IDAS E VOLTAS [52] ~ E a despedida da república

Depois da morte do papai, meus dias se tornaram vazios, foi difícil o recomeço, a sorte que meus amigos nunca me abandonaram.

O final do ano se aproximava e com ele vinha o vestibular, trabalhos em excesso no colégio e as provas de final de ano.

Eu estava bem no colégio, minhas notas eram boas devido ao meu rendimento nos trimestres anteriores, mas não conseguia mais olhar para os livros, trabalhos e ainda tinha o vestibular. Sentia-me cansado e sem forças pra seguir em frente.

Na academia já não aguentava mais ver as pessoas me olhando com sentimento de pena, o mesmo acontecia na republica, sentia que estava sendo um peso para os meninos.

- Quer carona hoje à noite?

- Não precisa Breno.

- Precisa sim, quero conversar com você.

Na hora da saída Breno fez questão de me oferecer à carona. Eu nunca vou esquecer a força que ele me deu nesse dia. Lembro a primeira vez que postei sobre ele aqui no conto e um leitor ainda comentou que apesar de sua forma ríspida de tratar as pessoas poderia ser um grande amigo e essa pessoa acertou, o Breno e o Rafael são como irmãos pra mim, o Breno mais ainda por ser um paizão, grande conselheiro que não tem receio em puxar minhas orelhas quando necessário e também sofre com meu sofrimento. Agora voltando à história, neste dia ele me mostrou que precisava acordar pra vida e não pensem que me deu colo ou passou a mão na minha cabeça, foi bem ao contrário e na hora eu fiquei com muita raiva, pensei em mandá-lo sumir da minha vida e me deixar em paz.

- Eu tenho notado sua tristeza e compreendo que o seu rendimento não tem sido o mesmo.

- Prometo melhorar, só tenha um pouco mais de paciência comigo.

- Você precisa entender que sua vida não parou apesar de tudo o que aconteceu.

- Ando cansado de tudo, me sinto sufocado nessa cidade, quando eu vim pra cá achei que as coisas fossem diferentes.

- Você não é o único que passa por isso, Sandro.

- Não foi justo o que aconteceu. – comecei a chorar.

- Você não está em condições de ir pra republica, dorme lá em casa essa noite.

- Não, eu quero ir pra casa.

- Não posso te deixar em casa assim, você não está em condições nem de trabalhar, foi um erro ter te aceito na academia abatido desse jeito.

Mesmo com minhas desculpas, ele fez o retorno e rumou a caminho do seu apartamento.

Chegamos a casa dele e logo ele deu um jeito de me emprestar uma bermuda que cabia quase três Sandros dentro, mas o que valeu foi à intenção.

Tomei um banho e quando saí, ele me aguardava com uma mesa posta pra degustarmos um lanche.

- Senta aqui e vamos conversar.

- Desculpe te dar trabalho depois de um dia cansativo na academia.

- Eu entendo sua dor, mas eu não quero você entregue ao sofrimento, isso não te faz bem e nem as pessoas que estão a sua volta.

- Estou tentando ser forte, mas tem horas que é difícil.

- Eu sei Sandro, mas tenta imaginar a situação de seus amigos, eles estão tentando te ajudar, porém não sabem o que fazer porque você não está se ajudando.

- É mais forte que eu.

- Já pensou se o Tiago fica sabendo que você mal se alimenta, não estuda, só chora?

- Não conta nada pra ele, por favor, o Tiago já tem problemas demais, não quero ser um peso na vida dele.

Eu já falei com os meninos e prometemos te ajudar, seria injusto com o Tiago que também está sofrendo e tendo que cuidar de tudo sozinho.

- Eu sei.

- Embora ele tenha o apoio da Paula, é muita coisa pra ele.

- Eu prometo que vou melhorar.

- Eu confio e sei que vai porque se não melhorar, você terá que fazer um tratamento psicológico.

- Eu não tenho problema nenhum só me sinto cansado e desanimado.

- Você quer uns dias de folga?

