Num movimento leve, eu alcancei o rosto dele e tratei de amparar-lhe a lágrima. O beijei na altura em que ela se precipitava e suguei sorvendo mais aquele líquido expelido pelo corpo de Maurcío. De alguma maneira, eu o tinha desarmado, desprendido de sua dura armadura de cara mau. Um menino diante dos meus olhos, um menino sofrido, quiçá arrependido, que, finalmente, era meu.
Os olhos dele se grudavam nos meus e eu me peguei atento à natureza daquele encontro: Maurício era meu como o beija-flor pertence à rosa. Os meus olhos desabrochavam, porosos, diante dos deles, que bicos, me entravam, fálicos.
Eu não tinha medo, não tinha dor, não tinha nem felicidade, estava acima disso tudo. No encontro com os olhos de Maurício, ele dentro de mim, eu me sentia acima dos sentimentos, como se eles não pudessem me afetar com suas oscilações vaidosas. Eu estava completo.
"Me come, Maurício." Supliquei num suspiro choroso.
"Não vai machucar?" Veio bondoso, mas eu já podia sentir a firmeza de sua bondade se serpenteando por entre minhas coxas.
"Não. Já tá bom. Vem."
"Devagarinho?" Mordeu minha bochecha.
"É." Fiz que sim com a cabeça. "Deixa eu sentir entrar cada pedacinho."
Ele sorriu, só os dentes de cima apareciam. Os debaixo se escondiam por detrás do lábio. Eu já estava sem shorts, sem cueca, um travesseiro dobrado por baixo do meu quadril. Maurício, então, puxou minhas pernas pra cima dos seus ombros e mordeu uma de minhas panturrilhas com força.
"O que foi?" Perguntou sínico ou ouvir a minha dor escapulida num gemido. "É tudo meu mesmo. Eu mordo, sim." Me sorriu e seus olhos brilharam intensos, o fogo que dele saía, me invadia junto e me fez arder tanto mais ainda do que a mordida com que ele, por direito, me marcava a outra perna.
Quente. Como a quentura da sua glande babada a me bater à porta, impondo-se, nervosa, impondo-se a entrar e ser guardada onde lhe era o lugar. Ser recebida e acalentada, honrada como a deusa que me era e me abria e me afrouxava a se entrar.
Maurício sorria largo, o safado. O sorriso de um campeão erguendo o prêmio e alguma coisa, no olhar que me lançava, me fazia lembrar do olhar de doçura que o medalhista de ouro costuma lançar a seus colegas de prata e bronze, lá do alto do pódio. Apesar de toda a sua simpatia e adestrada modéstia, era ele quem tinha vencido e isso o fazia, de um jeito ou de outro, superior.
Maurício era meu uma ova! Eu via. Eu via que ele me olhava do mesmo jeito bondoso, e até culpado, com que eu olhava pra Fernando. Carregado de pena e pesar. Até algum cuidado. O cuidado que é devido diante da responsabilidade que se tem sobre tudo aquilo o que se cativa, ainda que não se tenha pretendido cativar nada. Se lembrar de Fernando, ali em Búzios, com a cabeça do pau de Maurício entrando e saindo pelo meu cu laceado, me causava a sensação de ter engolido uma pedra de gelo, me dar conta do olhar condescendente de Maurício me causava a sensação de estar dançando em uma fogueira depois de ter engolido lâminas afiadas.
"Para." Eu queria ter dito. Queria ter encontrado a dignidade que eu precisava pra não ver meu brio, assim, tão barateado, mas minhas zonas erógenas, eriçadas, se levantaram prontas em rebelião só ao mero pensamento de fazê-lo parar com aquilo.
Eu estava acostumado ao bronze, a não ter o meu nome mencionado nos jornais. E estar ali, convidado por ele a subir no mais alto onde ele estava, nem que fosse pra apenas uma foto – cujo flash me convidaria a retornar ao meu devido lugar de volta –, me parecia glorioso demais pra que eu desperdiçasse em virtude de algo tão pequeno quanto o meu orgulho. Acostumado ao bronze e até afeiçoado a ele; tanto que já nem me dava mais ao trabalho de competir coisa alguma.
Não. Eu não ia ter momentos felizes nesta história. Ia gozar, eu sabia que ia continuar gozando como ninguém. Até porque para alguém com minha autoestima e poder de resignação, a relação entre nós dois era como que boa, perfeita e agradável. Como que, apenas. Eu o amava. O objeto de todo meu amor, me usava. Eu não tinha forças para dizer que não queria e nem forças para não querer. Pelo menos o tinha, na brevidade que fosse, eu o tinha. Quantos apaixonados não correspondidos podem se dar ao luxo de terem aquele que amam dentro de si com tanta frequência?
Ele dizia que me amava, mas seu olhar gritava pena. Pena e desejo, se isso me servisse de alguma consolação. Até que servia.
"Aaahhhhh." Escapou-lhe um suspiro. O hino nacional de sua terra sendo entoado, mesmo a despeito do meu mais absoluto silêncio. Não sabia cantar aquela música, não reconhecia aquela língua, mas sabia bem que soava como vitória. Uma vitória que não era a minha.
Estava me gozando, se contraindo e sorrindo todo satisfeito. A rola inteira foi deixada escorregar para o meu reto, facilitada pelo leite que acabara de largar ali.
Descontraído e lambuzado, o meu esfíncter se via dado para o livre acesso do único dono que reconhecia, abraçando-o carinhosamente com suas entranhas quentes. E Maurício, ensandecido, me escavava mais profundo com seu pau que não se tinha amolecido ainda.
