Estremeci quando o ouvi pronunciando o nome do Tom, e não consegui conter um sorriso quando ouvi aquele nome sendo pronunciado depois de tanto tempo. – Il devrait être de retour à la brune. – emendou.
- Merci beaucoup, monsieur! – agradeci, deixando o escritório. Até o entardecer eu teria tempo, mas não sabia o que fazer com ele, nem com a euforia que estava sentindo.
A princípio sai caminhando a esmo pelas vielas medievais de Antibes. Parava brevemente numa ou noutra das inúmeras lojas que encontrava incrustadas no casario de pedras, mas nada despertava minha atenção. Então me lembrei do Museu Picasso que deixara de visitar no dia da minha chegada a Antibes, e resolvi subir as ruelas estreitas que levavam até ele. Àquela hora não havia filas na bilheteria e circulei pelas obras magníficas com pouco interesse, estava ansioso demais para me concentrar no que quer que fosse. Olhava para o relógio no meu pulso com uma frequência doentia, os ponteiros pareciam não querer se mover. Deixei o museu pouco depois das duas da tarde, fazia calor e as ruas estavam quase desertas. Me arrependi de ter deixado o carro no hotel, teria que encarar a volta debaixo daquele calor. Durante o caminho de volta lembrei-me do sabor refrescante do vinho que tomara no jantar da noite anterior, e achei que seria oportuno aparecer diante do Tom com uma garrafa dele. Para o caso de não termos assunto para uma conversa, ele seria um pretexto e poderia deixar o clima menos tenso. Só me lembrava de ter visto um lugar chamado La Cave, no Boulevard Raymond Poincaré, onde pudesse encontrar vinhos, distava uns quatro quilômetros do hotel, mas mesmo assim resolvi encarar a caminhada sob o sol da tarde quente. O lugar parecia um templo dedicado a enofilia, os proprietários eram um casal simpático que me atendeu prontamente, e elogiou a minha escolha. Pensei no garçom do hotel, teria que agradecê-lo mais uma vez pela indicação. Depois de uma hora e vinte cheguei ao hotel, exausto, com as roupas coladas ao corpo e, ainda mais ansioso.
- Trop fatigue, Monsieur! – disse o rapaz da recepção ao me entregar o cartão-chave da suíte. Era o mesmo que fez o meu check-in, e não restava mais dúvida de que ele estava flertando comigo com aquele sorriso sedutor.
- Oui, aujourd’hui il fait vraiment chaud. – devolvi, menos encabulado. Eu devia estar com um aspecto terrível, pensei.
Eram seis da tarde e achei que me enfiar na banheira seria mais relaxante do que o chuveiro. Quando estava deitado na banheira imerso na água tépida, me dei conta de que nunca tinha ficado assim tão ansioso por um encontro e, muito menos, tão preocupado com o que o Tom fosse achar de mim. Eu não era um sujeito vaidoso, mas hoje estava usando toda a cota a que tinha direito.
O capitão do porto havia dito que o Margareth II devia estar de volta ao entardecer, o que nesta época podia ser até às oito horas da noite. Eu não queria parecer afoito feito um garotinho, mas também não queria dar chance para que o Tom talvez deixasse o porto antes da minha chegada. No carro, que finalmente resolvi tirar do estacionamento do hotel, achei que havia exagerado no perfume e escancarei os vidros para que a brisa fresca e úmida do mar volatizasse o excesso. O iate não estava na doca quando cheguei pouco depois das sete e trinta, isso só fez aumentar minha ansiedade e preocupação. Não quis voltar ao escritório do capitão do porto para perguntar se ele tinha notícias atualizadas do Margareth II, por isso caminhei pelas docas. Muitos barcos estavam regressando dos passeios ao longo da Côte D’Azur, e turistas animados e falantes desciam das embarcações mais bronzeados ou vermelhos conforme a capacidade de sua pele assimilar todo aquele sol. A maioria era composta por pessoas mais velhas, quase sempre casais de idade. Usufruíam da fortuna que acumularam durante a vida, pois uma coisa era certa, ali se concentravam poucos privilegiados dos mais recônditos cantos do mundo. As luzes ao longo das docas estavam acessas e se refletiam nas águas do porto e nas embarcações, o que parecia dar vida a elas na medida em que balançavam com as marolas. Aos poucos o movimento mais intenso foi cessando, e agora os barcos chegavam mais esporadicamente. Os passageiros desembarcavam e tratavam de deixar os deques rapidamente, era quase certo que algum programa, que entrava madrugada adentro, os esperava nas casas noturnas. Um quarto depois das oito a silhueta branca do Margareth II deslizava para dentro do porto. Ele estava todo iluminado e a fisionomia do Tom no passadiço manejando o leme com perícia fez com que minhas mãos começassem a suar. Um homem e um garotão com pouco mais de vinte anos e físico avantajado saltaram da amurada para o píer e habilmente amarraram o iate nos cabeços do cais. Fiquei a certa distância observando um grupo de cerca de oito pessoas se despedindo alegremente da tripulação e seguindo em direção à saída do porto. Pouco depois, o homem que havia amarrado o barco com o garotão, também seguiu o grupo com uma enorme sacola às costas. As luzes a bordo do Margareth II começaram a se apagar aos poucos, e eu ouvia algumas frases gritadas entre o Tom e o rapaz, relacionadas a tarefas a serem terminadas. Minhas pernas pareciam estar engastadas no cais, e demoraram a obedecer ao cérebro. Quando cheguei ao lado do iate o garotão, trajando bermuda e uma camiseta polo com a inscrição Margareth II no bolso na mesma letra dourada e cursiva do iate, surgiu no convés.
