gringobrasileiro - Minha primeira vez - Parte 1

Minha família americana e eu fomos a uma comemoração em uma vizinhança “gay” em um bairro finíssimo em Nova Iorque. Ruas absolutamente limpas, bandeiras do arco-íris espalhadas em praticamente todas as casas e um gosto delicadíssimo para decoração, pintura e a fins. Qualquer idiota diria: um gay passou por aqui. Ou no caso, uma multidão deles. Apesar de conhecer homossexuais, guardava dentro de mim pré-conceitos e preconceitos que seriam quebrados mais tarde. Decidimos jantar em um maldito restaurante vegetariano, o que me chateou profundamente, pois como bom brasileiro, queria mesmo eram 30 kg de picanha.
Apesar dos pesares, o jantar foi bom e agradável. Também, pudera... apenas a minha conta ficou em $45 dólares americanos, o que é considerado muito ao padrão americano de vida.

Eram meados de outubro e o frio do norte americano havia chegado de forma atípica, assim, poucas pessoas se aventuravam a ficar do lado de fora do restaurante, e os poucos que o faziam, mais pareciam múmias.
Como bom estudante de arte, me lembro de passar horas admirando aquele final de outono, onde os ventos sopravam forte e frio, fazendo com que todas as árvores se despissem de suas folhas, deixando um clima de melancolia e tristeza, mas nem por isso, menos apaixonante. Tudo era tão vermelho, tornando-se cinza. É difícil de explicar. Tudo era lindo, tudo era triste. Tudo era diferente para mim.
Lembro de estar sentado de frente para a rua, separado apenas pelo grande vidro transparente e alguns adesivos da coca-cola, admirando profundamente tudo o que via. Minha mente estava em Nárnia, a essa altura.
Por algum motivo, tive minha atenção voltada a conversa da mesa, e quando me virei, senti que alguém tinha perdido seus olhos em mim.
Três mesas à esquerda. Lá estava. Belíssima criatura de cabelos cor-de-ouro, olhos verdes e uma barba que instantaneamente me tirou um suspiro “hétero”. Demorei a entender que aquele lindo par de olhos estava olhando diretamente aos meus. Tinha certeza que era da minha cabeça, fruto de uma imaginação fértil e impura. Aquele jogo de olhares perdurou durante todo o final daquela melancólica tarde, mas eu não sabia o que fazer. Minha razão me pedia para ir para casa, e eu sabia que era a melhor escolha a se fazer. Depois de solicitado, o garçom se aproximou:

“Senhor, o gentleman ao lado me pediu que lhe entregasse este bilhete” – disse o garçom solícito e educado.
Demorei alguns segundos até cair em si e entender que aquela linda criatura de olhos verdes estava realmente interessada em mim.

“Benjamin... call me” – dizia o bilhete com letra tremida, seguido de um número de telefone e um sorriso pequeno.

Na esperança de ser educado, coloquei o papel do bolso, e forcei um sorriso de orelha a orelha. Todo mundo na mesa percebeu o que tinha acontecido. Me fingi de morto, paguei a conta e fui pra casa.

Tomar banho não foi tão fácil, pois tinha algo em minha mente. Terminar o dever da faculdade? Não. Não era possível. Aquele número de telefone, aquela situação, aquele papel, aquela noite, aquele nome, a barba, o par de olhos, a cor do cabelo... aquele menino.

“Desculpa a demora em te mandar uma mensagem de texto. Estava relutando em mandá-la ou não. Sinto-me lisonjeado por ter recebido seu bilhete, mas temo não ser o que procura.Você é lindo, provavelmente mais velho e experiente. Sou alguém do continente sul, cujo inglês não é perfeito e ainda está decidindo se sou gay ou não. Você pode me chamar de Leo, a propósito”. – acho que nunca demorei tanto para digitar e enviar uma mensagem via iMessage. Eu estava desesperadamente nervoso.

