Caio e eu pouco nos víamos durante o dia e a noite estávamos estressados para fazer qualquer coisa. Logo, os nossos programas de namorados era comer pipoca caramelada e comédia romântica. Na verdade o Caio ama os clássicos do cinema, mas ele dizia que para assisti-los era necessário estar zen. Não cobrávamos uma atitude mais animada um do outro, pois nos entendíamos e entediamos o nosso momento atual.
Passou um mês e o meu irmão chegou da viagem. Ele passou a me ligar pouco, mas eram conversas gentis. Ele ainda se preparava para arrumar o apartamento e para pedir a Gabriela em casamento. Mas pelo visto isso demoraria. Sempre apareciam empecilhos. Ele adiou, então, o pedido para o ano seguinte. Segundo os cálculos dele, seria o momento ideal para a proposta.
Um fim de semana qualquer, o amigo do meu irmão me convida para fazer um programa que há tempos eu não fazia:
- E aí, Marlon, beleza?
- Oi, beleza!
- Vamos bater uma pelada hoje? Domingão, sol. Faz tempo que eu não jogo.
- Putz, eu também. Vamos sim, deixa eu só avisar ao meu namorado e já-já eu estou aí.
Eu sabia que o Caio deixaria, pois ele não regularia uma saída minha. Além do mais, ele estava muito ocupado para me dar qualquer atenção.
- Mor, estou indo jogar bola, tá?
- Com quem?
- Com o amigo do meu irmão.
- Só vocês?
- Está com ciúmes, é? - brinquei.
- Dããã, eu não. Mas futebol não se joga com duas pessoas apenas.
- Mas é só um bate-bola. Há tempos que eu não jogo.
- Tudo bem. Volte suadinho e lindo para mim, ok?
- Hahaha.
E eu fui.
O bate-bola seria no prédio do amigo do meu irmão. Como ele não era assumido, não queria ser visto junto comigo. Eu entendia isso, já fui ele um dia.
Quando cheguei, ele me esperava no portão, sentado nas escadas e com a bola ao lado. Eu sabia que não estava atrasado, mas ele esboçava uma expressão de cansaço. Quando eu cheguei, ele sorriu.
- Me atrasei?
Ele se levantou, pôs a bola nos pés e chutou-a para mim.
- SEGURA! - gritou ele.
A bola vinha em direção ao meu peito, eu iria retrucar, mas não consegui, então segurei a bola no ar.
- Perdeu o ritmo? - me perguntou ele.
- Pô, acho que sim. - disse surpreso comigo mesmo.
- Também, faz tanto tempo que você não joga...
Entramos e fomos para a quadra. Lá nós driblávamos um ao outro. Foi muito divertido, eu sempre gostei muito de futebol. Prefiro o vôlei, mas futebol também é uma paixão. Nem vimos a hora passar. Parecia que não fazia falta outras pessoas jogando. Quando nos cansamos de verdade, ele me convidou para subir.
- Vamos lá em casa, a gente toma alguma coisa.
- Vamos.
Quando entramos no elevador, ele mudou o rumo da conversa.
- Você e o Caio estão juntos há quanto tempo?
- Pouco menos de um ano.
- É, parece que está durando.
- Vai durar muito mais que isso.
- Nossa, que apaixonado!
- Eu sou muito. - sorri.
- Eu quero um como você.
Sorri mais ainda. Fiquei envergonhado. Quando o elevador abriu, nos calamos. Depois que entramos no apartamento dele, fomos para a cozinha. Percebi que ele era bonito. No tipo físico, ele se parecia comigo: a mesma cor de pele, o mesmo tipo de cabelo bem como a sua cor, e os olhos também. Ele também era forte.
Mas ele não fazia o meu tipo. Quando eu achava que era hétero, eu dizia para mim mesmo que “tipos” não existiam. Mas eles existem sim. Mas o “tipo”, como a maioria costuma confundir, não estaciona na aparência.