- Posso falar com o Tom? – minha voz saiu fraca e gaguejando, enquanto ele se aproximava de mim com um olhar curioso. Precisei repetir a pergunta, pois eu havia falado tão baixinho que ele, mesmo naquela pouca distância, não conseguiu me ouvir.
- Tom! Il y a voici un garçon qui veut vous parle. – havia um forte sotaque nas palavras dele, que me pareceu inglês, quando ele berrou em direção ao interior do barco.
- Oui .... – Ele não terminou a frase quando me encarou como se seus olhos estivessem lhe pregando uma peça. – Edu? – a voz saiu rouca quando me reconheceu e um sorriso começou a se formar em seus lábios. – Vous pouvez laisser, Jordan. – disse, dirigindo-se ao garotão que continuava a me examinar com tanta indiscrição que me senti como se estivesse despido.
- Oi Tom! – minha voz ainda tremia, aliás, como eu todo.
- Edu, meu ... Não acredito no que estou vendo. Como chegou aqui? – ele avançou na minha direção, passou os braços ao redor do meu tronco e rodopiou comigo no ar. Ele estava nu da cintura para cima e eu não pude deixar de notar o olhar que o garotão, ainda parado a poucos passos de nós, lançava em nossa direção.
- Estou em férias. – o rosto bronzeado dele a tão pouca distância do meu me intimidou.
- Como me encontrou? – ele estava agitado e, de repente, me pareceu tão ansioso quanto eu.
- Foi por acaso. Posso te contar tudo se você me puser no chão. – respondi. Se bem que estava gostando de estar em seus braços.
- Claro, claro! – Venha entre aqui. – ele me arrastou para dentro do convés onde a luz do barco iluminava bem as nossas faces.
Enquanto ele apertava as minhas mãos entre as suas e me examinava de cima abaixo, tive a consciência incômoda de um latejar espasmódico na musculatura anal. Uma sensação constrangedora e delatora que ele conseguiu, visivelmente orgulhoso de si, captar na pele fria das minhas mãos trêmulas. O garotão finalmente se afastou das nossas vistas.
- Edu, Edu, ... Você ainda parece um garoto. Está mais lindo do que nunca! – havia um tom saudosista nas palavras dele, e por uma fração de segundo notei tristeza em seu olhar.
Sentamo-nos nas espreguiçadeiras que estavam no convés e ele quis saber tudo o que eu havia feito nesses anos em que não vimos. Fui muito sucinto na minha narração, não por que quisesse omitir as coisas dele, mas por que estava mais interessado na história dele, que certamente era muito mais interessante do que a minha, por isso me detive mais a contar como o havia encontrado. Ele tão pouco quis falar muito sobre si mesmo e eu podia imaginar a razão disso.
- E você casou-se, têm filhos? – perguntou curioso.
- Continuou solteiro. E você? – o sorriso dele desapareceu quando ouviu minha segunda pergunta.
- É uma resposta difícil. Oficialmente sou viúvo. Legalmente sou divorciado. E, atualmente sou solteiro. – ele tentou fazer graça, mas percebi que havia algo de muito dolorido por trás daquelas palavras.
- E por que alguém tão bonito como você, bem-sucedido, e tão boa gente continua solteiro? Ou está apenas sozinho no momento? – notava que ele queria ter a certeza que eu não tinha ninguém.
- Acho que não encontrei ninguém. – fui bastante vago, no íntimo queria dizer que jamais encontrara outra pessoa como ele. Mas, não era hora de fazer declarações.
Tomamos a garrafa de vinho junto com um rápido jantar que ele preparou na cozinha do barco enquanto colocávamos a conversa em dia. O garotão não apareceu, embora eu percebesse que ele estava em algum lugar do iate. Ele me contou que o barco pertencia a um magnata americano de 83 anos, envolvido com comércio atacadista, e que usava o iate não mais do que quatro ou cinco semanas durante as temporadas. E, que todas as vezes que o fizera estava acompanhado de uma ou duas mulheres que tinham um quarto de sua idade. Depois disso ele deixava o barco a seus cuidados, inclusive liberado para que ele pudesse fazer alguns fretes e ganhar algum dinheiro, além daquele que recebia como salário. ‘Não é ruim’, disse Tom, numa referência há tempos muito piores. O homem que saíra com a sacola nos ombros e o garotão formavam toda a sua tripulação. O primeiro era um marinheiro experiente vindo da marinha mercante, e o segundo, um desgarrado americano que por algum motivo, que ele garantia não envolver a polícia, precisou deixar seu país, mas eram eficientes no que faziam e isso bastava, acrescentou. A madrugada passou sem que percebêssemos. Quando os primeiros raios da aurora despontaram sobre o mar o Tom e eu estávamos tão entrosados como se nunca houvéssemos nos separado.