- Eu não quero ficar em casa parado sem fazer nada, vai ser pior.

- Aproveite a folga para estudar, passar no vestibular que era desejo do seu pai e seja o garoto aguerrido que sempre foi.

- Pra que passar no vestibular se ele não está mais aqui pra comemorar comigo?

- Eu não estou ouvindo isso de você, Sandro, por favor, seja homem e encare a vida de frente.

Eu estou sofrendo, poxa!

- Estou vendo você se acovardar pra vida, cadê suas ambições?

- Pro inferno com ambições, de que me adianta querer algo, se nada dá certo na minha vida.

- Porque você não se joga ai no chão ou dá uma cabeçada na parede?

- Está maluco, quer que eu me machuque?

- Não é você que está dizendo que a vida não presta, então vai, acaba com ela, jogue-se pela janela.

- O que você está pensando que eu sou?

- Os fracos agem assim.

- Eu não sou um fraco.

- Ah não é, então me prova com atitudes.

- Eu vou te provar e ainda vou jogar meu diploma na sua cara.

Comecei a chorar e o Breno que já estava sendo grosseiro perdeu a calma;

- Vamos parar com isso! – disse ríspido quase gritando.

- Você não entende o que é sofrimento?

- Chega de ser chorão, você já não é mais uma criança e não é o único que sofre na face da terra.

Enxuguei minhas lágrimas e fiquei olhando pra ele assustado.

- E não me olha com essa cara de cão valente, como eu disse Sandro, estude e passe, será uma forma de homenagear seus pais, seu irmão, seus amigos e todos que estão torcendo por você

Como, se não estou conseguindo me concentrar nos estudos?

- Tendo atitudes de homem, chega de se achar o prejudicado, seu tempo de adolescente revoltado acabou.

- Você não entende o que estou passando.

- A partir de hoje não quero mais choro e nem reclamações, chega de lamentações, você tem dezenove anos, acorda pra vida garoto.

- Eu estou tentando, será que você não percebe que o que está me pedindo vai além da minha vontade?

- A maturidade chegou cedo pra você, não perca essa chance que Deus está te dando.

- Eu vou tentar.

- Tentar? Não, quem tenta não sai do lugar, você vai conseguir!

- Eu vou embora, não preciso ficar aqui ouvindo ofensas a essa hora da noite.

Antes de pagar minhas coisas ele foi até a porta e abriu.

- Vá, o caminho está livre.

- Você não vai me levar em casa?

- Você acha que as pessoas têm um carrinho disponível quando querem? Tem táxi, tem ônibus, aproveita e vai.

- Já está tarde, esse horário fica complicado pegar um ônibus e estou sem dinheiro pra pagar táxi.

- Agora você é dono da sua vida, cadê o dinheiro do seu trabalho?

Fiquei durante longos minutos pensando nas duras palavras que ele me falou, algumas até me magoaram, mas cheguei à conclusão que ele tinha razão.

Desculpe Breno você tem razão.

- Ainda bem que você entendeu que é para o seu bem.

- Eu sei.

- Cada palavra que eu disse pode estar doendo agora, mas um dia você vai me agradecer.

- Eu vou terminar o ensino médio e passar no vestibular você vai ver.

Ele se manteve durão e nem se quer me deu um abraço, lembro que foi até o quarto pegou um lençol e um travesseiro, me indicou o caminho do quarto e deixou claro que nosso assunto estava encerrado.

Depois que eu me deitei comecei a chorar e pensar em tudo que ele me disse, foi à última vez que chorei pelos meus pais pra me lamentar pela perda. Breno tinha razão, choro não os traria de volta e a única maneira que eu tinha de tê-los perto de mim era me dedicando aos estudos.

No dia seguinte acordei cedo, tinha aula e fazia quase uma semana que não ia. As palavras de Breno vinham a minha mente constantemente como se fosse à gravação de uma musica que você ouve insistentemente até decorar. Às seis horas da manhã já estava de banho tomado e pronto para pegar um ônibus e ir até a republica buscar meu material.

