Bernardo [44/45/46] ~ Meu pai descobre que sou gay

Eu estava quebrado, dolorido, com o rosto coberto de sangue e me sentindo a pior pessoa do mundo. O que eu faria? Pra onde eu iria? Pra quem eu podia pedir ajuda? Eu dirigia sem rumo pela cidade. As pessoas nos carros me olhavam assustadas, como se eu tivesse saído de um filme de terror. Quem dera fosse apenas ficção aquilo.

Eu pensei em Pedro, mas depois lembrei que ele provavelmente só me bateria mais. Eu pensei em Rafael, mas me lembrei que ele agora namorava, que não podíamos nem mais sermos amigos porque a namorada dele não aprovaria uma amizade com seu ex-namorado. Eu pensei em Alice, mas lembrei que ela faria perguntas demais, se envolveria demais, e eu não queria isso. Eu pensei em ir para o hospital, mas lá eu teria que explicar o que aconteceu comigo.

Eu temei comigo mesmo que tudo o que precisava fazer era tomar um analgésico e descansar. Eu comecei a dirigir para casa. Meus irmãos e minha mãe estavam em Porto Alegre. Meu pai estava trabalhando e a empregada só chegava perto da hora do almoço, ainda estava muito cedo. Ninguém saberia. E assim eu fiz.

Como eu entrei pela garagem com o carro, o porteiro não me viu. Ele não contaria nada aos meus pais. Ao sair do meu carro, senti novamente a falta de ar e as dores. Eu me segurei na lateral do carro e tive que esperar por alguns minutos até ter forças pra continuar meu caminho. Com dificuldade, fui caminhando arqueado até o elevador e me escorei na parede dele enquanto ele subia. Ao chegar ao meu andar, novamente com muita dificuldade, peguei minha chave e abri a porta do meu apartamento. Me virei, tranquei a porta e me escorei nela por um momento de olhos fechados, criando forças pra próxima caminhada até o meu quarto. Meus olhos se abriram com o barulho daquela xícara se espatifando no chão. Meu pai me encarava completamente branco, como se todo o sangue tivesse sumido do seu rosto. A xícara de café que ele segurava tinha virado mil pedaços no chão. Nos encaramos por alguns poucos segundos sem reação.

Estava tudo acabado. Ele estava me vendo todo ensanguentando, sujo e quebrado. Que explicação aquilo poderia ter? Eu teria que lhe contar tudo. Ali, na frente dele, na frente daquele homem que sempre me pareceu uma muralha de força, eu comecei a chorar. Minhas lágrimas caiam pesadamente e minha garganta começou a se fechar. Eu não tinha mais forças para continuar com aquilo. Meus olhos se fecharam como se tentassem expulsar toda aquela dor. Meus joelhos cederam e eu caí no chão sem forças.

_Bernardo!

Meu pai correu até mim e levantou meu tronco.

_Bernardo! Acorda! O que aconteceu?!_ ele estava desesperado.

Eu nunca o tinha visto naquele estado. Abri os olhos e vi seus olhos vermelhos, à beira do desespero também. Sua camisa, antes impecavelmente branca, agora estava toda manchada com o sangue do meu rosto. Ele achava que eu estava morrendo. Eu não conseguia lhe responder que eu ia ficar bem, que eu só precisava descansar um pouco. Me faltava ar, me faltavam forças para me concentrar até em falar ou em manter os olhos abertos.

Meu pai era um homem forte. No auge do seu desespero, ele me pegou no colo e saiu correndo comigo para o elevador. Eu já tinha dezenove anos, eu era bem alto, eu deveria estar pesado, mas mesmo assim ele conseguiu. Não que eu duvidasse que ele conseguiria. Além de ser um homem forte, na hora do desespero surgem forças que você não poderia acreditar que tinha.

Minhas lembranças dali em diante ficaram embaçadas. Eu começava a sucumbir às dores. Eu me lembro dele me colocar no banco de trás do seu carro e sair dirigindo como um louco da garagem. Lembro de ouvir muitas buzinas, dele e dos outros, enquanto tentava correr pelas ruas engarrafadas da manhã de uma grande cidade. Chegando ao hospital, ele novamente me carregou pra fora. Lembro de olhar em seus e ver lágrimas represadas. Eu nunca o tinha visto daquele jeito. Ele entrou na emergência gritando, mas eu não conseguia saber o que ele gritava. Talvez nem fizesse sentido o que dizia. Eu me lembro de ouvir “meu filho” muitas vezes. Logo, várias pessoas trajando roupas verde-água estavam em volta de mim. Começaram a mexer em mim e me colocaram numa maca. Me senti me deslocando rapidamente.

_O que aconteceu com ele?_ perguntou uma voz desconhecida.

_Eu não sei!_ era a voz do meu pai _Ele chegou em casa assim!

_Será que foi assalto?_ falou a voz desconhecida.

_O celular, a carteira e a chave do carro ainda estão no bolso._ falou uma outra voz desconhecida.