- Quanto tempo você ainda fica por aqui? – quis saber.
- Minha reserva no hotel ainda tem dois dias, depois planejava seguir para Cannes e ao longo dos demais dias talvez até Toulon. Ainda tenho quase três semanas pela frente. – respondi.
- Fretei o barco para dois casais de alemães. São dois dias, a partir de amanhã, devemos ir até a Île du Levant. Com isso encerro as reservas de fretes desta temporada. O que me diz de irmos até a Córsega por duas semanas? Enquanto estou fora você pode ir até Cannes. – sugeriu. – Eu queria ter você a bordo só para mim. – acrescentou com malícia.
- Nada me faria mais feliz! Ter te encontrado foi o que de melhor me aconteceu em anos. – retorqui.
- Então estamos combinados! Na sexta-feira zarpamos cedinho. O que não impede que você passe a noite da véspera comigo. – havia desejo em seu olhar e a voz era um convite à luxúria.
- Quer que prepare ou traga alguma coisa para esses dias? – inquiri, tentando não demonstrar o quanto aquela insinuação me excitara.
- Não sou bom cozinheiro; aliás, ninguém a bordo é, se você quiser algo mais elaborado, deixo em suas mãos. – preveniu. – Para mim esse seu corpão já está de bom tamanho. – ele se aproximou de mim e me puxando pela cintura me trouxe para junto do seu peito. Um beijo longo e úmido no convés iluminado pela aurora foi trocado sem pressa e sem pudores.
- Bonjour, Monsieur! – o recepcionista do hotel sorriu maliciosamente em minha direção, como se tivesse flagrado uma criança aprontando alguma. Intimamente se censurava por não ser o responsável por toda aquela leveza e descontração com a qual eu chagava depois de uma noite não passada em meus aposentos.
- Beau jour! Beau jour! – retroquei provocativo, quando tirei o cartão-chave de suas mãos. Senti seu olhar nas minhas costas enquanto subia as escadas do saguão para as suítes.
Cannes é lugar para ver e ser visto, não resta dúvida. Me surpreendi com a quantidade de pessoas que flertavam abertamente. Tão diferente daqueles pudores latinos que eu conhecia. Ali os flertes eram ousados, as intenções explícitas, e a desistência tão rápida quanto uma centelha quando não correspondidos. Eu vagava pelas ladeiras do bairro histórico de Le Suquet explorando as lojinhas de artigos com preços estratosféricos, caminhei pelo La Croisette repleto de hotéis, lojas de alta costura e cassinos, além do famoso palácio onde são premiados os cineastas com a Palma de Ouro. A cidade definitivamente nada tem haver comigo. A ostentação de Ferraris, Mercedes, Lamborghinis e congêneres é espantosa, mulheres cobertas de joias e vestidos das mais renomadas casas de alta costura, futilidades cujo sentido passava longe da minha compreensão. Talvez fossem os meus genes tupiniquins que não me permitiam ver o glamour dessas coisas, ou o meu pensamento que naqueles dias só estava focado num homem navegando a milhas dali, e que eu sabia, me desejava. Para não dizer que passei pela Riviera francesa sem ter usufruído de seus encantos, terminei a minha última noite na cidade no terraço do Le 360, aos meus pés a marina iluminada onde os mastros das embarcações ancoradas se inclinavam de um lado para o outro, como os braços de alguém dizendo adeus, do outro lado da enseada os edifícios da orla brilhando como caixas incrustradas de pedras preciosas, atrás, a colina se elevando contra o céu estrelado. Eu não era o único solitário degustando meu vinho e admirando a paisagem, mas fui o único a ser abordado por três vezes. Duas por mulheres, uma tão jovem como eu, a outra mais vivida, e uma por um homem jovem, de pele morena e cavanhaque bem desenhado, olhos amendoados e um terno impecável e caro. Abordou-me em inglês, com forte sotaque árabe e ficou contente quando aceitei o drinque que me ofereceu. Foi muito sutil e elegante em sua abordagem, e se mostrou um cavalheiro quando o dispensei, pagando pela minha conta, frustrado, mas digno. Ver e ser visto, tornei a pensar quando voltei para o hotel.