“Eu me encantei assim que pus meus olhos em você. Pena não ter tido coragem de dizer pessoalmente. Seu inglês é ótimo. Preciso dar aulas pela manhã. Te mando mensagem breve. Beijos”.

Fiquei puto com a resposta. Muitas coisas passavam por minha cabeça. Eu tentei ser o mais articuloso possível em minha resposta, e em troca, recebo algo tão curto e objetivo. Eu queria algo um pouco maior, talvez mais doce, mais indireto... eu queria qualquer coisa. Eu queria algo que vira mais cedo naqueles olhos. Depois de um bom tempo lutando comigo mesmo e me odiando por ter mandado a mensagem, adormeci. Seria um longo dia na faculdade.

“Bom dia, Leo. Espero que tenha dormido bem. Tenho planos de assistir a Orquestra Sinfônica no encerramento do outono no Central Park esta noite, pensei que talvez você pudesse me acompanhar. Não se preocupe. Eu não mordo”.

Acordar e ver essa mensagem fez com que o frio do lado de fora não fosse mais um problema. Ter que acordar para um dia agitado... o que tem? O importante é que aquele par de olhos me mandou um texto antes mesmo que eu acordasse!

“Adoraria ir com você, Benjamin. Café da 9st às 7:00?” – enviei ansioso pela resposta.

“Combinado. Mal posso esperar para vê-lo” – foi a resposta que me estampou um sorriso de orelha a orelha.

O dia até que passou sem nem muito estresse. Apesar de todas as aulas e correrias da semana, eu sabia que algo interessante aconteceria aquele dia. Quando cheguei em casa, minha família americana percebeu que algo estava fora do lugar. Meu sorriso estava diferente e eu estava eufórico – palavras usadas por um deles.

Como ainda não tinha falado sobre a questão da minha homossexualidade, menti dizendo que encontraria no parque, uma menina que conheci mais cedo.
O momento de sair de casa finalmente chegou. Senti-me um idiota experimentando todas as roupas e casacos, na esperança de que algo combinasse e ele me visse como um bom hipster que me julgava ser.

Como era de se esperar, o metro estava cheio. Músicos tocando para todos os lados, pessoas morando literalmente dentro das estações de metros e túneis, e alguns ratinhos que se transportavam entre as estações. Uma típica noite nova-iorquina. Felizmente, morava apenas a duas estações do Central Park, o que fez o trajeto durar pouco mais de 5 minutos.

6:48. Cassete! Eu parecia uma menina. Como se tivesse chegado com 7452965 horas de antecedência. Ajeitei o cabelo, verifiquei o perfume, tirei meu caso e pedi o que sempre pedia: um hot chocolate, por favor.

7:00. Ele não está aqui. Ele não vai vir. Alguma coisa aconteceu. Ele estava apenas de piada com a minha cara. Uma hora dessas ele está rindo de mim. Como eu pude ser tão idiota? Eu deveria ter ouvido minha intuição e ter ficado em casa. Pessoas sempre fazem isso. Como eu sou tolo.

Leo? Estou esperando desde as 6:30, não tinha te visto aqui – disse Benjamin calando meus pensamentos e me fazendo instantaneamente suar frio e cair da dura realidade de um menino tímido.

Demorei alguns segundos até voltar a si e falei qualquer coisa sem sentido. Realmente não me lembro o que disse.

Ele me acompanhou no chocolate quente e menos de 3 minutos mais tarde, estávamos caminhando até o local do evento. Aquela típica cena americana: pessoas bem vestidas com casados, botas e luvas, carregando seus cafés ou chocolates quente, andando entre os arranha céus. Tudo parecia tão mágico. E eu estava suando. Nervoso, desesperado, com medo. Tinha medo de que nada aconteceria ali, mas ao mesmo tempo, tinha medo que ele realmente tivesse interessado em algo mais. Até então, meu único envolvimento com homem tinha sido no xvideos.