Eles descobririam. Não havia como esconder. Tudo foi por água abaixo. Pobre do meu pai, passando por tudo aquilo e ainda teria que escutar tanto. Me afligi pelo que viria em seguida. Com a dor física crescente e a minha mente em estado de esgotamento, meu corpo cansou e eu desmaiei enfim.

[...]

Abri meus olhos com dificuldade. Eu me sentia tonto. Eu estava com o pijama do hospital e deitado na enfermaria. Havia outras pessoas nas camas por perto. Meu braço estava ligado a uma máquina que fazia pingar soro. Olhei atordoado em volta. Uma enfermeira jovem e meio gordinha veio sorridente para mim.

_Que bom que você acordou.

_Cadê meu pai?

_Ele foi até em casa buscar uma roupa pra você vestir. Graças a Deus você não teve nada demais, apenas hematomas e esse corte no seu rosto. Não quebrou nada. O médico vai te dar alta hoje mesmo.

Eu olhava atordoado em volta tentando me situar.

_Você desmaiou devido a uma queda de pressão. Situações limites fazem isso com a gente. Estamos te dando um analgésico de porte médio e ele vai conter a dor.

_Ah...

_O que aconteceu com você?

Foi só ele falar isso e tudo voltou a minha mente. O pai de Tom me batendo e me xingando. Toda a dor emocional voltou e meus olhos se encheram de lágrimas.

Desculpe!_ a enfermeira falou assustada _Não é da minha conta. Descanse um pouco, seu pai já vem.

Passou mais alguns minutos e meu pai apareceu. Ele parecia cansado. Ele tinha trocado de camisa, mas ainda havia algumas manchinhas de sangue no seu pescoço. Seu olhar estava abatido. Eu nunca o havia visto assim. Nem parecia meu pai. Quando seus olhos se encontraram com os meus, eles pareceram se aliviar. Ele veio correndo e começou a passar a mão nos meus cabelos.

_Você está bem?

Meu pai nunca foi uma pessoa carinhosa. Ele não era autoritário e severo como o meu avô materno, mas tampouco era daqueles pais que abraçava e beijava os filhos a todo momento. Não era uma coisa ruim, era apenas a personalidade dele. Por isso era assustador vê-lo assim, me acariciando. Seu olhar sempre foi firme e decidido, e sua expressão era de pura força. Mas agora ele parecia outra pessoa.

_Sim, estou melhor. Desculpa pelo susto.

_O que aconteceu, meu filho?

_Você falou com a minha mãe?_ perguntei.

_Não, não consegui achá-la. Mas depois eu vou ligar de novo.

_Não fala com ela._ eu pedi e ele me olhou ressabiado _Pelo menos, não por enquanto.

_Por que? O que aconteceu, Bernardo?

Eu tremi. Eu teria que ter a tão temida conversa com ele. Como escapar? Não conseguia pensar em nenhuma mentira, nada que pudesse explicar aquela situação.

_Não agora, não aqui._ falei desviando o olhar _Em casa.

Ele voltou a me fitar com a expressão séria que lhe era de costume. Eu não ousei olhá-lo diretamente, mas eu podia jurar que de alguma forma ele sabia. Ele era inteligente. Ele estava montando a história sozinho na sua cabeça.

Naquele mesmo dia à noite, o médico me deu alta. Apenas me prescreveu alguns analgésicos e pediu que eu voltasse em alguns dias para tirar os pontos do corte no meu supercílio.

No carro, indo pra casa, meu pai se virou pra mim.

_Eu quero saber o que aconteceu. Já estamos a sós.

Eu comecei a ficar inquieto no carro e ele percebeu. Como escapar daquilo?

_Em casa, pai...

_Não. Agora._ ele falou firme.

Era como ele sempre falava com a gente quando éramos crianças. Ele não precisava gritar, apenas a força da sua voz era o bastante para impor respeito. Não vendo saída, com meu mundo prestes a desabar de vez, comecei a chorar. Ele não se comoveu. Ele sabia que tinha alguma coisa errada.

_Você foi assaltado?_ perguntou sem me olhar, se concentrado no trânsito.

Balancei a cabeça negativamente.

_Foi algum colega seu de faculdade?

Eu hesitei em responder.

_Responda._ ele falou _Eu posso muito bem ligar para Alice e perguntar. Mas eu quero ouvir de você.

_Não, não foi um colega.

_Então, quem foi?

Eu fechei os olhos. Não tinha mais como escapar daquilo.

_O pai de um colega.

Eu não precisei dizer mais nada. Era como se ele sempre soubesse. Era como se eu tivesse lhe dado a última peça do quebra-cabeça. Ele rangeu os dentes e apertou com força o volante do carro.

_Onde ele mora?

_Não, pai..._ falei choramingando.

_Onde ele mora?!_ ele gritou.

Nunca tinha visto meu pai gritando, ainda mais comigo. Eu me encolhi no banco amedrontado.

_Por ali..._ falei começando a guiá-lo em direção à casa de Tom.

O que ele ia fazer? Meu coração parecia que ia sair pela boca a qualquer minuto. Em pouco tempo, chegamos à casa de Tom.