Eu retornei a Antibes na quinta-feira à hora do jantar. Junto com o cartão-chave a recepcionista me passou um bilhete escrito em português numa folha de papel com o timbre do Du Cap. - ‘Estou a sua espera. Faça o check-out do hotel. O Margareth II será seu lar nas próximas semanas. Beijo, Tom’ -. Com um sorriso bobo ainda estampado no rosto pedi o fechamento da minha conta, antes de subir e tomar um banho, trocar de roupa e fazer as malas. Da suíte liguei para a Hertz para que mandassem retirar o carro do estacionamento do hotel. As nove e meia o motorista da Hertz me deixou em frente a entrada do porto, prontificando-se a me ajudar a levar a bagagem e as compras que eu fizera para a nossa viagem. O Tom me esperava no convés do Margareth II, descalço, sem camisa e com uma calça caqui com a barra enrolada até o meio da canela. Os cabelos dele ainda estava molhados, e ele me recebeu com um sorriso ladino estampado no rosto. Só esperou o motorista se afastar um pouco para segurar meu rosto em suas mãos e me dar um beijo voluptuoso, com a língua deslizando dentro da minha boca receptiva.
Aparentemente estávamos só nós dois a bordo. Depois de deixar minhas coisas na mesma cabine que o Tom ocupava, a maior e localizada na proa do iate, com um terraço privativo, fomos até a cozinha, de onde vinha o aroma de uma bouillabaisse.
- Você me disse que não sabia cozinhar, mas o cheiro aqui está ótimo. – disse, enquanto ele abria um Chablis que acabara de tirar da geladeira.
- E não sei. Encomendei nosso jantar para uma velha amiga. – respondeu.
- Eu imagino quantas velhas amigas você não tem que se prontifiquem a lhe fazer um jantar. – as palavras me escaparam antes que pudesse perceber. – Vi o entusiasmo com o qual as mulheres se despediram de você naquela noite quando desembarcou os turistas. – uma vez que havia começado, por que não concluir meu pensamento?
Ele riu, caminhou até o meu lado no balcão que dividia a compacta cozinha da área de refeições e apertou meu queixo com uma das mãos. Tornou a me beijar com a mesma volúpia e desejo de há pouco, enquanto tirava minha camiseta e abria o cós da minha calça. Quando estava só de cueca beliscou minha bunda.
- Mais tesuda do que eu me lembrava. – murmurou no meu ouvido, enquanto esfregava os lábios no meu pescoço.
Foi a melhor bouillabaisse que já comi, não só pela companhia, mas também por que os frutos do mar pareciam ter pulado daquelas águas azuis diretamente para a panela.
- Agradeça sua amiga por mim. Nunca comi nada tão gostoso. – provoquei.
- Farei isso! – retribuiu num sorriso cínico. Mas, não diga que nunca comeu nada tão gostoso antes de provar a sobremesa. – acrescentou, alargando o sorriso e me puxando para a cabine, enquanto eu ainda segurava minha taça de vinho.
A língua dele voltou a entrar na minha boca, insistente, lasciva, quente. Ele me fez sentar na cama e desceu o zíper da braguilha. Ele não estava usando cueca e o cacetão saltou para fora da calça, a glande brilhando de tão úmida.
- Prove! – sussurrou, colocando o caralhão bem diante da minha boca.
A rola estava muito maior do que eu me lembrava. Mas, o cheiro másculo que vinha dela era o mesmo que poluía meus pensamentos libidinosos, penetrante e afrodisíaco. Toquei delicadamente a ponta da língua sobre o meato uretral e comecei a provoca-lo, deslizando a língua em movimentos circulares ao redor da cabeçorra. A ereção dele se completou em segundos. O fluido viscoso que saia do pau dele atiçou minhas papilas gustativas e o frenesi me fez colocar aquela jeba na boca e sorver seus sabores. Tom soltou um gemido surdo e prendeu minha cabeça entre as mãos. O cacete pulsava na minha boca e eu lenta e demoradamente continuava a chupar aquela carne quente, ora com uma sutileza angustiante e ora com uma voracidade selvagem. Encarava-o com um olhar doce e submisso fazendo-o enrijecer-se de tesão. Segundos depois ele gozava na minha boca e, enquanto eu engolia aquela porra levemente amarga e ácida, ele acariciava o meu rosto. Depois, Tom me inclina sobre a cama e começa a passar as mãos enormes e grossas por cada curva do meu corpo, sente os músculos longos e pouco definidos se moverem trêmulos sob a pele imaculadamente branca e coberta com uma penugem loura que brilha dourada.
- Ah, Edu ... meu tesão! – O gemido escapava-lhe entre os dentes.