Sim, ele não fazia o meu tipo por causa do físico, ele era tão forte quanto eu e isso não me agradava. Não me imaginava abraçando alguém tão... largo. Mas ele não fazia o meu tipo muito mais porque ele não tinha o charme intelectual do Caio, nem era bem humorado. Ele também se parecia muito com o meu irmão na personalidade, exceto pela homofobia. Mas eu não poderia negar que ele era bonito.
Se for para citar algo físico que me agradava nele seriam as pernas, que eram torneadas.
Ele me ofereceu suco, mas eu preferi a água. Ele sentou na cadeira em frente à minha e tomou o suco. Depois que matamos a sede:
- O Caio não tem ciúmes de você, tem?
- Não. O ciumento sou eu.
- É, eu também sou muito ciumento. Mas eu nem tenho por quem ser ciumento.
- Por que você não arrisca mais?
- Nessa cidade minúscula? Eu mal saio e encontro sempre gente conhecida!
- Mas você não está indo aos lugares certos. Vá às baladas gays. Mesmo os encubados que você encontrar por lá nunca dirão que te viram. Pelo menos eu acho.
- Não, lá tem muitos afeminados. Eu não gosto.
- Isso é preconceito!
- Não, não é. Só estou dizendo que não gostaria de namorar um.
- Mas lá tem variedade.
- É, talvez... Marlon, o Caio é afeminado?
- Não, por quê?
- Nem parece que ele é gay.
- Bem, eu me apaixonei por ele, por tudo o que ele é.
- Pelo menos é um casal bonito. O Caio é uma graça.
- Isso é verdade,
- E ele tem um jeito de menino. Parece um rapazinho de dezesseis.
- Isso é o que muito me encanta nele. - falei.
Conversamos mais um pouco e depois ele me convidou para jogar videogame. Fazia algum tempo também que eu não brincava disso. Parecia que eu estava matando as saudades do início da adolescência.
Quando fui para casa, já escurecia. Assim que cheguei, percebi que não tinha ninguém em casa, então fui tomar banho. Quando saí do banheiro, encontro o Caio no corredor.
- Nossa, que demora!
- Ele ainda me chamou para jogar Play Station, aí eu não resisti.
- Hum, que amigo mais irresistível! - ironizou ele.
- Hahaha, vem cá, vem!
- Não. Eu disse que era para você voltar suadinho. Cadê?
- Ah, esqueci.
- Pois você vai dormir no sofá hoje.
Fomos juntos para o quarto.
- Onde você estava? - perguntei enquanto caçava uma cueca.
- Na vizinha. Fui pegar açúcar para o café.
- Mas a sua mãe comprou açúcar ontem.
- Ah, eu não vi...
Enquanto me vestia, me surgiu uma dúvida:
- Caio, você é gay e não é afeminado.
- Sim, mas às vezes eu me considero. Mas por que a pergunta?
- Sério?
- Sim, por quê?
- Eu não acho você afeminado.
- Há vários tipos de afeminados, eu acho.
- Na escala de 1 a 10, você deve ser 0,1 né?
- Hahahahahaha, sei lá.
- Porque você não se veste diferente, nem fala ou se comporta...
- Ah, mas eu sinto que sou e eu penso mais como mulher que como homem. E as minhas gírias são um pouco gays.
- Não acho que isso denomine você como um afeminado.
- Mas se eu fosse, o que é que tem?
- Nada, te amaria do mesmo jeito.
- Por que essa conversa?
- O amigo do meu irmão e eu conversamos sobre isso hoje. Sobre tipos agradáveis.
- “Tipos agradáveis”?
- É, aquilo que faz o meu tipo, o que faz o dele... sabe?
- Sei. E os afeminados não fazem o tipo dele! - afirmou o Caio.
- Não.
- Mas fazem o seu?