_Desce._ ele falou firme.

_Não, pai, eu...

_Eu disse pra descer.

Eu não tive como negar. Desci do carro tremendo de medo do que viria a seguir. Ele desceu também batendo a porta. Ele bateu a campainha e fez sinal pra que esperasse ao seu lado. Eu achei que alguém fosse atender no interfone e nos impediria de entrar, mas não, alguém abriu o portão. E era o pai de Tom. Só a sua figura foi o suficiente para eu me lembrar de tudo o que tinha acontecido naquela manhã, como se eu pudesse ter esquecido por um segundo sequer. Instintivamente, me recolhi atrás do meu pai. Aquele senhor me olhou com raiva.

_É ele?_ perguntou meu pai sem tirar os olhos do pai de Tom.

Eu não respondi, pois antes de qualquer coisa, o pai de Tom falou primeiro:

_Você é o pai desse viadinho?

Eu não vi mais nada. O meu pai, sempre tão centrado e frio, partiu com tudo para cima daquele homem. Eu olhei incrédulo. O meu pai era um homem forte, ele começou a socar aquele cara e não deixou que ele lhe acertasse um golpe sequer.

_Eu vou te ensinar a bater nos filhos dos outros!_ ouvi meu pai falando entre rosnados e barulhos de soco.

_O que é isso?!_ gritou uma voz feminina.

Duas sombras saíram de dentro da casa: uma mulher de meia idade, que devia ser a mãe de Tom, e o próprio. Ao olhar nos seus olhos, encontrei a única pessoa ali mais assustada do que eu.

_Eu vou chamar a polícia!_ gritou a mãe de Tom.

Meu pai saiu de cima daquele homem e, ainda com raiva na voz, apontou o dedo pra mulher e disse:

_Chama! Aproveita e conta pra polícia como esse desgraçado espancou meu filho e mandou ele pro hospital.

Ele estava suado e ofegava muito. O pai de Tom gemia contorcido no chão e virado de barriga pra baixo. A mulher não sabia o que fazer.

_E prestem bem atenção._ falou meu pai apontando o dedo para Tom em especial _Se qualquer um de você chegar perto do meu filho novamente, eu juro que não vou parar com alguns poucos socos. Estão avisados.

Ele saiu como uma besta pra fora e me puxou com ele. Entrei no carro assustado. Era tudo surreal demais. Eu não acreditava no que meus olhos tinham visto.

Apertando o volante com força, o meu pai se virou pra mim ainda com raiva nos olhos:

_Você pode ser o que quiser na vida, Bernardo, eu não me importo._ ele foi falando e fui escutando assustado com o seu tom _Mas tem uma coisa que eu não admito. Eu não te criei pra ser um covarde. Eu não te criei pra ser fraco. Você deixou que aquele homem te batesse o quanto quisesse, e sabe lá Deus o que ele te disse. Você é fraco, Bernardo, e eu não poderia estar mais decepcionado com você do que estou agora.

Aquelas palavras me marcaram fundo...


A luz da manhã feria meus olhos. Ainda estava muito cedo, não devia ser mais do que seis ou sete da manhã. Eu não conseguira dormir. Mesmo com todos os analgésicos que havia tomado, eu não consegui pegar no sono. Sim, eles aliviaram minhas dores físicas, mas não havia nada que acalmasse a minha mente.

Tudo o que tinha acontecido no dia anterior passava pela minha cabeça como se fosse um filme. Ao mesmo tempo que parecia distante, como se tivesse acontecido com outra pessoa, a dor que eu sentia me trazia de volta e garantia que tudo tinha acontecido de verdade. Os analgésicos podiam curar as dores do meu corpo, mas cada um daqueles hematomas estava marcado com as palavras daquele homem. Todos os nomes de que ele havia me chamado enquanto me batia, haviam penetrado no meu sangue através dos meus ferimentos e me corroíam como veneno. E não havia antídoto para aquele veneno, pois ele não era químico ou biológico, mas psíquico. Eu fui envenenado ao ponto de realmente acreditar nas palavras dele. Eu sempre vi a minha homossexualidade como um desvio, uma coisa errada, mas eu nunca me odiei por causa disso. Só que a partir daquele dia, eu não era mais apenas um perdido garoto gay, eu era uma bicha imunda e desgraçada. Eu passei a me ver assim. Era quem eu sempre fui, mas não queria ver. Não havia mais lágrimas pra chorar, então aquela confirmação só me trouxe mais angústia. Eu encarava o teto perdido, sem saber o que fazer da vida. Que lugar eu tinha nesse mundo agora? Que direito eu tinha de caminhar entre as outras pessoas? Eu era digno de continuar vivo e convivendo com outros?