Eu olho para ele parado na beira do leito os braços fortes, as coxas grossas e peito aberto, um pescoço de touro, o rosto másculo brilhando de desejo, abro meus braços e os estendo na direção dele, em seus lábios se molda um sorriso predador. Envolvo-o em meus braços quando ele se deita sobre mim e o beijo carinhosamente. Sinto que estou arrebentando de tanto tesão, cada músculo se contrai sem que eu voluntariamente consiga controla-lo. As mãos dele percorrem minhas coxas até se alojarem nas minhas nádegas e ele começa a dedilhar o meu cuzinho. Ele as aperta, amassa, a força e a urgência fazem com que eu sinta dor. O mesmo acontece com os bicos dos peitos, pequenos e duros, que ele mordisca imprimindo o contorno de seus dentes ao redor das minhas auréolas intumescidas. Começo a abrir as pernas e as faço deslizar ao longo do corpo dele até que meus joelhos estejam na altura dos ombros dele. Ele as aparta e se aloja entre elas, volta a enfiar a língua na minha boca e o caralhão dele se aninha no meu rego. Chupo a língua dele e nossas salivas se mesclam formando um tônico que nos estimula para a cópula. Tom coloca o cabeção na entrada do meu cuzinho, tremo antecipando a dor. Num tremor mais forte, minha respiração se interrompe, então o cacetão acha o caminho e entra sugado para dentro pelos beiços do biquinho que as pregas formam. Meu ganido ecoa pela cabine do barco, enquanto o Tom sente meus esfíncteres se abrirem apertados em torno da sua tora. Sente que me possui, delicia-se com minha submissão, com a doçura da minha entrega à sua pica. O barco balança suavemente tal como um berço onde se está ninando um bebe. Ele passa os dedos pelo meu rosto contraído e encontra a serenidade absoluta, embalada pelas estocadas lentas que seu caralhão dá até o fundo do meu rabo apertado. Redescubro aos poucos o prazer da entrega total. O barulho das ondas batendo contra o cais lá fora, num ritmo cadenciado e lento, encobre os meus gemidos que parecem aderir à mesma cadência. As estocadas do Tom são vigorosas e espalham uma dor aguda por toda minha pelve; mas, não são mais tão brutas e desesperadas quanto da primeira vez que ele me teve. Ele aprendera a domar sua fúria, embora não a volúpia de seus instintos. Ele só voltou a me estocar com mais energia após seus músculos se retesarem, sentir o gozo a lhe ferver nos culhões, e liberar jatos escaldantes de uma porra morna e pegajosa no fundo do meu cuzinho. Um som gutural que emerge do peito dele como um brado triunfal reverbera pela cabine. Eu gozei em seguida, melando minha barriga e mamando com frenesi dentro do cuzinho o caralhão latejante do Tom. Ele permanece um bom tempo em cima de mim, desfrutando do arrepio que percorre sua coluna enquanto eu lhe afago a implantação dos cabelos na nuca e o beijo ao longo do queixo e pescoço.
- Edu, Edu, ... meu virgenzinho de trinta anos. – murmurou num sorriso faceiro quando viu que em minhas coxas escorria um diminuto filete de sangue.
- Não sou mais virgem! Um colega do colégio me tirou a virgindade há muitos anos. – respondi, troçando dele.
- Ele não deve ter tirado o seu cabaço direito. – continuou malicioso, oferecendo-me uma caixa de lenços umedecidos.
- Eu não diria isso. É que nunca me abri para algo tão grosso como o seu cacete. – elogiei.
- Está me dizendo que em todos esses anos nunca mais ninguém entrou nesse cuzinho sedoso? – ele sabia a resposta, mas queria ouvi-la da minha boca.
- Nunca mais conheci alguém a quem quisesse me entregar. – deixei as palavras saírem com tanta ternura que ele voltou a me abraçar, colou sua boca na minha e, de ladinho, enfiou a jeba novamente nas minhas pregas, me fazendo soltar um grito, abafado por seus lábios nos meus. Não me lembro dele tê-la tirado do meu cuzinho antes de cair no sono, quando ele já ronronava abraçado a mim.
Acordei com o sol entrando pelas escotilhas e vozes no convés, estava sozinho na cama. Quando caminhei até o chuveiro senti minhas entranhas doendo. Mais inteiro, exceto pela fome que estava sentindo, subi ao convés onde o Tom finalizava os procedimentos para zarparmos.
- Oba! Nosso hóspede acordou! Bom dia! – saudou, aproximando-se de mim e roubando um beijo rápido.
- Bom dia! – retruquei encabulado, por sentir os olhares do homem e do garotão sobre nós.
- Edu, este é o Lorenzo meu imediato, e aquele é o Jordan nosso ajudante. – apresentou-me, enquanto eu apertava a mão calejada do primeiro e dava um ‘olá’ para o segundo. – Está pronto para partirmos? – a descontração dele era evidente.
- Posso fazer um café para vocês? – indaguei, ainda constrangido por descobrir que àquela altura os dois já sabiam o que havia rolado lá em baixo, e que isso se repetiria durante as próximas duas semanas. Um ‘estamos famintos’ em uníssono me salvou do embaraço, pois tive um pretexto para sair dali.
