17. Pais e filhos


       A minha cabeça estava pesada de sono. Apesar do friozinho que o ar-condicionado nos proporcionava, que eu nem lembro quando foi ligado, meu corpo derramava algumas gotas de suor. Júlio e eu dormimos agarrados um ao outro, quase sem roupa, novamente. Eu usava apenas um short e Júlio uma cueca box, e ele parecia estar curtindo um sonho bem divertido, pois seus lábios entrelaçavam um sorriso disfarçado. O meu relógio de pulso indicava que eram nove horas e quinze minutos; tia Ivana e o filho da puta do Mario já deviam ter ido trabalhar. Júlio e eu estávamos sozinhos.
       Ainda deitado ao lado de meu amigo, tentei, com leveza, bagunçar os cabelos loiros dele, mas voltavam ao normal no mesmo segundo. O rosto delicado e macio de Júlio sentia o deslizar dos meus dedos e seus lábios avermelhados e finos sentiam os meus o tocarem, sem falar que eram uma delícia de morder, de se beijar. Cheirei seu braço e o beijei; seu perfume ainda estava gravado no corpo e eu o beijei mais uma vez. Peguei sua mão branquinha, segurei-a com a minha e travei meus lábios nela. Virei-o de frente a mim e toquei meus lábios nos dele, propositalmente para que ele acordasse.
       A boca de Júlio, dormente, estava fechada, mas logo se abriu quando eu a toquei. Seus olhos acordaram numa piscadela e ele não recusou o meu beijo. Observei o rosto de traços infantis de meu amigo formar um largo sorriso.
       - Que jeito bonito de me acordar. – ele vagou, e bocejou.
Fiquei por cima de Júlio e o beijei no pescoço, sugando o seu gosto e seu silêncio. Ele fechou os olhos e mexia o membro dando mais espaço para que eu o provasse e o degustasse e tirasse suas forças com meus lábios. Minha língua deixava em seu pescoço um pouco do meu desejo e minhas mordidas sequestravam sua ingenuidade. Júlio se movia como se tivesse sido torturado, gemendo, porém com uma expressão de um derradeiro prazer.
       Desci meus lábios em seu peito (depois de muito mordiscar seu pescoço) que já se via mais durinho, e o mamei, arrancando mais suspiros de Júlio. Pousei ali e o prendi os braços, beijando seu peito e me martelando de tesão. Minha língua escorreu sobre sua barriga, lisa, branca e magra, arrepiando todos os seus pelinhos do corpo. Baixei a cueca de Júlio com a boca e quase fui atingido pela sua pica ereta, e os cabelinhos e que exaltavam sua puberdade. A cueca foi retirada bem devagar e encaixei seu pênis na minha boca, sem pressa e exatidão. Por muito tempo o arranquei seus gemidos, chupando naquela porra reta e dura.
       Aquela não foi a primeira vez que chupei a pica de Júlio, que já crescia alguns pelos ao seu redor e eu sentia sua cabeça rosada e a venerava com minha saliva, mas foi a primeira vez que o via como um homem que poderia destruir toda a minha sensibilidade. Eu o enxergava não somente como meu amigo de infância, e sim como um garoto que estava vulnerável a mim, que estava sobre meu domínio.
       - Tô doido por ti, loirinho. – sussurrei no ouvido de Júlio, com uma voz quase rouca. Nem sei o que deu nas minhas cordas vocais ao emitirem esse som. Talvez fosse o sono. Ou simplesmente o tesão do momento, mas de um modo ainda mais eufórico do que das outras vezes.
       - Tá mesmo? – Júlio devolveu no mesmo tom de fraqueza na voz.
       - Tô. Doidinho. Mais que o normal. – e voltei a abocanhar a sua pica. Eu a babava e a cercava com meus lábios, que estavam famintos por sexo.
       O gosto de sua pica já estava entranhado na minha boca quando Júlio me puxou e me deitou na cama. Dessa vez ele ficou por cima e me tirou o short e cueca, jogando-os no chão. Com nossos corpos grudados, Júlio entrelaçou nossos lábios, abastecendo-se com minha saliva. Com delicadeza, ele os mordia e em seguida os beijava de novo. Seus cabelos loiros pingavam suor na minha testa e ele me cercava de tanto beijo.
       Lígia e eu havíamos transado uns dois dias antes, porém não era mais a mesma coisa. Eu não sentia mais por ela, ao menos na cama, o que eu sentia por Júlio. Ver o rosto tarado dele, encharcado de suor e entregue a mim me despertava mais vontade de transar do que ela. E tê-lo ali, sobre mim, nos meus braços, no meu colo, no meu corpo, completava-me. O carnal dançava no meu sangue e eu queria Júlio na minha saliva, nos meus pelos, no meu rosto, no meu gosto, tudo; um ardor que não me deixava em paz.
       Pedi a ele que pegasse meu short e ele me entregou. Tirei de lá uma única camisinha que eu havia trazido. Júlio tirou o preservativo da embalagem e o colocou no meu pênis cuidadosamente.
       - Pode ir. – falei.
       - Meu corpo é todo teu. – ele disse, maliciosamente. Júlio, cautelosamente, se levantou, abriu as pernas e eu o assistia sentar-se na minha pica. Com uma careta de dor, meu amigo resistiu e sentou-se, fazendo os movimentos de vai-e-vem que me enlouqueciam de tanto prazer. Diferente da última vez que transamos, ele estava mais disposto e fogoso; mordendo os próprios lábios com veracidade e me expulsando um grito de euforia.
       - Me fode, cara! Me foda! – gritava Júlio, que cavalgava em mim sem pudor algum. Eu o segurava pela bunda, dando tapas que o faziam mover-se ainda mais rápido.
       - Vai, loirinho! – eu chamava, pingando de suor. – Você é todo meu!