Já estava de saída quando Breno apareceu na sala.

- Bom dia Breno!

- A cama não estava boa?

- Estava ótima, mas eu tenho aula.

- Vai à aula, isso é ótimo! Já lanchou?

- Tenho que passar na republica pegar meu material, vestir meu uniforme e está cedo ainda.

- Quer que eu te leve?

- Não precisa! Como você disse, eu tenho que me virar sozinho.

- Sandro...

- Eu entendi tudo e fique tranqüilo, não estou chateado.

- Tem dinheiro pro ônibus?

- Tenho vale transporte.

- Vale transporte é para o seu trabalho, se quiser eu te empresto.

- Eu me viro Breno, pode deixar, estou bem.

- Está certo então, se precisar de alguma coisa me procura.

- Eu sei que posso contar com você.

- E a folga?

- Eu não posso aceitar, ia pegar mal para os outros funcionários.

- É um adiantamento de férias que se justifica, pois você está passando por um momento difícil.

Juro que me casaria com você se não fosse hétero. – ele sorriu, viu que estava brincando.

- Olha o respeito comigo garoto, sou seu chefe.

- Eu nem te considero meu chefe.

- Não?

- Está mais pra irmão do que pra chefe.

- Neste caso, se não me obedecer eu posso até dar umas palmadas na bunda.

- Você teria coragem?

- Se não obedecer eu bato, nem experimente me enganar.

- Você falou quase igual a minha mãe ela era assim.

- Então não me decepcione.

- Valeu pelo puxão de orelha eu vou caprichar nos estudos e vou conseguir.

- Assim é que se fala.

- E a namorada, quando sai, essa casa está precisando de uma mulher.

- Não gostou da estadia? Eu não sinto diferença.

- A Poliana é linda. – ele caiu na risada.

- Ela é linda, mas não existe clima pra isso.

- Ah Breno deixa de ser chato e exigente, por acaso você quer uma princesa??

E porque não?

- Ah não acredito?

- Estou brincando, mas pra rolar tem que ter química.

- Neste ponto eu concordo com você.

- Ah, tenho uma novidade pra te contar.

- Qual?

- Visitei o Alexandre, ele está bem, está trabalhando e te mandou um abraço.

- Ele se lembrou de mim?

- Ele gosta muito de você.

- Eu também gosto muito dele.

- Acredita que ele quer se casar?

- Tão novinho e já quer casar?

- Também acho, mas minha irmã dá todo apoio, inclusive está fazendo casa pra ele e pediu para ajudá-lo.

- E você vai ajudar?

- Claro, quero ver meu irmão feliz.

- Fico feliz que você aceitou meu conselho, mesmo eu sendo imaturo serviu pra alguma coisa.

- Quem disse que você é imaturo?

- Já fiz tanta loucura na vida e tem horas que eu penso se estou no caminho certo.

- Você ainda gosta do Juliano?

- Eu gosto dele, mas não consigo aceitar o que ele fez comigo, você sabe, em relação ao Augusto.

- Como eu disse, nesse assunto eu não me meto.

Estou com outro carinha, ele é legal, bacana, mas às vezes se droga.

- Isso é grave.

- É grave, mas a maneira dele agir comigo torna esse detalhe tão pequeno.

- O Tiago sabe disso?

- Sabe e disse pra eu agir com cautela.

- Seu irmão está certo, mas não deixe de ser feliz por causa da opinião dos outros.

- Agora eu que fiquei surpreso.

- Não faça como eu que estou ficando velho e sozinho. A vida é muito curta, aproveite.

- Até parece que você é velho?

- Tenho 34 anos, o que você acha?

- Achei que você tinha 28 ou 29.

- Engano seu, estou ficando velhinho.

- Porque você não aproveita esse conselho e aplica na sua vida também?

- Estou pensando nisso, mas preciso ir com calma, pois já tinha me acomodado há muito tempo.

- Ainda bem que você está acordando porque ninguém consegue viver sozinho.

- Eu sabia que você ia me dizer isso. – disse rindo.