As quase duzentas milhas náuticas entre Antibes e a costa da Córsega foram percorridas numa velocidade de cruzeiro reduzida em pouco mais de dez horas. Era o primeiro dia do outono, mas o sol parecia não se importar com o calendário, brilhou forte enchendo o Margareth II de luz e calor. O casario escalando as escarpas e o campanário da Eglise Sainte Marie Majeure em Lumio, na alta Córsega, já estavam com suas luzes acessas quando o Tom me mostrou como se fundeava uma embarcação. Durante toda a viagem eu ficava olhando para ele, gostava de vê-lo trabalhando em algo que lhe dava prazer, e percebia como ele se sentia livre e seguro de si quando conduzia o barco. Quando ele me flagrava com o olhar colado nele, dava um sorriso e me mandava um beijo pelo ar. Nenhum dos tripulantes estava usando o uniforme que costumavam usar quando fretavam o iate. Todos estavam descalços, de bermuda ou short e o torso nu. Ficava um pouco difícil manter a concentração em alguma coisa enquanto todos aqueles músculos torneados e bronzeados se moviam conforme eles executavam as tarefas. Por outro lado, eles também deviam estar enfrentando os mesmos problemas, enquanto eu tentava dar uma cor à minha pele branca, tomando sol de sunga no convés, depois de tantos anos entre Nova Iorque e Paris, sempre coberto por um terno. Íamos passar a noite a bordo e só na manhã seguinte lançaríamos o bote para chegar ao litoral e percorrer a vila. Depois de ter sido o responsável pelo almoço, fui eleito o cozinheiro de bordo, e tanto o Lorenzo quanto o Jordan me felicitaram por não serem obrigados a comer comida empacotada. Eu ainda estava um pouco tímido em relação aos dois, mas ambos foram tão discretos e amáveis durante todo o dia, que eu já me sentia parte da tripulação. Às vezes, eu tinha a impressão de que só o Tom e eu estávamos a bordo, tão imperceptíveis os dois se faziam.
O céu estava estrelado e um vento frio soprava no convés onde o Tom e eu ficamos conversando longamente depois do jantar. Embora ele estivesse omitindo as fases mais dolorosas, ele me contou como tinha sido a sua vida depois daquele dia em que se despediu de mim e dos meus pais. Ele era muito grato ao meu pai, aquele presente que ele lhe dera foi um início de jornada menos problemático. Eu precisei contar a ele por que ainda continuava só, sendo que nem eu sabia bem o porquê. Quando descemos para a cabine eu escutei o ronco do Lorenzo vindo de uma das cabines do segundo porão, onde provavelmente o Jordan também dormia. O Tom trancou a porta da nossa assim que entramos, e abriu as portas para a varanda. O que entrava por elas era uma brisa fria que apenas parecia ter sido amainada em relação ao vento do convés. Ele se despiu e se esparramou sobre a cama, recostado nos travesseiros e exibindo seu cacetão com as pernas bem apertas. Com a porta do banheiro entreaberta deixei uma água morna cair sobre meu corpo. Ao voltar para o quarto foi ele quem me estendeu os braços me chamando para junto dele. Obedeci e ele pegou na toalha e continuou a me enxugar, as mãos percorrendo minhas coxas grossas e lisas.
- Você é brutalmente bonito, isso não mudou nesses anos todos e, ao mesmo tempo, sugere uma doçura e uma sensibilidade vulnerável, não consigo evitar isso aqui. - Então afastou a toalha que me impedia de ver sua ereção. – Chega a doer de prazer, sabia?
- Não seja exagerado! Não me acho tão bonito assim, e muito menos, vulnerável, como você diz. Não corro o risco de ser violado por conta disso. – retruquei.
- O Jordan, por exemplo, ao menor descuido, é capaz de foder o seu cuzinho com a mesma voracidade de um lobo que destroça um cordeiro. Já o Lorenzo pode ser menos afoito, mas não menos predatório. A experiência o ensinou a reconhecer alguém com o dom de aplacar os latejamentos de sua virilha. Ponha uma coisa na sua cabeça, você tem a capacidade de deixar muitos homens com o pau duro com esse corpo escultural, essa bundinha arrebitada e um simples sorriso. – disse, acariciando meu rosto.
- Eu não fazia ideia de que estava vivendo tão perigosamente a bordo desse iate. – retornei, fazendo pilhéria.
- Aqui você só corre perigo se não se empenhar em deixar, este macho e esse caralho esfomeado entre as minhas pernas, completamente satisfeitos – provocou, manipulando a rola.
- Então estou salvo, pois não há nada que eu queria mais do que isso. – afirmei. Aproximei-me mais dele e dei um beijo de leve na cabeçorra arroxeada e molhada do pau dele. Pouco depois eu gania com ela atolada no meu cuzinho.
Na penumbra quente, Tom estava deitado de costas, o braço sob o meu pescoço, eu enroscado junto dele, a cabeça apoiada em seu ombro largo, e uma perna por cima dele. Tom deu um suspiro profundo. A ponta dos meus dedos brincava com os pelos do peito dele. Duas cicatrizes, longas e salientes, próximas ao flanco esquerdo há dias já haviam despertado a minha atenção. Marcas de um passado obscuro e conflituoso. Acariciei-as delicadamente como se quisesse aliviá-lo das lembranças dolorosas que elas representavam, e ele teve a confirmação de que eu o amava desde o dia em que me entreguei a ele ainda adolescente.
