Juca estava sentado na cama com as costas apoiadas na cabeceira. Vi em seu rosto uma expressão indecifrável. Eu nem ao menos conseguia chutar o que se passava em sua cabeça. Quando finalmente consegui soltar meu corpo que era literalmente amparado pela porta, dei alguns passos na tentativa de dar a volta na cama.
- Nem tente me dizer que “não é isso que eu está pensando”. – Ele disse sem alterar o tom usual de sua voz.
- Eu... Eu... Desculpa!
Minha cabeça estava baixa, obviamente. Sem forças para dar a volta completa, sentei na beirada da cama de costas para Juca. Ele suspirou pesadamente e o ouvi se arrastar pelo lençol. Sentou na mesma posição que eu. Estávamos na mesma condição naquele momento: ambos constrangidos.
- Não precisa dar nenhuma desculpa.
- Não pretendia. – O interrompi.
- Não? – Ele que não me olhava, me lançou um olhar curioso.
- Não. Não ia lhe encher de justificativas banais para o que eu fiz, se é que você viu alguma coisa.
- Eu vi praticamente tudo. E não foi legal!
- É... Desculpa novamente, mas eu quis aquilo – o olhei sem medo, afinal, estava feito.
- Eu sei que você queria. Eu sabia quando o vi sair da cama.
Juca estava incrivelmente tranqüilo. Não parecia alterado e usava o seu tom de voz normal ao falar. Era impossível entender o que acontecia dentro dele.
- Como assim... sabia? – Eu que estava curioso agora.
- Eu também sabia quem você vira quando chegou naquele estado, completamente assustado. Na rua, um par de olhos nos mirou incredulamente. Eu também sabia quem era. E quando Chile me cumprimentou na praia, afirmando estar ali por acaso e um tanto perdido... eu também sabia de quem se tratava.
- Juca, do que você está falando? – Eu me virei um tanto de lado, estava quase de frente para ele.
- É a pele dourada, os cabelos compridos, a linha que desenha o corpo dele. A silhueta e a forma como o short cai abaixo da cintura e mostra um pouco da bunda. – Ele falava olhando para as mãos, gesticulando de forma que quase moldava o corpo de alguém. – É o queixo bem marcado, os ombros largos para um corpo não muito grande e a forma como se move, quase divinamente. Você estava certo no diário, ele é quase um deus.
Ao terminar de falar Juca me olhou com um sorriso pendurado nos lábios. Posso jurar que ele me encontrou com a boca aberta, completamente espantado. Não me contive.
- O diário! Mas eu li apenas algumas linhas. Você...Ah não, você leu escondido? – Saiu quase pausadamente.
- Você lê aquelas linhas onde fala, sem pudor algum, da bunda do certo rapaz e depois não quer despertar em mim uma curiosidade não humana? Você deixou o diário lá em cima da mesa. Eu juro que li apenas as páginas que dizem respeito a ele. Apenas estas!
- Apenas estas... – Eu repeti suspirando com força.
- Entenda! Eu não poderia me sentir traído com o que vi agora. – Eu voltei o olhar ao encontro dele. Seus olhos se apertavam e ele só fazia isso quando estava sendo verdadeiro. – Esse encontro era algo marcado para acontecer. Eu jamais lhe privaria disso. Pode doer em mim lhe ver com outro alguém, mas...
Eu o interrompi.
- Mas nada. Eu estou com você agora! – Escorreguei minha mão esquerda pela coxa de Juca e a enfiei na dobra do seu joelho pela. Ele se sente confortável e seguro quando faço isso.
- Eu sei. E eu quero que continue comigo. Mas... e o que existe entre vocês?
- Eu mato afogado no mar. Bela forma de morrer, não? – Eu tive que sorrir com minha mentira descarada. Não morreria tão fácil assim. Juca sabia disso, tanto que riu comigo.
- Você não vai conseguir. Por hora eu quero que você durma. E sem pesos, sem medos ou arrependimentos. Combinados?
Juca me estendeu a mão e eu a apertei. Ele ainda carregava o sorriso pendurado no canto dos lábios.
- Bom dia. – Ele sussurrou em minha nuca e ao fazer isso me despertou dos pensamentos.
- Bom dia. – Apertei seu braço em meu corpo ao falar.
- Lembre-se: sem pesos, sem medos ou arrependimentos – ele me disse. Pude ouvir o som do seu sorriso enquanto levantava da cama e completou – arrume essa cara. Te espero na cozinha. Climão é o prato do dia.
- Jucaaaaa, não brinca comigo. – Falei afundando o rosto no travesseiro.
Lavei o rosto, escovei os dentes, domei os cabelos que já caíam sobre a orelha de tão grandes e vesti o de sempre: short e regata. Barulho de xícaras e talheres vinha da cozinha. “Ah não, aqueles dois juntos. De novo!” pensei quase soltando um suspirando.