- Olha essa casa, está bem organizada, mas falta o toque de outra pessoa.

- Ehhh, você vai se atrasar garoto.

- A melhor coisa que aconteceu comigo aqui em Belo Horizonte foi ter te conhecido.

- Eu pensei que depois da briga de ontem você estivesse me odiando?

- Como eu posso odiar uma pessoa que só quer o meu bem.

- Que bom Sandro, eu gosto de você e ainda bem que o sermão de ontem serviu pra alguma coisa.

- A proposta da folga ainda está valendo?

- Está, vai querer?

- Vou aceitar, mas quando estiver perto do vestibular, pode ser?

- Pode, mas porque não tira agora que você anda desanimado?

- Essa noite eu chorei as últimas lagrimas de lamentação pelos meus pais, a partir de hoje, vou chorar só quando tiver boas recordações.

Essa conversa que eu tive com Breno, foi na segunda quinzena de novembro. Devido às faltas, perdi trabalhos e tive que correr contra o tempo, mas com ajuda da Adriana, Christian e João eu me recuperei e consegui concluir o ensino médio.

DezembroÚltimo dia de aula, nem acredito que terminamos. – disse João sorridente.

- E quem diria que terminamos o ano como dois namorados.

- Você foi meu maior presente que aconteceu esse ano, eu te amo Sandro!

- Mesmo eu te abandonando nos últimos meses?

- Queria ter te ajudado mais, mas eu me sentia tão fragilizado perante seus problemas, me desculpa.

- O que passou, ficou no passado e a partir de agora é vida nova.

- Isso quer dizer que estou em seus planos.

- Você me provou que está mudando.

- Que tal começarmos essa nova fase comemorando a conclusão do ensino médio?

- E que venha o vestibular.

- Estou feliz por ver você alegre novamente.

- Juntos nós somos fortes.

- Vamos pra minha casa, faz tempo que não curto meu namorado.

- E sua mãe?

- Ela te ama tanto quanto eu.

- Ah, que exagero João.

- Não é amor, minha mãe gosta muito de você, vamos?

- Vamos antes que eu me arrependa.

João ligou para a mãe dele que preparou um almoço bem legal pra nós, ele tinha razão, ela gostava de mim e fazia questão da nossa amizade.

- Dona Marta desculpe a intromissão, mas o João insistiu tanto que eu viesse.

- Não me chame de dona garoto, não sou tão velha assim. – disse ela rindo.

- Desculpe, lhe chamei assim por respeito.

- Você é muito educado, mas aqui estamos todos em família e você pode me chamar de Marta que eu não fico triste.

- Minha mãe também não gostava que a chamassem de Dona Sílvia.

- E ela não estava certa?

- Acho que sim, meus amigos se divertiam quando me visitavam. Ela ficava brincando com eles e chamando atenção pelo tratamento formal.

- Você gostava muito dela, né?

- Muito.

Eu gosto muito de você e ficaria muito chateada se não viesse a minha casa por vergonha.

- Mãe, nós temos uma novidade. – disse João jogando seu material em cima do sofá.

- Então me contem o que é, adoro novidades.

- A novidade é que nós passamos, não é João?

- Agora estamos livres do ensino médio.

- Meus parabéns meus filhos, vocês sofreram tanto e se sacrificaram que merecem esse diploma.

- João e eu queremos mais e agora vem o vestibular.

- Este é apenas o começo e eu tenho outra novidade pra contar.

- Que novidade, João?

- O que é meu filho?

João veio em minha direção, segurou minha mão e encarou a Marta.

- Sandro e eu estamos namorando.

- Eu já imaginava. – disse ela com a maior naturalidade.

- Já?

- Vocês estão sempre juntos, não sou tão boba que não percebo as coisas.

- E o que a senhora acha do nosso namoro?

- Faço muito gosto, o Sandro é o melhor genro que eu poderia ter.

- Fico feliz pelo seu apoio porque eu estou pensando em ir mais além. – disse ele me surpreendendo.

- Mais além, como assim?