Os dias voaram enquanto contornávamos o litoral da Córsega e descíamos a terra para perambular pelas aldeias, praias e rochedos, como dois adolescentes descontraídos aproveitando a vida. Enquanto as noites ardiam com o desejo de nossos corpos unidos, formando um único ser vivente. Na véspera da minha partida fizemos amor no Margareth II ancorado no porto de Antibes com o frenesi primitivo e selvagem dos animais, desavergonhado, impudico e único.
- Não posso viver sem você. Não depois desses dias maravilhosos. – disse, ao beijá-lo enquanto o sêmen dele molhava as minhas entranhas.
- Você merece alguém muito melhor do que eu. – a voz estava embargada e ele saiu de dentro de mim. – Tudo em que toco em algum momento se destrói. Gosto muito de você para vê-lo sofrendo por minha causa. – ele não me encarava enquanto falava.
- Não sou tão frágil quanto você imagina. Não acha que eu sou capaz de escolher o que é melhor para mim? – eu tomei seu rosto entre as mãos e o fiz olhar nos meus olhos.
- Somos incríveis quando estamos na cama. Mas, somos muito diferentes um do outro. Anjos não convivem com demônios. – o olhar dele adquiriu um brilho triste.
- Eu, ao contrário de muitas pessoas que passaram por sua vida, não te quero só pelo sexo. Eu sei enxergar os seus sentimentos, e sei o que sinto por você. Você só precisa me dar uma chance e me deixar entrar na sua vida. – eu começava a me afligir com a possibilidade de perdê-lo.
- Você faz parte da minha vida desde o dia que o ajudei naquele vestiário. Você é a parte mais doce e serena da minha vida, e para conseguir tocá-la adiante eu preciso ter a certeza de que você sempre estará bem, e para isso eu não posso estar com você. – pronunciar aquelas palavras o martirizava.
- Isso é um absurdo! Você está sendo impiedoso consigo mesmo.
- Você é lindo e amoroso, vai encontrar um homem digno dos teus carinhos.
- Eu não quero um homem para brincar de fazer troca-troca, essa versatilidade não combina comigo, eu quero um macho de verdade. Não um homem que desempenhe o papel de macho, quando na verdade sente comichão no cu. Mulheres podem se contentar com um homem, pois não sabem diferenciá-los dos machos. É preciso ser pouco homem para satisfazer os anseios de uma mulher, por isso tantos caras se arvoram de machões diante delas, mas são impotentes quando se trata de satisfazer as necessidades muito mais exigentes de outro homem. Para isso é preciso ser macho, e estes são raros como gemas de berilo vermelho. E você é um deles.
- Bela definição! Fico lisonjeado que pense isso a meu respeito. – retrucou com um sorriso orgulhoso e acabrunhado.
Ele me penetrou mais duas vezes, ávido e insaciável. Enquanto minhas entranhas receptivas aconchegavam o cacetão dele, e minha musculatura se apertava ao seu redor, eu tive a estranha sensação de que esta estava sendo a última vez que eu o aninhava em mim, e duas lágrimas rolaram pelo canto dos meus olhos. Ele as enxugou com um beijo em cada uma.
O comboio do TGV deixou a Gare Nice-Ville rumo a Paris, pontualmente, as dezesseis e trinta e quatro. Depois da despedida efusiva do Lorenzo e do Jordan, quando me presentearam com uma miniatura de um antigo veleiro dentro de uma garrafa, abraços que me fizeram estremecer entre seus braços musculosos, e um beijo ousado e úmido do Jordan, o Tom me levou até Nice. Ele falou pouco durante o trajeto de carro até a estação, como se temesse não conseguir me deixar partir. Eu tão pouco conseguia abordar qualquer assunto, receoso de que fosse cair em prantos como uma criança desamparada. Havíamos trocado endereços de e-mail e telefones, mas algo me dizia que eu nunca receberia uma ligação ou mensagem dele. Quando o trem parou na plataforma meu peito estava tão constrito que eu mal conseguia respirar. Percebi que o Tom apertava as mãos cerrando-as como se estivesse prestes a desferir um soco.
- Bem! Acho que preciso entrar. Diga que vai sentir a minha falta. – eu passei a mão em seu rosto e me deixei puxar para um abraço que me fez sentir o calor do peito dele.
- Cuide-se! – balbuciou. Seus olhos brilhavam úmidos.
- Você é o melhor homem do mundo! Eu te amo. – sussurrei em seu ouvido com a voz embargada. – Não se esqueça de mim. – beijei-o terna e carinhosamente, passando por sobre todos os meus pudores e não me importando com quem quer que estivesse nos vendo. A minha dor era tanta naquele momento que eu não queria saber da existência de um mundo além daquilo que me fazia sofrer. Eu soluçava nos braços dele.