O concerto durou aproximadamente 2 horas. Musica clássica e alguns nuances da contemporaneidade. Muita gente fingindo interesse, crianças correndo, casas discretamente se beijando e eu ali, perdido naquele ambiente. Sinceramente, a música não me interessou. Sou mais ligado ao Jazz, Blues e Soul. O frio, a música, as pessoas e o charme da cidade: tudo aquilo perdeu a importância e tudo o que eu podia pensar era naquele par de olhos verdes.
Não nos conversamos muito durante o concerto, porque ambos estavam compenetrados. Bem, ele pelo menos, estava. Em algumas ocasiões, nossas mãos se tocaram tentando encontrar o copo de chocolate, e também percebi que seus olhos, eventualmente, se perdiam nos meus, quando estava distraído. Algo estava acontecendo.

Quando o concerto acabou, ele disse que me levaria até em casa. Ele também estava usando o metro, e portanto, isso não seria muito útil, e por isso, rimos da situação. Como morava muito perto, não teríamos tempo de conversar muito, então decidimos enfrentar o frio e o vento e caminhar pelas ruas de Nova Iorque até o apartamento onde morava em Manhattan. A conversa fluiu incrivelmente bem. Falávamos como amigos íntimos e compartilhávamos memórias, ideologias, sonhos e aventuras. Era impressionante como ele era bem mais do que um lindo par de olhos verde. Descobri sobre ele: tinha 28 anos, se mudara de Atlanta, para Nova Iorque depois de terminar sua faculdade. Trabalhava como professor em um importante colégio de Artes. Falava alemão e Frances, não sabia muita coisa sobre o Brasil, mas era sempre interessado pelo homem brasileiro. Estivera em dois relacionamentos sérios e matou seu cachorro atropelado. Claro, num acidente. Tantas coisas em comum. Eu também matei meu ratinho. RIP.

Quando enfim chegamos a porta do meu apartamento, ele me olhou. Outra vez, senti-me arrebatado por aquele par de olhos verde. Era impressionante como ele conseguia penetrar meus sentimentos sem mesmo fazer ou falar nada. Talvez por ser a primeira vez em que estava tão perto assim de um homem com quem me interessara, sem medo de julgamento ou acusação, ou simplesmente pela química. Eu não sei. Sei apenas que tudo aquilo era mágico.

Um silencio constrangedor tomou conta da situação. Eu sabia que deveria fazer alguma coisa, mas estava nervoso, tremendo, suando e quase chorando. Ele percebeu que algo estava fora do lugar, e, segurando minha mão, sussurrou em meu ouvido direito:

“Tudo está legal. Não se preocupe” – e me beijou.

O preconceito. – e me beijou.
Uma barba envolvendo a minha – e me beijou.
Um coração acelerado praticamente grudado ao meu – e me beijou.
O que meus pais no Brasil pensariam se me vissem naquela situação – e me beijou.
O que eu faria com toda a questão religiosa por trás da homossexualidade – e me beijou.
O que minha família americana diria quando eu dissesse que era gay – e me beijou.

O mundo parou, quando senti que os pelos que aqueciam meu rosto agora, não eram apenas os meus.


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Comentários


foto perfil usuario iuri

iuri Comentou em 30/08/2015

Completamente envolvido pelo conto. A sutileza da interpretação, a não necessidade de ser erótico... e ao mesmo tempo,me fez sentir cada calafrio junto com o Leo,grato por dividires essa experiência conosco. Parabéns pelo conto.

foto perfil usuario boxboxbox

boxboxbox Comentou em 28/08/2015

Amei o seu conto. Gostei muito e votei. Leia também o meu conto publicado hoje. Conto nº 69961 "Dicas sobre locais apimentados onde praticar sexo"




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Ficha do conto

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Nome do conto:
gringobrasileiro - Minha primeira vez - Parte 1

Codigo do conto:
69928

Categoria:
Gays

Data da Publicação:
27/08/2015

Quant.de Votos:
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