       - Sou, todinho! – ele gritava, enquanto se masturbava. O pênis dele estava tão duro quanto o meu e nós batíamos uma punheta para nós mesmos. Num fogo que não se apagava, ele acelerava e radiava êxtase naquela transa. Minhas unhas arranhavam sua bunda e sua costa, e ainda assim ele exigia mais. Eu ia entrar em pane.
       - Ah, porra! – Júlio berrou, fantasioso. Sua cara jorrava insensatez, ardor e prazer. Ele cavalgava com pressa, masturbando-se e insistindo para que eu o fodesse. Meu corpo pedia sexo. Pedia foda.
       Júlio gritou e seu pênis disparou um jato forte de porra no meu peito e no meu queixo. O jato não parava. Júlio ainda em cima de mim, não se entregava. Era como uma torneira, mas o líquido não era água. Retirei a camisinha do meu pau, ainda duro feito uma rocha, a joguei no chão, e disparei a porra sem cessar sobre meu corpo. Meu amigo, numa atitude domada de sacanagem, deitou sobre mim, passou a língua sobre minha barriga suada, coberta de esperma e levou até a minha boca. Nossas línguas se cruzaram e com um recheio bem diferente no normal. De todos, foi um dos nossos beijos mais duradouros e que nos proporcionou uma chama inapagável.
       Deitado ao meu lado, limpando a testa, Júlio perguntou, rindo de si:
       - Thomaz, que foi isso?
       - Não sei. Você tava com tudo! – falei, sem fôlego.
       - Não. Você tava com tudo! – e retificou, virando-se a apoiando-se em mim.
       - Cara, acho que vai ficar uma marca. – eu observava seu pescoço, que tinha um vermelhão deixado por mim, mas Júlio riu, sem se importar.
       - Quero é que fique marcado. – e me beijou no pescoço.
       - Não sei o que tá havendo, Júlio. - eu disse. Não era a minha intenção, mas preferi ser sincero. – O meu tesão por ti tá aumentando, cara.
       - É?
       - É. Na verdade, por ti, por outros homens, por outras mulheres. – fui franco, um pouco envergonhado. De uns dias até ali eu havia sentido essa vontade e mal percebia e nem acreditava que isso acontecia. Depois dessa foda com Júlio, esse desejo se elevou. Mesmo ele sendo meu melhor amigo e nosso nível de intimidade extrapolava o normal, ainda fiquei com receio de contá-lo, mas se não fosse desabafar com ele, seria com quem? Com Lígia. Nem no meu pior pesadelo.
       Júlio afastou-se de mim, fingindo exagero no espanto com dramaticidade devido ao meu comentário.
       - Mas você dizia que não sentia atração por outros caras... Que ficava comigo, mas...
       - Sim, mas tô percebendo uma mudança, sabe? – falei, relutante. – É difícil ter que reconhecer isso, mas... Eu tenho olhado os homens com outros olhos... Eu sempre achei homens bonitos, só que dessa vez tem algo a mais...
       - E as meninas? Você não tem mais tesão por elas?
       - Tenho sim. Tenho é vontade de me relacionar com outras, ir pra cama com outras. Eu fiquei com poucas garotas antes da Lígia, e já estávamos há tanto tempo juntos... Pouco aproveitei.
       - E você tá achando isso ruim? Tá achando ruim de ser gay? – ele perguntou, vestindo sua cueca.
       - Não, realmente. Cara, ser gay ou não, não é isso que me importa. – eu me vestia, também. Meu corpo grudento de tanto sexo não me incomodava, mas eu não pretendia demorar muito para ir à minha casa e tomar um banho. – Nunca me importei se uma pessoa gosta de garotos ou garotas, se veste como um ou outro, se é pobre ou é rico, se curte pagode ou rock, se é branco feito uma nuvem ou preto como um carvão, se é gordo feito um porca ou magro como um palito. Nunca me importei, não seria agora que eu iria me importar.
       - Tá, mas isso é com os outros. Estou falando de você. – advertiu Júlio, sentado na minha frente.
       - Da mesma forma. Não vou me condenar se eu gostar de ficar com meninos ou com meninas, desde que me divirta e tenha experiências. “Quanto mais experiências, mais a gente vive”, isso foi o que eu ouvi minha mãe falar uma vez. Não vejo isso como algo ruim, é algo normal. Sexo é sexo. Gosto é gosto. E sentimento é sentimento.
       - Tudo isso que você tá falando é muito bonito, Thomaz. Agora... E seus pais? Como eles reagiriam? Sim, porque te conhecendo como eu conheço, você não iria aguentar ficar preso no armário, não é?
       - Não...
       - Então...
       Júlio não pôde continuar, pois fomos interrompidos por uma ligação vinda do celular dele, que estava no armário. Era meu pai. Eu havia esquecido o meu aparelho em casa, por isso telefonou para o celular de meu amigo. Lígia estava me esperando em casa. Eu esqueci completamente que eu havia marcado de almoçar na casa dela. Saltei da cama, vestindo-me por completo e disse:
       - Tenho que ir, loirinho. Lígia já notou que eu estou distante dela...
       - Então vá. Tio Jair parecia um pouco aborrecido no celular.
       - Ele deveria estar com pressa para encontrar um cliente no escritório...
       Em vão, Júlio tentou me oferecer um café, pois eu realmente estava com fome, mas apenas tomei um banho rápido, fui mais ágil que o Papa-Léguas e o Ligeirinho juntos. Beijei-o nos lábios e o abracei bem forte antes de sair do quarto. Os últimos acontecimentos com Júlio me chamaram atenção: e se Mario estivesse em casa, só esperando para nos flagrar? Eu estaria fodido. Mas, por sorte, e para meu alívio, não havia mais ninguém na casa.