- Não. O que eu sei que faz o meu tipo é caras como você, mais tímidos, mais magros, mais nerds. Não gosto dos grandões, gosto dos garotinhos lisinhos.
- Ui - brincou.
- Hahahahahahahaha.
- Ah, por falar no amigo do seu irmão, o seu irmão ligou para cá.
Eu me sentei na cama junto com ele e o beijei rápido.
- Ah é? E o que ele queria?
- Não sei. Ele disse que queria falar com você urgente.
- Tá, então eu vou ligar.
Eu abracei o Caio e comecei a deitá-lo na cama e a beijá-lo com selinhos.
- Hahahaha, você não vai ligar para o seu irmão?
- Daqui há pouco.
Namoramos um pouco, até os pais dele chegarem. Depois eu liguei para o Ewerton.
- Alô, Ewerton?
- Marlon, tudo bem?
- Tudo. O que houve?
- Não, é sobre o carro.
- Que carro?
- O seu.
- O meu?
- É, eu comprei outro. Se você quiser o seu de volta, eu te devolvo.
- Como assim?
- É isso. Você quer o seu carro de volta?
- Eu... eu não sei.
- Como não sabe?
- É que eu não imaginava isso.
- Bem, mas agora ele é seu, se você o quiser de volta.
- Não sei se vale a pena.
- Como assim?
- Quem vai pôr o combustível?
- Você não está trabalhando?
- Mas não ganho muito e para quê um carro nessas condições? Para sair só nos finais de semana?
- Bom, o carro está na casa do papai. Se você o quiser, basta ir pegá-lo. Eu não te contei ainda, mas me mudei para o apartamento novo já.
- Ah, que bom...
Conversamos mais alguns segundos e depois desligamos. Além da surpresa, fiquei desorientado, pois agora eu poderia ter o meu carro de volta, mas sem condições de mantê-lo.
Se o meu irmão e eu não estivéssemos passando por um período de paz, eu acharia que se tratava de uma provocação. Apesar de não ser, fiquei chateado como se fosse. Não com ele, é claro, mas com a situação. Era injusto. Decidi conversar com o Caio, que concordou comigo que era inviável manter um carro na minha posição.
Então disse não.
Meu irmão achou que era uma espécie de vingança, de chantagem emocional, mas eu lhe expliquei que não. Ele entendeu por fim.
O Caio passou a sair cada dia menos. Tom e Claudinha viajaram com suas respectivas famílias, pois ninguém da turma se manifestou acerca de uma viajem para todos.
O Augusto eu não via muito, pois ele era como o Caio, espírito livre, só que, ao contrário do meu namorado, ele estava realmente livre para curtir e o Vinícius andava sumido.
Meu novo melhor amigo era o amigo do meu irmão. A única coisa ruim era porque não eram todos os lugares que poderíamos ir, mas ele era uma companhia agradável, sempre conversávamos sobre besteiras.
- ...o insuportável é quando ficam “desliga você!”, “não, desliga você!” - disse ele.
- Ah, não é tão insuportável assim. Quando você tiver alguém com quem fazer isso, você vai saber como é bom.
- É, você está certo. Mas enquanto isso não acontece, eu ainda acho isso um tédio.
- Hahahaha.
- Como é que o Caio te chama?
- Tipo apelido? Ah, ele me chama de Marlonzinho-zinho-zinho.
- Hã?
- Hahahahahahahaha, que vergonha!
- Hahahahahahahaha.
Um dia ele ligou para minha casa e quem atendeu foi o Caio, que me chamou logo depois. Quando eu me aproximei, o Caio tampou o microfone do telefone e me perguntou:
- Desde quando ele te chama de Marlonzinho-zinho-zinho?
- Hã?
- “Hã?” nada. Desde quando?
- Ele me chamou assim? - perguntei rindo.
- Está rindo porquê? Gostou?
- Ai, Caio, nada a ver esses ciúmes.