E havia meu pai. “Ele te aceitou! Ele entendeu tudo e não reagiu a isso, então está tudo bem.” Sim, mas não era uma surpresa. Eu nunca vi traços homofóbicos no meu pai. Apesar de o assunto nunca ser discutido na minha família, desde pequeno eu observava as pequenas reações dele às notícias ou ao comportamento de gays perto dele. Ele não era a pessoa mais amigável do mundo com gays, mas também não era a pessoa mais amigável do mundo com não-gays. Assim, não me surpreendi com sua reação positiva. O problema sempre foi minha mãe. Ela sim era homofóbica, e já tinha dado provas suficientes para isso. Só que ela era casada com meu pai. O meu pai era muito correto, ele nunca manteria segredo dela sobre uma questão tão importante sobre um dos seus filhos. Assim que ela chegasse de viagem, ela ficaria sabendo e isso era torturante. Era como aguardar pacientemente pela hora da morte num pelotão de fuzilamento. Era contar os segundos para o momento que você mais evitou na vida.

Eu não queria levantar da cama. Eu queria ficar lá pra sempre, ou até que tudo passasse, até que todos esquecessem. Eu não tinha nenhum ânimo para levantar e continuar vivendo. Eu não tinha forças para isso. Dentre tudo o que já me foi dito sobre mim e minha personalidade, nada poderia ter sido mais cruelmente sincero do que a acusação de meu pai que eu era fraco. Eu era! Eu não fui forte o bastante para amar Rafael. Eu não fui forte o bastante para lutar pelas minhas amizades. Eu não fui forte o bastante para ajudar Eric, a despeito do que as pessoas pensariam. Eu não fui forte o bastante para contar para minha família em uma situação melhor do que aquela. Eu não fui forte o bastante para impedir aquele homem de me machucar. E eu não era forte o bastante para me levantar daquela cama e seguir adiante. Eu era fraco, e minha fraqueza era o maior desapontamento que eu poderia dar ao meu pai.

Eu tinha passado a noite em claro, eu precisava ao menos comer. Fiz um esforço extra para conseguir me levantar da cama e ir até a cozinha comer algo. Chegando lá, encontrei meu pai sentado à mesa bebendo seu café e lendo o jornal. Ele ainda estava de pijama, o que estranhei. Eu não queria encará-lo tão cedo assim, mas era muito tarde pra recuar e voltar para o quarto.

_Bom dia._ falei.

_Bom dia._ ele respondeu me olhando, mas eu não tive coragem de olhá-lo de volta.

Em silêncio, eu preparei o meu café da manhã sentindo seu olhar nas minhas costas.

_Como passou a noite?

_Bem._ menti _Não vai trabalhar hoje?

_Não vou te deixar sozinho. Só vou depois que a Celeste chegar.

_Não precisa.

Eu acabei de preparar meu café e fui em direção ao quarto, mas ele empurrou a cadeira ao seu lado com o pé. Ele não estava pedindo, ele estava me mandando sentar. Me sentei e comecei a comer em silêncio.

_Precisamos conversar.

_Agora, não, pai..._ falei tentando adiar ao máximo aquela conversa.

_Agora sim. Esta conversa devia ter acontecido há anos atrás. Se eu tivesse feito isso, você não estaria assim agora.

_Não é sua culpa.

_Tem alguma coisa errada com você, e a culpa é de quem te criou._ respondeu.

Olhei para ele cansado. Ele amoleceu o olhar, mas ainda era firme. Eu não voltaria a vê-lo no estado limite que o tinha visto no dia anterior.

_Eu sempre soube._ ele começou _ Desde que você era pequeno. O jeito como você ficava se policiando, se corrigindo. Você se intimidava com as brincadeiras do seu irmão, e se encolhia quando o assunto vinha à tona.

Olhei para ele surpreso. Eu achava que ele tinha descoberto tudo do dia anterior, que houvesse apenas uma desconfiança. Eu o subestimei. Ele é um advogado muito bom, é treinado em ler pessoas. Mas se ele sabia, será que...

_A mamãe sabe?_ perguntei aflito.

_Não._ nos seus olhos eu pude ver a aflição de saber o que aquilo significava _Se ela desconfiou, nunca me disse. Acho que ela nunca quis ver.

Olhei triste. Aquilo para mim era a confirmação que encarar minha mãe com aquele assunto não seria nada fácil.

_Você conhece a história do tio Aurélio?_ perguntei.

Ela balançou a cabeça afirmativamente em tom triste.

_Como você acha que vai ser?_ perguntei torcendo para eu estar enganado.

_Vai ser difícil. Vem uma tempestade aí.

Eu abaixei a cabeça. Era muita coisa de uma vez.

_Mas eu estou do seu lado._ ele falou ao ver meu estado _Vamos fazer isso juntos.

_Você não precisa.

_Preciso. Eu faltei como pai. Desde o momento que eu percebi, eu devia ter te colocado na minha frente e ter tido uma conversa séria. Eu devia ter pegado a sua mãe e aberto os seus olhos._ ele suspirou _Mas você era muito novo. Eu tive medo que ela quisesse lhe impor algum tipo de “tratamento”. Pensei que seria melhor deixar você crescer antes. Só que você cresceu do jeito errado. Eu tenho uma grande parcela de culpa e agora estamos juntos nessa luta.

Eu sorri desanimado. Se por um lado é bom saber que tem alguém ao seu lado, por outro é torturante saber que por sua causa, seus pais começariam uma guerra. Eu começaria a destruir a minha família.

