“Preciso ir.” Eu ali martelando onde estava me envolvendo, e ao meu lado aquele fruto da imaginação me julgando.
- Sabe aqueles dias em que você não consegue entender como o mundo pode continuar girando, sei, já sei o que você vai dizer, mas você também sabe que eu não tenho culpa de nada, foi ele que me beijou na boca, e sentindo seu corpo forte e másculo me abraçando não tive como evitar o beijo... [sempre foi atirado e fraco por beijos] O quê? Nem venha, eu nunca fui assim com você, escute bem Daniel não é porque você está morto que eu tenho que pegar leve, você sabe muito bem que eu sou um rapaz que gosta das coisas certas e que não sou do tipo que faria algo para arruinar a vida de uma família bonita como a dele. Você sabe. Você sabe que eu gosto dele, mas não faria nada para roubar ele de sua esposa, afinal isso não seria o correto... [mesmo ele sendo um canalha?] mesmo ele sendo um verdadeiro canalha, que além de sair com alunas, também saia com alunos. Ou seria correto?
Pena que aquele fantasma no sofá não era real, se fosse com certeza ele me responderia que eu sou um fracassado. Na verdade eu precisava de alguém para desabafar, e o Rafael ainda não tinha chegado, o que me fez pensar que ele estava demorando, e eu já ia para o trabalho... Ainda pensei ligar para a Nat e marcar um encontro, mas eu sabia que iria parecer um paranoico, melhor deixar para o dia seguinte.
A noite na escola eu teria apenas os últimos três horários, e resolvi ir a biblioteca fazer uma pesquisa para as aulas seguintes. E chegando lá eu me deparo com uma jovem mulher, de saia justa acima dos joelhos, e com uma blusa branca mostrando um farto busto, cabelos negros e longos, e pele morena clara, ela estava na estante de literatura, me aproximando
- Olá, posso ajudá-la?
Ela me olhou de cima a baixo em um segundo, e me respondeu com um sorriso...
- Obrigada, mas já encontrei o que procurava, e você, trabalha ou estuda aqui? - será que eu estava com cara de adolescente?
- Trabalho. Sou professor de história do ensino médio, prazer, Caladriel.
- Olá, sou a substituta de Português, Ísis.
- Belo nome, desculpe, é que sou meio fascinado por nomes bíblicos e místicos, e no seu caso Ísis é uma das deusas mais adorada do mundo grego romano.
- Também gosto dele, e o seu é algum desses nomes bíblicos.
- Sim, é nome angelical.
- Legal, então, você trabalha quase todos os horários?
- Não, somente a noite.
Sabe como as coisas podem mudar da água para o vinho, minha cabeça estava a mil, mas ao encontrar a Ísis, parece que estive em outro patamar, depois fui para a sala dos professores onde ouve a apresentação dela formalmente. Foi interessante observá-la, parecia dona de seu nariz e tinha um porte elegante e sedutor.
Já de volta, encontrei o Rafa na praça me esperando.
ele parecia feliz, e estava. Ele foi me encontrar no caminho e me abraçou, disse que tinha encontrado um emprego, e que tinha falado com a mãe dele, ela tinha prometido pra ele que iria tentar fazer a cabeça do pai pra ele voltar pra casa, realmente pude acreditar que ele estava melhorando, e que aquelas novidades iriam ajudar bastante.
...
Pela manhã fui a cozinha, e procurei não olhar para o Daniel que estava com um sorriso de orelha a orelha, sério, queria que ele não fosse tão sarcástico, mas ele parecia mais feliz do que uma pomba em cima de um monte de milho. Tomei meu café e deixei-o só em casa, tinha a esperança dele não me acompanhar, o Rafa nem notou que o Daniel estava impaciente com minhas novidades, claro, ele era apenas fruto da minha imaginação. Deixei um boa sorte para o Rafa no seu primeiro dia de trabalho e fui para a faculdade onde encontrei a Nat, que já estava a minha espera, queria saber de tudo, pena que eu não tive coragem de contar tudo, nem falei de Miguel, ou o que aconteceu depois do filme, e nem sobre meu encontro com Ísis, mas ela me contou uma novidade, estava namorando um cara que não fazia parte do nosso circulo, e que queria que eu fosse com eles no sábado para uma balada, eu até tentei dizer que não, mas ela me fez prometer ir. O Miguel não tinha aula com a gente, e nem o vi.