Ele me ofereceu o telefone agressivamente e saiu chateado. Do outro lado da linha, ele me convidava para sair, mas eu disse que não podia. Depois que ele desligou, fui até o nosso quarto.
- Caio, o que te deu?
- O que deu em você para permitir que os seus amigos te chamem como eu te chamo?
- Que besteira!
- Besteira é? Ok, então eu vou ceder a vez ao seu mais novo amigo. Deixe que ele te chame assim agora. Eu só vou te chamar de Marlon, e olhe lá! - ameaçou.
- Caio, até o Tom me chama assim.
- Na brincadeira, me imitando.
- E o que é que tem de mais nisso?
- Marlon... nada, não tem nada de mais!
- Caio, o que houve? Por que você está com ciúmes desse jeito? Eu estou dando motivos?
- Ainda não, mas eu não gostei nada-nada dele te chamando como eu te chamo. Só eu posso fazer isso. Ele não te chamou na brincadeira, ele não me imitou como o Tom faz, ele te chamou assim como se fosse comum.
- Tá, eu vou dizer para ele não me chamar mais assim.
- NÃO! - gritou abruptamente.
- Por que não? - disse assustado.
- Porque o que ele vai pensar de mim? Vai me achar um idiota, que pediu para que o amigo do namorado não o chamasse mais carinhosamente por causa de ciúmes ridículos.
- Eu digo que eu é quem não gostei, pronto!
- Não, deixa para lá! - e me deu as costas.
- Caio! - chamei.
Eu fui atrás.
- Caio, me espera!
- Marlon, esqueça. Pode sair com o seu amigo.
- Eu não vou sair.
- E por que não?
- Porque não estou afim.
- Ou é porque eu não me agradei com ele hoje?
- Caio... - perdi a paciência - eu vou levar em consideração que você está muito estressado e pensando só no vestibular, ok?
Por que eu disse isso?
Ai, ai...
- Como assim, senhor Marlon? Você está dizendo que vai me ignorar porque eu estou em um momento de estresse? É isso?
- Hã? Não estou fazendo certo?
- Certo? Ok, então vamos mesmo considerar o fato de que eu estou ficando maluco e que os meus ciúmes ridículos atrapalham a sua vida social.
- Eu não estou entendendo nada.
- Você acabou de me chamar de maluco.
- Eu? Está ficando maluco?
- Não, meu querido, maluco eu já estou!
O pai do Caio chega.
- Vocês dois estão brigando?
- NÃO! - gritou o Caio, que depois saiu.
- O que houve? - me perguntou o pai do Caio.
- Ciúmes. Um amigo meu me chamou pelo apelido que o Caio me chama e ele ficou chateado.
- Mas que coisa boba!
- Pois é...
Quando eu cheguei ao quarto, ele estava no parapeito da janela, chorando. Eu não estava entendendo. Fui consolá-lo e o abracei por trás.
- Caio... - ele me interrompe.
- Não encosta em mim!
- Por que isso, hein?
- Ignore, eu sou maluco.
- Caio, eu não chamei você de maluco!
- Tá, Marlon!
- A gente vai ficar brigado?
- Marlon, ignore tudo isso. Amanhã eu esqueço tudo e você vai ver que eu sou bipolar.
- Por que você não para de dizer ironias e vamos conversar sério? Se eu errei, me diz onde e eu te peço desculpas. Não tenho problemas com isso.
- Se você não consegue enxergar onde errou, não sou eu quem vou te dizer.
- É justamente porque eu não consigo enxergar que eu quero que você me diga, para que eu possa me redimir.
- É justamente porque você não enxerga o erro que denuncia a sua insensibilidade.
Não adiantava, para o Caio eu estava errado e ponto. Então eu tirei as minhas sandálias, tirei a roupa, fiquei de cueca e fui dormir. Nem olhei mais para ele. Deitei-me e em pouco tempo caí no sono. Acordei umas três horas da manhã e encontrei o Caio no computador.