Abri a porta evitando olhar diretamente para Chile, mas era impossível. Ele estava sentado à mesa. Juca lhe preparava um pão na chapa.
- Acordou do coma. Amém! – Juca disse num sorriso.
- Rá! Rá! – fui irônico enquanto me aproximei da mesa. Puxei uma cadeira e sentei, o mais distante possível de Chile.
Aproveitando que Juca não nos olhava, Chile apontou para ele, obviamente perguntando se eu tinha contado sobre a noite anterior.
- Agora não! – sussurrei como resposta.
- Um pão. Dois pães. O senhor precisa de mais algo? – Juca se virou rapidamente, servindo os pães de Chile com um sorriso que poderia atingir ambas as orelhas.
- É... Nem precisava. Eu disse que faria... – falou Chile num susto.
- Quieto! E você, Caião, o que quer?
- Caião? – Eu tive que sorrir. – O mesmo. E na mesma quantidade. – Ao terminar de falar ganhei um beijo rápido. Provocativo que é, Juca virou o rosto e olhou para Chile, ainda com aquele sorriso largo. Ele é terrível quando quer!
Lanchamos. Chile inventou de sair para dar uma volta mas prometeu a Juca, por ordem dele, que voltaria para o almoço. Até confiscaria sua mochila se fosse preciso.
Almoço sem grandes surpresas. Cada passo que eu dava me distanciando um centímetro sequer dos dois, imaginava que Juca abriria o jogo. Felizmente nada aconteceu. Nenhum assunto foi jogado sobre a mesa. Eu não entendi porque continuava apreensivo mesmo sabendo que Juca não estava chateado com o que aconteceu.
O Sol baixava no horizonte. Juca estava inquieto olhando pela janela da cozinha.
- Vamos pro mar.
- Porque isso agora? – perguntei.
- Por do sol. Vamos! – Ele praticamente já saía em direção a porta.
- Você vem! – Falei quando passei por Chile que me acompanhou.
Juca carregava algumas poucas cervejas que tinha na geladeira. Chile andava levantando o short folgado de sempre chutando a areia enquanto caminhava, eu andava devagar a fim de ver os dois caminhando. Eram lindos. Ah, como eram. Qual deles eu deveria deixar para trás era a pergunta que dançava sobre meus cabelos ao vento.
- Sabe... eu poderia viver pra sempre disso aqui. Sol, mar, cerveja e homens. – Juca falou ao sentar, sem olhar para trás.
- Há pouco tempo atrás você diria o quê? Sol, mar, cerveja e mulheres? – Eu perguntei me acomodando na areia ao seu lado.
- Mulheres? – Juca pareceu curioso ao sentar ao meu lado.
- Ok. Papo pra outro momento, Caio! – Juca riu ao cortar o assunto.
Tomamos as quatro ou cinco cervejas. As garrafas estavam jogadas pela areia. O sol já tinha passado do horizonte há tempos. O céu estava pintado de um roxo escuro e resquícios de um laranja vivo no fundo da “tela”. Num pulo Juca levantou e se livrou do short que vestia. Exibia uma cueca qualquer.
- Sem desculpas. Os dois... No mar! – Ordenou e saiu caminhando em direção a água.
Chile e eu nos entreolhamos.
- Não pense no que aconteceu ontem... Viva esse momento! – Eu ri e também em pulo me vi livre do meu short. Diferente de Juca eu estava pelado. Chile riu e quis tapar os olhos, mas sem demoras também estava completamente pelado e corria, mais rápido que eu, para a água. Ultrapassamos Juca e nos tacamos no mar agitado.
Em segundos os três estavam completamente molhados quando a água atingiu nossas cinturas. Chile saltava de forma que víamos sua bunda ao sair da água. Juca ria e me puxava para junto de si. Num riso ele me beijou com seus lábios molhados e salgados. Agarrei seu corpo escorregadio e retribui o beijo com a mesma intensidade. Foi um beijo longo, apaixonado e carinhoso. Sua língua, como sempre, fazia um ótimo trabalho em procurar pela minha. Senti uma de suas mãos saírem da minha cintura. Paramos o beijo. Juca estendia seus dedos na direção de Chile, que era praticamente hipnotizado e caminhava em nossa direção calmamente, abrindo o mar com sua cintura moldada pelos deuses. O céu agora se pintou de todas as cores possíveis. Não era apenas roxo e um laranja desfocado. Rosa, azul, vermelho, lilás, amarelo. Era uma festa de cores.
Eu sorria confortavelmente enquanto Chile se aproximava. Não acreditava que isso aconteceria diante dos meus olhos. Aliás, o que estavas prestes a acontecer?
Hum... Como eu suspeitei uma surubinha rsrs. Adeptos do poliamor, Acho legal,mas não da p mim. Não conseguiria ficar dividindo atenção e alguem sempre acaba sobrando no final ??