...
À tarde fiquei só em casa, pelo menos até as duas e meia, quando ouço batidas na porta, mesmo sentindo meu coração bater acelerado, pois já imaginava de quem poderia ser, sim lá estava ele de pé esperando um convite para entrar.
- Olá Caladriel, e agora podemos conversar?
- Claro Miguel, pode entrar.
Na sala, já acomodados, ele me olhou nos olhos e me perguntou diretamente.
- Então, Caladriel, não vai me dizer nada?
- Tipo o quê? “você passou dos limites!”
- Passei? Você acha que passei? Você não gostou do meu avanço?
- Acho que são muitas perguntas. – pareci um pouco aborrecido, mas também eu tinha que me mostrar um pouco sério.
No canto da sala Daniel apenas me observava com seus olhos frios.
- Escute Caladriel, não precisa falar nada se não quiser, mas acho que sei por que você saiu correndo do meu apartamento.
- Acho que sim, se não você seria um sínico.
- Nossa, você parece bem chateado não...
- E você acha que eu não tenho direito, ao saber que você tem uma foto do Rochel...
- Sim, mas então Caladriel, eu não lembrei que vocês já moraram juntos, ele sempre falou bem de você, sempre se referiu a você como um jovem cabeça e bem estruturado.
- Sério, ele falou isso de mim?
- Claro, ele gostava muito de você, é tanto que ele mesmo morando comigo durante uns dois meses antes de se transferi, nunca o tratou como um ‘arrependimento’, eu é que sentia inveja dele por ter tido um caso tão bonito.
- Espere, nós não tivemos caso... foi tudo muito confuso, e eu não quero falar sobre esse assunto. Quero saber o que você quer de mim.
- Eu quero apenas ter o prazer de ficar com você, e saber o que você tem para despertar tantos desejos em mim.
- Como é? E você gosta de homens, não eram suas alunas que te faziam pular a cerca.
- Sim, elas também.
- Olha Miguel, desculpe, mas isso parece complicado de mais pra mim.
- Caladriel, não precisa me responder nada agora, apenas vim aqui dizer para você não ficar grilado, pois eu não vou forçar nada, vou esperar você vim até a mim – e antes dele sair pela porta pareceu se lembrar de algo - Há! Já ia esquecendo, seu DVD, você saiu tão rápido que esqueceu.
- Melhor não aceitar...
- Você já aceitou...
- Me conta uma coisa, só para não parecer coisa de novela.
- Este filme foi pura coincidência ou teve algo mais que eu não sei?
- Fiquei sabendo pelo Rochel, ele falou muito de você, e disse uma vez que você queria muito ver esse filme, mas não tinha conseguido ainda achar em DVD, então, quando vi na loja...
- Já entendi tudo. Obrigado, vou aceitar, mas preciso ficar só.
Depois dessa, ele se foi. Claro o Daniel ficou rindo “Pode ficar caladinho ai!”. Mas que cara mais convencido, naquela tarde passei as ultimas horas só pensando no que ele falou, e na porra da má sorte que eu tenho, se não fosse aquela foto do Rochel com ele na estante, eu poderia ter ido pra cama com ele. E agora eu estava cada vez mais grilado com tudo, e quando digo tudo falo principalmente nos envolvimentos amorosos.
...
Em fim chegou a hora de ir buscar o Gabriel, meu querido irmão.
Ele parecia eufórico, seria uma comemoração de aniversário tardia, eu sei, ele me amava, que nada, ele só queria um motivo para gastar dinheiro do pai no shopping e no cinema.