- Caio, por que você ainda está na internet?
- Porque eu quero!
- Então ainda estamos brigados?
- Não sei, talvez não estejamos, mas como eu sou maluco... vai saber né?
Não tive paciência para continuar discutindo.
- Boa noite! - e me virei para dormir.
- Isso, ignore o maluco.
Eu me levantei, me espreguicei, fiquei de pé na frente dele, pus as mãos na cintura e disse:
- Amor, vamos conversar? Você não é assim. Você é centrado, é maduro, é consciente. Não estou reconhecendo você... - ele me interrompe.
- Vai ver que eu enlouqueci!
- Essa atitude não combina com você. Vamos conversar. Se você ficou desse jeito, já vi que eu errei mesmo. Então vamos conversar!
- Descubra onde você errou.
- Por que eu disse para outra pessoa como você me chama na intimidade ou por que eu disse que você estava estressado?
- Não pergunte para mim.
- Por que você não diz logo e a gente resolve logo tudo?
- Ah, claro. Você descobre onde errou, depois é só dizer “desculpa” e tudo resolvido, não é?
- Me diga onde eu errei, para que eu não volte a errar de novo.
- Aprenda com os seus erros sozinho que aí você não volta a errar nunca mais.
- Bem, já vi que você não vai me dizer, então boa noite!
E fui dormir.
No dia seguinte, eu acordei cedo, pois iria para o estágio. Quando cheguei à cozinha, senti falta do café do Caio. Eu sou uma negação na cozinha, não sei fazer nada, então peguei um suco de caixa na geladeira e tomei com um pão duro. Não acho que ele não tenha acordado de propósito, acho que ele estava cansado, pois madrugou no computador. Mesmo assim acredito que ele não se levantaria se pudesse. Eu não ficaria chateado porque não tinha o meu café, mas sim pelos motivos pelos quais ele não faria. Parecia injusto ele ficar desse jeito por causa de palavras tão sem sentido. O que tinha de mais em outra pessoa me chamar pelo apelido? E o que tinha de mais dizer que eu iria poupá-lo de uma discussão porque ele estava estressado? Nem eu pedi para que o amigo do meu irmão me chamasse pelo apelido, tão pouco chamei o Caio de maluco. Mas eu já estava ficando maluco com essa história, pois não suportava a ideia do Caio bravo comigo. Isso me torturava muito.
Nem trabalhei direito. Cheguei em casa durante a tarde e fui logo tomar banho. Quando eu chego no nosso quarto, o Caio estava no computador. Eu nem falei com ele, fui direto para o guarda roupas. Enquanto eu procurava uma cueca, ele me informa:
- Seu mais novo melhor amigo em toda a face da Terra te ligou hoje! - disse irônico.
- Obrigado pelo recado.
- Disponha, eu estou aqui para isso.
Eu saí do quarto, não queria brigar mais. Liguei a televisão para me distrair, mas foi em vão. Eu fiquei chorando calado lá na sala. Depois que a minha cota de lágrimas tinha acabado, fui para cozinha beliscar algo. Quando eu voltei, o Caio apareceu na sala.
- E aí, ligou para o seu amigo?
- Ainda não.
- Por que não?
- Não estou afim agora.
- Pode deixar que, se ele ligar de volta, eu atendo.
- Você quem sabe.
Tentei ignorá-lo, não queria mais discutir. Ele voltou para o quarto e, pelo o que deu para ouvir das teclas, também voltou para o computador.
Eu fiquei lanchando. Ele passava vez ou outra pela sala para ir à cozinha, mas não nos falávamos.
Anoiteceu, ficou tarde e deu a hora de dormir. Não queria ir para o quarto, não queria encontrar o Caio e iniciar uma nova discussão.
Eu fui, peguei o meu travesseiro e um lençol no guarda roupas e fui dormir no sofá. Ele olhou a cena, mas não disse nada. Eu voltei a chorar de novo no sofá feito um bobo.