- Eu quero me casar com você.

- Casar?

- Sim amor, eu quero que você venha morar conosco, tenho certeza que mamãe vai nos apoiar. O que a senhora acha?

- Vocês já têm o meu apoio, mas pensem bem antes de qualquer decisão.

Fiquei louco de vergonha, ela encarou com tanta naturalidade que eu até me assustei.

- Então amor, aceita?

- Você está brincando, né João?

- É sério, você acha que não podemos morar juntos?

- Não sei você me pegou de surpresa, tudo é muito novo pra mim.

- Você tem medo por causa do meu vicio, já fez três meses que estou limpo.

- Não é por isso, é que a idéia de casamento nunca me passou pela cabeça.

- Você pode morar aqui, nós dividimos a casa, não é mesmo, mãe?

- Por mim não tem problema meu filho, mas cabe ao Sandro essa decisão.

- Então amor, aceita?

- Acabei de perder meu pai e mal tenho dinheiro pra me sustentar.

- A gente dá um jeito e se precisar eu também posso trabalhar.

- Isso é loucura João.

- Minha mãe vai nos ajudar, aceita?

- É a decisão mais louca da minha vida.

- E?

- Eu aceito.

João fez uma festa veio ao meu encontro e me abraçou, depois ficou rodando comigo pela cozinha, enquanto a mãe dele só ria de nós dois.

Depois de almoçarmos, a mãe dele saiu e ficamos de donos da casa, só então a ficha caiu, deitei no sofá e fiquei imaginando que logo faria parte daquela casa.

João aproximou de onde estava e passou a mão em minha cabeça acariciando meu cabelo.

Amor.

- Oi.

- Tem um lugarzinho pra mim nesse sofá?

- Tem sim, deita aqui ao meu lado.

Cheguei bem próximo ao encosto do móvel e ele deitou.

- Estou muito feliz que você aceitou meu pedido.

- Seu maluquinho, você me surpreende a cada dia.

- Gostou da surpresa?

- Muito, mas me preocupo, somos tão imaturos, tenho medo de fazer você sofrer ou me magoar.

- Tenho minhas fraquezas, mas estou fazendo tratamento e prometo que nunca vou te magoar.

- Eu fico muito feliz por essa evolução, você mudou bastante, por isso tem que continuar o tratamento pra continuar fazendo efeito.

- Eu prometo que não vou abandonar o tratamento.

- Posso te fazer uma pergunta bem pessoal.

- Claro amor, agora entre nós não pode mais haver segredos.

- A sua mãe é estrangeira? – ele sorriu e brincou com a ponta dos dedos no meu nariz.

- Já deu pra perceber?

- Eu já percebi, só não sei de que país ela é.

- Essa é uma parte da minha vida que eu quero que você conheça.

- Fico feliz que você pensa assim, me transmite confiança.

- Eu não nasci em Belo Horizonte.

- Não?

- Vim morar aqui depois que meu pai passou no concurso da polícia civil em 2002, logo em seguida ele foi chamado pra atuar numa cidade vizinha a BH.

- Isso é muito pessoal e se você quiser não precisa me contar.

- Faço questão que meu namorado saiba quem sou por completo.

- Lindeza, foi por isso que me apaixonei por você.

- Mamãe é Argentina, meus familiares maternos são de Paso de Los Libres e meu pai é de Uruguaiana.

Fiquei pensativo depois que ele me contou, então as reclamações que João tinha do pai faziam sentido, principalmente quanto ao abandono.

- O que foi?

- Fiquei pensando em algumas coisas.

- Em quê?

- Não imaginava isso, fiquei surpreso.

- Você é a primeira pessoa que estou contando sobre minha vida.

- Fica tranqüilo, pode confiar em mim.

- Os familiares do meu pai, meus avós e tios ainda moram lá, assim como minha vó materna e meus tios por parte de mãe também residem em Paso de Los Libres.

- Então aqui em Belo Horizonte você não tem familiar?

- Tenho dois primos que vieram estudar aqui, eles moram em republica assim como você.