       Caminhando, sem muita pressa, pensei em tudo o que Júlio e eu fizemos até ali. Nos meus míseros dezoito anos de vida, ter transado com meu melhor amigo, e não apenas uma vez, mas duas, foi uma das maiores bizarrices que eu fizera. Cerca de um mês atrás, chupar uma pica e enfiar a minha em um cuzinho de outro garoto era algo mais que improvável. Mas além de isso ter acontecido, eu gostei. E naqueles últimos dias, eu me pegava pensando em transar não apenas com Júlio ou Lígia, mas com outros caras e com outras garotas. No nosso um ano de namoro, eu nunca sequer me imaginei com outra menina. Agora, eu me imagino com uma, duas... Com outras morenas, loiras, negras, ruivas...
       Um beijo bem demorado foi o que Lígia recebeu de mim quando cheguei em casa. Ela já estava impaciente por ter me esperado tanto e me relembrou que eu havia marcado de almoçar na casa dela. Já eram quase onze horas, eu nem havia notado como o tempo passou rápido. Corri pra cozinha e pedi que Fabíola, nossa diarista, me ajudasse com o café. Meu estômago roncava de tanta fome. Lígia não queria que fizesse a refeição porque temia que não almoçasse direito. Quando se tratava de comida, não tinha dessa. Às vezes eu achava que havia um buraco negro no meu estômago.
       - A última vez que te vi assim com tanta fome – dizia Lígia, quando Fabíola se distanciou – foi quando ficamos sozinhos aqui na sua casa. – com um sorriso safado e uma piscadela. Por pouco não me engasguei rindo. A fome, de fato, me atacava depois de transar.
       - Pronto. Terminei. – informei a ela. – Vou trocar de roupa e podemos ir pra sua casa.
Como se uma corrente elétrica tivesse me atingido, vi Fabiola e a abracei.
       - Você tá animadinho, hein. – ela comentou. – Fique de olho nele, Lígia!
       - Tô vendo. E vou ficar de olho, sim.