O meu celular tocou, era o amigo do meu irmão.
- Oi cara, beleza?
- Oi, tudo bem?
- Eu queria conversar com você, mas você não entra mais no MSN!
- É, ando sem tempo.
- Eu queria perguntar umas coisas, dar uma desabafada sabe?
- Sei...
- Mas não queria que fosse por telefone. Amanhã pode ser?
- Amanhã eu trabalho.
- Depois do trabalho.
- Tá, quando?
- Umas dezessete horas, pode ser? Eu passo aí.
- Umas dezoito, pode ser?
- Pode.
- Ok, tchau.
Quando eu desliguei, ouço a voz do Caio atrás de mim:
- Deve ser uma amizade linda mesmo. Olha a hora que amiguinho liga!
Não falei nada, nem olhei para ele. Dirigi-me ao sofá, me enrolei no cobertor e fechei os olhos. Mas ele não desistiu.
- Não vai falar nada não? Vai me ignorar?
- Caio, estou tentando evitar brigas.
- Por quê? Tem medo de descobrir onde errou?
- Boa noite, CaioNo dia seguinte, eu cheguei umas dezessete horas do trabalho, mas pedi para que o amigo do meu irmão viesse às dezoito, para que desse tempo de eu ter chegado em casa e o Caio não ter que recebê-lo.
Quando ele chegou, eu abri a porta e o cumprimentei. Ele já estava entrando em casa, quando eu disse:
- Não, vamos conversar lá embaixo.
- Tá, você quem sabe.
Fomos para uma pracinha do condomínio, sentamos em um banco e começamos a conversar:
- Eu estive pensando naquilo que você me disse, sobre eu frequentar baladas gays.
- E...?
- Não posso ir sozinho. Você pode ir comigo?
- Depende do dia.
- Ah, fim de semana, claro.
- Vamos ver, e tenho que falar com o Caio.
- Ué, chama ele também.
- Ele não está podendo sair, está estudando para o vestibular.
- Mas ele tem que sair um pouco, se distrair. É até recomendável para vestibulandos.
- É, eu falo com ele.
Conversamos um monte. Ele ainda queria saber como se comportar na balada, o que ele deveria fazer caso surgisse alguém legal, etc. e além disso, nós tínhamos muito em comum e conversávamos sobre muita coisa. Quando ele foi embora e eu subi. O Caio estava na sala assistindo TV.
- O papo deveria estar bom. Demorou tanto!
Eu não disse nada. Sentei no outro sofá e fiquei assistindo televisão. Mas ele ainda me provocava.
- Você está ensinando a ele na prática como é ser gay?
Não disse nada:
- Vai ficar me ignorando não é? Pois bem.
- O que você quer de mim?
- Nada. Absolutamente nada!
- Perdoe a minha insensibilidade. Será que você consegue?
- Conseguir eu consigo, mas será que você consegue deixar de ser tonto?
- Me diga o que fazer e eu faço.
- Não vou te dizer nada.
- Bem, então vou evitar você para o seu próprio bem.
- O que você sabe do meu bem?
Fiquei calado.
- Vai me agredir?
- Não, você está estudando muito para esse vestibular. Você não pode se estressar à toa.
- Deixe que dos meus estudos cuido eu!
- Tudo bem.
E me calei. Ficamos horas sem nos falar. Depois eu peguei o meu notebook, levei-o para a sala e comecei a adiantar alguns trabalhos.
Ficou tarde, então eu fui ao quarto pegar o travesseiro e o lençol. Quando eu voltei, ele ficou me olhando com uma cara feia.
Era uma situação insuportável. Na verdade era IN-SU-POR-TÁ-VEL. Quando eu me arrumei no sofá, ele continuou a provocação.
- É, quando a gente sabe que está errado, faz de tudo para se sentir “O Coitadinho”!
- Pois é.
- Pois é.
Calei-me.