_Mas não vai ser agora._ ele falou e eu o encarei curioso _Você está passando por muita coisa. Pensaremos numa explicação para seus machucados. Vamos deixar você melhorar primeiro, antes de contarmos para sua mãe, certo?

_Obrigado._ falei sinceramente, num inesperado arrombo de alegria e alívio.

_Mas eu não vou guardar isso por muito tempo. Ela é sua mãe, eu não tenho esse direito.

_Eu sei...

Voltamos a comer em silêncio, antes dele voltar a falar.

_Posso te perguntar uma coisa que está me afligindo?_ ele perguntou.

_Claro.

_Há uns meses atrás, você estava todo alegre e sorridente. Tinha alguém especial em sua vida?

Eu me sorri lembrando de como eu era feliz ao lado de Rafael. Parecia uma memória tão distante.

_Sim...

_Era aquele garoto de ontem?

_Não!_ respondi sacudindo a cabeça _Ele nunca deixaria as coisas chegarem àquele ponto. Era o Rafael.

Ele sorriu discretamente e abaixou a cabeça de volta pro seu café.

_Rafael parece ser um rapaz bacana._ ele falou sem me olhar, mas ainda sorrindo.

_Ele é..._ respondi sorrindo também.

O que Rafael pensaria se soubesse disso? Seu sogro agora sabia dele, não era o que ele sempre quis de mim? Pena que o perdi.

_O que você vai fazer hoje?_ ele me perguntou.

_Não sei...

_Ficar em casa não é uma opção. Não vou deixar você se trancar no quarto pro resto da vida. Você pode até não ir pra faculdade hoje, mas amanhã você vai.

Balancei a cabeça em concordância. Eu não tinha o mínimo ânimo pra ir pra aula, mas meu pai não me deixaria ficar. Eu não estava pronto pra encarar o mundo, eu não tinha força pra isso.

_Eu avisei para o meu grupo que não vou apresentar o seminário, mas tenho que ir lá entregar a parte escrita. Também tenho que lavar meu carro, tem sangue nele.

_Muito bem.

[...]

Quando eu encostei meu carro no prédio da faculdade naquela tarde, tudo o que eu queria era não ser visto por ninguém. Eu escolhi justamente um horário em que não teríamos aula pra diminuir o risco. Entrei rapidamente pra que ninguém me visse e viesse a perguntar sobre meus machucados, fui até a sala do professor e deixei o trabalho com ele. Metade da tarefa estava cumprida. Agora era só sair sem ser visto.

Mas a vida gosta de me pregar peças. Correndo em direção a uma escada secundária do prédio, trombei com um garoto forte. Ao olhar, era Pedro.

_Me desculpe._ me levantei e me virei pra ir embora.

_O que aconteceu com seu rosto?_ ele perguntou me encarando.

_Nada. Tchau.

_Apanhou do seu macho?

Aquilo me subiu o sangue. Eu não estava tendo a melhor semana da minha vida, eu estava me sentindo um lixo, não estava com paciência para Pedro.

_Vai se fuder.

_O que você disse?_ ele falou apertando meu braço com força.

Tentei me soltar, mas ele era mais forte do que eu. Era só o que eu precisava, mais uma surra.

_Eu mandei você ir se fuder. Agora me solta.

Ele me olhou com ódio e me soltou me empurrando.

_Viado.

Foi impossível não me lembrar das palavras do pai de Tom. Eu estava com tanto nojo e raiva de mim mesmo represados dentro de mim. Foi impossível segurar a avalanche que veio. Meus olhos se encheram de lágrimas e Pedro parou por um instante. Mas eu não parei. Eu queria gritar.

_Sou mesmo! Um viado imundo! Olha!

Eu levantei a minha blusa e expus meus hematomas. Não era uma coisa bonita de se ver. Eu era bem branco, então aquelas marcas pretas e roxas pareciam se destacar ainda mais. Pedro ficou paralisado quando viu.

_Vê?! Alguém chegou antes de você, Pedro. Alguém me bateu por eu ser um viado.

Ele não conseguia tirar os olhos daquelas marcas.

_Feliz?! Eu tive o que mereci! Eu encontrei o que sempre estive procurando!

_Quem..._ ele veio com a intenção de tocar no hematoma, mas eu me afastei.

Apesar de seus olhos vidrados, o seu toque parecia significar preocupação. Mas eu não achei que seria isso. Eu tive medo, confesso. Medo que ele fosse terminar o que o pai de Tom começou.

_Não toca em mim!_ falei com raiva _Você não tem nojo de mim? Então, fica longe!

_O que aconteceu?!_ ele veio novamente pra cima de mim, mas novamente me afastei.

_Não encosta em mim!_ gritei, eu estava cego com todos aqueles sentimentos negativos na cabeça _Pode pegar alguma coisa em você, sabe? Porque essa raça imunda da qual eu faço parte pode te contagiar só com o toque.

Ele me olhou ferido. Ele sabia que eu estava zombando do seu jeito de pensar.