- Adeus, amor. – grunhiu me apertando com tamanha força que sentia meus ossos estalando.
Ele caminhou alguns passos ao lado do trem quando este começou a deslizar para fora da estação. Minha mão estava aberta e espalmada contra a vidraça da janela, sem forças para dar um ‘até breve’, quanto mais um ‘adeus’. Ele estava com o braço erguido acenando, chorava como um menino abandonado, e seus passos já não davam conta de acompanhar a velocidade do trem. O comboio saiu para a tarde nublada, uma garoa fina começou a cair lá fora, enquanto o trem ganhava velocidade fazendo as construções ao lado da ferrovia passarem distorcidas pela janela.
Passei mais um ano e meio no escritório de Paris, quando numa tarde de inverno, minha secretária abre a porta da minha sala e faz entrar meu pai e meu avô. Chegaram a Paris de surpresa, eles queriam me comunicar pessoalmente ‘algo de muito interesse para você’, como frisou meu avô em sua voz rouca e séria, que aquela altura da vida só ia algumas manhãs até o escritório de São Paulo, para não perder o hábito, como ele mesmo brincava.
- Durante esses pouco mais de quatro anos, a filial de Paris foi a mais lucrativa e dinâmica, graças a você. – meu avô tinha essa maneira de iniciar seus discursos, dando voltas. – Apesar da complexidade das causas e da demanda de novos clientes ter aumentado muito, você deu conta de tudo e se mostrou muito hábil. Não perdemos nenhum processo. – ele andava pela sala, falava comigo, mas olhava pelas janelas em direção a margem oposta do Sena, para o burburinho do Marais.
- Seu avô, tio-avô, eu e seus tios, tivemos uma reunião na semana passada. – interveio meu pai, pouco afeito às delongas do meu avô.
- Decidimos que você está pronto para integrar o grupo de sócios do escritório, e queremos que volte ao Brasil para assumir seu lugar. – meu avô apressou-se a completar seu discurso, contrariado pela interferência do meu pai, sendo ele querendo ser o portador do convite.
- Nem sei o que dizer! Estou muito feliz que estejam contentes com o meu desempenho. – até então eu era um advogado comissionado do escritório, como alguns dos meus primos e outros contratados que não faziam parte da família.
- Então faça suas malas. Dentro de seis semanas, no máximo, quero vê-lo em seu novo escritório em São Paulo. – sentenciou meu avô, num abraço caloroso e afetuoso. – Você tem futuro garoto! – ele se sentia orgulhoso por mim.
Durante esse ano e meio enviei três e-mails para o Tom que, como eu desconfiei, não obtiveram resposta; além de meia dúzia de telefonemas para o celular dele, que acabaram caindo na caixa postal. Ele era turrão, isso eu sempre soube, mas ingenuamente achava que comigo ele fosse capaz de ceder, vez ou outra, abrindo mão de seus posicionamentos. Antes de embarcar para o Brasil voltei a Antibes, fui procura-lo e, ao Margareth II, no porto de Vauban. O capitão do porto me informou que o Margareth II agora se chamava Dolores, e que não tinha notícias do antigo capitão. Quando me aproximei do Dolores, o Jordan estava pintando o lado interno das paliçadas com uma pistola de pintura. Ao me reconhecer jogou o equipamento de lado e veio me abraçar, entusiasticamente, com o torso nu e suado, me apertando com uma intimidade constragedora. Durante o jantar naquela noite no meu hotel ele me contou que o dono do Margareth II falecera seis meses depois da minha partida. Os filhos não se interessavam pelo barco e só o viam como uma despesa a ser eliminada. Venderam-no para um grego, para quem ele trabalhava, fazendo a manutenção do barco que ele havia rebatizado de Dolores. Lorenzo decidira finalmente se casar com a garota que ficou enrolando por mais de sete anos, e eles se mudaram para alguma aldeia na Provença, cujo nome ele sempre esquecia. Quando começou a falar sobre o Tom ele me encarou e, diante da minha expressão aflita e ansiosa, disse que ele fora convidado a capitanear a embarcação de um italiano que costuma frequentar a Côte D’Azur com seu iate.
- Ele se despediu de mim e do Lorenzo com um ‘até breve’, não deixou nenhum contato, e não voltou com o italiano na temporada passada. – ele ia falando devagar, sabendo que suas palavras me magoavam como se ele estivesse me cravando um punhal. Parou de falar quando viu que as lágrimas escorriam pelo meu rosto.
- Você o ama, não é? Eu nunca tinha visto o Tom tão feliz e descontraído como naquelas duas semanas do nosso cruzeiro. Eu sei que ele também te ama. – afirmou, tentando amenizar as informações, na esperança de que assim eu sofresse menos.
- Eu sei! No entanto, nem isso nem o meu amor fizeram com que ele ficasse comigo. – eu mal podia distinguir a fisionomia do Jordan do outro lado da mesa, eu chorava como nunca havia chorado na vida.