- Porque vieram estudar tão longe?

- No inicio eles vieram morar conosco, mas ai não deu certo e mudaram pra uma republica.

- Por isso você disse que se afastaram?

- Eles não se afastaram, meu pai os expulsou.

- Se seu pai os expulsou foi porque eles aprontaram?

- Foi e não foi.

- Não entendi.

- Meu pai me culpa até hoje, porque foi com eles que descobri minha sexualidade.

- Agora faz sentido o seu comportamento em relação à sexualidade.

- Foi da pior maneira possível.

- Seu pai pegou vocês?

- Por isso que eu odeio ser passivo, é muito triste, não gosto nem de pensar nisso.

- Você não tem que se julgar por isso, o sexo é uma coisa natural e acontece com qualquer pessoa.

- Quando meu pai veio de mudança eu tinha 10, meu primo mais novo, o Alex tinha 16 e o Anderson 18.

- Eles vieram com vocês?

- Não! Quando eles vieram já fazia quase um ano que morávamos aqui. No inicio foi tranqüilo, nós já nos conhecíamos e a aproximação nos uniu mais ainda, até que um dia numa brincadeira o Anderson ficou nu e pediu pra chuparmos o pau dele.

- O irmão também?

-Também!

- Você era novinho.

- Era novinho, mas aprendi a malandragem desde cedo. – disse rindo.

- E eu pensando que era esperto, mas em termos de viadagem você me ganhou.

- Já fiz muita loucura, não sei se foi pra chamar atenção ou porque estava no sangue mesmo. – disse ele rindo, era muito engraçado.

Depois disso, toda vez que ficávamos sozinhos em casa, fazíamos sexo oral um no outro e deu certo porque meus pais nunca desconfiaram.

- Quanto tempo vocês ficaram nessa brincadeira?

- Quase um ano, ate que um dia o Anderson queria mais, então o Alex deu pra ele e eu fiquei com vontade, mas não tive coragem.

- Acho que jamais teria coragem de fazer algo assim principalmente com irmão.

-Você nunca se envolveu com nenhum primo?

- Nunca, o primeiro cara que eu me envolvi foi o Roger e já estava com quase dezessete.

- E o Juliano?

- Ele surgiu num dos piores momentos da minha vida, tinha perdido o Roger pra Aline, mamãe estava doente e mesmo com todos os problemas o que vivemos foi muito intenso e só não deu certo por causa do ex dele.

- Ele não é seu primo?

- Não, mas é quase, minha tia que o criou.

- A minha primeira vez como passivo foi com o Anderson, eu tinha quatorze e depois fazíamos troca-troca entre ele, Alex e eu, até que meu pai nos pegou.

- E aí?

- Papai os expulsou de casa e me deu uma surra que fui parar no hospital.

- E quando foi isso?

- Eu tinha quinze.

- Por isso você criou esse bloqueio quanto a sua sexualidade?

- Prometi ao meu pai que nunca mais faria isso.

- E depois?

- Cumpri minha promessa enquanto eles foram casados.

- E sua mãe aceitou que ele te batesse sem questioná-lo?

- Ele sempre se fazia de vítima, disse que ela era culpada de tudo, que não cuidava da casa e um monte de mentiras e desculpas que me embrulha o estômago só em pensar.

- Por isso você ficou chateado?

- Eu não gosto daqui, odeio essa cidade.

- Por quê?

- Meu pai veio pra trabalhar em outra cidade e nos deixou morando aqui a própria sorte.

- Ele não morava com vocês?

- Ele inventou uma desculpa que aqui era mais desenvolvido e a mamãe era boba aceitava tudo. Enquanto meus primos estavam conosco eu não reclamei, depois que fiquei sozinho é que não deu mais pra aguentar a solidão, ela trabalhava e eu tinha que me contentar com a TV e o videogame.

- Foi aí que você foi trabalhar com ela na loja?

- Foi e infelizmente conheci a Ana que você já sabe no que deu.

- Sua mãe deveria gostar muito dele pra aceitar tanta humilhação.