       A casa de Lígia estava mais animada que o normal. Diferente da minha família, a dela costumava se reunir ao menos duas vezes por mês e aquele almoço foi uma dessas ocasiões. Primos e tios estavam presentes, além dos pais dela. Dona Vivian, a mãe dela, era uma senhora gordinha e amável, simples e muito piadista. Ela tinha seu próprio ateliê, costurava e produzia todo tipo de roupa; como o uniforme do meu time de futebol do colégio. O pai dela, seu Estácio, era vendedor de uma concessionária e ganhava muito bem, mesmo naquela época de crise. E um dos assuntos favoritos entre meu sogro e eu era o futebol.
       - Porra Thomaz, tem certeza que não quer torcer pro Flamengo? Esse teu Vasco tá ruim pra caramba...
Segundo minha namorada, a maior prova de que eu e seu Estácio havíamos nos dado bem foi essa liberdade que ele teve em zoar com meu time de futebol. Mas ele não era o único. Os primos de Lígia também me sacaneavam bastante e eu não deixava por menos, procurando logo um motivo pra zoar com eles. E uma das primas dela que encontrei por lá foi Luma, que logo perguntou por Júlio.
       - Dormi na casa dele ontem. – respondi, servindo-me de sobremesa. O creme de maracujá estava com uma cara boa... – Ele está tudo bem.
       - Que bom. Faz tempo que não falo com ele. – ela disse, tentando prolongar o assunto. Mas mina boca estava ocupada, saboreando o doce. – Você sabe me dizer se ele está ficando com alguém?
       Engoli o doce e fiquei pensando se eu responderia ou não a verdade: que Júlio estava ficando com Roberta. Mas a melhor coisa a fazer era dar essa missão ao meu amigo.
       - Depois eu te passo o número do celular dele e vocês conversam melhor. – e me retirei. Se eu desse bola pra ela, iria me comprometer.
       Sentei-me ao lado de Lígia e beijei nos lábios. Um beijo com sabor de creme de maracujá. Minha namorada me contava que iria passar as festas de fim de ano com a família dela em uma cidade do Nordeste e perguntou se eu queria ir, mas eu não podia: meus primos Diozinio e Estar chegariam no domingo justamente para passar as festas conosco e eu estava ansioso para revê-los. Porém, duas visões à minha frente quase me fizeram derramar o creme. Um casal, uma moça baixa e morena, de cabelos longos e encaracolados, de lábios carnudos e sensuais vinha acompanhada de um rapaz, também, moreno, de cabelos cacheados, corpinho sarado e parecia estar rindo de alguma piada que a garota contara. Os dois poderiam ser irmãos, pois tinham algumas semelhanças fisicamente.
       - Quem são aqueles dois ali, gata? – perguntei à Lígia, que conversava com uma amiga. Ela os olhou de esguelha e respondeu:
       - São os sobrinhos da nossa diarista.
       - Sobrinhos da Neia?
       - Sim. Ah, você só conhece as duas filhas dela, não é?
Neia, a diarista da família de Lígia, tinha duas filhas pequenas, uma de seis e outra de três anos, duas lindas garotinhas. Mas eu não conhecia aquele casal de sobrinhos dela; ambos muito atraentes. Difícil foi definir por quem eu senti uma tara maior: pelo rapaz ou pela garota? Pelos dois. Tive uma vontade aturada de provar um beijo deles. Guardei a louça do creme e, disfarçadamente, os segui. Os dois estavam de costas, então analisei uma das partes do corpo que mais me atraiam numa menina: a bunda. E ambos foram agraciados com dois empinados traseiros. Imaginei-me pegando nos dois. Imaginei-me pegando nos seios volumosos dela e no corpo aparentemente másculo dele.
       - A titia está nos chamando?
       Voltei à realidade com a pergunta da menina de cabelos encaracolados. A minha presença já fora notada.
       - Não, não. Eu só estava dando uma volta.
       - Ah tá.
       Ela sorriu e voltou a conversar com o rapaz. Para não dar mais mancada alguma, saí de perto deles e voltei para a companhia de Lígia. E antes de meu pai me buscar, quase duas horas depois, ficamos na frente da casa dela, namorando. Tensa, ela respirou fundo e perguntou:
       - Gato, está tudo bem com você?
       - Está sim.
       - Tô te achando meio distraído ultimamente.
       - Não é nada, gata. – e a beijei no rosto.
       - Tem certeza? Tenho te achado distante... Mas acho que é coisa da minha cabeça. Não é? – perguntou, esperando ouvir um “sim”.
       - Sim...
       - Thomaz... Me fala a verdade... – Lígia ficou reta e apreensiva. – Você já me traiu alguma vez?
Um dia essa pergunta viria à tona.
       - Não. Nunca.
       - Nunca ficou com nenhuma outra garota?
       - Não. Nunca.
       - Que alívio. – ela sorriu e me abraçou.
       - Mas... E se isso acontecesse? O que você faria?
       - Se você me traísse? Eu te matava.
       Era o tipo de resposta que eu esperava ouvir. Lígia me abraçou e me beijou, jogando beijos para o meu pai, que estava no carro. Ele disse que iria me deixar em casa e depois iria se encontrar com o sócio do escritório de advocacia. Lembrei-me, então, do que Júlio havia me alertado: “Tudo isso que você tá falando é muito bonito, Thomaz. Agora... E seus pais? Como eles reagiriam? Sim, porque, te conhecendo como eu conheço, você não iria aguentar ficar preso no armário, não é?”. Tive vontade de perguntar ao meu pai se ele tinha algum preconceito contra os homossexuais, porém aquele ainda não era o momento.
       À noite, quando ele e minha mãe estavam em casa, jantando e falando, cada um sobre seu dia estressante de trabalho; ele do escritório e ela da loja de roupas, juntei-me a eles com o proposto de fazer essa tal pergunta. Mesmo conhecendo-os, eu gostaria de saber claramente qual a opinião dos dois. Eu conversava com meu primo Gésio pelo WhatsApp, o mesmo que tocou violão para a gente no meu aniversário, enquanto os dois tagarelavam. Meu primo não via a hora, assim como eu, da chegada de nossos primos Dionizio e Ester. Nós costumávamos brincar juntos na infância, até eles deixarem Luz dos Olhos para morar no Rio de Janeiro.
       Até que surgiu uma oportunidade e fui claro e objetivo.
       - Eu quero fazer uma pergunta a vocês, só por curiosidade.
       - Faça, ué. – disse mamãe.
       - Só por curiosidade... – enfatizei a frase – o que vocês fariam... se eu fosse gay?
       O garfo que minha mãe levava à boca ficou parado no meio do caminho e a boca dela aberta. Meu pai se levantou para levar a louça à pia e também ficou paralisado como uma estátua. Ele pôs o prato na pia e sentou de novo. Respirou fundo e perguntou:
       - Por acaso, você é gay?
       - Han? Não, não. – apressei-me em dizer e eles respiraram tranquilizados. – É que e soube que um colega meu contou aos pais dele que era bi e eles não reagiram muito bem. – bolei essa mentira esfarrapada na hora, e eles acreditaram. – Eles não reagiram nada bem. – frisei. – E vocês? Como reagiriam se soubessem que eu... Sou...?
       - Filho, eu preferia que você não fosse. – admitiu meu pai.
       - Mas ele não é gay, Jair. Ele namora a Lígia. – lembrou mamãe.
       - Mas a pergunta teve um “se”. E eu não ficaria muito contente com isso, não.
       - Por que? – inquiri.
       - Ah Thomaz, eu nem conheço muitos gays, nem na nossa família tem, até onde eu saiba. E eles sofrem tanta discriminação, muitos morrem por causa disso. E eu também, pra ser sincero, não sei se iria saber lidar com isso. – explicou, com uma aparência cansada. Mamãe, por outro lado, me surpreendeu.
       - Eu acho que não ia me importar, não. – opinou mamãe.
       - Não, Neuza? – meu pai, cruzando os braços.
       - Não. Tenho tantos clientes e funcionários gays, e eles são tão legais e felizes, os que são assumidos, principalmente. Tenho um funcionário lá da loja que é gay, mas os pais não sabem, e ele sofre demais com isso. Eu já o aconselhei a revelar. Ele só gosta de garotos! Não é nenhum criminoso; e é discreto, não é afeminado, e isso facilita muito.