_E você não pode ser viado, Pedro._ falei desta vez me aproximando dele _Um rapaz tão bonito, tão viril, tão macho.

Só pra provocá-lo, ainda sem muita noção do que estava fazendo, eu passei a mão sobre seus braços musculosos e os apertei. Por reflexo ou nojo, sei lá, ele me empurrou com força. Vejam bem, seria só um empurrão sem grandes consequências se não houvesse uma escada atrás de mim. Eu recuei com a força do seu empurrão, mas meus pés não conseguiram encontrar nada firme pra se apoiar. Eu caí de costas e bati a cabeça com força num dos degraus. Eu acabei de rolar pelos dois lances de escada que separavam os dois andares. Eu não desmaiei ou senti dor. Eu estava muito assustado com a rapidez com que aquilo aconteceu. Deitado no chão, eu encarava com olhos arregalados a face sem cor e igualmente surpresa de Pedro um andar acima. Ali, deitado no chão, com as dores voltando a tomar conta do meu corpo, com mais uma agressão, eu não pude deixar de pensar que eu finalmente tinha encontrado o fundo do poço.


Meu corpo e minha mente estavam cansados de todas aquelas porradas que vieram levando nas últimas semanas. Era muita coisa pra processar. Eu estava esgotado. O nosso organismo tem mecanismos de defesa muito avançados, o que em mim se traduziu num desmaio. Disseram que foi porque eu bati a cabeça na queda da escada, mas não. Era o meu corpo e mente tirando algum tempo para descansar da realidade.

Desde modo, eu não sei como fui socorrido, por quem, o que Pedro disse quando perguntaram sobre a minha queda, ou como cheguei ao hospital. Abri os olhos e já estava escuro. Desta vez eu não estava na enfermaria com outros pacientes, mas num quarto sozinho. Era tudo muito arrumado, mas a quantidade de aparelhos ali não me deixava esquecer que se tratava de um quarto de hospital. Deixei meu peso cair sobre a cama e fechei os olhos novamente. Não estava com sono, apenas queria continuar descansando, fugindo da realidade. Eu não tinha nem mesmo mais vontade chorar. Acho que tinha chorado nos últimos dias mais do que em todos os anos anteriores. Eu estava cansado de levantar todo dia e encarar o mundo. Eu estava cansado de continuar apanhando. Eu queria morrer. Mas eu era muito fraco até para tomar essa medida. Naquele momento, eu era apenas um morto-vivo.

Logo, a enfermeira apareceu. Era a mesma que tinha me atendido no dia anterior.

_Mas você gosta de se machucar, hein, menino?

Eu ri sem graça. Não sabia como responder àquela pergunta. Eu gostava de me machucar?

_Desta vez foi um pouco mais sério._ ela continuou.

E la veio até mim e mexeu na minha cabeça. Só então percebi que havia alguma coisa presa nos meus cabelos. Eu passei a mão e descobri que era um grande curativo.

_Sete pontos. Não é brincadeira._ ela comentou _O médico vai vir falar com você, mas vou adiantar que você vai ficar bem, foi só uma concusão. Não chegou a abrir o osso, mas você parece ter batido a cabeça com força. Por precaução, você vai passar a noite aqui em observação.

Concordei com a cabeça.

_Quem está aqui comigo?_ perguntei.

_Seu pai. Você tem dado alguns novos cabelos brancos para ele essa semana, não?

Eu ri. Ela era bem intencionada e bem humorada.

_Eu quase não dei nenhum em dezenove anos, eu tenho uma cota pra usar._ respondi.

_Certo. Mas da próxima vez, engravide alguém e pare de se machucar.

_Ok._ falei rindo.

Ela se sentou na beirada da cama e me olhou com carinho.

_Precisa que eu chame alguém pra conversar com você?

_Como assim?

_Um psicólogo, ou alguém.

_Meu pai não está me batendo, se é isso que você tá dizendo.

Ela riu com vontade.

_Eu sei. A preocupação no rosto dele deixa isso bem claro. Mas eu já atendi pacientes demais nessa vida pra perceber quando o que está incomodando são só as feridas físicas ou não.

Eu abaixei a cabeça envergonhado. Eu precisava de ajuda, eu sabia, mas eu não sabia como pedir. Não era o momento ainda.

_Não, obrigado._ respondi _Não precisa chamar ninguém. Não agora. Eu preciso me entender comigo primeiro antes de conversar com alguém.

_Você que sabe. Só te lembrando que há profissionais treinados para ajudar.

_Eu sei. Obrigado.

Ela se levantou e foi até a porta.

_Vou falar com seu pai e seus amigos para entrarem.

_Amigos?_ perguntei surpreso.

_Sim, os dois garotos e a garota. Eles pareciam muito preocupados com você.