- Precisou ela ver a amante dele grávida pra tomar uma atitude.

- Ela deve ter pensado em você, não é fácil pra uma mulher sozinha cuidar de um filho numa cidade grande como Belo Horizonte.

Ele nunca gostou da minha mãe, nem quando era segurança particular.

- Isso na sua cidade natal?

- Papai sempre trabalhou nesse ramo desde os dezoito anos.

- E como eles se conheceram?

- As cidades são vizinhas, mas o movimento ocorre mesmo em Uruguaiana e minha mãe costumava freqüentar as festas na cidade e numa dessas, eles se conheceram.

- Eles namoraram por muito tempo até ela engravidar?

- Ela não gosta de falar sobre isso, mas eu sei por que ouvi numa briga, papai a acusando de golpista, que foram três encontros e ela engravidou.

- Nesse ponto seu pai exagerou.

- Quando mamãe soube que estava grávida, ele já andava com outra e nem queria mais saber dela.

- Sua mãe é nova ainda, quantos anos ela tinha?

- Quinze.

- Nossa, ela era novinha e seu pai?

- Meu pai é bem mais velho que ela.

- Dá pra perceber pelas fotos.

- Na época ele tinha 27 anos.

- Sua mãe foi muito inocente, mas graças à inocência dela você existe.

- Eu sou um enjeitado pelo pai, um fardo que ele teve que ser obrigado a carregar até hoje.

- Não fala assim João, de algum jeito ele deve gostar de você.

- Você diz isso porque não o conhece.

- João, só mais uma curiosidade, aqueles dois rapazes que estavam com você quando nos escondemos na igreja eram seus primos?

- Não, está maluco?

- Me veio essa idéia louca na cabeça.

- Depois que meus primos saíram daqui de casa não tive mais contato com eles, os dois querem distancia de mim.

- Você acha que seu pai fez alguma coisa pra eles?

- Acho que não, eles ficaram com medo e se afastaram.

- Seus pais não falam deles?

- Meu pai deve saber, mas não fala.

- E sua mãe?

- Nós já conversamos sobre isso, mas ela sempre afirma que não sabe de nada.

- Não deve saber mesmo.

- Também acho.

- E agora, como você se sente depois de desabafar?

- Em paz.

- Fiquei muito feliz por você se abrir comigo, assim fica mais fácil para eu te ajudar.

- Não quero que você sinta pena de mim.

- E quem disse que eu tenho pena de você?

- É melhor assim, agora vamos matar a saudade e comemorar nosso recomeço.

Ele aproximou, me deu um beijo e seguimos nos abraçando ali no sofá. Quando estava com João eu me sentia bem. Pensar que tinha passado por tantas coisas naquele ano e justamente a pessoa que menos imaginava estava em meus braços dizendo que me amava, era tudo que eu precisava pra seguir em frente.

- Vamos para o quarto, lá é melhor, quero matar a saudade do meu namorado.

- Preciso tomar um banho.

- Tomamos juntos e depois podemos nos curtir até a hora de você ir para o trabalho.

- Então vamos.

Ele levantou do sofá me estendeu a mão e fomos para o banheiro. Lá enquanto tomávamos banho nos beijamos muito, beijei lambi e chupei todo seu corpo e João fez o mesmo comigo. Saímos do banho, e ele sempre carinhoso me envolveu com uma toalha, bem diferente das primeiras vezes que nos relacionamos e foi bruto comigo.

Secamos-nos e fomos pra cama e novamente ele muito amável foi beijando meu corpo pegou meu pau e chupou me fazendo contorcer de prazer. Não consegui controlar e gozei em sua boca, João veio e me beijou me fazendo sentir o gosto do próprio sêmen. Virou-me de bruços e beijando meu corpo ate chegar a minha bunda, abriu minhas nádegas e enfiou a língua em meu cuzinho me fazendo gemer de prazer, começou a me alargar enfiando dedos, deitou sobre meu corpo e disse em meu ouvido.

- Eu te amo e a partir de hoje esse quarto será nosso.