"Quer dentro? É?" Cutuva intenso. "Quer minha pica toda dentro de você?"
"Quero." Eu choramingava. Meu corpo queria, minha alma queria, mas meu espírito gritava que não. Nossos olhos encontrados. Os meus, divididos - não! Divididos não. Já tinham aceitado o quanto podiam receber e se davam uníssonos. Os dele, sim, divididos, ainda entre a pena e o desejo animal de, pelo menos, gozar onde gostava de vir gozar.
E eu o puxei pelo trono, o queria mais fundo, mais em mim. Que machucasse. Que arrebentasse com tudo de vez pra que o físico se equiparasse ao interior em ferimentos. Ainda que eu soubesse que pra isso, fosse necessário talvez uma espada para que ele me empalasse logo de uma vez. Aí, eu teria o equilíbrio entre as duas coisas. Mas o que eu queria mesmo era fundi-lo, confundi-lo, soldar seu pau dentro do meu cu.
Ele me dobrou ao meio, atendendo ao pedido das minhas unhas fincadas em sua costas, puxando-o pra mais dentro. Maurício me beijou e me entregou sua língua para que eu a chupasse, a sua saliva escorria pra dentro da minha boca e eu a engolia como se matando a minha sede, a minha mais insistente sede.
E o acariciava nas costas e lhe beijava o rosto, sentindo sua rola pulsar no meu intestino esporrado, que se expandia para melhor recebê-lo, piscando e mordendo-o com o amor todo que eu conseguia expressar.
"Fica dentro, meu dono. Não sai de mim." Eu implorava. "Come esse cuzinho que é seu. Seu pra você botar. Bota nele, Maurício." Meus lábios serpenteavam babados, incontidos, pela orelha dele.
"Eu fico. Saio daqui nada." Eu podia sentir que ele sorria. "Escorregando na minha porra, olha." Eu, na verdade, só podia sentir. Entrava fácil, indolor, delicioso.
Mas ele saiu de dentro. Me deitou de lado, de costas pra ele e passou o braço por volta do meu pescoço e se encaixou em mim de novo, mordendo minha orelha, de onde gemia com ferocidade.
"É a femeazinha do Maurício?" Me perguntou bombando com calma.
"É." Minha voz, instintivamente, mais fina... Eu não pensava em afiná-la, não era como se dirigisse a mim mesmo numa cena ou coisa assim, fluía, saía de mim desse jeito, menina pra ele. Era o que eu sempre fui. Era o que ele sempre me tinha feito: a menina dele. A mãe do Melocoton, a esposa, a namoradinha... E era bem mesmo tudo o que eu queria ser.
Queria que aquele leite me fecundasse, me colocasse um pedaço dele pra crescer no ventre e, então, ser, de verdade, a mãe do filho de Maurício. Minha anatomia, porém, estava bem ali pra me dizer que tal opção não constava em seu sistema. Maurício, por sua vez, não parecia saber disso.
Um braço se fechava ao redor do meu pescoço - braço este cujos pelos eu lambia e mordia com os lábios -, o outro se fechava em minha cintura, puxando-me, fazendo-me dele ainda mais, enquanto ele se movimentava empurrando o pau pra dentro e o puxando pra fora. Ele mordiscava minha cabeça. Meus cabelos, ainda cheirando a shampoo, dentro de sua boca.
Não resisti e levei minha mão ao meu próprio pau que já doía de tão rígido. Gozei, me explodindo rápido.
O meu gozo deve tê-lo enlouquecido, porque se empurrou todo para o fundo e ficou lá pulsando, jogando mais leite dele no meu íntimo. Enfiou-se o mais fundo que pôde e grudou nossos corpos no suor.
Ele ficou me beijando o pescoço calado. Foram incontáveis estalinhos que chegaram a deixar minha pele mais sensível onde tocaram. Talvez fosse um pra cada pena que sentia de mim, um pra cada culpa de me usar sabendo que eu desesperadamente o amava. E os beijos cessaram e seu som foi trocado pelo ressonar alto de Maurício que adormecera com o pau enfiado dentro de mim.
Temerário de que qualquer movimento o pusesse pra fora, me mantive quieto, imóvel, sentindo o arrepio que a respiração dele causava à minha nuca. Até que, também eu, adormeci, mais uma vez, exausto de pensar e calcular a natureza instável do que havia entre nós.
Eu queria te contar que nossos dias em Búzios seguiram cheios de outros momentos regados a amor e/ou lascívia e a mais absoluta perversão. Queria te contar que Maurício e eu ficamos horas deitados no futon sob as jiboias ou que fizemos muitas refeições inadequadas entregues em domicilio. Queria te contar das outras vezes em que ele me mijou e da vez em que eu mesmo me mijei enquanto ele mijava dentro de mim. Queria contar das mil vezes em que ele me tomou nos braços e me arrancou o fôlego em beijos tórridos. Como também queria te contar que sequei com outro beijo uma outra lágrima que vi escapar do olho direito dele quando confessou que, em vão, vinha lutando contra seu bom senso, as expectativas da minha família, a inferioridade de meu nascimento, a posição dele e que estava disposto a colocá-los de lado e me pedir que dê um fim em sua agonia por que me amava. Ardentemente.
Pra você ter uma ideia, queria poder te contar até que a estada lá seguiu regada das minhas incertezas quanto aos sentimentos de Maurício em relação a mim, ou ainda da certeza que eu tinha de que ele só estava envolvido comigo por pena ou porque gostava do domínio que exercia. Ou por causa das duas coisas, talvez.
Mas o telefone tocou antes que tudo isso pudesse ter acontecido, então, não tenho nada disso pra te contar.
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