Suspirei e deixei meu corpo cair no travesseiro novamente. Eu não estava preparado para enfrentá-los agora. Como esperado, meu pai entrou no quarto com Pedro, Alice e Rafael no seu encalço. Meu pai foi o único que se aproximou da cama. Alice e Rafael me olhavam com uma expressão estranha. Só ao pensar nisso lembrei de como meu rosto devia estar horrível com a marca do soco do pai de Tom e o corte no supercílio, sem contar os hematomas no meu braços que apareciam pelas mangas do avental que eu usava. Pedro, ainda mais distante, evitava me olhar e mantinha os olhos abaixados. Eu devia sentir raiva dele, mas não sentia. Mas não sentia pena também. Eu cansei dele. Eu cansei dos seus preconceitos, dos seus julgamentos e cansei de correr atrás da sua amizade.

_O que aconteceu desta vez?_ perguntou meu pai.

Suspirei fundo com a pergunta. Troquei um olhar rápido com Pedro, mas ele desviou rapidamente. Ele estava ali pra enfrentar as consequências do seu ato. Mas eu não ia lhe dar essa oportunidade, eu preferia vê-lo sendo consumido pela culpa silenciosa.

_Eu caí._ falei sem olhar diretamente pro meu pai, ou ele saberia que era mentira. _Não lembro direito. Acho que eu estava correndo e escorreguei na escada.

Só então Pedro permitiu me olhar direito, como se pedisse uma explicação. Não lhe dei atenção e me voltei pro meu pai.

_Você ainda devia estar fraco._ falou meu pai _Você estava com corte bem grande na cabeça, podia ter perdido muito sangue. Ainda bem que o Pedro te achou.

_É.

Pedro ficou inquieto e começou a andar em pequenos círculos pelo quarto, o que me divertiu de um jeito muito cruel.

_Pai, estou com fome. Não comi nada direito desde o café da manhã.

_Certo. O que você quer comer?

_Qualquer coisa que não seja comida de hospital.

_Tem uma padaria aqui do lado, vou lá buscar.

_Obrigado.

_Vocês cuidam dele pra mim?_ perguntou meu pai para os três.

_Claro._ responderam Alice e Rafael.

_Já volto._ e saiu do quarto.

Eu fechei os olhos por alguns segundos e relaxei a cabeça. Alice, Pedro e Rafael me olhavam em silêncio.

_Bê..._ começou Rafael, mas eu o interrompi.

_Você já pode ir agora, Pedro.

Todos me olharam assustados. Os olhos dele brilharam como se estivessem prestes a se encherem de lágrimas.

_Não viu? Eu não contei nada, pode ficar tranquilo._ falei desta vez o encarando _Eu não vou contar que você me empurrou da escada.

Foram alguns instantes pra Rafael e Alice entenderem o que estava acontecendo.

_Você fez o que?!_ gritou Rafael que fez menção de ir pra cima dele, mas Alice o conteve.

_Bernardo, eu..._ começou Pedro já começando a se engasgar com o choro.

_Me diz que isso é mentira._ falou Alice.

Ela olhava para ele com um olhar de profunda desaprovação. Alice podia não admitir, mas ela sentia algo a mais por Pedro. E lá estava ele, provando mais uma vez que não era uma boa pessoa. Isso a atingia. Pedro, ao notar o olhar dela pra ele, começou a chorar de verdade. No momento, ele era a segunda pessoa em pior estado naquele quarto.

_Bernardo, eu não queria._ ele falou de modo desesperado _Você começou a falar aquelas coisa e eu perdi o controle.

_Essa é sua desculpa?_ perguntei _Ok, não está perdoado. Pode sair agora.

_Eu vou te colocar pra fora daqui a chutes!_ falou Rafael com raiva partindo pra cima dele.

_Aproveita pra sair também._ falei.

Ele parou e me olhou sem entender nada. Seu rosto era um misto de raiva e confusão. O meu olhar era o mais frio que podia ser. Eu não sentia nada por ninguém naquele momento.

_E você também, Alice. Vocês três já vieram, provaram ser bons seres humanos ao se preocupar com o próximo, agora podem ir embora. Eu vou sobreviver.

_Bernardo, não seja idiota_ falou Alice vindo pro meu lado na cama _Nós viemos porque nos preocupamos com você. Até mesmo esse idiota.

_Tá, mas agora já podem ir embora. Você tem um namorado agora e ele tem uma namorada. E deve ter alguma piranha por aí pra dar pro Pedro. Tenho certeza que vocês têm coisa melhor pra fazer.

Ela me olhava magoada. Foi a vez de Rafael vir para o outro lado da minha cama.

_Eu sei que a gente anda em falta com você, mas não significa que a gente deixou te amar. A gente sabe que você tem passado por muita coisa ultimamente e...

_Tenho passado por muita coisa?!

Ali eu perdi a calma. Sim, eu estava passando por muita coisa e precisava gritar pra todos. E aqueles três seriam as vítimas do meu desabafo.

_E o que eu tenho passado ultimamente, Rafael, já que está tão informado?!

Ele recuou assustado com minha agressividade, mas respondeu.

_A morte do Eric, o término do nosso namoro...