Ao chegar em casa, ele foi logo para o quarto, arrumou as coisas e depois ao banheiro. Não é por que era meu irmão, mas ele era bonito e já tinha um corpo quase da minha altura e um rosto mais bonito, sim, ele estava na idade em que desperta desejos em qualquer pessoa, se não fosse meu irmão, eu tiraria uma casquinha. Depois que ele saiu do banho se deparou com o Rafa na mesa da cozinha...
- Oi, desculpe não vi que tinha visita...
- Gabriel, esse é o Rafael meu amigo, e Rafael este é o meu irmão de quem eu tinha lhe falado. E Gabriel, ele está passando uns dias aqui até encontrar outro lugar para ficar, ok?
- Tá, sem problema, desde que ele não seja nenhum daqueles nerds chatos que só falam em computadores e jogos, por mim tudo bem.
- Não se preocupe guri, sou descolado. – respondeu o Rafa na bucha e bem boy, uma coisa é certa, o Rafa era bem diferente do Daniel, ele era bem mais másculo, quem não sabia da sua vida de calçada, nunca desconfiaria de que ele gosta da fruta.
Os deixei a sós para se conhecerem melhor, claro que eu já tinha passado as recomendações para o Rafa: nada de cigarros, bebidas, e nem papo de farras ‘gls’ com Gabriel, ele não poderia desconfiar de nada, enquanto fui trabalhar.
Mim encontrei com Ísis logo na chegada, ela parecia ser legal, conversamos um pouco e já notei que ela estava livre, então fiz o que não era para fazer, a convidei para ir no sábado comigo para a balada com a Nat, e ela aceitou de boa, o que me deixou todo animado [animado, parecia um convertido tendo uma recaída pelo pecado], até ali eu não sabia a idade dela, mas acredito que no máximo teria uns vinte e cinco anos.
De volta ao apartamento, ao chegar me deparo com uma cena nada legal, encontro o Gabriel conversando com Miguel. E nada do Rafael, nem acreditei na hora de que ele já tinha faltado o compromisso de cuidar do meu irmão, assim logo no primeiro dia.
- Boa noite - tento parecer tranquilo, apesar de suar frio, não sabia até que ponto ele era legal, ou se era doente, ou coisa assim, temia pela virgindade anal do meu irmão.
- Boa noite Caladriel, vim aqui, mas esqueci que hoje você também trabalhava, mas seu irmão me deixou entrar, claro depois de mil e uma perguntas.
- Sim, mas o que te traz aqui assim tão tarde?
- Bem, cheguei mais cedo, e como você não estava resolvi esperar, na companhia desse adorável jovem. É sobre o meu filho, queria saber se a sua escola, aceita alunos regulares no turno da noite? [será que era só isso mesmo?]
- Olha Miguel, esse assunto você poderia ter procurado a secretaria da escola, seria mais fácil...
- Não liga não seu Senhor Miguel, ele é sempre assim indelicado. – interveio Gabriel, se metendo onde não devia.
- Não é isso, é que o PROFESSOR Miguel sabe muito bem como é essa coisa de vagas de alunos regulares, Agora PROFESSOR a noite só funciona o ensino médio e turmas do EJA.
- Claro, o Joel, já está no terceiro ano.
- Como assim ele já está no terceiro ano?
- Nossa mano como você é curioso - novamente Gabriel se metendo.
- Tudo bem Gabriel, seu irmão tem razão. Ele já tem quase 18 anos, sei, nem precisa perguntar, eu pareço novo para ter um filho com essa idade, mas veja bem, eu me casei forçado aos 20 anos, quase que não terminava o ensino médio, e pior quase não entrava na faculdade. Mas deu tudo certo, e aqui estou, querendo saber se sua escola receberia meu filho a noite. [a cada revelação eu mais ficava desmotivado a sair com ele]
- Tá, tudo bem, amanhã eu vejo isso, e lhe informo na sexta.
- Não, melhor, você me ligar.
- Claro, tudo bem.
- Então, vou indo já está tarde, e foi um prazer Gabriel.
- Valeu Miguel – meu irmão parecia o conhecer há anos.
- Boa noite Caladriel.