       - Não acredito que você pensa dessa forma, mãe. – eu disse, contente.
       - Não tô dizendo que quero que você seja gay, Thomaz. – repreendeu-me. - Também não sei se saberia lidar com isso, no início. Mas com o tempo... Acho que a gente se acostuma.
       - Eu não me acostumaria de jeito nenhum. – meu pai foi incisivo. Ele se levantou e foi lavar a louça. A opinião mente aberta de mamãe não o agradou nada.
       - Porque você é um careta, Jair.
       - Não sou careta. O nosso filho iria sofrer, você não pensa nisso?
       - Filho nenhum sofre se os pais o apoiam. – mamãe disse, com serenidade. – Não acho muito bonito um homem sair por aí vestida de mulher, mas trocar uns beijos não faz mal a ninguém, nem a ele e menos ainda aos outros.
       - A senhora beijaria uma mulher, mãe? – perguntei, muitíssimo curioso.
       - Acho que se tivesse bem bêbada. – ela respondeu, rindo. – Mas um beijo não faria mal... Seria uma experiência...
       - Você tá é doida, Neuza. – meu pai balançou a cabeça negativamente.
       - Filho, - mamãe pegou na minha mão – seu pai é careta, o pai dele, seu avô, também era. E diga à mãe do seu colega que ela é careta e antiquada, também.
       - Thomaz, você perguntou qual a minha reação se eu soubesse que você é gay, não é? Pois bem: gay para mim só na televisão, cinema, peça de teatro, livro. Lá é mais bonito. E nem é tão bonito assim. Se o filho do vizinho quiser ser gay, correr risco de sofrer preconceitos e arriscar a própria vida com doenças ou morrer espancado, tudo bem. Mas meu filho, não! – ele concluiu, sério.
       - Que absurdo, Jair.
       - Absurdo nada. Se eu souber, Thomaz, que você tá que nem esse seu colega, beijando outros meninos... – ele riu com desgosto, desligou a torneira que havia acabado de ligar e continuou: - Eu nunca levantei à mão pra você, você sabe. Mas se você me contar que é gay, eu juro que não vai mais sobrar um dente nesse seu sorriso bonito.
Mamãe o aplaudiu ironicamente.
       - Faça isso, faça, e eu me separo de você. – ameaçou.
       - Você tá é doida! – e ele gritou.
       - Tô mesmo! E a doida aqui não dorme com outro doido. Você vai dormir no sofá, Jair! – mamãe estava furiosa e se levantou da mesa. - E lave meu prato também!
       - Não era pra vocês brigarem. Eu só fiz uma pergunta! – tentei amenizar.
       - E muito boa, por sinal. Porque eu não conhecia esse lado violento e machista do seu pai.
       - Não sou machista. Só não quero uma coisa dessas para o Thomaz.
       Ela olhou meu pai com nojo e saiu da cozinha. Papai tentou ir atrás dela, mas ouvi um grito “Pegue seu cobertor e vá para o sofá!”.
       Eu realmente não tinha muitos diálogos com meus pais; eles passavam mais tempo trabalhando do que comigo. E só essa pergunta já foi o suficiente para conhecê-los melhor. Se mamãe soubesse o que eu andava fazendo e sentido, talvez ficasse do meu lado. Mas se meu pai soubesse eu estava completamente fodido. E no pior sentido.


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Comentários


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haroldolemos Comentou em 24/12/2015

Bom demais! Acompanhando sempre! Parabéns, fera!

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viitor Comentou em 16/12/2015

muito bom... :)

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goodboy Comentou em 15/12/2015

valeu pelo conto! como sempre, muito bom!

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jeovanerosa Comentou em 15/12/2015

Estou gostando desse lado safado do Thomaz, espero que ele viva toda sexualidade dele ao maximo




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Ficha do conto

Foto Perfil Conto Erotico historiasemsegredo

Nome do conto:
17. Pais e filhos

Codigo do conto:
75614

Categoria:
Gays

Data da Publicação:
14/12/2015

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