João iniciou a penetração, doeu um pouco fazia mais de mês que não transávamos, mas seus beijos e carinhos me acalmaram, deixaram-me ainda mais excitado, então ele aumentou a velocidade e o prazer foi aumentando. Mudamos pra posição de frango assado ele foi punhetando meu pau até que gozamos, foi simplesmente maravilhoso.

Deitamos de lado um acariciando o outro levemente, nos olhando trocamos alguns selinhos e só então me dei conta do que ele havia me falado há pouco.

- Quando você vai trazer suas coisas?

- Primeiro preciso conversar com meu irmão?

- Você já é adulto, porque precisa do aval dele?

- Não é isso, nós sempre fomos assim e eu me sentiria mal se tomasse qualquer decisão sem o conhecimento do Tiago.

- Ele te conta tudo que se passa na vida dele?

- Eu sempre fui o primeiro, a saber, das decisões dele, foi assim no noivado, no casamento, mas não se preocupa, o Tiago é tranqüilo.

- Tomara que ele não seja um empecilho porque você já é adulto e tem condições de tomar suas próprias decisões.

- Você pensa assim porque não tem um irmão como eu tenho, não fica chateado, o Tiago é uma espécie de pai pra mim, além de ser meu irmão.

- E quando eu tenho essa resposta?

- O mais rápido que você imagina.

Conforme prometi ao João, falei com Tiago e ele não gostou muito da ideia, disse que eu estava tomando uma decisão em cima das mágoas que havia sofrido no passado e poderia me arrepender trazendo sofrimento a todos, mesmo assim, falou que independente da minha decisão, iria me apoiar.

O mais difícil e complicado na minha decisão foi deixar a republica. Os meninos acharam que eu estava cometendo uma loucura. Ouvir a opinião deles me deixou pensativo se estava seguindo no caminho certo, mesmo assim, segui o que meu coração mandava.

Antes de minha saída combinamos uma rodada de pizza numa pizzaria e foi lá que Lucas me contou da reconciliação de Roger com Aline, apesar de não me surpreender, fiquei triste pela decisão dele em não conseguir se livrar do medo que o impedia de ser feliz.

Depois do encontro com Juliano quando meu pai esteve hospitalizado não o avistei mais, meus amigos me disseram que ele havia viajado para o Canadá com os tios, foram passar o final de ano com Junior.

Outro que seguido eu conversava pela internet era o Diego, estava estudando e ficou muito chateado porque não pode me dar um abraço quando meu pai faleceu, mesmo assim me deu todo apoio mesmo que virtual. Ficou surpreso com a notícia que eu ia me casar com João e só acreditou mesmo quando Rafael confirmou que estava deixando a republica.

Outra que não gostou muito da minha decisão foi Adriana, mesmo assim ela me apoiou.

No dia da mudança a republica também estava quase vazia, período de férias a galera se mandou pra casa dos pais, ficaram somente Rafael e Pedro. A despedida foi bem complicada, chorei me emocionei e só não desisti porque estava curtindo muito minha relação com o João.

- Não sei por quanto tempo seu lugar vai ficar vago, mas se não der certo volte que você será sempre bem-vindo. – disse Rafael emocionado.

- Obrigado por me aguentar e dividir o mesmo quarto.

Tentei ser forte, mas acabei chorando abraçado ao meu amigo.

- Não se esquece da gente.

- Jamais Pedrão e nem pense que vou me afastar daqui.

- Se você fizer isso, vou até sua casa e te dou um puxão de orelhas.

- Eu jamais os deixarei Rafael.

- É bom mesmo. – disse ele tentando conter a emoção.

Em Janeiro de 2011 mudei para a casa do João por poucos dias, pois logo nossa vida teria uma reviravolta.

CONTINUA…


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Ficha do conto

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Nome do conto:
IDAS E VOLTAS [52] ~ E a despedida da república

Codigo do conto:
217602

Categoria:
Gays

Data da Publicação:
06/08/2024

Quant.de Votos:
3

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