- Boa! – fiquei o encarando até ele sumir no corredor.
Depois que ele saiu o Gabriel me encarou...
- O que foi isso, é impressão minha ou você o destratou de propósito.
- Nem venha com essas suas observações, nossa, até parece que você não sabe fazer outra coisa a não ser encher o meu saco. E por favor não faça mais isso, nós não estamos no interior em que você pode abrir a porta para qualquer um.
- É, mas ele falou que era seu professor, e além do mais o Rafael disse que tava tudo bem.
- Sim, mas mesmo assim, e se ele fosse um pedófilo.
- E você acha que eu não saberia me defender.
- E por falar no Rafa, cadê aquele irresponsável?
- Recebeu um telefonema meio estranho, foi no banheiro, se perfumou todo, parecia uma vadia, e saiu correndo.
Com uma dessa procurei logo mudar de assunto, e fomos dormir. Já vi que o Rafa andava aprontando. Quase meu sono não chegava, estava muito incomodado com as revelações do Miguel, ele era pai de um rapaz e não de um garotinho, e pior, ele poderia ser aluno meu, o que me deixaria mais próximo do Miguel.
...
A quinta foi bem calma, a tarde levei o Gabriel ao shopping onde nos encontramos com a Nat e seu namorado novo, não só no sentido de ser novo namorado, mas também de ser um rapaz mais jovem, ela tinha minha idade, talvez alguns meses a mais, ele no máximo vinte anos. Ela nos apresentou, como sendo Hibrael, nossa que nome lindo, a única coisa que me veio a mente naquele momento de adoração foi de que eu poderia ficar tranquilo, já seu nome revela ser de um anjo do bem. Ficamos então nós quatros, o Gabriel ficou meio incomodado, pois não estava fazendo bem o que ele queria, até que o Hibrael sugeriu irmos logo para o cinema pois o filme já estava para começar. O filme foi tranquilo.
Em casa, quase não dormíamos naquela noite, ele falando do filme para o Rafa que a cada momento me olhava como se queria dizer algo, mas eu estava tão cheio, que interpretava que ele pedia era socorro.
Só na sexta foi que falei que iria sair no sábado em duplas com a Nat e o namorado dela, então o Rafa logo perguntou.
- E quem vai ser sua parceira?
O Gabriel ficou de prontidão esperando a minha resposta...
- Ísis, minha nova colega de trabalho...
- Quem? Você nunca me disse que tinha uma nova colega de trabalho.
- É, mano, você não me falou que estava namorando de novo.
- Pessoal não grila, não é namorada, apenas vamos sair para se confraternizar, e fazer companhia para a Nat que é uma boa amiga.
Bem, claro que aquela desculpa não colou, mas o Gabriel não ficou nada satisfeito em saber que iria ficar em casa só na companhia do Rafael, mesmo ele prometendo que iria ficar, e não iria desaparecer como da outra noite. O meu medo estava ai, mesmo conhecendo o Rafa, o problema era o Gabriel que adora comprar briga do nada.
A noite da sexta eu só tinha o primeiro horário, ainda vi Ísis que confirmou nosso encontro de casais. Voltei pra casa e sai com o Rafael e o Gabriel, fomos numa lanchonete com cara-oquê, e por incrível que pareça nos divertimos muito, o Gabriel pareceu bem solto, e o Rafael me mostrou uma face ainda desconhecida, ele era bem divertido, e sabia até cantar, nossa fazia tempo que não me divertia tanto, e olha vendo meu irmão ali, notei o quanto o clima família me fazia falta, até pude notar o Rafael como eu o tinha visto pela primeira vez, radiante com um olhar bem vivo e feliz, os dois ali, e eu o mais velho deles, me senti um cara realizado. Voltamos para casa, eu estava morto de sono, fui dormir, e deixei os dois na sala conversando e vendo TV. Senti que os dois estavam se entendendo muito bem, enfim uma preocupação a menos.
Pela manhã de sábado, acordo, e vejo que o Gabriel não está na parte de baixo. Caminho até a sala e me deparo com os dois.
Continua...