Eu ri sem graça. Aquela era só a ponta do iceberg. Num impulso levantei da cama. Alice e Rafael se levantaram e recuaram assustados. Pedro olhava atento, ainda chorando. Eles nunca me viram naquele estado. Eu sempre fui calmo. Eu podia até ser meio paranoico e reclamão às vezes, mas eles nunca tinham me visto tendo um ataque de raiva. Aliás, eu acho que eu mesmo numa tinha me visto num ataque de raiva. Só uma amostra no dia que contei pra Pedro que era gay.

_A morte do Eric?! O término do nosso namoro?! Você acha que é só isso que está acontecendo comigo?!

Eu nem sabia mais o que estava fazendo. Eu arranquei num puxão o avental do hospital que usava, ficando só de cueca diante dos três. O que eles viram? O meu corpo muito branco e magro marcado por manchas pretas e roxas. Algumas eram enormes, chegando a ocupar quase a minha coxa inteira. Devia ser uma imagem assustadora. Rafael arregalou os olhos e me fitou com os olhos vidrados. Pedro parou de chorar e encarou aquela imagem assustado também. Alice levou a mão a boca.

_Sabem o Tom, nosso calouro?_ falei com dentes trincados _Pois bem, eu estava saindo com ele. Acontece que o pai dele nos pegou juntos na casa dele. E o que ele fez? Ele me espancou até se cansar, pelo que me pareceu horas de chutes e socos. Sem contar aquelas lindas palavras que ele me dizia enquanto fazia isso.

Os olhos de Alice e Rafael se encheram de lágrimas.

_Oh, Bernardo..._ ela fez menção de me tocar, mas eu me desviei.

_Eu saí de lá e dirigi sangrando e sem ar até a minha casa. E quem encontrei lá? Meu pai! Eu não só fui obrigado a ver meu pai num estado de desespero inédito pra mim, como fui obrigado a contar tudo pra ele!

Eles me olhavam sem ação.

_E depois de assistir ele espancando o pai de Tom, eu tive que escutar como eu era uma pessoa fraca e covarde. Uma decepção, nas palavras dele. E o melhor: ele deixou bem claro que a reação da minha mãe vai ser a pior possível quando ela descobrir. E pra coroar, agora eu tenho um corte na cabeça graças a esse imbecil!_ falei apontando pra Pedro.

Eu percebi que eu estava querendo causar pena neles. Eu queria que doesse neles o que estava doendo em mim. Eu queria que eles sofressem por ter me abandonado. Era o caso de me perguntar: que tipo de pessoa eu tinha me tornado?

Demorou um tempo até eles assimilarem as informações. Eu continuava ofegante de raiva e expondo meu corpo.

_Bernardo,_ começou Alice derramando lágrimas silenciosas _eu sei que nos afastamos nas últimas semanas, mas nós estamos aqui. Nós vamos te ajudar a passar por isso.

_Tarde demais._ falei ressentido _Não quero mais nenhum de vocês por perto. Vão embora.

_Não!_ gritou Rafael.

Ele veio e me segurou pelos ombros. Ele tinha lágrimas nos olhos, mas me olhava com intensidade.

_Eu não vou te abandonar._ ele falou _Eu te amo!

Ele me abraçou. Eu devia me sentir confortado, mas não. O que eu senti foi raiva por ele ter ido embora, por não ter estado lá quando eu precisei dele. Ele namorava agora. Ele não estava comigo mais. Num acesso de raiva, eu o empurrei com força e ele recuou assustado.

_Fora daqui! Vocês três, fora!_ gritei.

_Bernardo..._ Alice veio com cuidado pra cima de mim, mas desviei.

_Fora daqui! Fora daqui! Fora daqui!_ comecei a gritar ensandecido.

Eles me olharam muito assustados. Meus gritos chamaram a atenção e a enfermeira logo invadiu o quarto pra saber o que estava acontecendo. Ao ver aquela cena, deu um jeito de tirar os três do quarto. Eu caí na cama chorando. Eu não chorava de tristeza ou de raiva. Eu chorava de cansaço. Eu estava tão cansando de viver, de lutar. Eu só queria que tudo acabasse.

A enfermeira me deitou na cama e me vestiu o avental de novo enquanto eu chorava. Ela examinou meu ferimento na cabeça pra se certificar que ele não tinha aberto na confusão.

_Vai ficar uma cicatriz._ ela comentou quando eu comecei a me acalmar.

_Uma a mais, uma a menos, que diferença vai fazer?_ respondi com a voz morrendo.

Eu estava cansando de todas aquelas cicatrizes.


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Comentários


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elzonetto Comentou em 13/08/2024

Se eu achava o Sandro, do contos Idas e Vindas ruim, esse Bernardo é pior ainda, pois ele machuca os outros ao redor dele e a si mesmo. Mas, só espero que ele abra os olhos e consiga ver as coisas a tempo! E ele se tornou um Éric! Acompanhando!!!




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Ficha do conto

Foto Perfil contosdelukas
contosdelukas

Nome do conto:
Bernardo [44/45/46] ~ Meu pai descobre que sou gay

Codigo do conto:
217917

Categoria:
Gays

Data da Publicação:
12/08/2024

Quant.de Votos:
4

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